Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 01628/06 |
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Secção: | Contencioso Administrativo - 2º Juízo |
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Data do Acordão: | 11/06/2008 |
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Relator: | Cristina dos Santos |
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Descritores: | CRITÉRIO DE SUFICIÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONTROLO JURISDICIONAL DA ACTUAÇÃO ADMINISTRATIVA |
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Sumário: | 1. Fundamentar um acto consiste na indicação dos motivos, das razões de facto e, quando a lei o exija, de direito por que o mesmo se pratica, de modo a que o destinatário possa “deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira e não de outra” impondo-se, entre outros requisitos, os de indicação expressa, clara, suficiente e congruente, embora sucinta, dos fundamentos. 2. A suficiência da fundamentação há-de aferir-se pelo critério da compreensibilidade das razões da decisão segundo um destinatário normal ou razoável colocado na situação concreta. 3. O domínio da sindicabilidade jurisdicional do mérito administrativo concentra-se no conhecimento dos limites positivos de competência, de finalidade, de imparcialidade e de proporcionalidade, na medida em que só existem a discricionariedade e a margem de livre apreciação de conceitos jurídicos indeterminados que a lei específicamente conceder. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | O Presidente do Conselho Directivo do Instituto de Solidariedade e Segurança Social inconformado com o acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que anulou o despacho de 02.03.04 por si proferido com fundamento em vício de insuficiente fundamentação, dele vem recorrer concluindo como segue: 1. O acto de mudança de local de trabalho limitou-se a dar expressão à vontade e interesses da Administração, no âmbito de um poder discricionário que lhe é conferido pela própria lei, ou seja o de poder determinar a afectação dos funcionários de acordo com as necessidades e interesses dos serviços. 2. O acto impugnado é um mero acto da administração, um mero acto interno, de gestão e organização dos serviços, insusceptível, por conseguinte, de impugnação contenciosa dado não ser lesivo, pelo que não tendo o tribunal a quo entendido estar perante um acto desta natureza sindicando o mesmo, viciou a sentença de vício de violação de lei por errada interpretação legal 3. Pelo que, não sendo o acto impugnado recorrível contenciosamente, a acção carecia de objecto e como tal deveria ter sido ser rejeitada, determinando-se a inutilidade superveniente da lide, com a consequente absolvição da instância, não tendo assim sucedido, encontra-se a sentença viciada por vício de violação de lei devendo como tal ser anulada e substituída por outra que determine esta consequência; 4. A declaração de interesse do serviço é fundamento bastante e legalmente admissível para a mudança de local de trabalho dos funcionários públicos, pelo que a sentença recorrida ao considerar que o acto impugnado carece de fundamento está viciada por erro nos pressupostos de facto e de direito pelo que deverá ser anulada e substituída por outra que determine a validade do acto impugnado; 5. A fundamentação do acto é o interesse do serviço e a escolha da A. residiu na circunstância de, por um lado a mesma não se ter querido pronunciar sobre a mudança e por outro lado, o local ser confinante com o da residência da mesma Sendo que tal fundamentação é bastante e deve ser considerada pelo tribunal como suficiente. 6. O acto impugnado não padece dos vícios que lhe são assacados de nulidade e ilegalidade, uma vez que sendo o acto interno e de gestão e organização dos serviços não carece de acordo da funcionária e está fundamentado no interesse dos serviços, dada a reorganização dos mesmos e falta de técnicos no serviço para o qual a A. foi deslocada; 7. Nessa medida, o acto impugnado, estando devidamente fundamentado e obedecendo aos parâmetros previstos na lei, como seja, que a mudança de local de trabalho foi feita para um concelho limítrofe ao que a funcionária se encontrava afecta, não viola o alegado princípio constitucional insíto no artigo 26.° da CRP; 8. 0 despacho impugnado é legal e não carece de fundamentação. * A Recorrida não apresentou contra-alegações. * Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência. * Em 1ª Instância foi julgada provada a seguinte factualidade: 1. A A foi nomeada definitivamente na categoria de técnica superior de 2a classe, da carreira técnica superior de serviço social com efeitos a 04.04.01 (cfr. publicação no DR, n° 80, 2a Série, de 04.04.01), tendo tomado posse em 04.04.01 (cfr. doc. de fls., constante do processo individual da A junto aos autos). 2. No ano de 2003, foi proferido despacho pela Adjunta do Director do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Lisboa, com o seguinte teor: "Considerando a reestruturação em curso do Núcleo de Cooperação e Respostas Sociais, integrado na Unidade de Acção Social, nomeadamente da área da competência de Serviços e Estabelecimentos de Apoio Social Privados; Considerando ainda a necessidade de pessoal que se verifica no Serviço local da Amadora, designadamente da Carreira Técnica Superior de Serviço Social; Determino que a técnica superior da carreira técnica superior de serviço social - Maria ...- que se encontra afecta ao Núcleo de Cooperação e Respostas Sociais, seja colocada no Serviço Local da Amadora, a partir do próximo dia 7 de Abril, para o exercício de funções na área da acção social, devendo apresentar-se à respectiva coordenadora, licenciada Piedade ..." (cfr. doc. de fls. 35 do pf. e artigo 1° da pi) 3. A A não foi ouvida antes da decisão transcrita no ponto anterior. 4. A A não manifestou concordância com a decisão transcrita no ponto 2, antes de a mesma ser tomada (admitido por acordo). 5. Em 7 de Abril de 2003, a A encontrava-se afecta ao Núcleo de Cooperação e Repostas Sociais, situado na Av. dos Estados Unidos da América, em Lisboa (admitido por acordo). 6. A A interpôs recurso hierárquico desta decisão para o Conselho Directivo do ISSS (cfr. doc. de fls. 30 a 32 do pf, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 7. Em 20.02.04, foi pela Unidade do Regime Jurídico e Condições de Trabalho prestada a informação constante do doc. de fls. 26 a 29 do pf, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, e onde se escreveu, designadamente, o seguinte: "De acordo com os elementos constantes do processo e com a análise que dos mesmos se fez, não assiste qualquer razão à recorrente pois que, por um lado, os seus argumentos não colhem e demonstram, aliás, à saciedade que a funcionária, concerteza à revelia dos serviços, vinha cumprindo um horário irregular e por outro, porque a ser assim, não houve qualquer diminuição dos seus direitos, nem prejuízos demonstrados, uma vez que a mobilidade ocorre entre o mesmo quadro e a recorrente não se apresenta prejudicada na sua carreira. Com efeito, da mobilidade resulta que continuará a exercer funções com o mesmo conteúdo funcional, dentro do mesmo quadro (ex Centro Regional de Lisboa e Vale do Tejo) e em concelho confinante quer com o da sua área de residência, que a menos de 50 Km do local em que exercia funções. Acresce que a afectação dos funcionários é um acto gestionário praticado no uso de um poder discricionário do órgão com competência para o efeito, que, no caso, é o Director do Centro Distrital, ainda que o mesmo tenha delegado tal competência na Adjunta, a que compete, no exercício desse poder a satisfação das necessidades dos serviços e a sua operacionalidade. Nesta medida e não tendo a recorrente alegado matéria de facto ou de direito passível de determinar a respectiva revogação, nem tendo demonstrado a inconveniência do acto impugnado, é de concluir que não assiste razão à funcionária, é de propor a improcedência do recurso com a consequente manutenção do acto impugnado. " 8. Sobre esta informação foi exarado em 02.03.04 pela Vogal do Conselho Directivo do ISSS Maria ..., o seguinte despacho; "Concordo e nego provimento ao recurso com base nos argumentos expostos na presente informação. " (cfr. doc. de fls. 26 do pf). 9. Desde o dia 11 de Abril de 2003 que a A exerce funções no serviço local de acção social da Amadora. 10. A A reside e residia, no ano de 2003, na Av. de S. ..., 1675-170 Pontinha (doc. de fls. junto ao processo individual, contendo a declaração de alteração de residência para a Pontinha). DO DIREITO 1. fundamentação do acto administrativo; Fundamentar um acto consiste na indicação dos motivos, das razões de facto e, quando a lei o exija, de direito por que o mesmo se pratica, de modo a que o destinatário possa “deduzir expressamente a resolução tomada das premissas em que assenta, ou em exprimir os motivos por que se resolve de certa maneira e não de outra”. (1) Sem esquecer as diferenças entre estrutura da fundamentação e âmbito de fundamentação, no que interessa à delimitação do dever legal orientado em função de cada acto administrativo em concreto (2), parece-nos que a formulação de Marcello Caetano mantém toda a actualidade e é, na sua síntese, absolutamente clara: o que importa é que o destinatário entenda a que propósito aquele acto concreto foi praticado, em que medida afecta a sua esfera jurídica e em que medida pode atacá-lo contenciosamente. De modo que, no que tange à obrigação de fundamentar, impressa constitucionalmente no artº 268º nº 3 CRP, em lei ordinária no artº 1º do DL 256-A/77 de 17.6 e, ora, no artº 124º CPA com destaque para certa tipologia de actos além dos casos em que a lei especialmente o exija, impõem-se, entre outros requisitos, os de indicação expressa, clara, suficiente e congruente, embora sucinta, dos fundamentos. Logo, não pode ser insuficiente, obscura ou incongruente sob pena de anulabilidade, ressalvando-se as hipóteses de falta absoluta que impliquem, antes, a declaração de nulidade. Acresce ainda que um acto deve sempre adequar-se aos seus fundamentos – e não estes àquele - o que impõe que a fundamentação deva ser sempre contemporânea da prática do acto, salvo nas hipóteses de remissão para fundamentação inserida em parecer ou informações anteriores, o que só não pode suceder nos casos dos laudos de avaliação, porque, nestes casos a fundamentação é aduzida pelos próprios peritos intervenientes, mediante a explicitação dos critérios utilizados na valoração atribuída. 2. critério de suficiência objectiva - compreensibilidade; Tendo presente a problemática que necessáriamente acompanha a delimitação concreta do conteúdo da fundamentação formal no tocante aos critérios gerais de suficiência ou insuficiência formal “(..) a suficiência terá de ser avaliada na perspectiva do destinatário da declaração. Na realidade, se a fundamentação é uma declaração justificativa, não bastará ter em conta o momento decisório em abstracto, impondo-se a consideração do “auditório” a quem o discurso se destina. A divergência surge, todavia, na identificação do destinatário: deverá tratar-se do destinatário concreto da medida, de um destinatário normal ou razoável, ou da entidade com poderes de controlo de legitimidade do acto ? Ou, por outras palavras, deverá julgar-se a suficiência pela cognoscibilidade, pela compreensibilidade ou pela controlabilidade da fundamentação ? (..)” Sem prejuízo de aceitarmos todas as insuficiências que a doutrina assaca, optamos claramente pelo segundo critério de “(..) compreensibilidade das razões da decisão por um destinatário normal ou razoável, ainda que colocado na situação concreta. (..) (..) A objectivização do juízo da suficiência possibilita não só um modelo de declaração única para todos os destinatários, seja qual for o interesse ou papel que representem, como também uma comunicabilidade entre o emissor e o receptor pela via da racionalidade linguística – que são, afinal, os requisitos de uma obrigatoriedade formal-contextual de fundamentação. (..) (..) o critério corresponde às exigências práticas que se colocam, em especial, no âmbito do controle jurisdicional: as razões que devem ser declaradas (..) são as (..) determinantes, isto é, aquelas que sejam, ao mesmo tempo, justificativas (..) e decisivas por terem sido entre todas, aquelas que serviram de causa impulsiva do agir da Administração. (..)” (3) * No caso dos autos, os motivos da transferência da Recorrida do centro da cidade de Lisboa, na Av. dos EUA, para os arrabaldes da Amadora, sendo certo que reside na Pontinha, são totalmente compreensíveis nos precisos termos da fundamentação do despacho, que expressamente fazem saber que a transferência assenta em motivos de gestão, nas vertentes da reestruturação dos serviços e necessidades de pessoal. Por isso, de toda a fundamentação do acórdão, no tocante ao complexo normativo e na medida da correcta subsunção da factualidade provada nos normativos citados, diríamos que, em coerência, a decisão juridicamente consequente com os fundamentos seria de julgar em favor da suficiência da fundamentação do acto impugnado. Diz-se no acórdão, por transcrições evidenciadas a negrito, (i) trata-se de um acto de gestão de transferência da trabalhadora Recorrida por “reestruturação do Núcleo de Cooperação e Respostas Sociais e a falta de pessoal do serviço local da Amadora”, subsumível na previsão do artº 25º nº 4 do DL 427/89” - “4 - Se o lugar de origem se situar na área dos municípios de Lisboa ou Porto ou nas áreas dos seus municípios confinantes, a transferência pode fazer-se para lugares neles situados, independentemente do acordo do funcionário.” (ii) no tocante à esfera jurídica da trabalhadora Recorrida o princípio da proporcionalidade não se mostra posto em crise, “o despacho invocado não viola o princípio geral do direito do trabalho da imutabilidade do local de trabalho” (iii) o mérito ou demérito da decisão administrativo é insindicável pelos Tribunais, pois “configura uma medida de gestão de pessoal compreendida no âmbito dos poderes organizativos e de direcção da Administração relativamente aos seus funcionários.”, “o despacho em causa cabe nos poderes de livre apreciação da Administração, não podendo ser contenciosamente sindicado a menos que se verifique desvio de poder, erro grosseiro ou manifesto, ou violação dos princípios constitucionais e legais pelos quais se rege a actividade da Administração Pública.” (iv) nada de concreto resultou provado,“A A diz que o acto em causa lhe impossibilita que preste assistência à sua mãe durante a hora do almoço, senhora octagenária, pois a afectação da A ao serviço local da Amadora aumenta o tempo de deslocação de casa para o trabalho e do trabalho para casa, onerando-lhe também o montante a pagar pelos transportes. Contudo, admitindo que sejam verdadeiros estes factos que a A alega, o que é certo é que não se traduzem em prejuízos desproporcionados em relação ao possível benefício alcançado para o interesse público. 3. sindicabilidade contenciosa do agir da Administração; A nosso ver, o erro de julgamento reside no passo que se transcreve, com evidenciado a negrito: “(..) Ora, se, por um lado, o conceito de reestruturação é vago e genérico, podendo abranger circunstâncias de diversa natureza, por outro não se percebe porque é que a escolha para colmatar a falta de pessoal no serviço local da Amadora recaiu sobre a A. Os elementos indicados na decisão não permitem, pois, a um destinatário normal aperceber-se de todo o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela autora do acto para proferir a decisão, designadamente as razões que estão na base da escolha operada pela Administração para colmatar a falta de pessoal no serviço local da Amadora. O acto impugnado, ao confirmar o despacho proferido pela Adjunta do Director do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Lisboa sem aditar outros elementos que permitam conhecer integralmente os motivos deste, padece, assim, de insuficiente fundamentação. (..)” * É nesta parte que não acompanhamos o discurso jurídico fundamentador do acórdão sob recurso., na medida em que o controlo jurisdicional dos elementos formais da fundamentação exigidos no artº 125º nº 2 CPA não tem por objecto o mérito da decisão administrativa, no caso, saber quais as concretas razões preexistentes à “reestruturação do Núcleo de Cooperação e Respostas Sociais e a falta de pessoal do serviço local da Amadora”. E não tem, exactamente porque a discricionariedade administrativa, consiste na “(..) liberdade de escolha da Administração Pública quanto a partes do conteúdo (envolvendo a própria necessidade e o momento da conduta), do objecto, das formalidades e da forma de actos seus de gestão pública unilaterais, [e, pese embora se saiba que] alguma doutrina e jurisprudência recente questiona a definição da discricionariedade administrativa como liberdade de escolha, dizendo que há sempre uma e uma só solução administrativa condizente com o interesse público concreto prosseguido, ou seja, condizente com o fim do acto, [todavia] Não tem razão. Pode haver mais do que uma solução administrativa para prosseguir um certo interesse público concreto – quer quanto ao conteúdo, quer quanto ao objecto, quer quanto à forma. Ponto é que o legislador tenha querido atribuir a liberdade de escolha à Administração Pública e que o exercício dessa liberdade não colida com qualquer outro princípio norteador da actividade administrativa. Não se nos afigura, por isso, legítimo ao Tribunal encarregado de controlar a legalidade de um acto de administração ir ao ponto de definir – nos casos em que a lei quis atribuir discricionariedade – um conteúdo, um objecto ou uma forma únicos compatíveis com o fim a prosseguir, e, em função deles, apreciar o acto em questão. Isso representaria admitir que o Tribunal se pudesse substituir sempre à Administração Pública no traçado de todos os elementos do acto por ela praticado. O que põe em causa a lei – que quis dar à Administração Pública uma liberdade de escolha – assim negada. (..)” (4)( Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de Direito Administrativo, Vol. I, Lex, 1999, págs. 107/108.). * Dito de outro modo, a sindicabilidade contenciosa do agir da Administração Pública pára na fronteira da “(..) reserva da administração consubstanciada numa margem de livre decisão administrativa [que] constitui um limite funcional da jurisdição administrativa, pois as opções do órgão administrativo tomadas nesse domínio relevam da esfera do mérito e não da esfera da validade. A questão, no fundo, é a seguinte: partindo do princípio de que qualquer acto jurídico da Administração pode ser submetido à fiscalização de órgãos jurisdicionais (que o removerão da ordem jurídica na parte em que o julgarem inválido), até onde devem e até onde podem os tribunais controlar a actividade administrativa para que a Administração possa actuar – dentro dos limites da lei e tendo em vista a realização de fins de interesse público – de acordo com os seus próprios critérios? Em bom rigor, a regra básica e visto o problema em abstracto é de fácil formulação: a margem de livre decisão qua tale é insusceptível de controlo judicial porque respeita ao mérito, à conveniência ou à oportunidade da administração; pelo contrário, tudo o que se situar fora dessa esfera é judicialmente sindicável porque estará em causa a validade da conduta administrativa (e nesse domínio já não há livre decisão mas sim vinculação) (..)” (5). A via de compromisso entre os princípios da separação de poderes e da garantia de controlo judicial da actividade administrativa, cfr. artºs. 111º e 268º nº 4 CRP, traduz-se em que “(..) O mau uso de poderes administrativos (isto é, o seu uso inconveniente em toda a medida em que houver livre decisão) é susceptível de controlo de mérito, e este só pode ser feito pela própria Administração nunca pelos Tribunais. A autonomia pública administrativa qua tale apenas admite, pois, controlo gracioso, não contencioso. (..)” (6) * Quer isto dizer que no domínio de escolha discricionária, a sindicabilidade concentra-se sobre a eventual violação seja dos limites internos seja dos limites externos do poder discricionário concedido em vista do interesse público a realizar. (7) No tocante ao mérito, o que os Tribunais verificam concentra-se no conhecimento dos “(..) limites positivos de competência, de finalidade, de imparcialidade e de proporcionalidade (..) porque só existem a discricionariedade e a margem de livre apreciação de conceitos jurídicos indeterminados que a lei específicamente conceder (..). Apesar da abertura da norma – abertura da norma que traduz a discricionariedade - os efeitos de direito produzidos pelo acto hão-de corresponder a um tipo a que se reporta a norma de competência. Não há competência sem individualização do tipo de poder concedido e, portanto, a norma deverá fornecer um quadro ou descrição fundamental suficiente para demarcar o âmbito de actuação autoritária do órgão sobre as esferas jurídicas dos administrados e para repartir o âmbito de actuação entre os diversos órgãos das pessoas colectivas que integram a Administração. A indeterminação dos efeitos que resulta da abertura do tipo é pois sempre parcial (..) a abertura da previsão nunca pode ser total: da norma ou do concurso de normas que regem o acto administrativo tem de poder extrair-se o núcleo essencial do tipo de situação sobre a qual poderá incidir o exercício do poder. Sem tal tipificação faltariam ao executor da norma critérios objectivos da subsistência da necessidade pública a que corresponde o poder (..)” (8). * Uma vez que o despacho contém referência expressa aos motivos da transferência de serviço de Lisboa para a Amadora, a circunstância de a trabalhadora Recorrida não concordar com eles, ou não lhe convir a transferência, configura questão diversa da assacada insuficiência de fundamentação que, pelas razões expostas, não tem aptidão para sustentar a invalidade do acto. Pelo que vem dito, assiste razão ao Recorrente na questão suscitada nas conclusões sob os itens 4 a 7 das conclusões, cumprindo revogar o acórdão e manter, por válido e eficaz, o despacho de 28.04.2004, julgando-se prejudicado o conhecimento das demais. *** Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em, na procedência do recurso, revogar o acórdão recorrido, mantendo válido e eficaz o despacho de 02.03.04. Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias. Lisboa, 06.NOV.2008, (Cristina dos Santos) (Teresa de Sousa) (Coelho da Cunha) (1) Marcello Caetano, Manual de direito administrativo, Almedina, 10ª edição, Vol-1, pág. 477. (2) Vieira de Andrade, O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina/1991, págs. 23 e ss; Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e Pacheco de Amorim, Código do procedimento administrativo, Almedina, em anotação ao artº 123º, págs. 582/586 (3) Vieira de Andrade, O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina/1991, págs. 241, 247/248. (4) Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de Direito Administrativo, Vol. I, Lex, 1999, págs. 107/108. (5) Bernardo Diniz de Ayala, O (défice) de controlo judicial da margem de livre decisão administrativa, Lex, 1995, pág. 83. (6) Bernardo Diniz de Ayala, Obra citada, pág. 87 (7) Mário Esteves de Oliveira, Lições de direito administrativo, 1980, págs. 355/368, 439 e 616/624. (8) Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia contratual nos contratos administrativos, Almedina, Teses, 1987, págs.491/492. |