Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 11514/14 |
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Secção: | CA - 2º. JUÍZO |
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Data do Acordão: | 11/20/2014 |
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Relator: | MARIA HELENA BARBOSA FERREIRA CANELAS |
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Descritores: | CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL – NULIDADE PROCESSUAL - ALEGAÇÕES - CONTRADITÓRIO |
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Sumário: | I- À tramitação dos processos do contencioso pré-contratual aplicam-se as disposições que regulam a tramitação processual da ação administrativa especial, apenas no que não estiver especificamente regulado no CPTA para o processo de contencioso pré-contratual. II – Antes de proferir despacho-saneador com conhecimento de exceção que tenha sido suscitada na contestação deve o juiz do processo assegurar o exercício do contraditório por parte do autor relativamente a tal questão, por força do disposto no artigo 87º nº 1 alínea a) do CPTA ex vi do artigo 102º nº 1 do mesmo Código, determinando a sua notificação para se pronunciar no respetivo prazo legal (de 5 dias, por força do disposto no artigo 102º nº 3 alínea c) do CPTA), e só após ter sido notificado para o efeito poderá o autor apresentar requerimento pelo qual se pronuncie quanto à suscitada exceção. III - Enquanto o regime regra na tramitação da ação administrativa especial é o da possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas antes de ser proferida decisão sobre o mérito da causa, para o que são notificadas para o efeito (só assim não sendo quando tenha havido lugar a audiência pública por iniciativa das partes, a que alude o nº 3 do artigo 91º do CPTA, ou quando as partes tenham a elas previamente renunciado nos termos das disposições conjugadas dos artigos 78º nº 4 e 83º nº 2 do CPTA, como decorre do disposto nos artigos 87º nº 1 alínea b) e 91º nº 4 do mesmo Código) já na tramitação dos processos de contencioso pré-contratual só haverá lugar à possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas antes de ser proferida decisão sobre o mérito da causa “no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação” (cfr. artigo 102º nº 2 do CPTA), sendo certo que havendo lugar à audiência pública prevista no artigo 103º do CPTA (a qual terá lugar quando o tribunal a considere “aconselhável ao mais rápido esclarecimento da questão”) as alegações são nela proferidas de forma oral. IV – O sentido da norma ínsita no nº 2 do artigo 102º do CPTA é o de, no âmbito do processo de contencioso pré-contratual, no qual foi afastada, como regra a fase das alegações escritas prevista na tramitação da ação administrativa especial, esta tem lugar quando se justifique permitir ao demandante (e às contra partes, em contraposição) tomar posição, pronunciando-se, sobre elementos de prova surgidos no decurso do processo. V – Não se pode considerar integrado no conceito de “produção de prova com a contestação” a remessa do Processo Administrativo, a que alude o artigo 81º nº 1 do CPTA, aplicável aos processos de contencioso pré-contratual ex vi do artigo 102º nº 1 do CPTA, já que a obrigatoriedade da sua remessa pela entidade demandada tornaria constante nos processos de contencioso pré-contratual a fase de alegações, esvaziando assim a norma do seu sentido. VI - A mera circunstância de ter sido requerida a produção de prova testemunhal, quer pelo réu quer pela contrainteressada, nas suas respetivas contestações, não tendo a mesma tido lugar, por tais requerimentos de prova terem sido indeferidos, não dá lugar à apresentação de alegações, nos termos do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA. VII - Em face da junção pela contrainteressada de documentos que não integravam o Processo Administrativo, constituindo os mesmos produção de prova (documental) com a contestação, na aceção acolhida no nº 2 do artigo 102º do CPTA e para os efeitos ali previstos, traduzindo-se em elementos probatórios novos, apresentados no decurso do processo, teria que ser assegurada a possibilidade de as autoras tomarem posição através da apresentação de alegações antes de se proferir decisão sobre o mérito da causa. VIII- Não basta para que se julgue verificada a nulidade processual decorrente da falta de notificação para as alegações escritas, a sua simples falta (omissão), para ocorrer nulidade processual mister é que “a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa” (cfr. parte final do nº 1 do artigo 195º do CPC), já que a omissão de tal formalidade não se encontra expressamente cominada ou fulminada na lei como gerando uma nulidade processual. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO B….. UNIPESSOAL, LDA. e A……, LDA. (devidamente identificado nos autos), inconformadas com o Acórdão de 07/07/2014 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que decidiu pela improcedência da Reclamação para a Conferência que haviam deduzido do saneador-sentença de 03/06/2014 proferido no Processo de Contencioso Pré-contratual (\) instaurado contra o CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL, EPE, (devidamente identificado nos autos), visando a anulação do ato de adjudicação do lote 1 à contrainteressada A……, LDA. no âmbito do Concurso Público Internacional nº 1 – 1 – 5000/2014, para o fornecimento de reagentes e demais bens necessários para a realização de análises clínicas, vêm interpor o presente recurso jurisdicional, concluindo do seguinte modo: “Deverá ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, ser revogada a Decisão Recorrida e substituída por outra que: a) Revogue a decisão de dispensa de apresentação de alegações finais escritas, por erro de julgamento, decorrente de violação de lei, designadamente do disposto nos artigos 27.º, n.º 1, al. i), e 102.º, n.º 2, do CPTA, gerador de nulidade processual nos termos dos artigos 195.º e seguintes do CPC, ordenando a repetição desses atos processuais; b) Revogue a decisão de considerar não escritos os artigos 31.º a 70.º do requerimento da Recorrente, de 09.04.2014, por erro de julgamento, decorrente de violação de lei, designadamente dos princípios do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC). c) E, em todo o caso, se entenda não deferir o pedido constante da alínea a) e for proferida decisão final sobre o mérito da causa, que seja declarada a invalidade do Ato Impugnado de adjudicação do Lote 1 e do Contrato celebrado em 20.02.2014, com fundamento em violação: (i) Do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso, (ii) Do disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Programa de Concurso, (iii) E, em incumprimento, pela proposta da A…… de normas legais e regulamentares aplicáveis (artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e Circular 069/CD elo I…….), com a consequência determinada pelo artigo 70.º, n.º 1, al. f) do CCP, e (iv) Em vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade, da igualdade legalmente consagrados no n.º 4 do artigo 1.º do CCP e nos artigos 3º e 5º do Código do Procedimento Administrativo.”
B. A realização de alegações escritas finais destina-se, neste tipo de processos, a permitir ao Demandante a pronúncia sobre elementos probatórios apresentados com a Contestação, só assim se promovendo o exercício do contraditório, de forma completa e esclarecida, sobre a totalidade do quadro fáctico que o Tribunal irá considerar (cf MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS FERNANDES CADILHA, "Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3.ª Edição Revista, 2010, Almedina, Coimbra, pág. 684). C. O Tribunal a quo decidiu mal ao antecipar o conhecimento do mérito da ação, através de recurso ao artigo 27.º do CPTA, porque negou o "direito a produzir alegações finais, ao abrigo do artigo 102º nº 2 deste Código", enfermando a decisão recorrida em nulidade processual, cominada pelo artigo 195.º do CPC, por omissão de ato processual obrigatório e por ter conhecido "do mérito da causa quando esse conhecimento lhe estava vedado" (vide, neste sentido, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, proferido no âmbito do Processo n.º 01533/06, datado de 01.06.2006). D. As questões suscitadas no presente pleito não são "simples", pois importam uma apreciação de diversos aspetos "fácticos" da proposta da A……., designadamente a interpretação da declaração unilateral, subscrita pela M……, inserida na mesma proposta, pelo que também por essa razão não se encontravam preenchidos os pressupostos legais constantes do artigo 27ºnº 1, al. i), do CPTA, norma que a Decisão Recorrida também viola, incorrendo em erro de julgamento. E. Nas contestações apresentadas, os Recorridos não se limitaram a negar o facto constitutivo da ação, tendo acrescentado algo que putativamente "obsta a que os mesmos produzam o efeito jurídico que lhes seria próprio" - uma suposta relação jurídica de subcontratação entre a A……. e a M……. - que sena impeditiva dos vícios que as Recorrentes imputaram ao Ato Impugnado, argumento acolhido pelo Tribunal a quo, ao afirmar que "Em suma, a contrainteressada concorreu individua/mente ao concurso e assume recorrer à subcontratação para adquirir um dos reagentes, integrado na posição 61 do lote 1, e fornece-lo de seguida ao Centro Hospitalar." (cf pág. 18 do Saneador- Sentença). F. Trata-se, por isso, de matéria de exceção perentória, por invocação de facto impeditivo (cf Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido cm 02/12/1997, no âmbito do Processo n.º 98A459), já que a invocação da alegada relação jurídica de subcontratação, com conteúdo inovatório relativamente ao objeto da ação, tem como único e exclusivo desiderato invocar uma circunstância ele facto que seria alegadamente impeditiva das causas de invalidade assacadas pelas Recorrentes ao Ato Impugnado, designadamente a violação das regras de participação no Concurso e do disposto no artigo 10°, n.º 2, do Programa do Procedimento. G. Quando impediu o exercício do contraditório das Recorrentes sobre essa matéria, considerando não escritos os arts. 31.º e ss. do requerimento datado de 09.04.2014, a Decisão Recorrida violou diversas normas legais, designadamente as que preveem os princípios do contraditório (artigo 3.º, nº 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6º do CPTA), da promoção do acesso ao justiça (artigo 7º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC), com o que incorreu em erro de julgamento, que invalida a decisão final tomada. H. A declaração unilateral subscrita pela M……., constante da al. P) dos factos provados, tem um destinatário preciso, que não é a Contra-interessada A……, mas sim o próprio Demandado Recorrido, única razão atendível para justificar a respetiva inclusão na proposta da A……, pois o declarante afirma o seu compromisso incondicional de proceder aos fornecimentos nos "exactos termos previstos nesse caderno de encargos'', no caso de a adjudicação recair sobre a proposta da "A…… L……., Lda. ", mas não refere que o seu compromisso é de fornecer a esta entidade. I. Sendo a proposta dirigida à Entidade Adjudicante e contendo-se nos documentos que a constituem uma declaração jurídica unilateral de um terceiro (a M…….), que não identifica um destinatário preciso, a inclusão dessa declaração na proposta só pode ter por desiderato que a Entidade Adjudicante seja o respetivo destinatário, dela tomando conhecimento e aceitação, garantindo-se lhe que, em caso de adjudicação à proposta apresentada pela A…….., a M…… aceita os termos do Contrato, assumindo, para este fornecimento, a posição de adjudicatário. J. Tal objetivo explica-se facilmente: a Contra-interessada A…… não preenche os requisitos legais e regulamentares para fornecer o produto compreendido na posição 61 do lote 1 - barbituratos de soro - razão pela qual optou por incluir na respetiva proposta uma declaração unilateral, subscrita por quem reunia esses requisitos - a M…… - como forma de suprimento da respetiva incapacidade. K. Porém, a A…… não se apresentou a concurso na modalidade de agrupamento de empresas, com a M……, nos termos exigidos pelo nº 6 do artigo 5.º e artigo 8 do Programa de Concurso; nessa medida, a proposta da A…… não incluiu o fornecimento de todos os reagentes previstos no Caderno de Encargos para o Lote 1, correspondendo a uma proposta parcial que, nos termos do disposto no artigo no n.º 2 do artigo 9º do Programa de Concurso não era admissível, razão pela qual o Júri deveria ter determinado a respetiva exclusão por violação das referidas normas do Programa do Concurso, também em conformidade com o preceituado no artigo 70.º do CCP. L. Assim, a Decisão Recorrida enferma de erro de julgamento ao concluir pela validade da adjudicação do Lote 1 à proposta da A…… (e, consequentemente, do contrato celebrado em 20.02.2014), devendo ser revogada e substituída por decisão que determine pela ilegalidade da adjudicação do Lote 1 à proposta da A…… por violação do disposto no nº 6 do artigo 5° do Programa de Concurso e do disposto no n.º 2 do artigo 9º do Programa de Concurso (e do artigo 70.º do Código dos Contratos Públicos). M. Admitindo, sem conceder, que o Tribunal ad quem mantém o entendimento de que a declaração da M….. se explica no quadro de uma mera relação de subfornecimento à A…… e que "a contrainteressada concorreu individualmente ao concurso” mesmo nesse enquadramento persiste a ilegalidade do Ato Impugnado, embora com fundamento em violação do disposto do artigo 70.º, nº 2 alínea f) do CCP, porque a A…… não se encontra habilitada a fornecer legalmente o reagente identificado na posição 61 (barbituratos soro), não estando devidamente registada, em violação o artigo 12.º do Decreto-Lei 189/2000, de 12 de agosto, da Circular 069/CD do I……. N. A Decisão Recorrida reconhece a falta do referido registo mas afirma que (...) o registo dos DIV comercializados no mercado nacional pelos seus distribuidores só terá de ocorrer quando se for proceder à aquisição e utilização efetiva do reagente e não antes'', tese que significa retirar qualquer alcance útil ao disposto no artigo 70º n.º 1, al. f), do CCP, uma vez que, em grande maioria de situações, o não preenchimento, por parte de um concorrente, de disposições legais e requisitos regulamentares necessários para o exercício de urna certa atividade poderá, num momento futuro, vir a ser sanado. O. Tratando-se de um juízo a efetuar em sede de procedimento pré-contratual, está em causa verificar se a proposta e o concorrente cumprem, no momento procedimental relevante, os requisitos legais e regulamentares ele acesso à atividade e não a hipótese abstrata de, até à data da celebração elo contrato, vir a reunir tais requisitos, caso os não cumpra aquando da apresentação ele proposta (cf. MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA "Concursos e Outros Procedimentos de Contratação Pública", Almedina, Coimbra, 2011, pág. 939). P. O artigo 12.º elo Decreto-Lei 189/2000 determina a obrigação do distribuidor comunicar ao I…… a lista elos produtos que comercializa, o que se processa pelo registo elo produto como comercializado pela entidade em causa, preceito que impede a Contra-Interessada Recorrida ele fornecer ao CHLC qualquer produto que não esteja corno tal registado junto do I……, correspondendo a circular informativa n.º 069/CD elo I…… ao exercício elo poder regulamentar do I……. sobre esta matéria, legalmente estabelecido no artigo 15.º do Decreto-Lei nº 46/2012, de 24 de fevereiro. Q. O escopo da referida Circular é evidente: assegurar que as entidades que são adjudicatárias nos procedimentos de contratação pública encontram-se devidamente habilitadas a fornecer os produtos em causa, garantindo por essa via que as suas propostas são incondicionais, ou seja, não dependem de um eventual e posterior registo junto do Infarmed, de resto em consonância com o preceituado no artigo 70.º nº 1, al. g) do CCP. R. Quanto à possibilidade de a Contra-interessada se valer da qualidade de uma putativa subcontratada para evitar o efeito excludente da respetiva proposta, cominado pelo artigo 70º n.º 1, al. f), do CCP, vem a propósito recordar a jurisprudência constante de Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, datado de 13.10.2011, no âmbito do Processo nº 07915/11, que nega essa hipótese e que afirma categoricamente que, nesses casos, a proposta deve ser excluída. S. A admitir-se que a Declaração da M…… é urna "mera" declaração de subcontratado, e que, como se refere no Saneador-Sentença, a "contrainteressada concorreu individualmente ao concurso", a proposta da Contra-interessada viola o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e a Circular 069/CD do I……, o que determinaria a exclusão da proposta da A…… [artigo 70.º, n.º 2, al. g) do CCP], pelo que o Ato Impugnado e o contrato celebrado em 20.02.2014 são ilegais, devendo a Decisão Recorrida ser revogada, com fundamento em violação das normas identificadas, e substituída por uma decisão que determine a invalidade do Ato Impugnado e do contrato celebrado. T. Resulta da documentação constante da proposta da A……, designadamente dos dois planos do laboratório apresentados para cumprimento do requisito exigido de adequação da solução ao espaço disponível, ter sido apresentado para o Lote 1 e para o Lote 11 o mesmo equipamento - a cadeia F…… 3.6 -, propondo se assim que os dois serviços em causa partilhem o mesmo equipamento, como, aliás, consta da alínea R) dos factos assentes. U. Apesar de ser certo que nessa fase o Concorrente não podia assegurar que iria vencer nos dois lotes, e assegurar, por essa via, e efetiva vantagem de custos, conforme se sublinha no Saneador-Sentença, este elemento não é irrelevante na construção do preço a apresentar, fazendo assim a A…… uma ponderação de riscos para os preços a apresentar nesses dois lotes, pelo que, o valor que a A…… apresentar no âmbito dos Lotes 1 e 11 teve de facto a consideração da colocação de apenas um equipamento e não de dois, conforme era exigido. V. Deste modo, nos termos previstos nos artigos 70° e 146°, n.º 2 ai. o), ambos do CCP, a proposta da A……. deveria ter sido excluída, por não dar integral cumprimento ao disposto no Caderno de Encargos, pelo que, também com este fundamento se conclui que a Adjudicação efetuada à A……. é manifestamente ilegal, incorrendo a Decisão Recorrida em erro de julgamento, por violação de base legal aplicável, devendo ser revogada e substituída por outra em conformidade com o exposto. * II. DA DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO (das questões a decidir)O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos artigos 144º nº 2 e 146º nº 4 do CPTA e dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC novo (aprovado pela Lei n.º 41/013, de 26 de Junho) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA. No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pelas recorrentes, são colocadas a este Tribunal pelas Recorrentes as seguintes questões essenciais: - saber se ao ter sido proferida decisão sobre o mérito da ação em despacho-saneador, sem que às partes tenha, assim, sido possibilitada a apresentação de alegações escritas, ocorreu violação do disposto nos artigos 27º nº 1 alínea i) e 102º nº 2 do CPTA ou nulidade processual nos termos dos artigos 195.º e seguintes do CPC – vide conclusão a) das alegações de recurso; - saber se a decisão vertida no despacho-saneador de 03/06/2014 proferida pela Mmª Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, titular do processo, mantida pelo Acórdão de 07/07/2014 da respetiva conferência, de considerar não escritos os artigos 31º a 70º do requerimento de 09/04/2014 da Autora Beckman, aqui Recorrente, incorre em erro de julgamento, por violação dos princípios do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC) – vide conclusão b) das alegações de recurso; - saber se em vez de ter sido julgada improcedente a ação pelo saneador-sentença de 03/06/2014, proferido pela respetiva Mmª Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, titular do processo, mantida pelo Acórdão de 07/07/2014 da respetiva Conferência, deveria ter sido declarada a invalidade do impugnado ato de adjudicação do Lote 1 e do Contrato celebrado em 20/02/2014, com fundamento (i) em violação do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso; (ii) em violação do disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Programa de Concurso; em (iii) incumprimento, pela proposta da A…… de normas legais e regulamentares aplicáveis (artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e Circular 069/CD elo INFARMED), com a consequência determinada pelo artigo 70.º, n.º 1, al. f) do CCP, e (iv) em vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade, da igualdade legalmente consagrados no n.º 4 do artigo 1.º do CCP e nos artigos 3º e 5º do Código do Procedimento Administrativo. – vide conclusão c) das alegações de recurso. Da ordem do conhecimento das questões Por se tratar de questão que deve ser primeiramente decidida, cumpre começar por apreciar e decidir se a decisão vertida no despacho-saneador de 03/06/2014 proferido pela Mmª Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, titular do processo, mantida pelo Acórdão de 07/07/2014 da respetiva conferência, de considerar não escritos os artigos 31º a 70º do requerimento de 09/04/2014 da Autora B……., aqui Recorrente, incorre em erro de julgamento, por violação dos princípios do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC) (conclusão b) das alegações de recurso). Cumprirá, de seguida, apreciar e decidir se ao ter sido proferida decisão sobre o mérito da ação em despacho-saneador, sem que às partes tenha, assim, sido possibilitada a apresentação de alegações escritas, ocorreu violação do disposto nos artigos 27º nº 1 alínea i) e 102º nº 2 do CPTA ou nulidade processual nos termos dos artigos 195.º e seguintes do CPC (vide conclusão a) das alegações de recurso). Por fim, e caso não mereça provimento o recurso com tal fundamento, importará então apreciar e decidir se se em vez de ter sido julgada improcedente a ação pela decisão vertida no saneador-sentença de 03/06/2014, mantida pelo Acórdão de 07/07/2014 da respetiva Conferência, deveria ter sido declarada a invalidade do impugnado ato de adjudicação do Lote 1 e do Contrato celebrado em 20/02/2014, com fundamento (i) em violação do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso; (ii) em violação do disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Programa de Concurso; em (iii) incumprimento, pela proposta da A…… de normas legais e regulamentares aplicáveis (artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e Circular 069/CD elo I…….), com a consequência determinada pelo artigo 70.º, n.º 1, al. f) do CCP, e (iv) em vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade, da igualdade legalmente consagrados no n.º 4 do artigo 1.º do CCP e nos artigos 3º e 5º do Código do Procedimento Administrativo (conclusão c) das alegações de recurso). * III. FUNDAMENTAÇÃOA – DE FACTO No saneador-sentença de 03/06/2014 foi dada como provada pela Mmª Juiz do Tribunal a quo a seguinte factualidade: “A) Em 19.6.2013, por deliberação do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), foi tomada a deliberação de contratar fornecedores de reagentes para a realização de análises clínicas, por via da abertura de um concurso público internacional a que foi atribuída a referência nº 1 – 1 – 5000/2014 – ver docs juntos aos autos. B) O CHLC lançou em 25.6.2013 o Concurso Público Internacional nº 1 – 1 – 5000/2014, para o fornecimento de reagentes e colocação e montagem de equipamentos necessários para a realização de análises clínicas, tendo efetuado uma divisão dos dispositivos médicos em 36 lotes – ver anúncio publicado no Diário da República, nº 120, 2ª série, de 25.6.2013. C) O Concurso visava o fornecimento de reagentes específicos e não específicos, calibradores, controlos e consumíveis necessários à realização das análises clínicas, controlos de qualidade internos, realização de confirmações de resultados duvidosos a laboratórios externos e controlos de qualidade externos, por lote, englobando a colocação, instalação e montagem, pelo prazo de vigência do contrato, dos equipamentos identificados no Anexo II ao Caderno de Encargos, e respetivas ações de manutenção preventiva e corretiva, bem como a realização das ações de formação ao pessoal do CHLC indispensáveis à utilização dos equipamentos – ver cláusula 1ª do Caderno de Encargos – doc nº 3 da petição inicial. D) As peças do Concurso são constituídas pelo Programa do Procedimento e pelo Caderno de Encargos – ver docs nº 2 e 3 juntos com a petição inicial. E) De acordo com o art 10º, nº 3 do Programa de Procedimento, o critério de adjudicação, para o lote 1, é da proposta economicamente mais vantajosa – ver doc nº 2 junto com a petição inicial. F) Nos termos do art 11º do Programa de Procedimento a avaliação das propostas nos lotes 1, (…), obedece ao seguinte modelo de avaliação: a) preço – 80 pontos (máximo) …; b) adequabilidade das soluções propostas – 20 pontos, repartidos pelos subfactores elementares previstos nas tabelas constantes dos Anexos I a este Programa de Procedimento (…) – doc nº 2 junto com a petição inicial. G) O lote 1 do Concurso destinava-se ao fornecimento dos reagentes identificados no anexo I do Caderno de Encargos, prevendo o fornecimento de 89 reagentes e a colocação e montagem, pelo prazo de vigência do contrato, dos equipamentos identificados no anexo II do Caderno de Encargos – ver doc nº 3 junto com a petição inicial. H) De entre as posições previstas na lista de análises clínicas do anexo I estava a 61, relativa a barbituratos soro – ver doc nº 3 junto com a petição inicial. I) O Caderno de Encargos prevê quatro pólos que se localizam no Hospital de Santo António dos Capuchos, Hospital de Santa Marta, Hospital Curry Cabral e Hospital Dona Estefânia – ver pág 31 do Caderno de Encargos. J) O Hospital de São José funciona como laboratório central, altamente automatizado e especializado, sendo o laboratório de referência para o conjunto do CHLC – ver Anexo II, pág 31, do Caderno de Encargos. K) De acordo com os termos constantes do Anexo II do Caderno de Encargos o lote 1 compreendia a colocação e montagem, pelo período do contrato de uma cadeia pré-analítica e o lote 11 a colocação e montagem de um sistema robotizado para tubos EDTA – ver fls 31 e 35 do Caderno de Encargos – doc nº 3 junto com a petição inicial. L) O Concurso decorreu na plataforma eletrónica de contratação V…… – ver docs juntos aos autos. M) A Autora pediu ao júri do concurso o esclarecimento seguinte: no anexo II a que se refere o art 1º, nº 1 do Caderno de Encargos é estabelecido para o lote 11, sob a epígrafe «Hemogramas e Reticulocitos» que deverá ser fornecido, entre outros, um equipamento para distribuição e arquivo de amostras (tipo sorter), integrada na cadeia robotizada que permita a separação dos tubos EDTA para outros procedimentos tais como: velocidade de sedimentação, hemoglobinas glicadas, doseamento da hemoglobina e citometria de fluxo para o DSJ. Pergunta-se: É admissível a apresentação de uma solução em que o equipamento tipo sorter não se encontre fisicamente integrada na cadeia de hematologia, permitindo efetuar essa separação de forma automatizada mas não integrada fisicamente? – ver doc nº 14 junto com a petição inicial. N) A este pedido de esclarecimento o júri respondeu: não – ver doc nº 15 junto com a petição inicial. O) Aos lotes 1 e 11 apresentaram proposta, entre outras, a Autora (em agrupamento com a A……, Lda) e a contrainteressada – ver docs juntos aos autos. P) Na proposta da contrainteressada são apresentados os diversos preços para os diversos reagentes, tendo também sido junta uma declaração subscrita pela sociedade M…… – M……., Lda, nos termos da qual esta declara que caso seja adjudicada a proposta apresentada pela A……, Lda, a sua representada (a M…..) se compromete incondicionalmente a fornecer os reagentes e calibradores necessários à execução dos testes constantes da posição 61 (código 122040097 – baibituratos soro) pertencente ao lote 1 do presente Concurso, nas quantidades e nos exatos termos previstos nesse Caderno de Encargos – ver doc nº 4 junto com a petição inicial e doc nº 1 junto com a contestação da contrainteressada, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. Q) Até 16.1.2014 não se encontrava registado junto do I…….., no sistema on line S…, dos dispositivos médicos de diagnóstico in vitro comercializados no âmbito da atividade de distribuição por grosso da contrainteressada, o reagente identificado na posição 61 (barbituratos soro) do Anexo I do Caderno de Encargos – ver doc nº 5 junto com a petição inicial. R) A contrainteressada apresentou para o lote 1 e para o lote 11 o mesmo modelo de equipamento – Flexlab 3.6 – ver docs nº 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial. S) Mas, para o lote 1 propôs o fornecimento de um sistema de automatização com pré-analítica incorporada FlexLab 3.6, formado por: . um módulo de input/ output (IOM); . um módulo Bulk Input (BIM); . duas centrífugas; . um descapsulador; . um aliquotador; . um recapsulador; . um selador; . um removedor de selo; . um U Turn; . um arquivo refrigerado com capacidade para 9216 tubos – ver doc nº 1 junto com a contestação da contrainteressada. T) Para o lote 11 propôs o fornecimento de um sistema de automatização FlexLab 3.6, formado por: . um módulo de input/ output (IOM) – ver doc nº 8 junto com a petição inicial. U) Nos termos do relatório preliminar de 23.12.2013, o júri do Concurso classificou as propostas apresentadas nos seguintes termos: 1º lugar: A…… – 63,89 pontos (= preço: 45,39 + adequabilidade: 18,5), 2º lugar: B…../ A…. – 44,75 pontos (= preço: 29,50 + adequabilidade: 15,25), 3º lugar: S…… – 43,27 pontos (= preço: 33,27 + adequabilidade: 10), 4º lugar: R…../ B…… – 37,42 pontos (= preço: 24,92 + adequabilidade: 12,5) – ver docs juntos aos autos. V) Em sede de audiência prévia, a Autora apresentou a sua pronúncia tendo pugnado pela exclusão da contrainteressada por incumprimento das disposições imperativas do Caderno de Encargos, nos termos do doc nº 10 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. W) O júri do Concurso elaborou o relatório final, no qual procedeu à apreciação das pronúncias em sede de audiência prévia, tendo mantido a classificação proposta constante do relatório preliminar – ver doc nº 11 junto com a petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. X) Ato impugnado: Por deliberação de 29.1.2014 foi aprovada a proposta de adjudicação à contrainteressada, do fornecimento de reagentes e demais bens necessários para a realização de análises clínicas (lote 1) – ver doc nº 1 junto com a petição inicial. Y) A adjudicação foi notificada à Autora na plataforma eletrónica no dia 31.1.2014 – ver docs juntos aos autos. Z) No dia 12.2.2014 a Autora foi notificada da data da apresentação dos documentos de habilitação por parte do adjudicatário Abbott, em relação ao lote 1 – ver doc nº 12 junto com a petição inicial. AA) A 20.2.2014 foi celebrado o contrato com a contrainteressada relativo ao lote 1 – ver processo administrativo apenso. BB) O preço apresentado pela Autora para o lote 1 foi de €: 2.973.060,78 – ver docs juntos aos autos. CC) O preço apresentado pela contrainteressada para o lote 1 foi de €: 2.518.061,37 – ver docs juntos aos autos. DD) A diferença entre os preços propostos no Concurso para o lote 1 é de €: 454.999,41 a mais pela Autora – ver docs juntos aos autos.” ** B – DE DIREITO1. - Da questão de saber se a decisão de considerar não escritos os artigos 31º a 70º do requerimento de 09/04/2014 da Autora B……, aqui Recorrente, incorre em erro de julgamento, por violação dos princípios do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC) - conclusão b) das alegações de recurso. Da decisão recorrida: É o seguinte o teor do segmento do despacho-saneador de 03/06/2014, em que se insere a decisão em causa, proferido pela respetiva Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra titular do processo: “Resposta da Autora à matéria de exceção, de 9.4.2014: Ao abrigo do princípio do contraditório, admite-se a resposta à matéria de exceção compreendida nos arts 11º a 30º. Consequentemente, admite-se também a modificação objetiva da instância, no sentido da impugnação do contrato celebrado em 20.2.2014. Porém, o demais articulado, nos arts 31º e segs, considera-se como não escrito, por não ser admissível o contraditório sobre matéria impugnada nas contestações (cfr. arts 102º e 87º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Notifique.” E o Acórdão da Conferência do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de 07/07/2014, decidiu pela improcedência da Reclamação deduzida com o seguinte fundamento, quanto a este aspeto, que se passa a transcrever: “Também, o tribunal deixou expresso que o teor dos arts 31º e segs da resposta da autora à matéria de exceção se tinha como não escrito, por não ser admissível o contraditório sobre matéria impugnada nas contestações (cfr arts 102º e 87º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos). Na verdade, defesa por exceção (ainda que perentória) e defesa por impugnação são realidades jurídicas diferentes, com consequências diversas. E o tribunal reitera que a defesa levada a cabo pelas autoras, nos arts 31º e segs da resposta da autora, consubstancia discordância dos factos e do direito articulado pela demandada e pela contrainteressada, nos termos e para os efeitos do disposto no art 574º do CPC ex vi art 1º do CPTA.” ~ Da tese das recorrentes:Defendem as Recorrentes que a decisão de considerar não escritos os artigos 31.º a 70.º do requerimento da Autora B……. de 09/04/2014 deve ser revogada por erro de julgamento, decorrente de violação de lei, designadamente dos princípios do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC). ~ Da posição dos recorridos: Quer o Réu CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL, EPE, quer a contrainteressada A…….., LDA., pugnam pela improcedência do recurso, defendendo, em suma, não ter sido invocada em qualquer das contestações apresentadas qualquer exceção perentória, tendo ambas defendido-se por impugnação. ~ Do Parecer do Ministério Público: Pugna o Ministério Público no seu Parecer pela improcedência do recurso nesta parte, pela seguinte ordem de razão, que se passa a transcrever: “O articulado em apreço, no que respeita aos art.2s 31.º e segs, considerados não escritos pelo Tribunal, pronunciou-se sobre matéria que não constitui exceção. Na contestação a Ré e contrainteressada, no que concerne a esta parte, limitaram-se a apresentar uma versão jurídica diversa da apresentada pelas recorrentes, sobre a mesma realidade, com vista a defender a improcedência dos pedidos formulados. Limitaram-se a afirmar que a intervenção da fornecedora M…….., com o conteúdo que resulta do doc. n. 4 era a de subcontratada - alínea P) dos factos provados. Este documento estava incluído na proposta em causa. Assim, terá extravasado a Autora a faculdade que lhe é conferida de responder às exceções, mas tão só a estas, e não também a matéria de mera impugnação. Porém, mesmo que se pudesse entender o contrário, o art.º 584.º novo do C.P.Civil, imediatamente aplicável, por força do art.º 5.º, n.º 1 da Lei n.º 41/2013, de 26/06, nem sequer admite réplica/resposta à contestação ainda que tenham sido deduzidas exceções, só podendo esta resposta ser apresentada na fase dos articulados se tiver sido deduzida reconvenção, só em audiência prévia ou no início da audiência de julgamento, conforme os casos, ou a convite do Tribunal quando entenda ser necessário que a parte contrária exerça o contraditório, nos termos do art.º 3.º, n.ºs 3 e 4, do mesmo diploma legal. O art.º 87.º n.º 1 do CPTA não refere a audiência prévia, mas resulta deste preceito que, findos os articulados, o processo é concluso ao juiz para elaborar despacho saneador, decidir do mérito da causa de imediato ou abrir a fase de produção de prova quando ainda exista matéria de facto controvertida. Nesta fase, apenas poderá, se pretender decidir de imediato do mérito da ação, e se assim o entender, ouvir as partes sobre as exceções que se lhe apresentem, nada obstando que as convoque para tal. Porém, o regime de audição das partes é facultativo e não vinculativo para o Juiz. Pelo que, necessariamente, não sendo admissível sequer o contraditório na fase processual em que se encontrava o processo e constituindo uma faculdade do Tribunal admiti-lo ou não, a decisão em apreço obedece à lei e não ofende os princípios da igualdade das partes (art.º 6.º do CPTA), da promoção do acesso ao justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547° do CPC), invocados pelo recorrente.” ~ Da análise e apreciação da questão:Importa antes do mais ter presente que a decisão aqui recorrida, contida no despacho-saneador de 03/06/2014, decorre da arguição de nulidade feita pela Contrainteressada A…….,LDA. no seu requerimento com data de entrada de 14/04/2014 (de fls. 554 ss. dos autos) quanto a parte do articulado apresentado pela Autora B…… em 09/04/2014 (de fls. 461 ss. dos autos), mais precisamente no que tange ao por ela escrito nos artigos 31º ss. daquele seu articulado, pugnando devendo dar-se por não escrito o ali contido nos termos do disposto no artigo 195º nº 2 do CPC novo. Conhecimento que foi efetuado pela Mmª Juíza do tribunal a quo no despacho-saneador de 03/06/2014. Invocam as recorrentes em sede do presente recurso que a decisão de considerar não escritos os artigos 31.º a 70.º do requerimento da autora B……. de 09/04/2014 deve ser revogada por erro de julgamento, decorrente de violação de lei, designadamente dos princípios do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC). Importa, assim, aferir se bem decidiu a Mmª Juíza do tribunal a quo na decisão recorrida ao dar procedência a tal arguição, considerando não escritos tais artigos 31º ss… O que fez por entender «não ser admissível o contraditório sobre matéria impugnada nas contestações (cfr. arts 102º e 87º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.». Vejamos. Fora das situações enunciadas nos artigos 186º a 195º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013 (correspondentes aos artigos 193º a 200º do anterior CPC), que integram as chamadas nulidades principais, dispõe o n.º 1 do artigo 195.º do CPC novo (correspondente ao artigo 201º nº 1 do antigo CPC) que “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”. Está-se aqui perante as chamadas nulidades secundárias ou atípicas, cujo conhecimento está dependente da arguição da parte interessada, salvos os casos especiais em que a lei permite o conhecimento oficioso, conforme decorre da segunda parte do artigo 196º do CPC novo (correspondente ao artigo 202º do anterior CPC). Tal como tem entendido a Doutrina (vide JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, in A Justiça Administrativa (Lições), 5ª Edição, Almedina, 2004, pág. 288 ss., e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, pág. 436) e como vem sendo Jurisprudência dos tribunais superiores (vide, entre outros, o Acórdão deste TCA Sul de 13/01/2011, Proc. 03507/08), a tramitação da ação administrativa especial (definida nos artigos 78º e ss. do CPTA) não compreende a existência de um articulado réplica tal como ele era previsto no artigo 502º do anterior CPC e acolhido na ação administrativa comum sob a forma de processo ordinário (por força da norma remissiva do artigo 35º nº 1 do CPTA). Com efeito, e caso na contestação tenha sido deduzida matéria de exceção, cumpre ao juiz determinar a notificação do autor para sobre tal matéria se pronunciar. Neste sentido, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, pág. 436, onde se lê o seguinte: “(…) tal como já sucedia no recurso contencioso de anulação, o CPTA também não prevê a figura da réplica, nos moldes em que ela se encontra prevista no CPC (…) (Mas) o contraditório relativamente às eventuais exceções deduzidas processa-se apenas, uma vez concluso o processo ao juiz para despacho, no prazo de dez dias expressamente previsto, tanto na alínea a), como na alínea b), do nº 1 deste artigo 87º.” Sentido em que se pronunciou também o Acórdão deste TCA Sul de 13/01/2011, Proc. 03507/08, em cujo sumário se lê o seguinte: “O CPTA também não prevê a figura da réplica, nos molde em que ela se encontra prevista no CPC. A secretaria tem necessariamente de dar conhecimento ao autor, nos termos do artº 492 (e artigo 229.2) do CPC, das contestações, assim como da eventual intervenção do Ministério Público, produzidas ao abrigo do artº 85. Mas o contraditório relativamente às eventuais exceções deduzidas processa-se apenas, uma vez concluso o processo ao Juiz para despacho, no prazo de 10 dias expressamente previsto tanto na alínea a) como na alínea b), do nº 1 deste artigo 87. Ou seja, o autor, tendo sido deduzidas exceções na contestação, não carece, para responder, de apresentar réplica (cujo prazo de apresentação, em processo civil, se contaria desde o momento em que ele se considerasse notificado da junção da contestação – cfr. Artigo 502.3 do CPC), devendo antes aguardar a notificação que, para o efeito, lhe seja feita pelo Juiz, nos termos do artº 87, nº 1, alíneas a) ou b). É portanto a audição do autor, nos termos do referido preceito, que exerce a função que no artigo 502 do CPC, corresponde à réplica.” Esta doutrina continua a ser válida após a entrada em vigor do novo CPC, aprovado pela Lei nº 41/2013, com a particularidade de o novo CPC não prever agora, também ele, o articulado réplica como articulado de resposta à matéria e exceção (perentória ou dilatória) que tenha sido deduzida nas contestações, articulado que foi eliminado do processo comum de declaração regulado no Título I do Livro III, artigos 552º ss., mantendo-se apenas para a situação de ter sido deduzida reconvenção. Na situação dos autos havia sido suscitada nas contestações apresentadas quer pelo Réu quer pela Contrainteressada a exceção dilatória da ilegitimidade ativa da Autora, aqui recorrente. Exceção dilatória que assim deveria ser conhecida pelo tribunal em sede de despacho saneador, mas sempre após ouvir a autora, nos termos do disposto no artigo 87º nº 1 alínea a) do CPTA, aplicável ao processo de contencioso pré-contratual por força do disposto no artigo 102º nº 1 do CPTA, audição que de todo o modo sempre decorreria do princípio do contraditório, tal como acolhido no artigo 3º nº 3 do CPC, aqui aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, de acordo com o qual não é lícito ao juiz decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem. O que significa que antes de proferir despacho-saneador, com conhecimento daquela questão, deveria a juiz do processo assegurar o exercício do contraditório por parte da autora B……. relativamente a tal questão, por força do disposto no artigo 87º nº 1 alínea a) do CPTA ex vi do artigo 102º nº 1 do mesmo Código, determinando a sua notificação para se pronunciar no respetivo prazo legal (aqui de 5 dias, por força do disposto no artigo 102º nº 3 alínea c) do CPTA) quanto a tal exceção dilatória. E só após ter sido notificada para o efeito poderia então a autora apresentar requerimento pelo qual se pronunciasse quanto a tal questão (ou outras que pudessem ter sido oficiosamente suscitadas pelo Tribunal). Sucede que na situação dos autos a autora não aguardou que fosse proferido despacho nesse sentido, tendo espontaneamente apresentado em 09/04/2009 o requerimento em causa (de fls. 461 ss.). E nele, para além de responder à exceção dilatória de ilegitimidade ativa que havia sido expressamente suscitada nas contestações apresentadas, veio nos artigos 31º ss. pronunciar-se quanto ao que qualificou ser «facto novo que impediria o efeito pretendido» por ela na ação. E foi precisamente quanto a essa parte (no que vem exposto pela autora B……. nos artigos 31º ss. daquele seu requerimento de 09/04/2014, de fls. 462 ss.) que foi arguida nulidade processual pela contrainteressada A……., a qual veio a ser reconhecida no despacho-saneador de 03/06/2014, no segmento aqui recorrido. E bem, diga-se. É que, com efeito, o que foi exposto pela autora B…… nos artigos 31º ss. daquele seu requerimento de 09/04/2014, de fls. 462 ss., extravasa o âmbito do exercício do direito de contraditório, constituindo, nessa parte, prática de ato processual que a lei não admite e que influi no exame e decisão da causa, o que importa nulidade processual, de harmonia com o disposto no artigo 195º nº 1 do CPC, ex vi do artigo 1º do CPTA. Como é sabido, constituem exceções dilatórias as que “obstam a que o tribunal conheça do mérito da causa” (cfr. artigo 576º nº 2 do novo CPC, aprovado pela Lei nº 41/2013, correspondente ao artigo 493º do anterior CPC), designadamente as que se encontram elencadas nas diversas alíneas do artigo 577º do atual CPC (correspondente ao artigo 494º do anterior CPC) e do artigo 89º nº 1 do CPTA e constituem exceções perentórias as que “importam a absolvição total ou parcial do pedido e consistem na invocação de factos que impedem, modificam ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor” (cfr. artigo 576º nº 3 do novo CPC, aprovado pela Lei nº 41/2013, correspondente ao artigo 493º do anterior CPC). Sendo que na situação dos autos, e para decisão da presente questão, tal como foi colocada a este Tribunal de recurso, o que importa aferir é se o Réu e a contrainteressada, nas respetivas contestações, invocaram matéria de exceção (para além da exceção dilatória de ilegitimidade, já que quanto a ela não se colocou qualquer questão, sendo admissível a resposta apresentada, em exercício do direito de contraditório) que constitua exceção perentória (mesmo que inominada) relativamente à qual fosse de admitir (assegurar) o direito de contraditório por parte da autora B…….. Como afirma ANTUNES VARELA, in, “Manual de Processo Civil” – 2ª Edição, Coimbra Editora, págs. 288 “a defesa por impugnação, ou defesa direta, é aquela em que o demandado nega de frente os factos articulados pelo autor ou em que, sem afastar a realidade desses factos, contradiz o efeito jurídico que o autor pretende extrair deles”; e a págs. 290 na defesa por exceção “trata-se da defesa que, sem negar propriamente a realidade dos factos articulados na petição, nem atacar isoladamente o efeito jurídico que deles se pretende extrair, assenta na alegação de factos novos tendentes a repelir a pretensão do autor”. Ora do confronto entre a Petição Inicial (de fls. 4 ss.) pela qual foi instaurado o presente processo de contencioso pré-contratual visando a anulação do ato de adjudicação do lote 1 à contra-interessada A……. no âmbito do Concurso Público Internacional nº 1 – 1 – 5000/2014, para o fornecimento de reagentes e demais bens necessários para a realização de análises clínicas, com as contestações apresentadas pelo Réu e pela contrainteressada (respetivamente a fls. 300 ss. e a fls. 324 ss. dos autos), resulta que nestas não foi alegado qualquer facto novo no que tange à questão em torno da posição jurídica da indicada M……., LDA., e da qualificação e respetivos efeitos jurídicos da declaração por ela subscrita apresentada com a proposta da contrainteressada A…… ao concurso em causa (declaração que para além de integrar o Processo Administrativo, foi também junta pela Autora B…… com a sua Petição Inicial, sob Doc. nº 4, junto a fls. 131 dos autos). Na verdade lidas as contestações o que resulta é que nelas foi, a este respeito, contraposto entendimento diverso ao que foi propugnado pela autora, mormente quanto à qualificação e efeitos jurídicos a retirar daquela identificada «declaração». Enquanto a autora defendeu na sua Petição Inicial, com base naquela «declaração» e na interpretação que dela fez, que o fornecimento do reagente identificado na posição 61 do Anexo I ao Caderno de Encargos não seria fornecido pela contrainteressada A……. mas por aquela identificada M……, que não participou no concurso, não formando com a contrainteressada A……. um agrupamento de empresas, e que assim sendo, deveria ter a sua proposta sido excluída nos termos dos artigos 5º nº 6, 8º e 9º nº 2 do Programa do Procedimento e do artigo 70º nº 2 alínea f) do CCP pugnando, consequentemente pela ilegalidade do impugnado ato de adjudicação (vejam-se os artigos 23 a 46º da Petição Inicial), o Réu e a Contrainteressada pugnam nas suas respetivas contestações pela legalidade da admissão da proposta da contrainteressada A…… defendendo que aquela «declaração» constitui tão só e apenas um “compromisso de terceiro”, assumido pela M……. perante a A……, representando e constituindo uma subcontratação válida para a execução do contrato (vejam-se designadamente os artigos 21º ss. da Contestação da Ré e os artigos 35 ss. da Contestação da Contra-interessada), defendendo assim não ocorrer a violação das regras de participação no concurso nem das normas legais e concursais invocadas pela autora, e pugnando por conseguinte, pela validade do ato impugnado. É assim evidente que tal defesa do réu e da contrainteressada não configura uma defesa por exceção, perentória ou dilatória, nem foi alegado, nas respetivas contestações, qualquer facto novo relativamente ao qual cumprisse assegurar o respetivo direito de contraditório. Sendo que qualquer das normas e princípios invocadas pelas recorrentes, designadamente do contraditório do contraditório (artigo 3º, n.º 3, do CPC), da igualdade das partes (artigo 6.º do CPTA), da promoção do acesso à justiça (artigo 7.º do CPTA) e da adequação formal do processo (artigo 547º do CPC), não justificam a apresentação de um articulado pelo autor de uma ação com vista a rebater os argumentos esgrimidos pelo réu ou pelos contrainteressados nas suas contestações em sua defesa, quando estes não integrem ou constituam a chamada defesa por exceção, mas meramente defesa por impugnação. Pelo que corretamente se decidiu na decisão impugnada, não incorrendo a mesma em erro de julgamento. Improcedendo, por conseguinte, nesta parte o recurso. * 2. - Da questão de saber se ao ter sido proferida decisão sobre o mérito da ação em despacho-saneador, sem que às partes tenha, assim, sido possibilitada a apresentação de alegações escritas, ocorreu violação do disposto nos artigos 27º nº 1 alínea i) e 102º nº 2 do CPTA ou nulidade processual nos termos dos artigos 195.º e seguintes do CPC – vide conclusão a) das alegações de recurso. Da decisão recorrida: A Mmª Juiz do Tribunal a quo, titular do processo, proferiu o saneador-sentença de 03/06/2014, após indeferir a produção de prova testemunhal que havia sido requerida pela autora, pela ré e pela contrainteressada nos respetivos articulados iniciais, o que fez com o seguinte fundamento que assim ali verteu: “A Autora, a Entidade Demandada e a contrainteressada arrolaram testemunhas para prova dos factos. Porém, a factualidade alegada e relevante para a decisão da causa é suscetível de ser provada com os documentos juntos ao processo. Pelo exposto, a produção de prova testemunhal afigura-se-me claramente desnecessária. Assim, de acordo com o disposto no art 102º, nº 1 e no art. 90º, nº 2 do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, indefiro os requerimentos para produção de prova testemunhal apresentados nos autos pelas partes.” Após o que passou de imediato a apreciar e decidir o mérito da ação, sem que tenha notificado as partes para apresentarem as alegações escritas a que aludem os artigos 91º nº 4 e 102º nº 2 do CPTA, decidindo pela não verificação dos vícios de violação de lei que vinham assacadas ao impugnado ato de adjudicação, julgando assim a ação improcedente, não anulando tal ato nem o subsequente contrato entretanto celebrado. Apresentada pelas autoras, aqui Recorrentes, reclamação para a Conferência nos termos do artigo 27º nº 2 do CPTA, invocando tal questão, o Acórdão da Conferência do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de 07/07/2014, decidiu pela improcedência da Reclamação, com o seguinte fundamento no que a ela respeita, que se passa a transcrever: “De acordo com o disposto no art. 102º, nº 1 e 2 do CPTA, o processo de contencioso pré-contratual, sendo um processo urgente, seguir a tramitação das ações administrativas especiais com as adaptações que constam do art. 102º do CPTA. Entre essas adaptações consta a de poder ser admitida a produção de alegações se tiver sido produzida prova com a contestação, não, como pretendem as autoras, a obrigatoriedade de existirem sempre alegações finais quando seja produzida prova com a contestação. A razão de ser da não inquirição das testemunhas reside no entendimento deixado pelo tribunal, de que a factualidade alegada e relevante para a decisão da causa é suscetível de ser provada com os documentos juntos ao processo. E, assim sendo, foram indeferidos os requerimentos para produção de prova testemunhal apresentados nos autos pelas partes.“ ~ Da tese das recorrentes:Propugnam as recorrentes a revogação «da decisão de dispensa de apresentação de alegações finais escritas», por erro de julgamento, decorrente de violação de lei, designadamente do disposto nos artigos 27.º, n.º 1, al. i), e 102.º, n.º 2, do CPTA, gerador de nulidade processual nos termos dos artigos 195.º e seguintes do CPC, ordenando-se consequentemente a repetição desses atos processuais, defendendo que o Tribunal a quo violou o direito das partes à apresentação de alegações escritas ao conhecer do mérito numa fase processual em que lhe estava vedado tal conhecimento, sustentando que nem na sua Petição Inicial nem em qualquer momento subsequente requereu a dispensa de apresentação de alegações a que alude o artigo 78º nº 4 do CPTA; que à luz do artigo 102º nº 2 do CPTA, que dispõe que “só são admissíveis alegações no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação”, tendo sido produzida prova documental com as contestações apresentadas e tendo todos as partes requerido a produção de prova testemunhal deveria ter ocorrido a possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas, que se destinam neste tipo de processos a permitir ao demandante pronunciar-se sobre elementos probatórios apresentados com a Contestação, assim podendo exercer o contraditório, de forma completa e esclarecida, sobre a totalidade do quadro fáctico que o Tribunal irá considerar, pugnando que ao decidir de mérito sem que tenham as partes tido a possibilidade de apresentar alegações escritas incorreu o Tribunal a quo em nulidade processual, nos termos dos artigos 195.º e seguintes do CPC, com influência na decisão final. ~ Da posição dos recorridos: Quer o Réu CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL, EPE, quer a contrainteressada A……, LDA., pugnam pela improcedência do recurso também nesta parte, defendendo, em suma, que em face do disposto no nº 2 do artigo 102º do CPTA nos processos de contencioso pré-contratual não se está perante um direito das partes de dispensarem ou não as alegações finais, como acontece na ação administrativa especial, mas perante uma situação de admissibilidade de apresentação de alegações finais escritas, a qual se encontra circunscrita nos termos ali previstos; que para que haja lugar a alegações nos processos de contencioso pré-contratual não basta que tenham sido juntos documentos as contestações apresentadas, sendo necessário que tais documentos não fossem do conhecimento prévio da autora à data em que apresentou a Petição Inicial, ficando desde logo de parte os documentos que fazem parte do processo instrutor; que muito embora as Recorrentes invoquem em seu favor o facto de terem sido juntos documentos com a contestação da contrainteressada, mas não os individualizam nem explicam em qualquer momento qual desses documentos influiria necessariamente na decisão final e teria levado à suposta nulidade da sentença recorrida. ~ Do Parecer do Ministério Público: Pugna o Ministério Público no seu Parecer pela improcedência do recurso também nesta parte, pela seguinte ordem de razão, que se passa a transcrever: “Estão em causa a aplicação de regras estatuídas no art. 102º nº 1 1 e 2 do CPTA que constituem uma exceção às regras gerais previstas para as alegações escritas (arts. 78º nº 4 conjugado com o artigo 83º nº 2 do mesmo diploma legal). A dispensa de alegações escritas pressupõe que não se proceda à produção de prova, passando o Tribunal imediatamente a decidir do mérito da ação após a fase dos articulados. Neste caso foi apresentada prova testemunhal, mas o Tribunal entendeu não ser necessária. O contencioso pré-contratual é urgente, pelo que o normal andamento do processo apresenta-se abreviado, sendo inclusive reduzidos os prazos. O artigo 102º nº 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos estabelece uma regra especial: “só são admissíveis alegações no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação”. Donde resulta que são apenas «admissíveis», cabendo ao juiz ponderar da sua relevância. Esta regra afasta necessariamente a verificação do requisito (de que dependa a emissão de saneador-sentença) relativo à dispensa de alegações nos termos em que é formulado na alínea b) do nº 1 do artigo 87º do CPTA. Pois que da conjugação do mesmo artigo com as restantes normas citadas resulta que é facultativa a produção de alegações, pelo que não está o Tribunal vinculado a cumprir o preceituado no mencionado art. 87º nº 1 al. b) do CPTA. É este o preceito aplicável e não o do artigo 27º nº 1 alínea i) do CPTA. As alegações apenas têm lugar quando sejam realizadas diligências instrutórias nos termos referidos ou para que o Autor se pronuncie sobre documentos a que não tenha tido acesso quando elaborou a petição inicial (Mário Aroso d ealmeida, Carlos Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 3ª ed.). A documentação junta pela Ré e contrainteressada já era do conhecimento da Autora, como resulta dos autos. Pelo que, não ocorre qualquer nulidade daí decorrente, e designadamente as previstas nos arts. 195º e segs. do C.P.Civil”. ~ Da análise e apreciação da questão:Importa antes do mais explicitar que embora seja válida no direito processual a ideia segundo a qual «das nulidades reclama-se das decisões recorre-se», nada obsta que em sede do presente recurso se proceda ao conhecimento e decisão da arguida nulidade processual, consistente na prolação de decisão sobre o mérito da causa sem que às partes tenha sido dada a possibilidade de apresentarem alegações escritas (consubstanciando uma nulidade processual por omissão de ato prescrito na lei), já que se está, no caso, perante uma nulidade coberta ou assumida pelo próprio saneador-sentença de 03/06/2014, que foi também arguida no âmbito da Reclamação para a Conferência e nesta indeferida. Vide a respeito da admissibilidade da arguição e conhecimento em sede de recurso das nulidades processuais cobertas ou assumidas por decisões judiciais, na doutrina, ALBERTO DOS REIS, in, “Comentário ao Código de Processo Civil”, 2.º, págs. 507 e ss., MANUEL DE ANDRADE, in, “Noções Elementares de Processo Civil”, pág. 182, e na jurisprudência, entre outros, os Acórdãos do STA de 28/03/2012, Proc. 01178/11, de 28/03/2012, Proc. 0934/11 e de 15/09/2011 (do Pleno), Rec. 505/10-20; deste TCA Sul de 03/11/2011, Proc. 07960/11 e do TCA Norte de 27/10/2011, Proc. 00647/10, todos in www.dgsi.pt.. Com efeito as nulidades processuais são “desvios do formalismo processual seguido em relação ao formalismo processual prescrito na lei e a que esta faz corresponder uma invalidade mais ou menos extensa de atos processuais e que podem assumir um de três tipos: a prática de um ato proibido, a omissão de um ato prescrito na lei e, por último, a realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido” (cfr. ANTUNES VARELA, in “Manual de Direito Processual Civil”, 1984, pág. 373). Sendo que, sem prejuízo das nulidades de conhecimento oficio, as nulidades devem ser arguidas pelos interessados perante o juiz (cfr. artigos 196º e 197º do novo CPC, aprovado pela Lei nº 41/2013), e é a decisão que vier a ser proferida que poderá ser impugnada pela via recursória, agora com a limitação constante do artigo 630º nº 2 do CPC nos termos do qual “não é admissível recurso das decisões… proferidas sobre as nulidades previstas no nº 1 do artigo 195º … salvo se contenderem com os princípios da igualdade ou do contraditório, com a aquisição processual de factos ou com a admissibilidade de meios probatórios” (cfr. ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2ª Edição, pág. 24). Solução que deve ser aplicada aos casos em que tenha sido praticada uma nulidade processual que se projete na sentença mas que não se reporte a qualquer das alíneas do nº 1 do artigo 615º do CPC, as quais constituem nulidades da própria sentença (nulidades «in interiore»). Feita esta explicitação vejamos se ocorre a invocada nulidade processual, consistente na prolação de decisão de mérito sem que tenha sido possibilitada a apresentação de alegações escritas. Fora das situações enunciadas nos artigos 186º a 195º do CPC novo, aprovado pela Lei nº 41/2013 (correspondentes aos artigos 193º a 200º do anterior CPC), que integram as chamadas nulidades principais, dispõe o n.º 1 do artigo 195.º do CPC novo (correspondente ao artigo 201º nº 1 do antigo CPC) que “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa”. Está-se aqui perante as chamadas nulidades secundárias ou atípicas, cujo conhecimento está dependente da arguição da parte interessada, salvos os casos especiais em que a lei permite o conhecimento oficioso, conforme decorre da segunda parte do artigo 196º do CPC novo (correspondente ao artigo 202º do anterior CPC). A invocada nulidade processual decorrente da preterição das alegações escritas, a existir, configurará uma nulidade secundária ou atípica, à luz do disposto no nº 1 do artigo 195º do CPC novo. Assim, para se chegar à conclusão de que ocorreu, no caso, nulidade processual consistente na falta de notificação das partes para apresentarem alegações escritas a que aludem os artigos 91º nº 4 e 102º nº 2 do CPTA, tem primeiro que aferir-se se, à luz do processualismo legalmente previsto no CPTA para o processo de contencioso pré-contratual, deveria ter havido lugar à prática de tal ato processual. E respondida que seja positivamente tal questão, isto é, verificado que seja que foi omitido ato legalmente prescrito no figurino processual, tem ainda assim que se resolver outra questão, subsequente, que é a de saber se tal omissão pode influir no exame ou na decisão da causa. Vejamos, então. Na situação dos autos no saneador-sentença de 03/06/2014 a Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, após indeferir a produção de prova testemunhal que havia sido requerida pela autora, pelo réu e pela contrainteressada nos respetivos articulados iniciais, passou de imediato a apreciar e decidir o mérito da ação. Proferiu, pois, a Mmª Juíza do tribunal a quo decisão sobre o mérito da causa em sede de despacho-saneador (decidindo pela não verificação dos vícios de violação de lei que vinham assacadas ao impugnado ato de adjudicação, julgando assim a ação improcedente, não anulando tal ato nem o subsequente contrato entretanto celebrado), sem que tenha, assim, dado lugar à fase de alegações escritas a que aludem os artigos 91º nº 4 e 102º nº 2 do CPTA, notificado as partes para as apresentarem. E deduzida pelas autoras, aqui Recorrentes, reclamação para a Conferência nos termos do artigo 27º nº 2 do CPTA, invocando a verificação da nulidade processual consistente na falta de notificação para alegarem, o Acórdão da Conferência do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de 07/07/2014, decidiu pela improcedência da Reclamação, com o seguinte fundamento no que a esta questão respeita, que se passa a transcrever: «De acordo com o disposto no art. 102º, nº 1 e 2 do CPTA, o processo de contencioso pré-contratual, sendo um processo urgente, seguir a tramitação das ações administrativas especiais com as adaptações que constam do art. 102º do CPTA. Entre essas adaptações consta a de poder ser admitida a produção de alegações se tiver sido produzida prova com a contestação, não, como pretendem as autoras, a obrigatoriedade de existirem sempre alegações finais quando seja produzida prova com a contestação. A razão de ser da não inquirição das testemunhas reside no entendimento deixado pelo tribunal, de que a factualidade alegada e relevante para a decisão da causa é suscetível de ser provada com os documentos juntos ao processo. E, assim sendo, foram indeferidos os requerimentos para produção de prova testemunhal apresentados nos autos pelas partes.». O processo de contencioso pré-contratual encontra-se previsto e regulado nos artigos 100º ss. do CPTA para a impugnação de atos administrativos relativos à formação de contratos de empreitada e concessão de obras públicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens, tendo o mesmo caráter urgente, nos termos do disposto nos artigos 36º nº 1 alínea b) e 101º do CPTA. O que significa que “corre em férias, com dispensa de vistos prévios, mesmo em fase de recurso jurisdicional, e os atos da secretaria são praticados no próprio dia, com precedência sobre quaisquer outros” (cfr. nº 2 do artigo 36º do CPTA). Quanto ao seu regime dispõe o artigo 100º nº 1 que o contencioso pré-contratual se rege pelo disposto na secção II do Capítulo I do Título IV, isto é, a especificamente atinente ao processo de contencioso pré-contratual, onde estão compreendidos os artigos 100º a 103º do CPTA, e subsidiariamente pelo disposto na secção I do capítulo II do título III, ou seja, a atinente à ação administrativa especial destinada à impugnação de atos administrativos, compreendendo os artigos 50º a 65º do CPTA. E dispõe ainda o artigo 102º nº 1 do CPTA, sob a epígrafe “tramitação”, que o processo de contencioso pré-contratual obedece “à tramitação estabelecida no capítulo III do título III, salvo o preceituado nos números seguintes”. O que nos remete para as normas atinentes à marcha do processo prevista nos artigos 78º a 96º do CPTA para a ação administrativa especial. Daqui se infere que à tramitação dos processos do contencioso pré-contratual se aplicam as disposições que regulam a tramitação processual da ação administrativa especial, apenas no que não estiver especificamente regulado no CPTA para o processo de contencioso pré-contratual. A tramitação da ação administrativa especial inclui, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 91º nº 1, 2, 3 e 4, 78º nº 4, 83º nº 2, 87º nº 1 alínea b) do CPTA, a apresentação de alegações escritas pelas partes antes da prolação da decisão sobre o mérito da causa quando não haja lugar à audiência pública por iniciativa das partes, situação em que as alegações de direito são aduzidas de forma oral, ou quando as partes não tenham renunciado à sua apresentação. Havendo lugar à apresentação de alegações escritas (apelidadas de “alegações finais” no artigo 87º nº 1 alínea b) do CPTA) as partes são previamente notificadas para as apresentarem, pelo prazo sucessivo de 20 dias (cfr. nº 4 do artigo 91º do CPTA). Mas as mesmas são de apresentação facultativa, como decorre da última parte daquele nº 4 (…”para, querendo, as apresentarem”), não existindo qualquer efeito preclusivo ou cominatório da sua não apresentação por qualquer das partes. No que respeita à tramitação dos processos de contencioso pré-contratual o nº 2 do artigo 102º do CPTA estatui que “só são admissíveis alegações no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação”. Temos assim que enquanto o regime regra na tramitação da ação administrativa especial é o da possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas antes de ser proferida decisão sobre o mérito da causa, para o que são notificadas para o efeito (só assim não sendo quando tenha havido lugar a audiência pública por iniciativa das partes, a que alude o nº 3 do artigo 91º do CPTA, ou quando as partes tenham a elas previamente renunciado nos termos das disposições conjugadas dos artigos 78º nº 4 e 83º nº 2 do CPTA, como decorre do disposto nos artigos 87º nº 1 alínea b) e 91º nº 4 do mesmo Código) já na tramitação dos processos de contencioso pré-contratual só haverá lugar à possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas antes de ser proferida decisão sobre o mérito da causa “no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação”. Sendo certo que havendo lugar à audiência pública prevista no artigo 103º do CPTA (a qual terá lugar quando o tribunal a considere “aconselhável ao mais rápido esclarecimento da questão”) as alegações são nela proferidas de forma oral. Esta especificidade de regime para os processos de contencioso pré-contratual, apenas admitindo a existência de apresentação de alegações escritas se for requerida ou produzida prova com a contestação, pode facilmente encontrar justificação na particular natureza e âmbito das questões objeto daquele contencioso e dos interesses em causa, que também explicam o carácter urgente do processo, eliminando como regra da notificação das partes para apresentarem alegações escritas pelo prazo sucessivo de 20 dias (cfr. artigo 102º nº 3 alínea a) do CPTA), e apenas a admitindo, excecionalmente, quando seja requerida ou produzida prova com a contestação. Sendo que, como já se disse, à tramitação dos processos do contencioso pré-contratual apenas se aplicam as disposições que regulam a tramitação processual da ação administrativa especial no que não estiver especificamente regulado no CPTA para o processo de contencioso pré-contratual. Em face do quadro normativo assim traçado, aplicável na tramitação dos processos de contencioso pré-contratual, tem de afastar-se desde logo a invocada violação do artigo 78º nº 4 do CPTA, na interpretação segundo a qual só poderia ter deixado de haver lugar a produção de alegações escritas se tivesse sido requerida na petição inicial a sua dispensa, bem como a invocada violação do artigo 27º nº 1 alínea i) do CPTA, já que este em nada contende com a questão em análise, antes dispondo acerca da possibilidade de, nos casos em que a decisão sobre o mérito da causa competir a tribunal coletivo, por efeito do valor da causa, o juiz titular do processo (relator) poder optar pela decisão singular da causa (juiz singular), constituindo, assim, uma norma de competência. Mas subsiste a questão atinente à invocada violação do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA. Relembremos que nos termos do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA nos processos de contencioso pré-contratual só haverá lugar à possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas antes de ser proferida decisão sobre o mérito da causa “no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação”. Pelo que importa precisar o conteúdo e alcance deste normativo, de modo a detetar-se se, no caso, deveria ou não ter havido lugar à notificação das partes para apresentarem alegações escritas. À luz do disposto no artigo 9º do Código Civil o intérprete deve, na fixação do sentido e alcance da lei, presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados, e reconstituir, a partir da letra da lei, o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico e as circunstâncias em que a lei foi elaborada. Sendo que é a letra da lei o ponto de partida e limite da interpretação jurídica a efetuar pelo intérprete e aplicador da lei, nos termos do disposto nos artigos 9º e 10° nº 2 do Código Civil, que, entre o demais, determina na tarefa de interpretação da lei se elimine aquele ou aqueles sentidos que nela não tenham a menor correspondência, e que, no caso de a lei comportar apenas um sentido seja esse o sentido da norma (cfr. BATISTA MACHADO, in, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, Coimbra, 1985, pág. 181). A respeito desta norma (do artigo 102º nº 2 do CPTA), tem vindo a ser entendido na doutrina (vide MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 2005, pág. 684) como na jurisprudência (vide, neste sentido, entre outros, o Acórdão do STA de 28/03/2012, Proc. 0934/11, e o Acórdão deste TCA Sul de 23/09/2010, Proc. 06401/10, in www.dgsi.pt/jsta) que não se pode considerar integrado no conceito de “produção de prova com a contestação” a remessa do Processo Administrativo, a que alude o artigo 81º nº 1 do CPTA, aplicável ao processos de contencioso pré-contratual ex vi do artigo 102º nº 1 do CPTA, nos termos do qual “com a contestação, ou dentro do respetivo prazo, a entidade demandada é obrigada a remeter ao tribunal o original do processo administrativo, quando exista, e todos os demais documentos respeitantes à matéria do processo de que seja detentora, que ficarão apensados aos autos”, já que a obrigatoriedade da sua remessa pela entidade demandada tornaria constante nos processos de contencioso pré-contratual a fase de alegações, esvaziando assim a norma do seu sentido. E temos nós também esse entendimento. Pelo que a circunstância de o Réu ter remetido, aquando da sua contestação, o Processo Administrativo atinente ao procedimento pré-contratual em causa nos autos, não origina a admissibilidade de apresentação de alegações escritas. Sucede que na sua contestação (de fls. 300 ss. dos autos) o Réu requereu a produção de prova testemunhal, arrolando cinco (5) testemunhas, que identificou. Estatui o nº 2 do artigo 102º do CPTA que “só são admissíveis alegações no caso de ser requerida ou produzida prova com a contestação” (sublinhado nosso). Será então que por referência à contestação do réu se tem que dar por verificada a primeira das circunstâncias enunciadas no nº 2 do artigo 102º do CPTA: ter sido requerida prova com a contestação? Como se verifica que na sua contestação (de fls. 324 ss. dos autos) a contrainteressada A…… não só requereu a produção de prova testemunhal, arrolando duas (2) testemunhas, que identificou, como procedeu à junção de nove (9) documentos (que constam de fls. 351 a fls. 447 dos autos). Será, então, que por referência à contestação da contrainteressada se tem que dar por verificada não só a primeira das circunstâncias enunciadas no nº 2 do artigo 102º do CPTA, ter sido requerida prova com a contestação, mas também a segunda, ter sido produzida prova com a contestação? Ora no que toca à primeira das circunstâncias enunciadas no nº 2 do artigo 102º do CPTA, ter sido requerida prova com a contestação, tem sido reiterada a jurisprudência no sentido de que o mero oferecimento de um rol de testemunhas, considerado inútil pelo tribunal, é inoperante para os fins previstos no artigo 102º nº2 do CPTA por esta norma embora falar em prova “requerida” querer aludir “àquela que, sendo requerida frutiferamente, será mesmo produzida e não a que não o seja, por desnecessidade” (vide neste sentido o Acórdão do STA, de 28/03/2012, processo n.º 01178/11; os Acórdãos deste TCAS, de 23/09/2010, Proc. 06401/10 e de 03/11/2011, Proc. 07960/11, e os Acórdãos do TCA Norte de 27/10/2011, Proc. n.º 00647/10.7BEPNF). E com efeito tem que entender-se que o sentido da norma ínsita no nº 2 do artigo 102º do CPTA é o de, no âmbito do processo de contencioso pré-contratual, no qual foi afastada, como regra, lembre-se, a fase das alegações escritas prevista na tramitação da ação administrativa especial, esta só tem lugar quando se justifique permitir ao demandante (e às contra partes, em contraposição) tomar posição, pronunciando-se, sobre elementos de prova surgidos no decurso do processo. Não faria qualquer sentido, não podendo ter-se como querido pelo legislador, haver lugar na alegações escritas pela simples circunstância de ter sido requerida pelo demandado ou pelos contrainteressados nas suas contestações a produção de prova (mormente a testemunhal), não obstante a mesma não tenha sido produzida, por o juiz do processo ter indeferido os requerimentos de prova (cfr. artigo 90º nº 2, ex vi do artigo 102º nº 1 do CPTA) e ter considerado não ser de determinar a abertura de um período de produção de prova (cfr. artigo 87º nº 1 alínea c), ex vi do artigo 102º nº 1 do CPTA). Como dizem MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA, in “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2005, pág. 684, “(…) no caso do contencioso pré-contratual a apresentação de alegações só é admissível quando a prova tenha sido junta pelo demandado na contestação ou tenha sido requerida nesta peça processual, o que significa que as alegações se destinam essencialmente a permitir ao demandante pronunciar-se sobre elementos de prova apresentados no decurso do processo e a que porventura não tenha tido acesso antes”. Assim sendo, e pelo exposto, tem que considerar-se que a mera circunstância de ter sido requerida a produção de prova testemunhal, quer pelo réu quer pela contrainteressada, nas suas respetivas contestações, não tendo a mesma tido lugar, por tais requerimentos de prova terem sido indeferidos pela Mmª Juiz do Tribunal a quo (como também o foi a prova testemunhal que havia sido requerida pela autora B….. na sua Petição Inicial), não dá lugar, nos termos do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA. Não foi assim omitido tal ato processual. E não o tendo sido, não ocorre a invocada nulidade processual. E quanto à produção de prova (documental) com a contestação da contrainteressada? O nº 2 do artigo 102º do CPTA estatui que são admissíveis alegações no caso de ser produzida prova com a contestação. E a contrainteressada A…… procedeu à junção com a sua contestação (de fls. 324 ss. dos autos) de nove (9) documentos, que constam de fls. 351 a fls. 447 dos autos. Alguns desses documentos constituem reprodução (cópia) de documentos que integram o Processo Administrativo, como é o caso dos documentos atinentes e integrantes da proposta da contrainteressada A…… que foram juntos sob Doc. nº 1 (a fls. 351 ss. dos autos) e Doc. nº 8 (a fls. 444 ss. dos autos) com a sua contestação. Não se tratando de elementos de prova novos, de que os demandantes não tivessem já conhecimento, não é de considerar, por referência a tais documentos, haver lugar a alegações à luz da doutrina vertida supra a respeito da interpretação da norma ínsita no nº 2 do artigo 102º do CPTA. Mas já não é assim com os documentos que foram juntos sob Docs. nºs 2 a 6 (constantes de fls. 433 a 442 dos autos), nem com os que foram juntos sob Doc. nº 7 e Doc. nº 9 (a fls. 443 e fls. 447 dos autos, respetivamente), os quais constituem documentos que não integravam o Processo Administrativo, e que foram juntos pela contrainteressada A…… para prova do por si alegado nos artigos 70º a 77º e 84º da sua contestação. Em face da junção de tais documentos, constituindo os mesmos produção de prova (documental) com a contestação, na aceção acolhida no nº 2 do artigo 102º do CPTA e para os efeitos ali previstos, traduzindo-se em elementos probatórios novos, apresentados no decurso do processo, teria que ser assegurada a possibilidade de as autoras tomarem posição através da apresentação de alegações escritas, notificando-as para o efeito, antes de se proferir decisão sobre o mérito da causa. Não tendo ocorrido tal notificação, não sendo dada a possibilidade às autoras (e às contrapartes) de apresentarem alegações escritas, tem de concluir-se que foi omitido ato legalmente prescrito no figurino processual. Mas como já se viu supra, à luz do disposto no nº 1 do artigo 195º do CPC novo, aqui aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA, não basta para que se julgue verificada a invocada nulidade processual decorrente da falta de notificação para as alegações escritas, a sua simples falta (omissão). Para ocorrer nulidade processual mister é que “a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa” (cfr. parte final do nº 1 do artigo 195º do CPC), já que a omissão de tal formalidade não se encontra expressamente cominada ou fulminada na lei como gerando uma nulidade processual. Com efeito, de harmonia com o disposto no artigo 195º nº 1 do CPC novo, na situação das nulidades secundárias, como é o caso, “a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa” (sublinhado nosso). As recorrentes alegam que tendo sido produzida prova documental com as contestações apresentadas deveria ter ocorrido a possibilidade de as partes apresentarem alegações escritas, por as mesmas se destinarem neste tipo de processos a permitir ao demandante pronunciar-se sobre elementos probatórios apresentados com a Contestação, assim podendo exercer o contraditório, de forma completo e esclarecido, sobre a totalidade do quadro fáctico que o Tribunal irá considerar, pugnando que ao decidir de mérito sem que tenham as partes tido a possibilidade de apresentar alegações escritas incorreu o Tribunal a quo em nulidade processual, nos termos elos artigos 195.º e seguintes do CPC, com influência na decisão final. Como já se viu, tendo sido produzida prova documental nova com a contestação da contrainteressada, com junção de documentos que não integravam o Processo Administrativo, tinham as autoras direito a apresentarem alegações ao abrigo do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA. Pelo que assiste, nesse segmento, razão às recorrentes, devendo a Mmª Juiz titular do processo no tribunal a quo ter, perante a constatação da junção aos autos com a contestação da contrainteressada de prova documental que não se encontrava integrada no Processo Administrativo, ter ordenado, em cumprimento do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA, a notificação das partes para apresentarem alegações escritas, querendo, no prazo sucessivo de 20 dias (cfr. artigo 102º nº 3 alínea a) do CPTA). O que não fez. Tal não basta, porém, para se concluir que tal omissão constitua, no caso, nulidade processual nos termos do artigo 195º nº 1 do CPC novo, que se projete e afete a decisão de mérito proferida no saneador-sentença de 03/06/2014, mantida no Acórdão de 07/07/2014 da Conferência do TAF de Sintra. É necessário ainda que tal omissão “possa influir no exame ou na decisão da causa” (cfr. artigo 195º nº 1 do CPC novo). O que concomitantemente significa que a parte que argua tal nulidade processual (que, renove-se, não se encontra expressamente cominada ou fulminada pela lei como tal), terá de alegar e demonstrar que a falta cometida é suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, não bastando a sua mera invocação abstrata (vide, neste sentido, entre outros, os Acórdãos do TCA Norte de 27/06/2014, Proc. 0140513.2BEBRG; de 27/10/2011, Proc. n.º 00647/10.7BEPNF; de 09/02/2006, Proc. nº 01300/04.6BEVIS e deste TCA Sul de 03/11/2011, Proc. 07960/11, in www.dgsi.pt). Ora as recorrentes não mencionaram nas suas alegações de recurso (como o não fizeram na prévia reclamação para a conferência) de que modo ou em que dimensão a circunstância de não lhes ter sido possibilitada a apresentação de alegações antes de ser proferida decisão de mérito sobre a causa influiu sobre o exame ou sobre a decisão que veio a ser proferida. Nem a tal conclusão se pode chegar em face dos elementos patenteados nos autos, já que perscrutada a matéria de facto dada como provada pela Mmª Juiz do Tribunal a quo no saneador-sentença de 03/06/2014, e respetiva motivação, tal como se mostra nele externada, constata-se que nele não foi selecionada como relevante para a decisão da causa qualquer dos factos alegados nos artigos 70º a 77º e 84º da contestação da contrainteressada A……, cujos documentos juntos sob Docs. nºs 2 a 6 (constantes de fls. 433 a 442 dos autos), sob Doc. nº 7 (a fls. 443 dos autos) e sob Doc. nº 9 (a fls. 447 dos autos) com aquele articulado se destinavam a provar. Não pode, por conseguinte, concluir que a omissão da notificação das partes para apresentarem alegações, que deveria ter existido nos termos do disposto no artigo 102º nº 2 do CPTA, tenha conduzido a nulidade processual nos termos do artigo 195º nº 1 do CPC novo, que se projete e afete a decisão de mérito proferida no saneador-sentença de 03/06/2014, mantida no Acórdão de 07/07/2014 da Conferência do TAF de Sintra. Improcedendo, por conseguinte, também nesta parte, o presente recurso. * 3. - Da questão de saber se em vez de ter sido julgada improcedente a ação pelo saneador-sentença de 03/06/2014, proferido pela respetiva Mmª Juíza Relatora do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, mantida pelo Acórdão de 07/07/2014 da respetiva conferência, deveria ter sido declarada a invalidade do impugnado ato de adjudicação do Lote 1 e do Contrato celebrado em 20/02/2014, com fundamento (i) em violação do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso; (ii) em violação do disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Programa de Concurso; em (iii) incumprimento, pela proposta da A…… de normas legais e regulamentares aplicáveis (artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e Circular 069/CD elo I……), com a consequência determinada pelo artigo 70.º, n.º 1, al. f) do CCP, e (iv) em vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade, da igualdade legalmente consagrados no n.º 4 do artigo 1.º do CCP e nos artigos 3º e 5º do Código do Procedimento Administrativo. – vide conclusão c) das alegações de recurso.Da decisão recorrida: No saneador-sentença de 03/06/2014 proferido pela Mmª Juiz do Tribunal titular do processo, que foi mantido no Acórdão de 07/07/2014 da Conferência do TAF de Sintra, foi decidida a não verificação dos vícios de violação de lei que vinham assacados ao impugnado ato de adjudicação do lote 1 à contra-interessada A……, Lda. no âmbito do Concurso Público Internacional nº 1 – 1 – 5000/2014, para o fornecimento de reagentes e demais bens necessários para a realização de análises clínicas, tendo assim sido julgada a ação improcedente, não tendo tal ato sido anulado nem o subsequente contrato entretanto celebrado. ~ Da tese das recorrentes:Propugnam as recorrentes que deve ser declarada a invalidade do impugnado ato de adjudicação do Lote 1 e do Contrato celebrado em 20/02/2014, com fundamento em violação: (i) Do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso, (ii) Do disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Programa de Concurso, (iii) E, em incumprimento, pela proposta da A…… de normas legais e regulamentares aplicáveis (artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e Circular 069/CD elo I……), com a consequência determinada pelo artigo 70.º, n.º 1, al. f) do CCP, e (iv) Em vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade, da igualdade legalmente consagrados no n.º 4 do artigo 1.º do CCP e nos artigos 3º e 5º do Código do Procedimento Administrativo.” ~ Da posição dos recorridos: Quer o réu CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL, EPE, quer a contrainteressada A……, LDA., pugnam nas suas contra-alegações pela improcedência do recurso, também nesta parte, defendendo em suma, não se verificarem as invocadas causas de invalidade do ato de adjudicação tal como decidido pelo tribunal a quo. ~ Do Parecer do Ministério Público: O Parecer do Ministério Público vai também no sentido da improcedência do recurso por não ocorrer erro de julgamento quanto à não verificação das causas de invalidade assacadas ao impugnado ato de adjudicação. ~ Da análise e apreciação da questão:Nos termos dos artigos 146º nº 4 do CPTA e do artigo 639º do CPC novo (correspondente ao anterior artigo 685.º-A) ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA, o recorrente deve apresentar a sua alegação na qual terá de formular conclusões, conclusões essas que deverão ser elaboradas de forma sintética e nas quais se devem indicar os fundamentos porque pede o recorrente a alteração ou anulação da decisão judicial, bem como se deve invocar os normativos violados. Com efeito na fase de recurso, em que nos encontramos, o que importa é apreciar se a decisão proferida pelo Tribunal a quo deve ser mantida, alterada ou revogada, circunscrevendo-se as questões a apreciar em sede de recurso, à luz das disposições conjugadas dos artigos 144º nº 2 do CPTA e 639º nº 1 e 635º do CPC novo (ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA), às que integram o objeto do recurso tal como o mesmo foi delimitado pelo recorrente nas suas alegações, mais concretamente nas suas respetivas conclusões (sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso), mas simultaneamente balizadas pelas questões que haviam já sido submetidas ao Tribunal a quo, não se confundindo, naturalmente, com meras considerações, argumentos, motivos ou juízos de valor (vide, neste sentido ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, Almedina, págs. 27 e 88-90). O objeto do recurso jurisdicional é, assim, constituído pelas ilegalidades/erros de julgamento imputados à decisão judicial recorrida, que ao recorrente cabe demonstrar (cfr. artigos 639º e 640º do CPC novo, correspondente aos anteriores artigos 685º-A e 685º-B) sob pena de não demonstrando o desacerto do decidido ver preterida a sua pretensão. Sendo que constitui entendimento uniforme o de que versando o recurso jurisdicional sobre a concreta decisão judicial impugnada, se as alegações não afrontarem válida e eficazmente aquela decisão terá o recurso que improceder (vide neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 23/02/2000, Proc. 023819; de 01/03/2011, Proc. 0368/10; de 17/04/2013, Proc. 01160/12 e de 15/05/2013, Proc. 0508/13, in, www.dgsi.pt/jsta). Na presente situação temos que as recorrentes renovam, grosso modo, a argumentação que já havia sido expandida na petição inicial no sentido da verificação dos assacados vícios geradores da ilegalidade do impugnado ato de adjudicação, pondo simultaneamente em causa o juízo feito no saneador-sentença de 03/06/2014, mantido no Acórdão da Conferência do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de 07/07/2014 quanto à improcedência de cada um de tais vícios. Pelo que importa analisar, por referência a cada um dos invocados vícios, se a decisão de mérito proferida pelo Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento. Antes, precise-se o seguinte. Os recursos jurisdicionais destinam-se a alterar ou a anular a decisão de que se recorre, dentro dos fundamentos da sua impugnação. Eles constituem meios judiciais de refutar o acerto do decidido, tendo o recorrente de alegar e concluir os fundamentos por que a decisão recorrida sofre dos vícios que este lhe imputa e que conduzem à sua anulação ou revogação. O âmbito dos poderes cognitivos do Tribunal de recurso é balizado, a um lado, pelo pedido e respetiva causa de pedir tal como os mesmos foram formulados e configurados em primeira instância no momento próprio (petição inicial), e a outro pelo julgado na decisão proferida em primeira instância (ressalvada a possibilidade legal de apreciação de matéria de conhecimento oficioso), como decorre do disposto no artigo 144º nº 2 do CPTA e 639º nº 1 e 635º do CPC novo, ex vi dos artigos 1º e 140º do CPTA (vide neste sentido, entre outros, o Acórdão deste TCA Sul de 08/05/2014, Proc. 11054/14, e o Acórdão do TCA Norte de 26/09/2013, Proc. 03049/11, in www.dgsi.pt). Pelo que, constituindo meios de impugnação de decisões judiciais, não podem os recursos jurisdicionais ser usados como meios de julgamento de questões novas. Não cabendo, pois, ao tribunal de recurso o conhecimento ex novo de questões que não foram submetidas a decisão no tribunal a quo. Perscrutada a petição inicial temos que nela foram alegados (tal como foram ali estruturadas e sistematizadas) dois segmentos, ou ordens de razões, enquanto fundamentos de ilegalidade do impugnado ato de adjudicação, que ali foram enunciados da seguinte forma: - ilegalidade da adjudicação «por violação das regras de participação no concurso e do disposto no artigo 10º nº 2 do Programa do Procedimento» (pelas razões e argumentos expostos nos artigos 23º a 46º da petição inicial); - ilegalidade da adjudicação «por violação do Caderno de Encargos, do princípio da igualdade, da concorrência» (pelas razões e argumentos expostos nos artigos 47º a 82º da petição inicial). No primeiro grupo, e em face do que foi exposto nos artigos 23º a 46º da petição inicial, é invocada a violação do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso – invocação a que aludem agora as recorrentes no ponto i) da alínea c) das suas alegações de recurso – bem como o incumprimento, pela proposta da contrainteressada A……, de normas legais e regulamentares aplicáveis, ínsitas no artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e na Circular 069/CD do I……, com violação do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea f) do CCP – invocação a que aludem as recorrentes no ponto ii) da alínea c) das suas alegações de recurso. No segundo grupo, e em face do que foi exposto nos artigos 47º a 82º da petição inicial, é invocada a violação do Caderno de Encargos, do princípio da igualdade, da concorrência, propugnando–se que nos termos previstos nos artigos 70º nº 2 alínea b) e 146º nº 2 alínea o) do CCP a proposta da contrainteressada A…… deveria ter sido excluída, e que assim o ato impugnado padece do vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade e da igualdade consagrados no nº 4 do artigo 1º do CCP e nos artigos 3º e 5º do CPA - invocação a que aludem as recorrentes no ponto iii) da alínea c) das suas alegações de recurso. Vejamos, então. ~ 3.1 Quanto à invocada violação do disposto no n.º 6 do artigo 5º do Programa de Concurso, do disposto no n.º 2 do artigo 9° do Programa de Concurso, violação do disposto no artigo 10.º, n.º 2 do Programa de Concurso, e incumprimento, pela proposta da contrainteressada A…… de normas legais e regulamentares aplicáveis, artigo 12º do Decreto-Lei n.º 189/2000 e Circular 069/CD do I……, com violação pelo ato de adjudicação do artigo 70.º nº 1 alínea f) do CCP – correspondentes ao primeiro grupo de ilegalidades da adjudicação (tal como enunciadas e expostas nos artigos 23º a 46º da petição inicial), a que as recorrentes aludem nos pontos i) e ii) da alínea c) das suas alegações de recurso. A tal respeito a recorrida decisão do tribunal a quo, tendo por base a matéria de facto que deu como provada, que não vem aqui posta em causa pelas recorrentes, julgou não verificado tais fundamentos, nos seguintes termos, que se passam a transcrever: “A presente ação surge no âmbito do Concurso Público Internacional nº 1 – 1 – 5000/2014, para o fornecimento de reagentes e demais bens necessários para a realização de análises clínicas, lançado pelo Centro Hospitalar de Lisboa Central, EPE. Em concreto, quanto ao lote 1, conforme resulta do anexo I do Caderno de Encargos, este lote destina-se ao fornecimento de um conjunto de reagentes, num total de 89 reagentes, entre os quais o fornecimento do reagente Barbituratos Soro (posição 61 do anexo I do Caderno de Encargos). Na proposta da A……, embora a mesma apresente um preço por teste para todos os reagentes identificados no Anexo I do Caderno de Encargos, a A……. junta na sua proposta uma declaração de outra entidade – a M……, Lda, nos termos da qual esta declara que «caso seja adjudicada a proposta apresentada pela A……, Lda a sua representadas (a M……) se compromete incondicionalmente a fornecer os reagentes e calibradores necessários à execução dos testes constantes da posição 61 (código 122040097 – barbituratos soro) pertencente ao lote 1 do presente Concurso, nas quantidades e nos exatos termos previstos nesse Caderno de Encargos». Onde a Autora entende que a proposta apresentada pela contrainteressada, para o lote 1, não compreende todos os reagentes constantes do anexo I do Caderno de Encargos, tendo antes assumido que, relativamente ao reagente que consta da posição 61 – barbituratos soro – o mesmo será fornecido por uma entidade que não participou no Concurso (sob a modalidade de agrupamento de empresas, a única forma legalmente admissível de assegurar a participação no concurso). E só esta entidade tem o reagente registado no I…….. A Entidade Demandada e a contrainteressada consideram a declaração da M…… como uma informação de que o reagente da posição 61 ia ser adquirido pela contrainteressada mediante subcontratação, legalmente permitida pela cláusula 24ª do Caderno de Encargos, sem necessidade de cumprir as formalidades previstas no art 5º, nº 6, nem no art 8º do Programa de Procedimento. Assim, defendem que a contrainteressada pode adquirir o produto a que se refere a posição 61 do lote 1 a outrem, que o tem registado no I……, para o fornecer ao CH nos termos e nas condições previstas no Caderno de Encargos. Os factos dizem-nos que a contrainteressada não se apresentou ao concurso sob a modalidade de agrupamento de empresas com a subscritora da declaração, a M……, Lda, como seria possível ao abrigo do art 8º do Programa de Procedimento e do art 54º do Código dos Contratos Públicos. Na verdade, a coberto dos preceitos legais citados, os concorrentes podem apresentar-se individualmente ou em agrupamento, caso este em que assume a posição de adjudicatário e deve associar-se, antes da celebração do contrato, na modalidade jurídica de consórcio externo. E, nessa circunstância, o art 5º, nº 6 do Programa de Procedimento e o art 57º, nº 5 do Código dos Contratos Públicos exige que a proposta e todos os documentos que se lhe associarem sejam assinados pelo representante comum dos membros que o integram ou, não existindo representante comum, deve a proposta e todos os documentos que se lhe associarem conter a assinatura por todos os seus membros ou respetivos representantes. Figura jurídica diferente do agrupamento, mas também admitida no Código dos Contratos Públicos e, em concreto, neste procedimento, consiste na subcontratação (cfr cláusula 24ª do Caderno de Encargos e arts 316º e segs do Código dos Contratos Públicos). Segundo Pedro Romano Martinez, «o subcontrato é um negócio jurídico bilateral subordinado a outro contrato (designado por contrato base ou contrato principal) e celebrado por uma das partes nesta última convenção com base nos direitos que da mesma lhe advêm. O subcontrato surge, pois, como um contrato em segunda mão, distinto do contrato principal, embora com conteúdos e objetos parcialmente comuns» (cfr em Contrato de Empreitada, pág 301). A subcontratação é diferente da cessão da posição contratual, como aliás refere o art 316º do Código dos Contratos Públicos. Porque, na cessão da posição contratual o contrato sofre uma alteração quanto a uma das partes contratantes, mas não há um novo contrato, há apenas substituição de um dos seus sujeitos. Na subcontratação existe uma relação contratual triangular. Não se verifica qualquer alteração do contrato, que se mantém tal como foi celebrado, apenas um dos sujeitos se faz substituir por outro na execução de, pelo menos, uma parte do objeto do contrato, não obstante e face ao outro contraente, correr sob a exclusiva responsabilidade daquele. A subcontratação terá geralmente na sua base a necessidade de o adjudicatário obter uma complementaridade de recursos técnicos: pode, originariamente ou no decurso da execução do contrato, não possuir os meios técnicos indispensáveis à execução do objeto do contrato, tendo de socorrer-se de outra entidade com quem, por isso, celebra um contrato (cfr Jorge Andrade da Silva, em Código dos Contratos Públicos, comentado e anotado, 2ª edição, 2009, pág 733). De todo o modo, como dispõe o art 288º do Código dos Contratos Públicos, sem prejuízo do disposto em matéria de cessão da posição contratual e de subcontratação, incumbe ao co-contratante a exata e pontual execução das prestações contratuais, em cumprimento do convencionado, não podendo este transmitir a terceiros as responsabilidades assumidas perante o contraente público. No mesmo sentido dispõe o art 321º do Código dos Contratos Públicos. Pelo que a declaração da M…… não pode ser lida como proposta para o fornecimento do reagente barbituratos soro. Na proposta da contrainteressada são apresentados os diversos preços para os diversos reagentes, incluindo os produtos a que se refere a posição 61, para o lote 1. A contrainteressada incluiu expressamente na proposta o produto a que se refere a posição 61, o código do produto, a referência identificativa dos testes, a quantidade de testes por embalagem, o preço por teste, o valor anual e por três anos proposto, tudo como melhor se alcança de fls 404 do processo físico do Tribunal (doc nº 1 da contestação da contrainteressada). Portanto, da proposta da contrainteressada resulta que a mesma assumiu o compromisso de que a adjudicante irá dispor dos 89 reagentes constantes do anexo I do Caderno de Encargos, nomeadamente do que se reporta a posição 61 do lote 1, pelo preço ali identificado e no âmbito da execução do contrato. Inexistindo, em consequência, qualquer proposta parcial apresentada pela contrainteressada para o lote 1, isto é, vício de violação do disposto no art 9º, nº 2 do Programa de Concurso. Mais, percorrendo as peças procedimentais, designadamente o art 7º do Programa de Procedimento, onde consta o enunciado dos documentos que constituem a proposta, deles não faz parte o comprovativo do registo junto do I……, no sistema on line S…, dos dispositivos médicos de diagnóstico in vitro comercializados no âmbito da atividade de distribuição por grosso da contrainteressada. Assim se percebendo a interpretação dos demandados, sobre o disposto no art. 12º do DL nº 189/2000, de 12.8, e na Circular informativa nº 069/CD do I……, no sentido de que o registo dos DIV comercializados no mercado nacional pelos seus distribuidores só terá de ocorrer quando se for proceder à aquisição e utilização efetiva do reagente e não antes. Em suma, a contrainteressada concorreu individualmente ao concurso e assume recorrer à subcontratação para adquirir um dos reagentes, integrado na posição 61 do lote 1, e fornece-lo de seguida ao Centro Hospitalar. Pelo exposto improcede o vício de violação das regras de participação no concurso.” Inconformadas com o assim decidido no saneador-sentença, as recorrentes reclamaram para a conferência do TAF de Sintra, defendendo por um lado, que a proposta apresentada pela contrainteressada A…… e por esta assumida no âmbito do Concurso corresponde a uma proposta parcial, expressamente não admitida nos termos do n.º 2 do artigo 9º do Programa de Concurso e por outro, que pretendendo a contrainteressada A…… apresentar-se a Concurso associada a outra entidade que assegurasse o fornecimento de um ou mais reagentes exigidos pelo Caderno de Encargos, então teria necessariamente que se apresentar a Concurso sob a modalidade de agrupamento de empresas, nos termos exigidos pelo n.º 6 do artigo 5° e artigo 8 do Programa de Concurso, o que não foi o caso, e que assim, por esse motivo, a proposta da A…… não incluiu o fornecimento de todos os reagentes previstos no Caderno de Encargos para o Lote 1 correspondendo assim a uma proposta parcial que, nos termos do disposto no artigo no n.º 2 do artigo 9º do Programa de Concurso não era admissível, o Júri deveria ter determinado a exclusão desta proposta por violação expressa das invocadas normas do Programa do Concurso. O que renovam no presente recurso. Diga-se que sem necessidade de esforço argumentativo acrescido que o decidido pelo tribunal a quo não merece censura, tendo procedido a correta interpretação e aplicação das normas e princípios que ali se invocaram. O que deve ser mantido, já que ademais, e bem vistas as coisas, as recorrentes não assacam qualquer concreto erro de julgamento à decisão recorrida, nem invocam erro de interpretação dos normativos aplicados pelo tribunal a quo, antes reiteram o entendimento, que haviam defendido, no sentido da ilegalidade do ato de adjudicação. Prevê com efeito o artigo 9 nº 2 do Programa do Procedimento que “em cada lote não são admissíveis propostas parciais”. Porém, e como bem foi entendido pelo tribunal a quo na decisão recorrida, tendo subjacente a factualidade que foi apurada nos autos, a proposta da contrainteressada A…… porque integra os diversos preços para os diversos reagentes, incluindo os produtos a que se refere a posição 61, para o lote 1 relativa a barbituratos soro (confronte-se as alíneas G), H) e P) da factualidade apurada), que é o que releva para a integralidade (completude) da proposta, não é configurável como uma proposta meramente parcial, não querida pelo artigo 9º nº 2 do Programa do Procedimento. Não incorreu, pois, em erro de julgamento, a decisão recorrida ao considerar como não violado o artigo 9º nº 2 do Programa do Procedimento, pelo que não deveria, com tal fundamento, ter sido excluída a proposta da contrainteressada. Como também não incorre em erro de julgamento a decisão recorrida ao considerar que através da declaração emitida pela M……, que a contrainteressada A…… fez acompanhar com a sua proposta – declaração em que, conforme decorre da alínea P) da factualidade apurada, aquela sociedade M……, Lda, declara que caso seja adjudicada a proposta apresentada pela A……, Lda., se compromete incondicionalmente a fornecer os reagentes e calibradores necessários à execução dos testes constantes da posição 61 (código 122040097 – baibituratos soro) pertencente ao lote 1 do presente Concurso, nas quantidades e nos exatos termos previstos nesse Caderno de Encargos) – esta não se apresentou (ilegalmente) ao concurso sob a modalidade de agrupamento de empresas a que alude o artigo 8º do Programa de Procedimento e o artigo 54º do CCP, tendo ao invés, através da junção daquela declaração, assumido que iria recorrer na execução do contrato à subcontratação, o que é admitido na Cláusula 24ª do Caderno de Encargos e nos artigos 316º ss. do CCP, ainda que dependendo da autorização da entidade adjudicante. Foi assim corretamente decidido não ocorrer a violação dos invocados artigos 5º nº 6 do Programa do Concurso, não sendo de concluir, como se decidiu, que a proposta da contrainteressada devesse ter sido excluída nos termos do nº 6 do artigo 5º do Programa do Procedimento, já que não se pode ter por considerado que a contrainteressada se apresentou ao concurso em agrupamento com a identificada M……. Sendo certo, ademais, que é distinta da situação dos autos daquela que foi decidida no Acórdão do TCA Sul de 13/10/2011, Proc. 7915/11, a que as recorrentes fazem referência em abono da sua tese, já que ali estavam em causa exigências atinentes à habilitação legal/profissional do concorrente constantes das peças do procedimento. Como não incorre também a decisão recorrida em erro de julgamento, ao considerar, como fez, em face das peças do procedimento, mormente do previsto no artigo 7º do Programa do Procedimento, que se impunha à contrainteressada que com a sua proposta juntasse documento comprovativo do registo junto do I……, no sistema on line S…, dos dispositivos médicos de diagnóstico in vitro comercializados no âmbito da atividade da contrainteressada, a que alude o artigo 12º do DL nº 189/2000, de 12.8, e a Circular informativa nº 069/CD do I……. Com efeito tal exigência não é feita naquele normativo, pelo que a falta da junção de tal documento não constituía motivo para exclusão da proposta. Tem, pois, que concluir-se que quanto a este naipe de fundamentos, e nos termos em que os mesmos foram evocados na petição inicial, corretamente decidiu o tribunal a quo ao julgar não verificadas tais alegadas causas de invalidade, não tendo incorrido em erro de julgamento ao assim decidir. Pelo que não colhem as pretensões ínsitas nos pontos i) e ii) da alínea c) das alegações de recurso, improcedendo neste aspeto, o presente recurso. * 3.2 Quanto às invocadas violação do Caderno de Encargos, do princípio da igualdade, da concorrência, propugnando–se que nos termos previstos nos artigos 70º nº 2 alínea b) e 146º nº 2 alínea o) do CCP a proposta da contrainteressada A…… deveria ter sido excluída, e que assim o ato impugnado padece do vício de violação de lei decorrente da ofensa direta aos princípios da concorrência, da legalidade e da igualdade consagrados no nº 4 do artigo 1º do CCP e nos artigos 3º e 5º do CPA – correspondentes ao segundo grupo de ilegalidades da adjudicação (tal como enunciadas e expostas nos artigos 47º a 82º da petição inicial), a que as recorrentes aludem no ponto iii) da alínea c) das suas alegações de recurso. A tal respeito a recorrida decisão do tribunal a quo, tendo por base a matéria de facto que deu como provada, que não vem aqui posta em causa pelas recorrentes, julgou não verificado tais fundamentos, nos seguintes termos, que se passam a transcrever: “A Autora alega ainda que a proposta da contrainteressada para o lote 1 é condicionada, variante ou não incorpora a totalidade dos respetivos custos, uma vez que afirma que a contrainteressada apresenta apenas um equipamento para os dois lotes, 1 e 11 do Concurso – uma cadeia FlexLab 3.6 – quando resultava do Anexo II ao Caderno de Encargos que para o lote 1 devia ser proposta a colocação de um equipamento no CHLC (a cadeia pré-analítica) e que para o lote 11 deveria ser proposta a colocação e montagem de um sistema robotizado para tubos EDTA. Quanto à alegada ilegalidade da adjudicação por violação do Caderno de Encargos e dos princípios da igualdade e da concorrência, os demandados contra- alegam que a contrainteressada apresentou o mesmo modelo de equipamento para os lotes 1 e 11 – o FlexiLab 3.6 – mas com composição distinta em ambos os lotes, do que resulta que em cada um dos lotes tal equipamento é proposto em separado. E assim propôs em separado, em cada uma das propostas financeiras apresentadas para o lote 1 e para o lote 11, o preço necessário à disponibilização de todos os equipamentos previstos para cada um dos lotes referidos. A propósito deste vício (o único aventado pela ora Autora em sede de audiência prévia), o júri deliberou nos termos que seguem: «O júri não concorda com os argumentos apresentados pelo concorrente relativos à proposta da concorrente A…… (tanto quanto ao lote 1, como quanto ao lote 11). Com efeito, toda a argumentação da concorrente parte de um pressuposto errado que inquina as suas conclusões: o de que as propostas da concorrente A…… quanto ao lote 1 e quanto ao lote 11 não são plenamente autónomas e que dependem uma da outra. A proposta da concorrente A…… apresenta um sistema para cada lote (ainda que com a mesma referência), ou seja, em caso de adjudicação dos dois lotes, tem que fornecer os dois sistemas, e afirma que, caso os dois lotes lhe sejam adjudicados, os sistemas são interligáveis – o facto de terem a mesma referência será certamente uma razão para que tal interligação seja possível (não constituindo isso qualquer dependência um do outro, mas apenas uma informação útil para efeitos do disposto no nº 2 da cláusula 11ª do Caderno de Encargos, de acordo com a qual «caso se verifique tecnicamente possível, os fornecedores dos lotes 1 (…), 11, (…) devem assegurar a plena interligação dos respetivos equipamentos, sem custos acrescidos para o CHLC, nos prazos previstos nas als g) e h) da cláusula 5ª, a contar da notificação pelo CHLC para tanto»). A correção deste pressuposto errado de que parte a concorrente B…… Portugal inviabiliza toda a argumentação que apresenta na sua pronúncia. Por outro lado, não obstante terem a mesma referência, os equipamentos propostos pela concorrente A…… para os lotes 1 e 11, individualmente, cumprem os requisitos técnicos exigidos para cada um desses lotes. Por outro lado, caso apenas seja adjudicado um desses lotes à concorrente A……, esta apresentará o equipamento que propôs só para esse lote, de modo totalmente independente da adjudicação ou não da sua proposta ao outro lote. Por outro lado ainda, se os dois lotes forem adjudicados às propostas apresentadas pela concorrente A…… aos mesmos, este terá que assegurar o fornecimento dos dois sistemas propostos e adjudicados (não procedendo a argumentação da concorrente B…… Portugal de que só estaria a apresentar um equipamento e que, com isso, conseguia de alguma forma uma qualquer «ilegitimidade poupança de custos» ou algum desvirtuamento da concorrência, ou que tal implicaria que a concorrente A…… tivesse apresentado os seus atributos de forma que não permitissem a sua avaliação – nem se concebe que assim pudesse ser, quando esta apresentou um preço por lote, facilmente avaliável no contexto do respetivo lote) e, porque demonstra na sua proposta que é possível fazer a interligação entre os dois sistemas, terá que os interligar (nos termos do disposto no nº 2 da cláusula 11ª do Caderno de Encargos). Finalmente, e face ao exposto, não existe a suposta alternatividade de propostas (os «dois cenários possíveis») que a concorrente B…… Portugal alega existir nas propostas da concorrente A……, porquanto esta apenas fez o que lhe era exigido pelo Programa de Procedimento – apresentou uma proposta autónoma para cada um desses dois lotes, e demonstrou que, caso lhe fossem adjudicadas as duas propostas aos dois lotes, seria tecnicamente possível – já em execução dos contratos – interligar os dois sistemas adjudicados – relevante para efeitos do previsto no nº 2 da cláusula 11ª do Caderno de Encargos. Tal não representa a apresentação de qualquer proposta variante, nos termos definidos no nº 1 do art 59º do Código dos Contratos Públicos («são variantes as propostas que, relativamente a um ou mais aspetos da execução do contrato a celebrar, contenham atributos que digam respeito a condições contratuais alternativas nos termos expressamente admitidos pelo Caderno de Encargos»), nem de uma qualquer proposta condicionada (nenhuma das propostas que apresenta depende de qualquer condição, designadamente da adjudicação de outra ou de qualquer outro facto»). Nestes termos, o júri … propôs a manutenção da classificação final das propostas constantes do relatório preliminar, quanto ao lote 1. A análise que vimos de transcrever insere-se no âmbito da discricionariedade. A discricionariedade, no entanto, não é um poder absoluto ou arbitrário, devendo ser entendida como uma reserva de prudência concedida pela lei à Administração, para valorar as situações concretas. A decisão administrativa tem de ser racional, porque não pode ser fruto de emoção ou capricho, mas, mais que isso, tem de corresponder à solução que melhor sirva o interesse público que a lei determinou. No caso, o júri ouviu os concorrentes sobre o relatório preliminar. Depois, em sede de relatório final, o júri analisou, ponderou e ajuizou sobre os argumentos da Autora, explicando porque entendia que não justificavam a alteração do projeto da decisão e inclusivamente do seu sentido e fundamentação. O Tribunal não poderá substituir-se ao júri do procedimento no desenvolvimento do raciocínio causal-teorético em questão, apenas lhe cabendo um controlo pela negativa (designadamente de inadequação do critério da avaliação, ou seja, erro grosseiro ou manifesto de apreciação, que constitui a violação da primeira das três vertentes do princípio da proporcionalidade). E, no caso, atenta a fundamentação exaustiva do relatório final, os factos provados (maxime, nas als. R), S) e T)), a proposta da contrainteressada não é uma proposta condicionada nem variante por apresentar o mesmo modelo de equipamento para os dois lotes 1 e 11 do Concurso – uma cadeia Flexlab 3.6.. As propostas da contrainteressada para o lote 1 e para o lote 11 são autónomas e não dependem uma da outra. A proposta apresenta um sistema para cada um dos dois lotes, com a mesma referência/ modelo (Flexlab 3.6), mas com composição distinta (cfr als S) e T) dos factos provados) e com um preço para cada lote. Aliás, a mesma referência dos equipamentos propostos pela contrainteressada para os lotes 1 e 11, individualmente, disse o júri, cumprem os requisitos técnicos exigidos para cada um desses lotes. O que não foi posto em causa pela Autora, com a alegação de factos onde pudessem sustentar qualquer erro, sequer, grosseiro, violação do princípio da igualdade e da concorrência. E, no caso, como apenas o lote 1 foi adjudicado à contrainteressada, dúvidas não restam de que a contrainteressada ficou vinculada a apresentar o equipamento que propôs só para o lote 1, totalmente independente da proposta para o lote 11. Termos em que também este vício improcede.” Inconformadas com o assim decidido no saneador-sentença, as recorrentes reclamaram para a conferência do TAF de Sintra, mas a tal respeito o que sustentam é que apresentação de duas propostas nas quais o concorrente apenas se proponha colocar e montar um único equipamento para os dois lotes confere-lhe uma ilegítima vantagem comercial, em comparação com a circunstância de os demais concorrentes terem apresentados equipamentos distintos para o Lote 1 e para o Lote 11 tendo apresentado preços considerando tal realidade (vide designadamente artigos 101º a 106 da reclamação para a Conferência), e que assim a proposta da contrainteressada devia ter sido excluída nos termos do artigo 70º e 146º nº 2 alínea o) do CCP. O que reiteram em sede do presente recurso. O que significa que, em rigor, não se insurgem quanto ao entendimento feito na decisão recorrida de que a proposta da contrainteressada para o lote 1 não é condicionada, nem variante ou que deixa de incorporar a totalidade dos respetivos custos. Juízo que assentou, ademais, na fundamentação exaustiva do relatório final, nos factos provados, maxime, nas alíneas R), S) e T), reproduzidas supra. Nem contra a o juízo feito na decisão recorrida de que não tendo sido posto em causa pelas autoras, o entendimento do júri de que a mesma referência dos equipamentos propostos pela contrainteressada para os lotes 1 e 11, individualmente, cumpria os requisitos técnicos exigidos para cada um desses lotes, através da alegação de factos onde pudessem sustentar qualquer erro, sequer, grosseiro, violação do princípio da igualdade e da concorrência improcedia tal alegação, por o Tribunal não poder substituir-se ao júri do procedimento no desenvolvimento do raciocínio causal-teorético em questão, apenas lhe cabendo um controlo pela negativa (designadamente de inadequação do critério da avaliação, ou seja, erro grosseiro ou manifesto de apreciação, que constitui a violação da primeira das três vertentes do princípio da proporcionalidade). Neste particular as recorrentes assaquem qualquer concreto erro de julgamento à decisão recorrida, nem invoca erro de interpretação dos normativos e princípios aplicados pelo tribunal a quo. O que inevitavelmente conduz à improcedência do recurso, neste aspeto. Com efeito, o objeto do recurso jurisdicional é constituído pelas ilegalidades, erros de julgamento, imputados à decisão judicial recorrida, que ao recorrente cabe demonstrar (cfr. artigos 639º e 640º do CPC novo, correspondente aos anteriores artigos 685º-A e 685º-B) sob pena de não demonstrando o desacerto do decidido, ver preterida a sua pretensão. Constituindo entendimento uniforme o de que versando o recurso jurisdicional sobre a concreta decisão judicial impugnada, se as alegações não afrontarem válida e eficazmente aquela decisão terá o recurso que improceder (vide neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA de 23/02/2000, Proc. 023819; de 01/03/2011, Proc. 0368/10; de 17/04/2013, Proc. 01160/12 e de 15/05/2013, Proc. 0508/13, in, www.dgsi.pt/jsta). E é manifestamente o que sucede quanto a este particular aspeto já que mesmo percorrendo o corpo das alegações de recurso no que a este naipe de fundamentos respeita o que se constata é que ali foram simplesmente reiterados os argumentos que haviam sido aduzidos como justificadores da pugnada exclusão da proposta da contrainteressada, com a consequente ilegalidade do ato de adjudicação (vide conclusões U) e V) das alegações de recurso). Pelo que não colhem as pretensões ínsitas no ponto iii) da alínea c) das alegações de recurso, improcedendo também neste aspeto, o presente recurso. ~ Assim, não ocorrendo qualquer dos apontados erros de julgamento assacados à decisão recorrida, em qualquer dos seus aspetos, não merece provimento o presente recurso, confirmando-se o saneador-sentença de 03/06/2014 do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, mantido pelo Acórdão de 07/07/2014 do mesmo tribunal em sede de reclamação para a conferência. * III. DECISÃONestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em negar total provimento ao recurso jurisdicional, confirmando-se a decisão recorrida, de improcedência da ação. ~ Custas pelos recorrentes - artigo 527º nºs 1 e 2 do CPC novo (aprovado pela Lei nº 41/2013) e artigo 7º e 12º nº 2 do RCP e 189º nº 2 do CPTA.* Notifique. D.N. * Lisboa, 20 de Novembro de 2014 _____________________________________________________ Maria Helena Barbosa Ferreira Canelas (relatora) _____________________________________________________ António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos _____________________________________________________ Esperança da Conceição Pereira Mealha |