Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 05125/11 |
![]() | ![]() |
Secção: | CT - 2.º JUÍZO |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Data do Acordão: | 03/13/2012 |
![]() | ![]() |
Relator: | JOAQUIM CONDESSO |
![]() | ![]() |
Descritores: | EMBARGOS DE TERCEIRO. PRAZO DE DEDUÇÃO TEM NATUREZA JUDICIAL. DILAÇÃO. NOÇÃO. CONTRATO DE LOCAÇÃO FINANCEIRA MOBILIÁRIA. EMBARGOS DE TERCEIRO DO LOCADOR. DÉFICE INSTRUTÓRIO. |
![]() | ![]() |
Sumário: | 1. Nos termos do artº.237, nº.3, do C. P. P. Tributário (regime aplicável aos presentes embargos - cfr.artº.12, do C.Civil), os embargos de terceiro devem ser deduzidos no prazo de trinta dias, contados do dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa, embora nunca depois dos respectivos bens terem sido vendidos. No entanto, não é ao embargante que cabe a prova da tempestividade dos embargos, mas antes ao embargado a alegação e prova da sua intempestividade, dado que o decurso de tal prazo configura uma causa extintiva do direito potestativo de acção, sendo esta excepção de caducidade de conhecimento oficioso pelo Tribunal, desde que o processo contenha elementos de facto que a tal permitam (cfr.artºs.333, nº.1, e 343, nº.2, do C.Civil). 2. Tanto à face do anterior C.P.Tributário, como do actual C.P.P.Tributário, os embargos de terceiro são configurados como incidente da execução fiscal ao qual se aplicam subsidiariamente as regras da oposição à execução (cfr.artº.319, nº.1, do C.P.Tributário; artº.167, do C.P.P. Tributário). 3. O prazo para deduzir embargos de terceiro é um prazo judicial, atento o disposto no artº.20, nº.3, do C.P.P.Tributário. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da Administração Tributária (artº.103, nº.1, da L.G.T.). Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do C.P.Civil (cfr.art.20, nº.2, do C.P.P. Tributário), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, transferindo-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.artº.144, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.). Igualmente por ter essa natureza de prazo judicial, é-lhe aplicável o disposto no artº.145, do C.P.C., relativamente à prática do acto fora do prazo. Por último, o referido prazo de 30 dias é acrescido da dilação que for aplicável, prevista no artº.252-A, do C.P.C. A partir da data da citação conta-se o prazo da dilação e, finda esta, começa a correr o prazo para a prática dos actos (cfr.artº.250, nº.2, do C.P.C.). Mais se dirá que a dilação é de cinco dias, além do mais, quando a citação tenha tido lugar fora da área da comarca em que se situa o serviço da administração tributária onde corre o processo (cfr.artº.252-A, nº.1, al.b), do C.P.C.). 4. A dilação (prazo dilatório é o que difere para certo momento a possibilidade de realização dum acto) visa garantir a possibilidade de defesa efectiva e plena em tempo útil, nos casos em que a distância geográfica entre o Tribunal da acção e o local da citação, ou modalidade desta, tornam (ou podem tornar) insuficiente o prazo peremptório que se inicia com a mesma citação. Por outras palavras, a dilação visa colocar em igualdade de circunstâncias o citado que reside na área do Tribunal e o que vive fora dessa área, tendo por fim garantir ao citado a integridade do dito prazo peremptório. 5. O contrato de locação financeira encontra-se actualmente regulado pelo dec.lei 149/95, de 24/6 (cfr.anteriormente o dec.lei 171/79, de 6/6), diploma que sofreu alterações posteriores, podendo definir-se como o contrato pelo qual uma das partes se obriga, contra retribuição, a conceder à outra o gozo temporário de uma coisa, adquirida ou construída por indicação desta e que a mesma pode comprar, total ou parcialmente, num prazo convencionado, mediante o pagamento de um preço determinado nos termos do próprio contrato. A locação financeira pode considerar-se um contrato nominado misto, dado conter elementos da compra e venda e da locação. 6. De acordo com a noção expendida pode concluir-se que no âmbito da locação financeira mobiliária o locador detém a posse em nome próprio do bem móvel objecto do contrato, o qual é possuído em nome alheio pelo locatário. Assim sendo, devem considerar-se procedentes os embargos de terceiro deduzidos pelo locador contra a penhora de bens móveis objecto de contrato de locação financeira, efectuada em momento posterior à celebração deste e no âmbito de execução fiscal movida contra o locatário. 7. No processo civil português prevê-se um sistema de cassação quanto à reapreciação da matéria de facto, quando o Tribunal “ad quem” anula, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na 1ª. Instância por reputar deficiente, obscuro ou contraditório o julgamento sobre pontos determinados da matéria de facto ou, ainda, quando considere indispensável a ampliação desta (cfr.artº.712, nº.4, do C.P.Civil). É que a competência conferida ao Tribunal de 2ª. Instância para reapreciar o julgamento da matéria de facto e alterar, em via de substituição, o julgado em 1ª. Instância, apenas é possível se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa. 8. Não podendo este Tribunal conhecer com base no mencionado sistema de substituição, verifica-se uma situação de défice instrutório, devendo antes ordenar-se a baixa dos autos ao abrigo do artº.712, nº.4, do C. P. Civil, com vista a que seja completada a instrução do processo pelo Tribunal de 1ª. Instância. O relator Joaquim Condesso |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
![]() | ![]() |
Aditamento: | ![]() |
1 | ![]() |
Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO “A..., S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmo. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.71 a 74 do presente processo, através da qual julgou improcedentes, devido a intempestividade da p.i., os embargos de terceiro deduzidos pela recorrente opondo-se a penhora de móveis levada a efeito no âmbito da execução fiscal nº.1333-2005/101831.0 e aps., a qual corre seus termos no Serviço de Finanças de Batalha.X RELATÓRIO X X O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.80 a 88 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:1-O Banco ora recorrente deduziu incidente de embargos de terceiro, nos termos do disposto no artº.353, do Código de Processo Civil, junto do Serviço de Finanças da Batalha, no âmbito do processo que corre termos com o nº.1333-2005/101831.0 e aps., em razão da citação de credores a fim de exercer o direito de reclamar os seus créditos pelo produto da venda dos bens constantes no contrato de locação financeira nº. 200300793; 2-O Banco ora recorrente não é credor com garantia real sobre os bens objecto do contrato de locação financeira referido, mas sim pleno proprietário daqueles; 3-O “A..., S.A.”, foi citado para reclamar crédito no âmbito do processo nº.1333-2005/101831.0 e aps., por via postal, conforme se conclui do aviso de recepção assinado em 19/2/2009; 4-O processo com o nº.1333-2005/101831.0 e aps. corre termos junto do Serviço de Finanças da Batalha; 5-O embargante, ora Banco recorrente, foi citado na morada da sua sede, cito na Av. ..., Lote 1682, 1099-072, Lisboa; 6-Dispõe o artº.252-A, nºs.1 e 2, al.b), do Código de Processo Civil, que acresce ao prazo de defesa do citando uma dilação de cinco dias quando haja sido citado fora da área da comarca onde pende a acção; 7-O prazo para deduzir o incidente de embargos de terceiro apenas terminava no dia 26 de Março de 2009, sem prejuízo do disposto no artº.145, nº.5, do Código de Processo Civil; 8-Os embargos de terceiro foram deduzidos no dia 24/3/2009, porquanto a data que impera tem por referência o dia em que deu entrada nos correios (cfr.talão de aceitação de correio registado, que ora se junta sob doc. nº.1); 9-O artº.145, nº.5, do Código de Processo Civil, estatui que o acto pode ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do 1º. dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a um quarto da taxa de justiça inicial por cada dia de atraso; 10-O artº.145, nº.6, do Código de Processo Civil, prevê que decorrido o prazo referido no nº.5, daquele artigo, sem ter sido paga a multa devida, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar multa de montante igual ao dobro da taxa de justiça inicial; 11-A notificação em causa nunca foi efectuada ao Banco ora recorrente; 12-É indubitável que o Banco ora recorrente poderia deduzir o incidente de embargos de terceiro, levando em conta o referido artº.145, nº.5, do C.P.C., até ao terceiro dia útil posterior ao termo do prazo, ou seja, até ao dia 26 de Março de 2009; 13-Foi proferida declaração de insolvência em 27/3/2009, no 1º. Juízo do Tribunal Judicial de Porto de Mós, tendo sido declarada insolvente a sociedade “B...- Iluminação, Lda.”, locatária do contrato de locação financeira nº.200300793; 14-De acordo com o previsto no artº.88, nº.1, do C.I.R.E., “a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva intentada pelos credores da insolvência; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.”; 15-O regime instituído pelo artº.88, do C.I.R.E., é um efeito automático da declaração de insolvência, não dependendo, sequer, de requerimento por parte de qualquer interessado; 16-A consequência da não conformidade com o disposto no artº.88, do C.I.R.E., é a nulidade dos actos que tenham sido praticados após a decretação de insolvência, o que deve ser oficiosamente declarado logo que a situação seja conhecida; 17-Termos em que se requer a V. Exa. se digne revogar a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que determine a tempestividade da dedução dos embargos de terceiro, assim se fazendo a costumada justiça. X Não foram apresentadas contra-alegações.X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de se negar provimento ao recurso e confirmar-se a sentença recorrida na ordem jurídica (cfr.fls.154 e 155 dos autos).X Corridos os vistos legais (cfr.fls.157 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.X A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.71 a 73 dos autos):FUNDAMENTAÇÃO X DE FACTO X 1-A sociedade “B..., L.da.”, encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Batalha com o n.º1068/030624 (cfr.cópia de certidão junta a fls.12 a 15 do processo de execução apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido); 2-Foi instaurado processo de execução fiscal para cobrança da quantia de € 130.819,68 (cfr.documentos juntos a fls.16 a 19 do processo de execução apenso); 3-Em 13/2/2008 e 11/2/2009 foram penhorados vários bens móveis nos termos que constam dos autos de fls.74 a 76 e 99 a 103 do processo de execução apenso cujo conteúdo se dá por reproduzido; 4-O “A...Leasing” foi citado para reclamar os seus créditos em 19/2/2009 (cfr. documentos juntos a fls.34 e 35 dos presentes autos); a) No ofício mencionava-se que os créditos a reclamar eram pelo produto da venda dos bens constantes do Vº contrato de locação financeira nº.200300793 (cfr.documento de fls. 34 cujo conteúdo se dá por reproduzido); b) O ofício foi expedido e registado em 18/2/2009 (cfr.documento de fls.35 cujo conteúdo se dá por reproduzido); 5-A petição inicial foi apresentada em 25/3/2009 (cfr.data de entrada aposta a fls.4 dos presentes autos); 6-Entre o “A...” e a “B...” foi celebrado, em 6/2/2003, contrato de locação financeira com o nº.200300793, nos termos que constam dos documentos de fls.17 a 24 dos presentes cujo conteúdo se dá por reproduzido; 7-Nos termos desse contrato, o embargante locou ao embargado os bens constantes da factura nº.A00015 de 5/12/2002 (cfr.documento junto a fls.17 a 24 dos presentes autos cujo conteúdo se dá por reproduzido); 8-Esses bens são os que constam da factura junta a fls.11, 12, 13, 14 e 15 dos presentes autos cujo conteúdo se dá por reproduzido; 9-O equipamento foi recebido pelo embargado em 5/12/2002 (cfr.documento junto a fls.16 dos presentes autos cujo conteúdo se dá por reproduzido); 10-Os bens ainda não foram vendidos. X A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou…”.X Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos juntos aos autos, referidos nos “factos provados” com remissão para as folhas do processo onde se encontram…”.X Levando em consideração que o recorrente põe em causa, parcialmente, a matéria de facto que fundamentou a sentença objecto do presente recurso, e dado que a factualidade em análise se baseia em prova documental, este Tribunal julga provados mais os seguintes factos que se reputam relevantes para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nº.1, al.a), e 2, do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):11-O processo de execução fiscal a que alude o nº.2 supra do probatório foi autuado em 13/12/2005, no Serviço de Finanças de Batalha, sob o nº.1333-2005/101831.0 e aps., no mesmo surgindo como executada originária a sociedade “B...- Iluminação, L.da.” e tendo por objecto a cobrança coerciva de dívidas no montante de € 120.157,71 e acrescidos (cfr.capa e documentos juntos a fls.8 e 16 a 19 do processo de execução apenso); 12-A citação a que se refere o nº.4 da matéria de facto exarada acima foi efectuada através de carta registada com a.r. remetida para a Av. ..., Lote 1682, 1099-072, Lisboa (cfr.documentos juntos a fls.34 e 35 dos presentes autos); 13-A petição inicial mencionada no nº.5 supra da matéria de facto, foi enviada para o Serviço de Finanças de Batalha através de correio registado em 24/3/2009 (cfr.documento junto a fls.94 dos presentes autos). X Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente improcedentes os embargos objecto dos presentes autos, em virtude da intempestividade dos mesmos, excepção alegada pela Fazenda Pública na contestação. ENQUADRAMENTO JURÍDICO X X Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil; artº.282, do C.P.P.Tributário).O recorrente discorda do julgado alegando em primeiro lugar, como supra se alude, que os embargos de terceiro foram deduzidos no dia 24/3/2009, porquanto a data que impera tem por referência o dia em que deu entrada nos correios. Dispõe o artº.252-A, nºs.1 e 2, al.b), do Código de Processo Civil, que acresce ao prazo de defesa do citando uma dilação de cinco dias quando haja sido citado fora da área da comarca onde pende a acção. É indubitável que o Banco ora recorrente poderia deduzir o incidente de embargos de terceiro, levando em conta o referido artº.145, nº.5, do C.P.C., até ao terceiro dia útil posterior ao termo do prazo, ou seja, até ao dia 26 de Março de 2009 (cfr.conclusões 5 a 12 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da sentença recorrida. Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício. Nos termos do artº.237, nº.3, do C. P. P. Tributário (regime aplicável aos presentes embargos - cfr.artº.12, do C.Civil), os embargos de terceiro devem ser deduzidos no prazo de trinta dias (cfr.artº.6, nº.1, al.e), do dec.lei 329-A/95, de 12/12), contados do dia em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou daquele em que o embargante teve conhecimento da ofensa, embora nunca depois dos respectivos bens terem sido vendidos. No entanto, não é ao embargante que cabe a prova da tempestividade dos embargos, mas antes ao embargado a alegação e prova da sua intempestividade, dado que o decurso de tal prazo configura uma causa extintiva do direito potestativo de acção, sendo esta excepção de caducidade de conhecimento oficioso pelo Tribunal, desde que o processo contenha elementos de facto que a tal permitam (cfr.artºs.333, nº.1, e 343, nº.2, do C.Civil; ac.S.T.J., 13/7/88, B.M.J.379, pág.561; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/5/95, rec. 18207, ap.D.R., 14/8/97, pág.1221 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 12/5/2010, proc.3938/10; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.683; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.126; Carlos Paiva, O Processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.124 e 125). Tanto à face do anterior C.P.Tributário, como do actual C.P.P.Tributário, os embargos de terceiro são configurados como incidente da execução fiscal ao qual se aplicam subsidiariamente as regras da oposição à execução (cfr.artº.319, nº.1, do C.P.Tributário; artº.167, do C.P.P.Tributário). O prazo para deduzir embargos de terceiro é um prazo judicial, atento o disposto no artº.20, nº.3, do C.P.P.Tributário. Com efeito, o processo de execução fiscal tem natureza judicial, na sua globalidade, apesar de haver uma parte do mesmo que é processada perante órgãos da Administração Tributária (artº.103, nº.1, da L.G.T.). Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do C.P.Civil (cfr.art.20, nº.2, do C.P.P. Tributário), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, transferindo-se o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto (cfr.artº.144, nºs.1, 2 e 3, do C.P.C.). Igualmente por ter essa natureza de prazo judicial, é-lhe aplicável o disposto no artº.145, do C.P.C., relativamente à prática do acto fora do prazo. Por último, o referido prazo de 30 dias é acrescido da dilação que for aplicável, prevista no artº.252-A, do C.P.C. A partir da data da citação conta-se o prazo da dilação e, finda esta, começa a correr o prazo para a prática dos actos (cfr.artº.250, nº.2, do C.P.C.). Mais se dirá que a dilação é de cinco dias, além do mais, quando a citação tenha tido lugar fora da área da comarca em que se situa o serviço da administração tributária onde corre o processo (cfr.artº.252-A, nº.1, al.b), do C.P.C.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.314; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/2/2012, rec.1016/11). A dilação (prazo dilatório é o que difere para certo momento a possibilidade de realização dum acto) visa garantir a possibilidade de defesa efectiva e plena em tempo útil, nos casos em que a distância geográfica entre o Tribunal da acção e o local da citação, ou modalidade desta, tornam (ou podem tornar) insuficiente o prazo peremptório que se inicia com a mesma citação. Por outras palavras, a dilação visa colocar em igualdade de circunstâncias o citado que reside na área do Tribunal e o que vive fora dessa área, tendo por fim garantir ao citado a integridade do dito prazo peremptório (cfr.Prof.José Alberto dos Reis, Comentário ao C.P.Civil, II, 1945, Coimbra Editora, pág.265 e 266; José Lebre de Freitas e Outros, C.P.Civil Anotado, I, 1999, Coimbra Editora, pág.439). No caso “sub judice”, o cômputo do prazo para deduzir embargos de terceiro por parte da ora recorrente teve o seu termo inicial em 20/2/2009 (presumindo-se que a embargante teve conhecimento da penhora levada a efeito dos bens objecto do contrato de locação financeira na data de citação), atenta a data de citação da embargante no âmbito do processo de execução, a qual ocorreu em 19/2/2009 (cfr.nº.4 da matéria de facto provada), mais levando em consideração a regra de contagem de prazos prevista no artº.279, al.b), do C.Civil. Passemos ao termo final de tal prazo. Tendo a embargante/recorrente sido citada em Lisboa, localidade situada fora da área da comarca em que se situa o serviço da administração tributária onde corre o processo (Batalha/T.A.F. de Leiria), haverá que acrescentar ao prazo de dedução de embargos a dilação de cinco dias, ponderado o disposto no artº.252-A, nº.1, al.b), do C.P.Civil. Fazendo o cômputo do prazo de dilação de cinco dias, seguido do período de dedução de embargos de trinta dias, conclui-se que o termo final deste ocorreu no pretérito dia 26/3/2009, uma quinta-feira. Como a p.i. de embargos de terceiro foi remetida pelo correio registado em 24/3/2009, deve considerar-se tempestiva (cfr.nº.13 da matéria de facto provada). Terminando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se procedente este fundamento do recurso e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida a qual padece do vício de erro de julgamento de direito derivado do errado cômputo do prazo de dedução de embargos de terceiro, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão. X Haverá, agora, que saber se, de acordo com o artº.715, do C. P. Civil, se pode aplicar no processo vertente a regra da substituição do Tribunal “ad quem” ao Tribunal recorrido, nos termos da qual os poderes de cognição deste Tribunal Central Administrativo Sul incluem todas as questões que ao Tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução que deu ao litígio, tudo ao abrigo do princípio da economia processual, o qual, no caso concreto, se sobrepõe à eventual preocupação de supressão de um grau de jurisdição.Pensamos que não, desde logo porque a factualidade provada não é suficiente para se poder decidir o mérito dos presentes embargos, no que respeita à alegada ofensa da propriedade dos móveis de que a embargante/recorrente se diz titular, em virtude da diligência de penhora levada a efeito no âmbito da execução fiscal nº.1333-2005/101831.0 e aps. Assim é, porquanto, dos autos não se pode concluir pela coincidência, ou não, entre os móveis que foram objecto do contrato de locação financeira com o nº.200300793 (cfr.nºs.6 a 8 da matéria de facto provada) e os móveis penhorados no âmbito do citado processo de execução fiscal (cfr.nº.3 da matéria de facto provada). E somente sendo efectuada prova sobre tal factualidade, estará o Tribunal em condições de decidir em consciência os presentes embargos. Recorde-se que a locação financeira se encontra regulada, fundamentalmente, pelo dec.lei 149/95, de 24/6 (cfr.anteriormente o dec.lei 171/79, de 6/6), diploma que sofreu alterações posteriores, podendo definir-se como o contrato pelo qual uma das partes se obriga, contra retribuição, a conceder à outra o gozo temporário de uma coisa, adquirida ou construída por indicação desta e que a mesma pode comprar, total ou parcialmente, num prazo convencionado, mediante o pagamento de um preço determinado nos termos do próprio contrato. A locação financeira pode considerar-se um contrato nominado misto, dado conter elementos da compra e venda e da locação (cfr.ac.R.Lisboa, 20/9/94, C.J., 1994, IV, pág.88 e seg.; ac.R.Lisboa 24/1/2012, proc.1741/10.0TBCLD-A.L1-1). De acordo com a noção expendida supra pode concluir-se que no âmbito da locação financeira mobiliária o locador detém a posse em nome próprio do bem móvel objecto do contrato, o qual é possuído em nome alheio pelo locatário. Assim sendo, devem considerar-se procedentes os embargos de terceiro deduzidos pelo locador contra a penhora de bens móveis objecto de contrato de locação financeira, efectuada em momento posterior à celebração deste e no âmbito de execução fiscal movida contra o locatário (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 8/11/95, rec.19714, C.T.F.381, pág.322 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 12/4/2000, rec.24848, Ac.Dout., nº.468, pág.1605 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/5/2000, rec.24847). Por outro lado, igualmente não foi efectuada prova no processo incidente sobre a factualidade alegada pela embargante/recorrente nas conclusões 13 a 15 do recurso, factualidade esta que pode ter influência sobre o processo de execução fiscal nº.1333-2005/101831.0 e aps. e, por consequência, sobre os presente embargos. Examinemos, agora, se este Tribunal, devido ao défice instrutório a que se acaba de aludir, deve fazer uso dos poderes de cassação constantes do artº.712, nº.4, do C. P. Civil, dado que do presente processo não constam todos os elementos probatórios que permitam a reapreciação da matéria de facto por parte do Tribunal “ad quem”. No processo civil português prevê-se um sistema de cassação quanto à reapreciação da matéria de facto, quando o Tribunal “ad quem” anula, mesmo oficiosamente, a decisão proferida na 1ª. Instância por reputar deficiente, obscuro ou contraditório o julgamento sobre pontos determinados da matéria de facto ou, ainda, quando considere indispensável a ampliação desta (cfr.artº.712, nº.4, do C.P.Civil). Recaindo embora sobre as partes o ónus da prova dos factos constitutivos, modificativos e/ou extintivos de direitos, a actividade instrutória pertinente para apurar a veracidade de tais factos compete também ao Tribunal, o qual, nos termos do disposto nos artºs.13, do C. P. P. Tributário, e 99 da L. G. Tributária, deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade, assim se afirmando, sem margem para dúvidas, o princípio do inquisitório pleno do Tribunal Tributário no domínio do processo tributário (cfr.Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág.512; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.163). Por último, dir-se-á que a situação “sub judice” se não enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no artº.712, nº.1, do C. P. Civil, norma aplicável ao processo tributário “ex vi” do artº.2, al.e), do C. P. P. Tributário, e que consagra os casos em que é possível a alteração da decisão de facto pelo Tribunal de 2ª. Instância. É que a competência conferida ao Tribunal de 2ª. Instância para reapreciar o julgamento da matéria de facto e alterar, em via de substituição, o julgado em 1ª. Instância, apenas é possível se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa. Pelo contrário, “in casu” e conforme mencionado acima, impõe-se a ampliação da matéria de facto que passa pela produção de prova sobre factos que não constam da base instrutória, a saber: 1-A alegada ofensa da propriedade dos móveis de que a embargante/recorrente se diz titular, em virtude da diligência de penhora levada a efeito no âmbito da execução fiscal nº.1333-2005/101831.0 e aps.; 2-Factualidade alegada pela embargante/recorrente nas conclusões 13 a 15 do recurso. Assim sendo, não podendo este Tribunal conhecer com base no apreciado sistema de substituição, verifica-se uma situação de défice instrutório, devendo antes ordenar-se a baixa dos autos ao abrigo do artº.712, nº.4, do C. P. Civil, com vista a que seja completada a instrução do processo pelo Tribunal de 1ª. Instância nos termos supra mencionados, aplicando depois o direito conforme, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão. X Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em, CONCEDENDO PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA E ORDENAR A BAIXA DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE 1ª. INSTÂNCIA, cumprindo-se em conformidade com as diligências de instrução que se reputem úteis e necessárias à ampliação da matéria de facto para os fins acima precisados, após o que se deverá proferir nova sentença que leve em consideração a factualidade entretanto apurada. DISPOSITIVO X X Sem custas.X Registe.Notifique. X Lisboa, 13 de Março de 2012 (Joaquim Condesso - Relator) (Lucas Martins - 1º. Adjunto) (Magda Geraldes - 2º. Adjunto) |