Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06694/02
Secção:Contencioso Tributário - 1º Juizo Liquidatário
Data do Acordão:06/08/2004
Relator:Casimiro Gonçalves
Descritores:TRIBUTAÇÂO
Sumário:1. Para efeitos do disposto na al. d) do nº 1 do art. 38º do CIRS, os indícios seguros de que a contabilidade ou os livros de registo não reflectem a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido não podem concretizar-se em meras semelhanças ou juízos de valor quanto aos preços por que os bens foram declarados.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: RELATÓRIO

1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença proferida no processo de impugnação deduzida por António ....e Maria ...., ambos com os sinais dos autos, e que correu termos sob o nº 189/2000 da 1ª secção do 1º Juízo do Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto, e na qual se decidiu pela não anulação das liquidações adicionais de IRS dos anos de 1994, 1995 e 1996, respectivamente nos montantes de Esc. 740.766$00, 2.518.456$00 e 3.580.598$00, acrescendo juros compensatórios respectivos nas quantias de 2.158.832$00, 909.663$00 e 741.626$00.

1.2. A Fazenda termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes Conclusões:
1. A prova testemunhal produzida não nos parece poder merecer qualquer credibilidade por emitida por alguns compradores dos prédios que confirmaram os valores.
2. A inspecção tributária carreou indícios seguros dos preços se encontrarem subestimados.
3. A tributação indiciária não se mostra bolida.
4. Foi violado o artigo 38° do CIRS.
Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da sentença.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O Exmo. Magistrado do MP emite Parecer onde sustenta que deve ser negado provimento ao recurso, já que, conforme refere a sentença, a AT não logrou demonstrar e recolher elementos de prova objectivos que permitam concluir, à luz da experiência comum, que tenha ocorrido a pretensa simulação de preços de venda dos imóveis, não se mostrando verificados os pressupostos legalmente exigidos para determinação da matéria colectável com recurso a métodos indiciários.

1.5. Correram os vistos legais e cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2.1. A sentença recorrida julgou provados os factos seguintes:
a) Pelos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária foi efectuado exame à contabilidade da impugnante relativamente aos exercícios de 1994 a 1997, ambos inclusive, tendo sido elaborado o relatório de folhas 80 a 96 o qual aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
b) Em consequência foi fixado aos impugnantes o rendimento colectável para 1994, 1995 e 1996 no valor de esc. 12.019.603$00, esc. 9.087.044$00 e esc. 12.453.054$00, respectivamente - cfr. fls. 86 v..
c) Pela impugnante foi apresentada reclamação nos termos do art. 84° do CPT - cfr. fls. 83.
d) Aquela reclamação foi indeferida na totalidade, tendo o Presidente da Comissão mantido os valores patrimoniais antes fixados e os agravamentos de esc. 140.000$00, 108.000$00 e 145.000$00, tudo conforme documentos de folhas 79 e 81.
e) A Administração fiscal procedeu à liquidação aos impugnantes do IRS referente a 1994 no valor a pagar de esc. 5.899.598$00, cuja data limite de pagamento ocorreu em 2/12/1999 - cfr. fls. 67.
f) A Administração fiscal procedeu à liquidação aos impugnantes do IRS referente a 1995 no valor a pagar de esc. 3.428.119$00, cuja data limite de pagamento ocorreu em 2/12/1999 - cfr. fls. 68.
g) A Administração fiscal procedeu à liquidação aos impugnantes do IRS referente a 1996 no valor a pagar de esc. 4.322.224$00, cuja data limite de pagamento ocorreu em 2/12/1999 - cfr. fls. 69.
h) Os impugnantes venderam a Joaquim Luís Barbosa Silva o lote n° 20 pelo preço de esc. 1.080.000$00 - depoimento da 1ª testemunha.
i) Os impugnantes venderam a Rosa Maria Pereira Moreira o lote n° 18 pelo preço de esc. 1.520.000$00 - depoimento da 2ª testemunha.
j) Os impugnantes venderam a António Manuel Ramos Silva o lote n° 59 pelo preço de esc. 3.000.000$00 - depoimento da 3ª testemunha.
k) Os impugnantes venderam a Abílio Fernando Coelho Ribeiro o lote n° 5 pelo preço de esc. 1.050.600$00 - depoimento da 4ª testemunha.
l) Os impugnantes venderam a António Fernando Ferreira Coelho o prédio descrito no documento de folhas 65 e 66 pelo preço de esc. 2.400.000$00 - depoimento da 5ª testemunha.
m) Damos aqui por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais os documentos de folhas 5 a 66.

2.2. Em relação aos factos não provados a sentença exarou: «Não se provaram outros factos para além dos enunciados supra».
E relativamente à fundamentação dos factos provados e não provados, exarou o seguinte: «O Tribunal formou a sua convicção com base nos documentos indicados relativamente a cada um dos factos os quais não foram impugnados e nos depoimentos das testemunhas dada a razão de ciência invocada.»

3. Com base nesta factualidade e enunciando as questões a decidir como sendo as de saber se existe ilegalidade da tributação segundo o método indiciário e se se verifica erro na quantificação da matéria colectável, a sentença conclui pela resposta afirmativa logo à primeira das questões referidas, com fundamento em que a AT não logrou demonstrar com a certeza jurídica necessária que os valores declarados sejam falsos.
E, como logo decorre do teor das Conclusões do recurso, a Fazenda contesta o assim decidido por entender que ocorre erro de julgamento de facto e de direito.
Vejamos, pois.

4. A Fazenda sustenta que a prova testemunhal produzida não parece poder merecer qualquer credibilidade por emitida por alguns compradores dos prédios que confirmaram os valores, sendo que a Inspecção Tributária carreou indícios seguros de os preços se encontrarem subestimados, pelo que a tributação indiciária não se mostra bolida.
Mas, a nosso ver, carece de razão.

4.1. Como consta do Probatório, os Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária efectuaram exame à contabilidade dos impugnantes relativamente aos exercícios de 1994 a 1997 e do respectivo relatório, que a sentença deu por reproduzido, consta, além do mais, no que agora interessa, o seguinte:
«2.1.1 - Trata-se de um contribuinte em nome individual ... que exerce a actividade de Compra e Venda de Imóveis ... actividade esta que nos anos em análise e em concreto, se limitou à compra de 2 apartamentos - fracções DO e DT de uma habitação na rua Sarmento Pimentel em Leça - Matosinhos e o restante à compra de terrenos para lotear e à venda do apartamento fracção DT, 22 lotes na Urbanização de S. Simão - Coreixas, Irivo, em Penafiel e de alguns terrenos sem lotear.
(...)
Possui os livros a que se refere o artigo 50° do CIVA, que se encontram devidamente escriturados até à presente data, se bem que e desde o ano de 1996 (inclusive), devesse possuir contabilidade organizada em cumprimento da alínea b) do n° 1 do art. 109 do Código do IRS.
(...)
A escrita não nos merece credibilidade, dado que são manifestos os erros praticados na execução da mesma, com erros de somas e erros de classificação demasiado frequentes, mesmo em operações isentas de dificuldade de enquadramento, como seja a contabilização de custos e até proveitos (em 1997 contabiliza-se como compra o que é uma venda de um terreno no valor de 8.310 contos). Refira-se que foram contabilizados custos, de cariz manifestamente particular do sujeito passivo, que em cada exercício se expurgarão, como correcções técnicas.
Por outro lado, foram detectadas inúmeras incorrecções na elaboração dos inventários de existências dos exercícios em análise, que omitem prédios adquiridos pelo sujeito passivo para a actividade e o valor dos bens e serviços gastos com as infra-estruturas dos loteamentos, como adiante referiremos aquando da determinação dos proveitos de cada exercício.
Passando agora à análise detalhada dos vários exercícios, verificamos os seguintes erros que descredibilizam a escrita do sujeito passivo:
Correcções Técnicas:
(...)
Presunção/Métodos Indiciários
8. - Aplicação de Métodos Indiciários.
Ora em conformidade com o art. 38° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS) e tendo em linha de conta a informação que antecede, bem como o que nos itens seguintes se referirá concretamente acerca das existências, cremos estarem reunidas as condições necessárias para a determinação do lucro tributável por métodos indiciários, uma vez que e como refere a alínea d) do referido art. 38° do CIRS, há erros ou inexactidões no registo das operações ou indícios seguros de que a escrita do sujeito passivo, não reflecte a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido, propondo-se assim a determinação do volume de vendas nos termos dos art. 82° e 84° do CIVA.
9. - Ano de 1994. Determinação do Volume de Negócios.
9.1. - Proveitos do exercício de 1994.
(...)
9.1.2. - Presunção de Vendas.
No exercício, o sujeito passivo, procedeu à venda dos primeiros 9 lotes da urbanização de S. Simão, situada em Coreixas, freguesia de Irivo, do concelho de Penafiel, em zona rural limítrofe da cidade e à venda da fracção DT (T3) do 1° andar direito com entrada pelo n° 358 sito na Praceta Sarmento Pimentel em Leça da Palmeira - Matosinhos.
Dado que os valores relevados nos elementos de escrita como sendo os das vendas dos imóveis não nos merecem credibilidade, vamos proceder à correcção dos Proveitos, do seguinte modo:
a. relativamente ao apartamento vendido e dado tratar-se de um T3 sito em Leça da Palmeira, vamos considerar como preço de venda o montante de 19.000.000$00, constante do índice de valores médios das transacções imobiliárias, fornecido pela Associação dos Industriais da C. Civil e Obras Públicas do Norte (AICCOPN) - (Cfr. ver doc. anexo n° 133);
b. relativamente aos lotes da urbanização de S. Simão, cuja localização é má (como pudemos comprovar da visita efectuada nesta data), por sobre ela passarem dois grupos de linhas de alta tensão da EDP com linhas a entrecruzarem-se a alguns metros dos telhados e com torres de ferro de transporte de linhas no meio dos arruamentos, situação esta que condicionou negativamente o preço de venda dos mesmos, vamos considerar como preço médio de venda por metro quadrado o valor de 2.500$00, (preço declarado de venda 2.000$00 e preço de avaliação para efeitos de sisa 2.100$00) como pudemos apurar junto de alguns dos compradores e já moradores na urbanização, que por motivos óbvios não querem ser identificados.
(...)
Resulta do que afirmamos que o valor das vendas corrigidas por presunção, no exercício de 1994 será de 32.900.000$00.
(...)
10. - Ano de 1995. Determinação do Volume de Negócios.
(...)
10.1.2 - Presunções de vendas
No exercício de 1995 o sujeito passivo vendeu 13 lotes de terreno (Cfr. ver Q. IX) da urbanização de - S. Simão em Irivo. O preço de venda eventualmente praticado neste exercício, sendo superior ao declarado, é também superior ao que utilizamos no exercício anterior (Cfr. ver item 9.1.2.b) pelas razões que expomos:
1. O preço de venda praticado em 1994, funcionou como preço de lançamento (promoção) do loteamento, que enferma das condicionantes negativas referidas naquele item;
2. Onerado pelos custos de infra-estruturas do ano, tais lotes foram manifestamente vendidos a preço superior ao de 1994;
3. Foi de 3.000$00 o preço médio de venda, segundo apuramos junto dos compradores desses lotes.
Assim vamos proceder à correcção das vendas de 1995 e que serão como consta do quadro IX:
Quadro IX
(...)
Resulta do que afirmamos que o valor das vendas corrigidas por presunção, no exercício de 1995 será de 24.420.000$00.
(...)
11. - Ano de 1996. Determinação do Volume de Negócios.
(...)
11.1.2.2. - Presunção de Vendas.
No exercício, o sujeito passivo, procedeu à venda dos lotes 59 e 60 da urbanização de S. Cosme, em Gondomar, à venda da sorte da Devesa e à venda referida no item 11.1.2.1 anterior.
E se no tocante à venda dos prédios Vinha da Raposa, Campo da Senhora Inês e Leiras das Vinhas, não se nos oferecem dúvidas quanto ao valor de venda, que foi de 1.500$00/m2 - valor que a C. M Penafiel praticou com todos os proprietários a quem adquiriu terrenos para a construção da variante, que refutou de extrema necessidade para a cidade e cujo preço deliberado em assembleia é de todos conhecido, já o mesmo não se poderá dizer quanto ao preço de venda dos restantes 3 prédios dado que os valores relevados na escrita como sendo os preços das vendas se nos afiguram subestimados, não nos merecendo credibilidade, pelo que vamos proceder à correcção dos Proveitos, do seguinte modo:
a. relativamente aos lotes 59 e 60 da urbanização de S. Cosme, em Gondomar, ambos com a área de 210 m2, vamos considerar o como preço de venda por m2 o valor de 29.000$00, constante do índice de valores médios das transacções imobiliárias, fornecido pela Associação dos Industriais da C. Civil e Obras Públicas do Norte (AICCOPN) - (Cfr. ver. doc. anexo n° 199);
b. relativamente à sorte da Devesa, pequena sorte de mato e muito pedregosa, cuja localização é de difícil acesso (como pudemos comprovar da visita efectuada nesta data), vamos considerar como preço médio de venda por metro quadrado o valor de 5.000$00, (preço declarado de venda 3.000$00 e preço de avaliação para efeitos de sisa 3.250$00), que teria sido o efectivamente praticado tendo em linha de conta o preço publicitado para a venda no local.
Do que fica dito, resulta o seguinte quadro de valores de vendas:
Quadro XI -
(...)
Resulta do que afirmamos que o valor das vendas corrigidas por presunção, no exercício de 1996 será de 23.690.000$00.
(...)
12. - Ano de 1997. Determinação do Volume de Negócios
(...)
13 - Determinação do Lucro Tributável Resultante das Correcções e das Presunções Efectuadas.
Tendo em consideração, os valores que a escrita selada revela e as correcções introduzidas resultantes da presunção por métodos indiciários a que procedemos, em conformidade com o referido nos itens 9, 10, 11 e 12 anteriores, bem como as correcções resultantes das correcções técnicas efectuadas, de conformidade com o referido nos itens 4, 5, 6 e 7 anteriores, é possível estabelecer o seguinte quadro de apuramento do lucro tributável nos diversos exercícios:
Exercícios de 1994 e 1995
(...)
1994
Resultado
Valor declarado - (9.618.625$)
Correcções - 21.638.228$
Valor Corrigido - 12.019.603$
1995
Resultado
Valor declarado - 4.501.177$
Correcções - 4.367.467$
Valor Corrigido - 8.868.644$
1996
Resultado
Valor declarado - (7.878.238$)
Correcções - 20.104.702$
Valor Corrigido - 12.226.464$
1997
Resultado
Valor declarado - (2.638.563$)
Correcções - 1.260.350$
Valor Corrigido - (1.378.213$)
(...)»

4.2. São estes os elementos probatórios em que, em relação ao lucro tributável calculado com recurso a métodos indiciários, a AT fundamentou a sua decisão de aplicação de tais métodos e que a ora recorrente Fazenda sustenta não terem sido infirmados pelos recorridos, ao contrário do que entende a sentença.
Mas, a nosso ver, a sentença decidiu correctamente.

4.3. Os impugnantes aceitam todas as correcções técnicas operadas pela AT. Contestam, apenas, as correcções resultantes do apuramento dos valores de venda dos imóveis com recurso a métodos indiciários, alegando que os prédios foram vendidos pelos valores constantes das escrituras e não outros.
Ora, do acima transcrito teor do Relatório resulta que, tal como se entendeu na sentença, no que respeita ao valor de venda da fracção autónoma e dos lotes de terreno (vendas realizadas nos anos de 1994, 1995 e 1996), a AT não aceita o preço da dita fracção autónoma declarado pelos impugnantes porque é inferior ao «índice de valores médios de transacções imobiliárias, fornecido pela Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Publicas do Norte» e não aceita os preços dos lotes também declarado pelos impugnantes porque os considera subestimados e por lhe ter sido informado por compradores ou moradores na urbanização que os preços praticados foram superiores.
Portanto, como se sustenta na sentença, do Relatório apenas ficamos a saber que a AT concluiu que a fracção autónoma em questão foi vendida por um preço inferior ao que consta do referido índice. Mas, para além deste, nenhuns outros motivos são indicados.
Ora, embora se não negue que o falado «índice» é um factor a ter em conta, não pode esquecer-se que tal «índice» não é o factor exclusivo. Ele tem que ser utilizado em associação com outros factores, tais como os atinentes ao próprio estado da fracção: nova/usada (ou se o índice contempla já algum outro índice de vetustez), degradada/ou em bom estado de conservação, qualidade de construção, localização, exposição solar, áreas, etc.. Mas, quanto a estes aspectos o Relatório nada diz. Limita-se a calcular o valor através do citado «índice» e a concluir que, uma vez que disso resulta um valor superior ao declarado pelos contribuintes, então o preço declarado é inferior ao realmente praticado.
E quanto aos lotes vendidos?
Como também se refere na sentença, apesar de no Relatório se referir que a sua localização é má e que existem ainda outras comprovadas circunstâncias susceptíveis de os desvalorizarem (sobre a urbanização passarem dois grupos de linhas de alta tensão da EDP, com linhas a entrecruzarem-se a alguns metros dos telhados e com torres de ferro de transporte de linhas no meio dos arruamentos) a AT acaba por concluir que o preço pelo qual foram vendidos é superior ao declarado porque os moradores da zona o disseram (e nem sequer identifica quem o disse e quais as razões porque o disse, onde é que esse alguém obteve tal conhecimento, «enfim, as razões de ciência de quem produz essa afirmação para que se possa aquilatar da sua veracidade»).
Ora, a este respeito, as testemunhas arroladas pelos impugnantes e inquiridas nos autos sem que tenham sido contraditadas ou tenha sido abalada a sua razão de ciência, afirmam que o preço pelo qual compraram os imóveis é o preço que consta das respectivas escrituras públicas, indicando razões concretas da justeza desse preço (terreno muito inclinado e rochoso; a urbanização na altura não estava ainda concluída e não havia infra-estruturas nem ruas; o local era isolado, sem escolas e sem GNR) e contrariando, assim, as declarações daqueles moradores não identificados pela AT.
A alegação da recorrente no sentido de que a prova testemunhal produzida não parece poder merecer qualquer credibilidade por emitida por alguns compradores dos prédios que confirmaram os valores (cfr. Conclusão 1ª) esquece, aliás, que também os indícios invocados pela AT assentam em declarações de outros compradores. Só que esses não estão, sequer, identificados, ao passo que as testemunhas estão identificadas e prestaram juramento nessa qualidade.
Acresce, ainda, que em relação ao valor dos lotes da urbanização é o próprio relatório da Fiscalização a dar conta de que, para além do preço declarado de venda, o preço de avaliação para efeitos de sisa foi o de 2.100$00/m2, razão pela qual também se não percebe como é que, para efeitos das liquidações ora em causa, a AT chegou ao valor de 2.500$00/m2.

4.4. Tal como consta da fundamentação jurídica da sentença, de acordo com o disposto no n° 2 do art. 104° da CRP, a tributação das empresas (e o mesmo se passa em relação aos contribuintes que em nome individual exercem uma actividade comercial ou industrial) incidirá fundamentalmente sobre o seu rendimento real. E os arts. 37° e 38° do CIRS dispõem que a determinação do lucro tributável das actividades comerciais se faz com base na contabilidade, quando o sujeito passivo a possua, com base nos livros de registo mencionados nos arts. 111° ou 112°, para as actividades da categoria C ou D, respectivamente, quando o sujeito passivo não seja obrigado a possuir contabilidade e, caso se verifique a inexistência de contabilidade ou dos indicados livros, ou uma das demais situações previstas nas als. do n° 1 do art. 38° do CIRS, entre elas «indícios seguros de que a contabilidade ou os livros de registo não reflectem a exacta situação patrimonial e o resultado efectivamente obtido», então a determinação do lucro tributável será feita com recurso aos métodos indiciários, de acordo com o art. 52° do CIRC, por imposição do nº 5 daquele mesmo art. 38° do CIRS.
Assim sendo, impõe-se que a AT demonstre a justeza do recurso à tributação de acordo com aqueles métodos, já que a regra é a da tributação com base na declaração de rendimentos apresentada pelo contribuinte (cfr. arts. 76º e 78º do CPT, à data em vigor) e já que o recurso à tributação segundo métodos indiciários só pode ter lugar quando, fundadamente, a AT, no uso do seu poder/dever de fiscalização (art. 75° do CPT), apurar factos que permitam concluir que a contabilidade do contribuinte não reflecte correctamente a situação tributária deste.
E porque a lei indica como requisitos da fundamentação da tributação por métodos indiciários ou presunções, quer a especificação dos motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa da matéria tributável, quer a indicação dos critérios utilizados na sua determinação, exige-se que tal fundamentação assente em factos objectivos, e não em meros juízos de valor ou conclusivos, os quais por serem sempre subjectivos, podem não ter qualquer correspondência com a realidade.
Ora, no caso dos autos, apenas ficamos a saber, quanto à venda da fracção autónoma em questão, que a AT concluiu que ela foi vendida por um preço inferior ao declarado porque este é inferior ao que consta do acima referido «índice»; e, quanto às vendas dos lotes questionados, ficamos a saber que, embora a AT tenha constatado que tais lotes têm uma má localização e que há outros factores que lhe diminuem o valor, pela circunstância de alguns moradores da zona terem dito que o preço terá sido superior ao declarado (embora se não identifiquem as pessoas que o disseram, quais as razões porque o disseram e onde é que obtiveram esse conhecimento, enfim, as razões de ciência de quem produz essa afirmação para que se possa aquilatar da sua veracidade), a mesma AT concluiu que o preço pelo qual foram vendidos é superior ao declarado.
Todavia, como acima se disse, nem o citado «índice» é um factor exclusivo, nem, quanto ao valor dos lotes, se pode fazer tábua rasa da prova testemunhal produzida.
Ou seja, tal como a sentença recorrida decidiu, da factualidade provada nos autos o que resulta é que a AT não logrou demonstrar com a certeza jurídica necessária que os valores declarados (e que são apenas os respeitantes à venda da fracção autónoma e dos lotes de terreno, ao longo dos exercidos em análise) sejam falsos.
Por isso, face ao disposto nos citados arts. 38º do CIRS e 52º do CIRC, este apuramento efectuado com recurso a métodos indiciários, tal como a fixação do mesmo, resultante da deliberação da Comissão que o manteve, sofrem de ilegalidade.
Assim tendo também decidido, a sentença recorrida não violou, portanto, o disposto no art. 38º do CIRS e, desta forma, improcedem todas as Conclusões do recurso.

DECISÃO

Termos em que acordam, em conferência, os juizes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em, negando provimento ao recurso, manter a sentença recorrida.
Sem custas.

Lisboa,08 de Junho de 2004