Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:00534/05
Secção:CT - 2.º Juízo
Data do Acordão:12/06/2005
Relator:Casimiro Gonçalves
Descritores:SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:Nos termos do disposto no nº 1 do art. 183º-A do CPPT, ocorre a caducidade da garantia prestada para suspender a execução fiscal em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição, quando, designadamente, na impugnação judicial não tiver sido proferida decisão em 1ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação, sendo que, com a redacção introduzida pela Lei nº 15/2001, de 5/6, passou a admitir-se a caducidade da penhora, em termos idênticos aos do art. 183º-A do CPPT, para a caducidade da garantia (cfr. nº 1 do art. 235º do CPPT).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: RELATÓRIO

1.1. A Fazenda Pública recorre da decisão que, proferida pelo TAF de Almada, no processo de impugnação judicial deduzida pela sociedade «E... - Comércio de Automóveis Novos e Usados, Lda.», com os demais sinais dos autos, ali corre termos sob o nº 306/2001, decisão na qual se «decreta o levantamento da penhora efectuada no processo de execução fiscal n° 2160-00/104482.6, para garantia da dívida exequenda referente ao IVA de 1999 e respectivos juros compensatórios».

1.2. A recorrente Fazenda Pública alegou o recurso e termina formulando as Conclusões seguintes:
1 - A executada requereu a caducidade da garantia nos termos do Art. 183º-A conjugado com o n° 1 do Art. 235º, ambos do CPPT;
2 - Foi proferido despacho decretando o levantamento da Penhora;
3 - A Representação da Fazenda Pública entende que só as penhoras em bens indicados pelo executado caem no âmbito da caducidade, prevista no n° 1 do Art. 183º-A, por remissão do n° 1 do Art. 235º do CPPT. Pelo que terá o referido despacho interpretado e aplicado inadequadamente os referidos Artigos.
4 - In casu, a penhora foi promovida pela Administração Fiscal tendo sido antecedida por arresto por existir fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributários.
5 - A referida penhora não suspende a execução fiscal nos termos do Art. 169º do CPPT, já que não satisfaz a totalidade da dívida exequenda.
6 - Ao admitir-se a caducidade da garantia estar-se-ia a esvaziar de conteúdo o objectivo principal e o efeito prático da Penhora, gorando-se as expectativas da Administração Fiscal.
7 - Foi por motivos alheios à Administração Fiscal que o prazo de caducidade foi ultrapassado.
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida.

1.3. Contra-alegou a recorrida «E... - Comércio de Automóveis Novos e Usados, Lda.», alegando:
- em sede de questão prévia,
- (i) quer a sua discordância quanto ao efeito suspensivo que foi atribuído ao recurso [já que alegadamente lhe foi fixado efeito suspensivo com base em que a atribuição de efeito devolutivo poderia comprometer o seu efeito útil, quando é certo que a Fazenda Pública se limita a fazer uma alegação geral e abstracta não especificando ou concretizando o porquê de se comprometer o efeito útil do recurso com a fixação de efeito meramente devolutivo, como é, aliás, a regra; e sendo que não fazendo uma alegação socorrendo-se de factos concretos, se encontra a Fazenda Pública impedida de provar o que (não) alegou, não se podendo, pois, manter o despacho de admissão do recurso, no segmento em que ao mesmo recurso atribuiu efeito suspensivo, por violação do art. 286º nº 2 do CPPT];
- (ii) quer a intempestividade do dito recurso interposto pela Fazenda [porque esta enviou, para o Tribunal e via fax, o seu requerimento de recurso no último dia do prazo de que dispunha para o efeito, e apenas fez dar entrada do original do mesmo no primeiro dia após o termo daquele prazo, sendo que a regulamentação legal do envio de peças processuais por telecópia se encontra nos arts. 2º e 4º do DL nº 28/92, de 27/2, e tal diploma tem aplicação, no que ao caso interessa, para os advogados, não resultando desse diploma que ele seja de aplicação extensiva à Fazenda Pública, que tem um estatuto próprio que de forma alguma se confunde com o estatuto dos advogados e sendo que também nenhuma invocação de justo impedimento ou manifestação de pretender praticar o acto fora do prazo foi feita pela Fazenda];
- (iii) e sustentando, no mais, a confirmação do julgado e formulando as Conclusões seguintes:
a) Não tem qualquer cobertura legal a interpretação que a Fazenda Pública faz dos artigos 183º-A e 235º do CPPT.
b) Não é o facto de a iniciativa para a penhora ter partido da exequente ou do executado que prejudica a aplicação do regime previsto no art. 183º-A do CPPT.
c) Tão pouco é o facto de o bem penhorado não ter valor suficiente para solver a quantia exequenda que prejudica a aplicação daquele regime uma vez que a lei tal não prevê.
d) Bem ao contrário do pretendido pela Fazenda Pública é a sua interpretação que viola a Lei nº 15/2001 de 5 de Junho.

1.4. Tendo o recurso sido inicialmente interposto para o STA, este alto Tribunal veio a julgar-se incompetente, em razão da hierarquia, para dele conhecer (decisão de fls. 80/81), dado que o mesmo recurso não versa exclusivamente matéria de direito, e afirmou, para tanto, a competência do TCAS.

1.5. Remetidos os autos a este TCAS, o EMMP promoveu que, nos termos do disposto no nº 4 do art. 742º do CPC, se juntassem aos autos os elementos documentais quer reproduzem o auto de arresto que terá sido efectuado sobre o «lote de terreno designado como lote 15 da Quinta das Rebelas, em 2/8/99 e convertido em penhora em 10/7/2001, bem como os documentos que apresentam tais bens como garantia do pagamento da totalidade da dívida exequenda.
Ordenada que foi a junção de tais elementos, vieram aos autos os de fls. 91 e sgts..
E, notificada a junção às partes, nada alegaram.

1.6. O EMMP emitiu Parecer no qual se pronuncia pelo provimento do recurso, sustentando o seguinte:
A fls. 109 a 114 dos autos de recurso de agravo n° 567/05 a correr termos neste TCA, está junta certidão da qual consta que os bens penhorados não garantem a totalidade da dívida exequenda e que após notificação para proceder à prestação de garantia idónea, a executada nada fez;
Nos presentes autos foi promovida a junção de certidão com estes elementos mas por lapso, não constam da mesma esses elementos.
Todavia, devem ter-se por provados, face àqueles elementos, tais factos, que são pertinentes para a apreciação do requerimento de levantamento da garantia.
A apreciação e fixação destes factos no despacho recorrido mostrar-se-ia relevante para uma interpretação dos mesmos, consentânea com uma correcta interpretação dos preceitos legais que fundamentam a apresentação das garantias pelos executados e com a sua posterior integração nos preceitos citados no despacho recorrido.
Assim, não se deverá fazer aplicação do disposto no art. 183°-A do CPPT sem curar de se interpretar e integrar na factualidade do caso em apreço o que dispõem os art. 195°, 199° e 169° do CPPT, sendo aliás a própria requerente ao levantamento da garantia que cita os art. 199° e 169° do CPPT em favor da sua pretensão.
Tal como bem refere a recorrente a garantia tem de ser prestada pelo executado nos termos dos art. 195° e 199° do CPPT, devendo ser garantia que abranja a totalidade da dívida.
Como decorre dos elementos factuais constantes do processo executivo, os bens penhorados já tinham sido arrestados anteriormente pela AT como meio de acautelar o pagamento das dívidas existentes da responsabilidade da executada "E...", sendo tais bens considerados insuficientes para garantir o respectivo pagamento e resultando também que apesar de notificada para prestar garantia suficiente a executada não o fez.
A sua pretensão ao levantamento da penhora ao abrigo do disposto no art. 183°-A do CPPT, afigura-se, pois, destituída de fundamento legal, uma vez que não se encontravam reunidos os pressupostos de prestação de garantia viável, como atrás se referiu.
Pelo que o pretendido levantamento da penhora não tem fundamentação legal face às condicionantes atrás referidas e poderá ser um meio hábil para conduzir à frustração dos fins próprios assegurados pela penhora dos bens já arrestados anteriormente pela recorrente AT.
Deve, portanto, ser concedido provimento ao recurso, pôr ter sido feita na decisão recorrida, uma incorrecta apreciação da matéria de facto e uma incorrecta interpretação dos preceitos legais aplicados.

1.7. Em face do teor do Parecer do MP, foi ordenada, pelo despacho de fls. 122, a junção da referida certidão de fls. 109 a 114 do Processo de recurso nº 567/05, dete TCAS.
E junta esta, foram as partes notificadas, tendo a recorrida E... vindo alegar o que consta de fls. 132 a 136, onde, em síntese, sustenta o seguinte:
- Nos presentes autos encontra-se já penhorado um bem cujo valor patrimonial é de € 896.777,52. Tal bem, por força do art. 199° nº 4 do CPPT, constitui já uma garantia para efeitos de suspensão do processo de execução.
- Entendendo que a dita garantia se tornou insuficiente o que a DGCI poderia fazer era solicitar o seu reforço – art. 199° nº 9 do CPPT. Mas não o fez, antes se limitando a dizer, por informação de 30/1/2002, que o bem penhorado não garante a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.
- Por despacho daquela mesma data, e para além de se ordenar a notificação da recorrida para prestar garantia, diz-se, de seguida, que deverá ser passado mandado ao Presidente da Comissão de Avaliação para emitir parecer técnico nos termos do art. 250° nº 1 alínea a) do CPPT. Ou seja o valor base do bem ainda teria de vir a ser determinado nos termos daquele art. 250° nº 1 al. a) do CPPT, o que ainda não tinha sido feito. Ora tal não parece ter impedido que, em tom meramente opinativo e sem qualquer suporte científico, se tenha escrito na informação prévia à avaliação que o bem não garantia a alegada dívida exequenda.
- A questão que fica é como é que se pode fazer tal afirmação sem que o bem imóvel tenha sido avaliado por quem tem a competência técnica e legal para o efeito e sem que tenha sido dada à recorrida, mediante a sua notificação para o efeito, a oportunidade de se pronunciar sobre os valores determinados pela DGCI e de saber quais os critérios que levaram à consideração do bem penhorado como insuficiente para garantir a suposta dívida e acrescido.
- Sendo evidente que aquela afirmação não só não podia ter sido feita como também não terá qualquer validade jurídica, pois que admitir o contrário seria admitir que a recorrida não pode questionar perante o órgão competente a suposta "avaliação" efectuada, atacando a mesma e pugnando pela fixação de outro valor mais consentâneo.
- O que é de todo inaceitável pois seria violado o seu direito ao contraditório que deve ser acautelado ao longo de todo o procedimento e de todo o processo – art. 45° do CPPT, sendo que no art. 267, nº 5, da CRP, se reconhece aos cidadãos o direito de participação na formação das decisões e deliberações que lhes digam respeito e sendo que o CPA concretizou este direito no seu art. 8°.
- Por outro lado o bem penhorado já constitui ele próprio uma garantia, mas a recorrida está a ser interpelada para constituir agora uma nova garantia tendo como valor de referência € 15.613.278,55, ou seja, garantia essa que visa acautelar a totalidade da alegada dívida e acrescido, ignorando-se, por completo, se com penhorado se acautela já a totalidade ou parte da alegada dívida.
- Tal, manifestamente, também não pode suceder uma vez que a ter de existir qualquer garantia agora a constituir, o que não se sabe se é necessário, teria de se lhe descontar o valor do bem já penhorado.
- Ainda por outro lado a liquidação ora efectuada, para efeitos de constituição de garantia, também se encontra errada por outra via: é que da indicação da taxa de justiça (presume-se que sejam as custas prováveis) consta o valor de € 108.868,09. Ora compulsando o CCJ em vigor, verifica-se que não existe taxa de justiça que alcance, sequer ao de leve, aquele valor.
- Verifica-se finalmente que, para determinação do valor de referência da garantia a constituir, se referem «Despesas c/ Conservatória do Registo Predial» de € 33.254,40. Ora para além de se não fundamentar minimamente tal valor resulta também da respectiva tabela emolumentar dos registos e notariado que aqueles montantes não têm qualquer adesão à realidade no que respeita ao registo de actos de penhora ou de arresto.
- Dito de outro modo, os valores avançados na liquidação efectuada pecam por excesso manifesto.

1.8. Corridos os Vistos legais, cabe decidir.


FUNDAMENTOS

2.1. A decisão recorrida julgou provados os factos seguintes:
1 - Em 13/7/2001 foi apresentada no Serviço de Finanças do Barreiro a petição que originou a autuação do presente processo de impugnação (cfr. carimbo aposto na petição de fls. 3/25).
2 - Em 18/3/2002 foi proferido despacho pelo juiz do extinto Tribunal Tributário de 1ª Instância de Setúbal como consta de fls. 52 com o seguinte teor: “proceda a secretaria a diligências no sentido de se obter uma data para a inquirição das testemunhas arroladas, por ambas as partes, nos dias previstos para as inquirições”.
3 - Em 27/1/2003 foi proferido pelo juiz do extinto Tribunal Tributário de 1ª instância de Setúbal o despacho de fls. 59 com o seguinte teor: “Renovo o meu despacho de fls. 52”.
4 - Em 18/3/2004 deram entrada na secretaria deste Tribunal os presentes autos de impugnação (doc. de fls. 61).
5 - Em 18/6/2004 foi aberta conclusão, tendo sido proferido na mesma data o respectivo despacho (doc. de fls. 64/65).
6 - Em 15/9/2004 foi apresentado o requerimento de declaração de caducidade da garantia (doc. de fls. 123/125).
7 - O processo de execução fiscal nº 2160-00/104482.6 é referente a IVA e juros compensatórios dos anos de 1996, 1997, 1998 e 1999 (cfr. docs. de fls. 129/131)
8 - Em 5/10/2001 no âmbito do processo de execução fiscal n° 2160-00/104482.6, foi lavrado o auto de penhora do “prédio urbano sito na Quinta das Rebelas, lote nº 15 composto por edifício para armazém industrial com a superfície coberta de 1.799,68 m2 e descoberta de 2.980,32 m2” conforme consta do auto de fls. 130/132.
9 - Os presentes autos de impugnação judicial encontram-se em fase de instrução.

2.2. E, com base em tal factualidade, a decisão recorrida, em aplicação do disposto no nº 1 do art. 183º-A do CPPT, julgou verificada a caducidade da garantia prestada para suspender a execução em caso de impugnação judicial (ordenando, consequentemente, o levantamento da penhora efectuada no processo de execução fiscal nº 2160-00/104482.6, para garantia da dívida exequenda referente ao IVA de 1999 e respectivos juros compensatórios), fundamentando-se em que dos factos dados como provados se verifica efectivamente que desde a data de interposição da presente impugnação decorreram mais de 3 anos, sem que tenha sido proferida a respectiva decisão, por motivo que não é imputável à impugnante, pelo que estão preenchidos os pressupostos previstos no art. 183º-A, por remissão do nº 1 do art. 235º, ambos do CPPT.

3. Nas suas contra-alegações a recorrida E..., Lda., suscita, em sede de questões prévias, quer a sua discordância quanto ao efeito suspensivo que foi atribuído ao recurso, quer a intempestividade do presente recurso interposto pela Fazenda.
Importa, assim, antes de mais, apreciar desde já, estas questões.

3.1. A respeito da questão do efeito atribuído ao recurso, a recorrida sustenta que a Fazenda Pública se limita a fazer uma alegação geral e abstracta, não especificando ou concretizando o porquê de se comprometer o efeito útil do recurso com a fixação de efeito meramente devolutivo e, por isso, não tendo alegado factos concretos, a Fazenda está impedida de provar o que (não) alegou.
Mas não tem razão, já que de todo o conjunto das alegações se percebe claramente que o que a Fazenda sustenta é que se ao recurso for atribuído efeito meramente devolutivo, então, o levantamento da garantia, poderá desde já comprometer a arrecadação da dívida exequenda.
E porque também assim entendemos, e porque também é certo que o recurso jurisdicional tem efeito suspensivo, quando, nomeadamente, o efeito meramente devolutivo (regra) afectar o efeito útil do recurso - nos termos do nº 2 do art. 286º do CPPT, improcede esta alegada questão prévia, não se alterando o efeito atribuído ao recurso.

3.2. Quanto à questão da tempestividade do recurso:
A recorrida sustenta, nesta parte, que não sendo o DL 28/92 aplicável à Fazenda Pública e não invocando esta justo impedimento ou manifestação de pretender praticar o acto fora do prazo, então o recurso é extemporâneo.
Mas também aqui a recorrida carece de razão legal.
Com efeito, as peças referentes a quaisquer actos que devam ser praticados pelas partes no processo podem ser enviadas por telecópia, valendo como data da prática do acto processual a da sua expedição – de acordo com os termos dos arts. 143º, nº 4 e 150º, nº 2, al. c), ambos do CPC (na redacção do DL nº 183/2000, de 10/8), aplicáveis ao caso por força do disposto na al. e) do art. 2º do CPPT.
Acresce que a circunstância de a Fazenda Pública ter um estatuto próprio não obstaria, ao que julgamos, só por si, para obstar à aplicação do regime previsto no DL 28/92.
Improcede, pois, também esta alegada questão prévia.

4. Quanto à questão de fundo do recurso:

4.1. Esta questão circunscreve-se, como acima se disse, à de saber se a decisão recorrida sofre de erro de julgamento de facto e de direito, por violação do disposto no nº 1 do art. 183º-A e no nº 1 do art. 235º, ambos do CPPT.
E, embora o MP alegue que deve ser aditado ao Probatório fixado no despacho recorrido também a factualidade, provada, decorrente dos elementos documentais ora juntos a fls. 93 a 117 e 124 a 129, julga-se que tal factualidade se mostra desnecessária à decisão da questão a apreciar no presente recurso, como adiante melhor se explicitará.
Daí que se acolha aquela factualidade especificada como provada no despacho recorrido, sem necessidade de qualquer aditamento.

4.2. A questão agora em apreciação já foi decidida e apreciada, em termos uniformes, por este TCAS, nomeadamente nos acs. de 24/6/2003, 21/6/2005, 18/10/2005 e 25/10/2005, respectivamente, nos recs. 724/03, 552/05, 582/05 e 567/05, em que, igualmente, foi recorrente a Fazenda pública e recorrida a E... – Comércio de Automóveis Novos e usados, Lda..
E, como em tais arestos se refere, sendo certo que de acordo com os termos do nº 1 do art. 183º-A do CPPT, ocorre a caducidade da garantia prestada para suspender a execução fiscal em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição, quando, designadamente, na impugnação judicial não tiver sido proferida decisão em 1ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação, com a redacção introduzida pela Lei nº 15/2001, de 5/6, passou a admitir-se a caducidade da penhora, em termos idênticos aos do art. 183º-A do CPPT, para a caducidade da garantia - cfr. os termos do nº 1 do art. 235º do mesmo CPPT.
Na verdade, de acordo com o disposto no nº 1 deste art. 235º “A penhora pode ser levantada verificados os pressupostos previstos no art. 183º-A aplicando-se os termos aí estatuídos, com as necessárias adaptações.”
Ora, ao contrário do sustentado pela Fazenda (na Conclusão 3ª do recurso) não se vê que aquele art. 235º, nº 1 do CPPT dê acolhimento à sua tese (no sentido de que, ao falar-se em termos aí estatuídos, se restringe o campo de aplicação daquela previsão aos casos em que a penhora tenha recaído sobre bens nomeados pelo executado), desde logo porque em lado algum da secção que trata da apreensão de bens se fala (ao contrário do que acontece no processo civil) em nomeação de bens pelo executado. Pelo que, daqui se pode inferir com razoabilidade, que o legislador não visou, em tal disposição, fazer aquela distinção, antes (na lógica do sistema, em que joga papel primordial a pressão no sentido de que sejam rapidamente decididos os processos de que possa depender o prosseguimento ou extinção da execução) se pretendeu equiparar, como acontece noutros lugares, a penhora às outras formas de garantia do pagamento da quantia exequenda.
E dado que o preceito alude a penhora sem distinguir se a mesma foi promovida pelo executado ou pelo exequente, da conjugação do disposto nesses citados normativos resulta, pois, que aquele regime estatuído pelo art. 235º do CPPT é aplicável ao caso vertente.
Veja-se, aliás, que assentando a ratio do instituto da caducidade em razões de certeza, de segurança e de paz jurídica, e que se é por virtude desta caducidade que, no caso, se extinguem as garantias (sendo que todas as compressões dos direitos e garantias dos contribuintes têm de constar de lei formal), então, a proceder a lógica argumentativa da Fazenda, estar-se-ia a admitir como que um favorecimento da sua posição da AT em face da posição do contribuinte, quando, ao contrário, o certo é que a reclamação deverá ser decidida com a mesma rapidez e eficiência quer a penhora seja efectivada em bens indicados pelo contribuinte, quer seja efectivada em bens nomeados pela exequente. Doutro modo, penalizar-se-ia o contribuinte e ocorreria um efeito discriminatório que a lei não pretende com o regime de caducidade, que é de interesse público, visto estar estabelecida em benefício quer da AT, quer do contribuinte.
A Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, teve como primordial finalidade o reforço das garantias do contribuinte e a simplificação processual e, como acima se disse, com a redacção introduzida por este diploma legal, passou a admitir-se a caducidade da penhora, em termos idênticos aos do art. 183º-A do CPPT, para a caducidade da garantia, sendo que, como refere o citado ac. deste TCAS, de 24/6/2003, no articulado do diploma o legislador não distingue, no plano das consequências derivadas da pendência dos procedimentos e processos pendentes, entre as situações em que a penhora foi realizada em bens indicados pelo contribuinte ou pela AT, pelo que não é lícito que ao intérprete preencher a eventual lacuna ditando a norma que aquele criaria, de modo a distinguir o regime nas sobreditas situações. Para além de a analogia não ser consentida por estarmos no campo das garantias do contribuinte cujo reforço o legislador visou com o diploma de que se fala.
Como ali se escreve, «Decorre dos termos do art. 169º do CPPT, que a reclamação, a impugnação ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, só suspendem a execução desde que tenha sido constituída garantia nos termos do art. 195º do CPPT ou prestada nos termos do art. 199º do CPPT, ou desde que a penhora garanta a totalidade da dívida exequenda. Isto é a reclamação, a impugnação ou o recurso judicial, não impedem a instauração da execução. Mas, de todo o modo, a execução terá necessariamente que suspender-se após a prestação de garantia ou após a penhora de bens suficientes (no caso de não ser requerida a prestação de garantia ou, sendo-o, não chegar a ser prestada). O núcleo das garantias constitucionais fica, portanto, salvaguardado com este regime de suspensão obrigatória, nesta fase, da execução instaurada, pois que, se a impugnação for julgada procedente, a execução se extinguirá necessariamente devido à consequente anulação da dívida e pois que o executado só responderá pelas custas relativas ao processado posterior à penhora no caso de não dar conhecimento da existência de processo que justifique a suspensão da execução (nº 4 do art. 169º do CPPT).
«Como decorre daqueles casos, a suspensão da execução só é possível quando haja sido prestada garantia ou efectivada penhora, durando aquela suspensão até se decidirem definitivamente os referidos processos, sem prejuízo de ser declarada a caducidade das garantias nos termos dos artigos 183º-A e 235º do CPPT.
«Pela combinação dos casos acabados de citar é possível reconstruir a norma reveladora da aplicação dum princípio geral expresso e que é o de que o deferimento da caducidade das garantias, verificadas as condições legalmente previstas, importa o levantamento das mesmas, quer as mesmas hajam sido constituídas por iniciativa do contribuinte, quer por iniciativa da AF.
«A suspensão nos casos - como o dos autos- em que há controvérsia judicial, seja quanto à legalidade, seja quanto à eficácia, quer mesmo quanto ao respectivo montante da dívida, é ditada pela necessidade de se aguardar pela decisão final da demanda, o julgamento final da causa, passando então a determinar-se v.g. a legalidade ou ilegalidade do tributo, a irresponsabilidade do oponente pelo pagamento (…). Mas o legislador veio reforçar as garantias do contribuinte por razões de ordem pública referidas à celeridade processual, evitando que as delongas imputáveis aos serviços da AT e à administração judiciária penalizem o contribuinte, independentemente de ter sido por iniciativa deste ou do exequente público que foram constituídas as garantias a que aludem os arts. 183º-A e 235º do CPPT.»
Perante tudo o exposto, improcedem, em consequência, quer as razões aduzidas pelo MP (e, consequentemente, a pretendida alteração do Probatório fixado na decisão recorrida, com o aditamento dos factos decorrente dos elementos documentais ora juntos a fls. 93 a 117 e 124 a 129, já que, como se viu, se mostram desnecessários à decisão), quer as Conclusões do recurso da Fazenda, devendo manter-se a decisão recorrida e ficando assim prejudicada a apreciação das questões suscitadas pela recorrida no seu articulado de fls. 132 a 136


DECISÃO
Termos em que acordam, em conferência, os juizes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em, negando provimento ao recurso, confirmar a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, 06/12/2005