Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 00571/05 |
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Secção: | CT - 2º Juízo |
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Data do Acordão: | 06/07/2005 |
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Relator: | Eugénio Sequeira |
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Descritores: | IMPUGNAÇÃO JUDICIAL IVA/IRS OMISSÃO DE PRONÚNCIA E FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO MATÉRIA DE FACTO MÉTODOS INDICIÁRIOS/INDIRECTOS ERRADA QUANTIFICAÇÃO ÓNUS DA PROVA FALTA DE CONTESTAÇÃO |
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Sumário: | 1. Não ocorrem os vícios formais de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação da sentença recorrida conducentes à declaração da sua nulidade, relativa a questão que o impugnante não coloca como causa de pedir na petição inicial e quando a mesma sentença, em discurso lógico e coerente, fundamenta as opções tomadas, quer em matéria de facto, quer quanto ao direito aplicável; 2. A determinação da matéria colectável com o recurso a presunções ou estimativas não constitui um apuramento real da actividade do contribuinte, mas antes aproximado, verosímil, razoável, que pode ser contrariado e infirmado perante prova em que efectivamente se demonstre que tal matéria tem menor dimensão do que a encontrada ou que se encontra errado o critério utilizado pela AF nessa quantificação; 3. Em sede de impugnação judicial, actualmente, no âmbito da vigência do CPPT, como no anterior CPT, cabe à Administração Fiscal assentar os pressupostos que levaram à tributação, em juízos de probabilidade, necessariamente elevada, sem exigir uma certeza do facto tributário, em que a maior parte das vezes, não é possível; 4. E ao contribuinte, que alegue e prove factos (através de prova concludente) que ponham em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário ou da sua quantificação; 5. A fundada dúvida prevista na norma do art.º 100.º do actual CPPT, fundamento de anulação do acto de liquidação, não pode assentar na ausência ou inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante, ao qual lhe cabe provar os factos que ponham em dúvida a existência e quantificação do facto tributário, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los; 6. Para determinação da matéria colectável por estimativas ou presunções podem ser utilizados quaisquer meios, designadamente as margens de lucro brutas de custo do sector, índices de rentabilidade, etc., na falta de outros elementos colocados à disposição da AF e directamente recolhidos da actividade do contribuinte; 7. A falta de contestação do RFP não importa a confissão dos factos articulados pelo impugnante e é de livre apreciação pelo tribunal. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | A. O Relatório. 1. E...e mulher T..., identificados nos autos, dizendo-se inconformados com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal que julgou parcialmente improcedente uma das impugnações judiciais deduzidas e a outra totalmente improcedente, vieram da mesma recorrer para este Tribunal, formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem: a) Ao não se pronunciar sobre a questão da legalidade da aplicação de métodos indiciários, que os impugnantes expressamente suscitaram nas petições de impugnação, a sentença recorrida sofre de omissão de pronúncia, que é causa de nulidade, nos termos do art. 125º, nº1, do C.P.P.T.. b) Ao considerar que cabia aos impugnantes o ónus de prova da excessiva quantificação da matéria tributável fixada por métodos indirectos, sem que se verificassem os requisitos para o referido efeito impostos pelo artº 121º, nº2, do C.P.T., a sentença recorrida violou esta última norma legal. c) A fundamentação da decisão de aplicação de métodos indiciários violou os artºs 38º, nº2, do C.I.R.S. e 81º do C.P.T. e a sua quantificação não respeitaria os critérios estipulados no art. 52º do referido Código, aplicável por força do nº5 da referida norma do C.I.R.S. (redacções em vigor no momento dos factos). d) A douta sentença recorrida não valoraria o facto de o referido representante da Fazenda Pública não ter procedido à contestação especificada dos factos aduzidos pelos impugnantes, não obstante o seu eventual interesse para a prova desses factos, não tendo, assim, tido em conta o disposto no art. 110º, nº7, do C.P.P.T.. e) A sentença recorrida violaria o princípio do inquisitório previsto no art. 99º, nº1, da Lei Geral Tributária, uma vez ter considerado globalmente provados os factos apurados pela inspecção tributária e não provados os factos não constantes do Relatório da Inspecção Tributária, não apreciando ou rejeitando liminarmente os factos aduzidos pelos impugnantes que lançaram a dúvida sobre os elementos que serviram de base à aplicação de métodos indiciários e à quantificação da matéria tributável apurada por esses métodos. f) A douta sentença recorrida não está igualmente fundamentada, de facto e de direito, não discriminando as razões pelos quais dados factos foram considerados provados e outros não provados e desconsiderando, através de breves afirmações desprovidas de qualquer justificação, os elementos probatórios trazidos para os autos pelos impugnantes. g) A sentença recorrida violou especialmente as regras de experiência aplicáveis à prova dos factos, não dando qualquer relevo à circunstância de os resultados obtidos pela farmácia da impugnante serem equivalentes aos normais das farmácias situadas em zonas rurais de desenvolvimento semelhante da Região Autónoma da Madeira e, após a aplicação de métodos indirectos e nos exercícios abrangidos, passarem a ser, em virtude da aplicação desses métodos, muito dos resultados médios obtidos por farmácias, não apenas sitas nessas zonas rurais, mas na própria cidade do Funchal, onde seria suposto serem muito superiores. h) Dada a fundada dúvida suscitada sobre a aplicação de métodos indirectos, no presente caso, e dado não se verificar a circunstância de inversão do ónus de prova do art. 121º, nº2, do C.P.R., devem, à luz do nº1 dessa norma legal, ser anulados os actos tributários impugnados, nos termos requeridos pelos impugnantes, ora recorrentes. Tudo como é de Direito e de Justiça. Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito suspensivo. O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por os recorrentes não terem colocado em causa, nas respectivas petições iniciais de impugnação judicial, os pressupostos para a aplicação dos métodos indirectos, e não terem, por outro lado, logrado provar mostrarem-se errados os métodos utilizados pela Administração Fiscal. Foram colhidos os vistos dos Exmos Adjuntos. B. A fundamentação. 2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se a sentença recorrida enferma dos vícios de omissão de pronúncia e de falta de fundamentação (de facto e de direito) conducentes à declaração da sua nulidade; E não enfermando, se a mesma padece de erro de julgamento quanto aos factos provados e não provados, fixados; Se se encontra errado o critério utilizado na quantificação da matéria tributável apurada por métodos indiciários/indirectos, ou essa própria quantificação em si e se cabe aos recorrentes a prova do eventual excesso dessa quantificação; E se a falta de contestação do RFP importa confissão dos factos articulados pelos impugnantes. 3. A matéria de facto. Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz: 1. O Relatório de Inspecção Tributária, em que assentaram as liquidações ora impugnadas, é o que consta de fls. 56 ss do processo administrativo apenso a este proc. 70/02 e que aqui dou como reproduzido. 2. Do mesmo consta, nomeadamente, o seguinte: 1... A empresa (da impugnante) desenvolve a actividade no âmbito do comércio a retalho de produtos farmacêuticos, possuindo para o efeito uma farmácia no local da sede (Sítio da Igreja, Estreito de Câmara de Lobos) e um depósito no Curral das Freiras. Possui ... uma directora técnica (proprietária), 4 ajudantes técnicos de farmácia, 1 praticante de farmácia e 1 escriturário. ... vende também ... fraldas para bebé, leite infantil, papas lácteas, produtos cosméticos e de higiene, Trata-se de um sujeito passivo (a impugnante) de IRS ... ... obtém rendimentos da categoria C... Trata-se de um sujeito passivo (a impugnante) de IVA ... enquadrado no regime normal de periodicidade mensal.. . ... é obrigado a possuir contabilidade organizada nos termos da al. b) do nº 1 do art. 109° CIRS. 2... Dos anexos C às declarações modelo 2 de IRS foram retirados os seguintes elementos: ... A variação das vendas é acompanhada por uma variação semelhante no CMVMC, o que denuncia um certo artificialismo na MLB s/Custo declarada. A rentabilidade fiscal declarada afigura-se artificial uma vez que foram detectadas omissões de custos, dando-se como exemplo a remuneração do empresário. Análise à Conta Caixa Existem entradas de caixa justificadas com base em documentos internos. . . docs. 5 e 6... ... O Saldo no exercício de 1996 é muito constante, o que denota um certo artificialismo. ... Análise às margens de comercialização Para testar a fiabilidade da MLB s/Custo declarada, expressa na linha 20 do quadro do ponto 2.1, efectuou-se uma amostragem expressa nos docs. 35 a 37 em anexo. A amostragem foi efectuada com a presença da proprietária da farmácia, tendo-se efectuado uma subdivisão entre medicamentos éticos ou de preço fixo, medicamentos não éticos ou de preço variável, e de outros produtos. O valor final foi obtido por ponderação, considerando-se que os medicamentos éticos representam 90% do total das vendas e os não éticos e outros produtos representam 5% das vendas cada, conforme auto de declarações, doc. 38... ... A margem aritmética ponderada da MLB s/Custo foi calculada da seguinte maneira.. ((37% x 90%) + (52% x 5%) + (45% x 55)) - 38%. Na linha 20 do quadro expresso no ponto 2.1 obtêm-se margens declaradas que variam entre 18% e 21 %, existindo uma diferença muito significativa em relação à obtida em amostragem, sendo a menor diferença de 17%. 4.2. Determinação do lucro tributável presumido O lucro-tributável presumido vai ser calculado com base na MLB s/Custo, conjugado com a alínea a) do art. 52° CIRC. Efectuaram-se os seguintes cálculos para obtenção do valor presumível das vendas: (ver quadro a fl. 80 do p.a.) 4.3. Distribuição do IVA em falta A distribuição do IVA em falta vai ser efectuada de forma equitativa, uma vez que o volume de negócios expresso nas declarações periódicas do IVA não coincide com o expresso no anexo C à modelo 2, o mesmo acontecendo em relação a alguns exercícios da contabilidade. Considerou-se, conforme auto de declarações doc.- 2..3 em anexo, que... 3. A impugnante é proprietária de uma das duas farmácias existentes na freguesia rural do Estreito de Câmara de Lobos. 4. Esta freguesia dista cerca de 10 km da sede do Concelho, único local onde tem um centro de saúde. 5. Além da farmácia propriamente dita, a impugnante possui um posto de venda de medicamentos na freguesia do Curral das Freiras, para onde tem de se deslocar e, nos seus impedimentos, um seu empregado. 6. Em relação a alguns medicamentos, a impugnante optou por não os ter em armazém, preferindo pedi-los, no dia, ao fornecedor no Funchal. 7. A zona é fria e húmida. 8. Numa farmácia nem todos os produtos adquiridos são vendidos. 9. Ao aumento das vendas verificado entre os anos de 1992 e 1996, correspondeu um aumento do resultado fiscal, que subiu de 4 272 565$00 em 1992, para 8 875 847$00 em 1996, com uma rentabilidade fiscal da ordem dos 4% a 5%; 10. Atente-se que esses valores reflectiam uma margem de lucro bruta sobre o custo da ordem dos 20%. 11. A impugnante não põe em causa a existência à data da fiscalização, de fundamentos para aplicação de métodos indiciários; 12. O valor de 1 788 226$00 de IVA deduzido indevidamente refere-se a aquisições de álcool feitas ao Instituto do Vinho da Madeira; 13. Este Instituto, aquando da venda do álcool, apenas emitia uma guia de pagamento, para ser satisfeito na respectiva tesouraria; 14. Nessa guia era mencionado expressamente o valor do IVA, que acrescia ao valor do álcool. 15. O Instituto do Vinho da Madeira entregou nos Cofres do Estado o IVA que foi liquidado à impugnante. 16. A base de todas as presunções é constituída pelos mapas que constam dos docs. 35 a 37. 17. A amostragem foi feita a 12 produtos de entre centenas com que uma farmácia lida no seu dia-a-dia. 18. Apesar de os impugnantes terem confessado que a contabilidade não estava correcta, depois da auditoria feita por uma empresa especializada, foi possível quintuplicar a amostra e nela incluir mais de meia centena de produtos; 19. Nesta amostra, e em relação aos medicamentos éticos, que constituem cerca de 90% da receita, chegaram a uma MLB média da ordem dos 27,5% (docs. 1 a 11). FACTOS NÃO PROVADOS A maioria dos produtos vendidos na farmácia é através de receita médica e com comparticipação da respectiva entidade (Segurança Social ou ADSE); Esta comparticipação, por vezes, leva meses a ser recebida. Nenhuma farmácia venderá qualquer medicamento, cujo prazo esteja a menos de 6 meses de expirar. Nunca vende nenhum medicamento fabricado há mais de dois anos. As MLB propostas para os medicamentos não éticos (52%) e outros produtos (45%) situam-se nos 40%, valor efectivamente declarado. Reorganizada a contabilidade, tais margens continuam dentro dos parâmetros declarados, havendo ligeiras oscilações, conforme se pode comprovar pelo Quadro apresentado como documento 12. Medicamentos como Activarol; Nimed; Xanax; Aulin; Aspegic; Atarax, Novalgina; Tantum Verde, têm uma MB da ordem dos 20%. Medicamentos como a Cortigripe; Sargenor; Betadine; Pazolan, etc, tem uma MB da ordem dos 30%. Os valores referidos nos factos nº 9 e 10 são acima do comum. PROVA A convicção do tribunal assenta na análise dos documentos juntos e conhecidos das partes, bem como nos depoimentos das testemunhas. As testemunhas foram globalmente vagas e genéricas, falando em termos de dedução para a situação presente a partir das suas experiências de vida, mas não relacionadas directamente com esta concreta farmácia. - Os documentos juntos pelos impugnantes não retiram verdade ao feito pela AF e -também não representam uma perícia independente e comprovada documentalmente à contabilidade da farmácia. Note-se que os valores que a impugnante declarava não eram acima do normal em farmácias fora do Funchal, conforme resulta de fls. 368 e 369 do proc. Nº 145/02. Já a diferença entre os 27% ora sugeridos pelos impugnantes e os 38% apurados pela Administração Fiscal (note-se que há farmácias no Funchal que o atingem) resulta apenas de outra eventual amostragem, usada sem se demonstrar a incorrecção ou invalidade da amostragem usada pela Administração Fiscal. A que, nos termos do disposto na alínea a) do n.º1 do art.º 712.º do Código de Processo Civil (CPC), a fim de melhor se perceber os montantes liquidados e a parte em que apenas ocorreram correcções técnicas, e em que o IVA foi anulado, acrescenta-se ao probatório mais os seguintes pontos: 20. Na sequência da acção de fiscalização em causa, foi liquidado à ora recorrente o seguinte IVA (cfr. PA apenso): Por métodos presuntivos --- Por correcções técnicas 1992 ..... (Em €uros) 701,17 756,28 1993 ..... 3317,87 21.755,20 1994 ..... 3723,03 2298,08 1995 ..... 4172,54 1911,21 1996 ..... 4910,18 ---- 21. E de IRS, categoria C (apenas por métodos indirectos) – cfr. Pa apenso: 1993 .... 69.299,81 1994 .... 60.071,51 1995 .... 49.377,19 1996 .... 62.222,66 4. Tendo sido imputada à sentença recorrida o vício de omissão de pronúncia, a existir, conducente à declaração da sua nulidade - cfr. matéria da sua conclusões a), embora a final se “tenha esquecido” de formular o respectivo pedido, já que apenas pede a anulação dos actos tributários impugnados - porque a mesma a ocorrer gerar, na realidade, a nulidade desta, nos termos do disposto nos art.ºs 668.º n.º1 alíneas b) e d), 660.º n.º2 e 713.º n.º2 do Código de Processo Civil (CPC), 143.º e 144.º do Código de Processo Tributário (CPT), e hoje dos art.ºs 124.º e 125.º do CPT, importa por isso conhecer em primeiro lugar, desta invocada nulidade. Tal nulidade só ocorre, nos termos daquelas normas citadas em primeiro lugar, quando o Juiz deixe de pronunciar-se em absoluto de questão que deva conhecer, que por isso tenha sido submetida à sua apreciação e da qual não conheça, nem o seu conhecimento tenha sido considerado prejudicado pela solução dada a outra(s), como constitui jurisprudência abundante(1). Como sabiamente invocava o Professor Alberto dos Reis - Código de Processo Civil Anotado, volume V, (Reimpressão), pág. 140 - «Há que distinguir, cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto". Consubstanciam, no caso, os recorrentes, tal omissão de pronúncia, por o M. Juiz do Tribunal "a quo", na sentença recorrida, não se ter pronunciado sobre a falta de pressupostos para a passagem aos métodos indirectos no apuramento do rendimento tributável, questão que foi expressamente suscitada nas petições de impugnação, ao que agora afirmam. Na sentença recorrida, a M. Juiz do Tribunal “a quo”, na realidade, não conheceu desta questão, por, como deixou fixado no probatório na matéria do seu ponto 11. - A impugnante não põe em causa a existência à data da fiscalização, de fundamentos para aplicação de métodos indiciários – ou seja, porque entendeu, que tal questão não fora suscitada nas respectivas petições iniciais de impugnação judicial. Porém, os recorrentes, vêm afirmar o contrário, ou seja, que expressamente, suscitaram tal questão. Mas não o deveriam vir agora afirmar, quando na sua petição inicial da impugnação judicial com o n.º 70/02, relativa ao IRS, afirmam expressamente, na matéria do seu art.º 51.º:...a impugnante não põe em causa a existência, à data da fiscalização, de fundamentos para aplicação de métodos indiciários; o que, ainda que por outras palavras repetem na impugnação n.º 145/05, depois de nos artigos anteriores, imputarem tal desorganização da contabilidade à empresa de contabilidade que para o efeito contrataram e que não lhes prestou o serviço que dela esperavam e a quem lançam toda a responsabilidade por essa desorganização contabilística, não se percebendo assim como pretendem agora que a realidade seja contrária a tal declaração. Os recorrentes não podem faltar à verdade por si conhecida sobre factos relevantes sobre o mérito da causa ou sobre algum dos fundamentos tendentes a esse fim, sob pena de puderem ser condenados como litigantes de má fé, nos termos do disposto no art.º 456.º do Código de Processo Civil (CPC), falta que igualmente pode ser extensível ao Exmo mandatário, nos termos do disposto no art.º 459.º do mesmo Código. No caso, a conduta dos recorrentes afigura-se-nos de raiar tal conduta de má fé, procedimento que apenas entendemos ser de afastar por os mesmos explicarem nos art.ºs 10.º e segs da anterior alegação (que contudo não levam à respectiva conclusão), conjugados com outros artigos das respectivas petições de impugnação, que interpretam como não havendo lugar à aplicação de métodos indiciários, mas depois de a contabilidade ter sido refeita ou reorganizada, após a acção de fiscalização, o que não se encontra em causa nos autos, mas sim as liquidações adicionais em causa, por efeito dos erros e omissões verificados na sua contabilidade, à data em que teve lugar tal acção fiscalizadora e quanto aos respectivos exercícios anteriores à mesma. Não tendo esta questão sido colocada pelos ora recorrentes nas suas petições iniciais de impugnação, é manifesto que não pode ocorrer qualquer omissão de pronúncia na sentença recorrida que de tal questão não conheceu. Se dela conhecesse, ao invés, é a que a mesma poderia ocorrer no vício oposto, de excesso de pronúncia, causa igualmente, da sua nulidade, nos termos do disposto nos art.ºs 660.º n.º2 do CPC e 125.º n.º1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), improcedendo assim, o invocado vício formal de omissão de pronúncia assacado à sentença recorrida. Na matéria da sua conclusão f), conjugada com a matéria da anterior alegação (art.ºs 52.º e segs), igualmente invocam os recorrentes, questão que a proceder levaria à nulidade da mesma sentença, ao lhe assarem o vício da sua falta de fundamentação (de facto e de direito), por ... A douta sentença recorrida não está igualmente fundamentada, de facto e de direito, não discriminando as razões pelos quais dados factos foram considerados provados e outros não provados e desconsiderando, através de breves afirmações desprovidas de qualquer justificação, os elementos probatórios trazidos para os autos pelos impugnantes. Quanto à falta da invocação das razões porque uma matéria se encontra provada e uma outra não se encontra, bem como foram desconsiderados os elementos probatórios trazidos pelos impugnantes, não invocam os mesmos, em concreto, quais as que a sentença recorrida deu como provada quando não deveria ter dado, bem como quais os que não deu como provada quando deveria ter dado, desta forma não substanciando o aludido fundamento para que este Tribunal possa exercer um juízo de censura sobre a sentença recorrida, sabido que, nos termos do disposto no art.º 690.º do Código de Processo Civil (CPC), na sua conclusão, deve o recorrente indicar os fundamentos, precisos, concretos, e não em termos hipotéticos, por que pede a alteração ou anulação da decisão. É que as alegações genéricas, que não precisem as razões por que se reflicta a decisão recorrida, são inidóneas para estribar a sua alteração ou revogação(2). Sempre se dirá, contudo, que o M. Juiz do Tribunal “a quo” justificou, em geral, os factos que considerou provados bem como os que não considerou, respectivos meios de prova e emitiu juízo de adequação entre as provas apresentadas e os factos considerados provados ou não provados, como se pode ver da respectiva fundamentação expressamente ora transcrita, pelo que nunca poderia ocorrer o invocado vício formal de falta de fundamentação da sentença. É que tal vício formal de falta de fundamentação da sentença recorrida – art.ºs 125.º n.º1 do CPPT e 668.º n.º1 b) do CPC – só pode ser integrado pela falta absoluta de fundamentação, que não por falta de fundamentação medíocre, incompleta ou parcial, que ela eventualmente, possa conter. O dever de o juiz fundamentar as suas decisões emana, desde logo, da norma geral do art.º 158.º do CPC e, relativamente à sentença, dispõe a do art.º 123.º n.º2 do CPPT e art.º 659.º deste mesmo CPC, em sentido semelhante. E a sua falta comina de nulidade tal sentença - art.º 125.º n.º1 do CPPT e alínea b) do n.º1 do art.º 668.º do CPC. A razão da fundamentação, no dizer Professor José Alberto dos Reis(3), é de ordem substancial e de ordem prática. Quanto àquela porque a sentença deve representar a adaptação da vontade abstracta da lei ao caso particular submetido à apreciação do juíz; ao comando geral e abstracto da lei o magistrado substitui um comando particular e concreto...a sua atribuição é unicamente a de extrair da norma formulada pelo legislador a disciplina que se ajusta ao caso sujeito à sua decisão, cumpre-lhe demonstrar que a solução dada ao caso é legal e justa, ou, por outras palavras, que é a emanação correcta da vontade da lei. E quanto a esta porque as partes precisam de ser elucidadas a respeito dos motivos da decisão. Sobretudo a parte vencida tem o direito de saber porque razão lhe foi desfavorável a sentença; e tem mesmo a necessidade de o saber, quando a sentença admita recurso, para poder impugnar o fundamento ou fundamentos perante o tribunal superior. Este carece também de conhecer as razões determinantes da decisão, para as poder apreciar no julgamento do recurso. Não basta, pois, que o juíz decida a questão posta; é indispensável que produza as razões em que se apoia o seu veredicto. ... Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Também a jurisprudência trilha igual caminho, no sentido de que apenas se verifica a nulidade por falta de fundamentação, quando ela é absoluta e não quando ela seja deficiente, medíocre ou incorrecta(4). No caso, porque nem sequer os recorrentes lhe imputam tal falta absoluta de motivação, não pode por isso ocorrer tal apontado vício formal. 4.1. Convém frisar desde já, que o presente recurso apenas abarca a parte da sentença em que os ora recorrentes ficaram vencidos, ou seja a parte das liquidações de IVA e IRS em que houve o recurso a presunções ou estimativas, que não a parte do IVA em que apenas houve lugar a correcções técnicas e cujas liquidações foram anuladas pela sentença recorrida – cfr. pontos n.ºs 12 e 20 do probatório fixado - parte esta que se mostra transitada em julgado – art.º 684.º n.º4 do CPC – não detendo, sequer, os ora recorrentes, nesta última parte, legitimidade para dela recorrerem por não serem parte vencida – art.º 680.º do mesmo CPC. Na matéria das suas alíneas e), f), nesta, apenas em parte, e g) das suas conclusões do recurso, colocam os recorrentes em causa a matéria de facto tal como fixada no probatório da sentença recorrida, quer porque não teria tido em conta os factos apresentados pelos recorrentes e que infirmariam os dados recolhidos pela fiscalização, quer por ter infringido as regras da experiência comum na fixação desses mesmos factos, desta forma parecendo pretender a alteração da matéria de facto tal como foi fixada no mesmo probatório. Porém, quando o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, a lei é ainda mais exigente do que quando apenas ataque a matéria de direito, já que nesta se basta, na conclusão respectiva, com a indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão (art.º 690.º n.º1 do CPC), ao passo que naquela, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados e quais os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (art.º 690.º-A do mesmo CPC), sem que o recorrente tenha de ser convidado a suprir a falta, não sendo esta norma inconstitucional nesta sua dimensão de exigibilidade, como decidiu o TC no seu acórdão publicado no DR II Série de 17.4.2004, o que os recorrentes não fizeram, nem mesmo nas anteriores alegações das suas conclusões do recurso, nelas se tendo limitado a vagas conclusões e genéricas dissertações sobre tais matérias. O âmbito da apreciação do julgamento da matéria de facto efectuado no Tribunal recorrido, cingir-se-á assim no presente recurso, ao disposto nos comandos do art.º 712.º, designadamente o do seu n.º1 alínea b) do CPC, na medida em que permitem a alteração da fixação da matéria de facto, mesmo oficiosamente. E dos autos, como bem se fundamenta na sentença recorrida, nenhuma prova existe capaz de infirmar a quantificação operada pela fiscalização tributária onde foi encontrada a margem bruta sobre o custo de 38% (MB), base de apuramento do rendimento colectável em sede de IRC e do IVA em falta, aliás, MB que foi encontrada em colaboração com a ora recorrente, a qual então declarou a percentagem dos medicamentos chamados de éticos de 95%, os não éticos de 5% e que as restantes mercadorias representavam 5% do total das vendas, como se vê do doc. de fls 128 do PA apenso à impugnação n.º 70/02, ao contrário do pretendido pelos recorrentes. Também o doc. de fls 22 a 33 dos mesmos autos de impugnação n.º 70/02, onde MBs de diferentes valores foram apurados, que teriam sido elaborados por uma empresa especializada – cfr. art.º 66.º desta mesma impugnação – que os recorrentes nem identificam qual, resultando um documento que nem assinado se encontra, carece de qualquer valor probatório para o fim em vista, desconhecendo-se quem terá emitido tais declarações, e muito menos que as mesmas sejam verdadeiras ou sinceras – cfr. art.ºs 373.º e segs do Código Civil – nada adiantando quanto à pretendida errada MB encontrada e aplicada pela fiscalização. Também o documento de fls 365 a 369 dos autos de impugnação n.º 145/02, fornecido pela Direcção de Finanças da Região Autónoma da Madeira, onde MBs com diferentes valores, relativos a farmácias da mesma RAM, e nos exercícios em causa, foram declarados pelas mesmas com menor expressão, não podem ter por virtualidade infirmar o apurado pela mesma fiscalização, por desde logo, puderem ser estes os que não se encontram certos. E também a prova testemunhal prestada nenhuns concretos factos veio provar capaz de infirmar aquela factualidade supra apurada em sede de fiscalização, nos moldes já avançados quanto aos valores das MBs encontradas, pelo que tal matéria não pode deixar de se manter. De resto, se os impugnantes pretendiam, efectivamente, infirmar aqueles MBs sobre os custos de 38%, então o caminho a seguir, seria o de terem requerido a realização de uma perícia à concreta situação da actividade farmacêutica desenvolvida pela impugnante, nesses exercícios, meio probatório que o legislador na norma do art.º 136.º do CPT, então vigente, veio eleger como privilegiado para tal fim, ao ali vir destacá-lo, de modo diverso do que acontecia nas impugnações em que não se encontravam em causa a errónea quantificação da matéria tributável, em que o legislador apenas dispunha que eram admitidos os meios gerais de prova – art.º 134.º do CPT. Recorde-se que os recorrentes, nas respectivas petições iniciais de impugnação judicial, colocavam em causa tais valores de MBs por uma das farmácias se encontrar localizada em zona rural, dividindo os clientes com uma outra, tendo por isso um fraca venda de certos produtos como os de higiene e cosmética, ocorrerem destruição de medicamentos por se encontrarem impróprios para consumo e ocorrerem quebras dos frascos de vidros onde os medicamentos vêm acondicionados, tudo isso originando prejuízos que uma simples amostragem não permitiria tomar em devida conta. Porém, não só os recorrentes não provaram tal matéria, como também não se encontra excluído que os valores de MBs encontrados e aplicados pela AF não tenham já tomado em conta a realidade específica do comércio de farmácia, em geral, e da situação da impugnante em particular, com essas quebras e estragos, sendo certo que nas declarações prestadas pela impugnante, já referidas supra, não lhe é feita qualquer referência, possivelmente porque as não considerou relevantes. Improcede assim a totalidade da matéria das conclusões a tal atinentes, designadamente quanto à invocada violação do princípio do inquisitório. 4.2. Na matéria das conclusões b) e h) insurgem-se os recorrentes com a sentença recorrida por a mesma ter considerado que lhes cabia fazer a prova da excessiva quantificação da matéria tributária fixada por métodos indirectos, não lhes aproveitando a eventual dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário. Na sentença recorrida, quanto a tal matéria, entendeu o M. Juiz do Tribunal “a quo”, que não se fez qualquer prova nesta matéria e que não havia lugar à aplicação ao regime do art.º 121.º do CPT (dúvida fundada quanto à existência e quantificação do facto tributário). E cremos ter-se decidido bem, como se tentará desenvolver. Nos termos do disposto no art.º 82.º do CIVA, a utilização de métodos indiciários para a determinação da matéria colectável, com a inerente liquidação do imposto, pode e deve ser feita com o recurso a presunções ou estimativas sempre que o Chefe da Repartição de Finanças constate a existência de inexactidões ou omissões nas declarações que conduzam a um imposto inferior ou a uma dedução superior aos que se mostrem devidos, sendo certo que a aludida constatação pode resultar de diversos factores enunciados naquele preceito legal, nomeadamente, de visita da Fiscalização efectuada nas instalações do sujeito passivo, através de exame aos seus elementos de escrita e/ou da verificação das existências físicas do estabelecimento. Normas de idêntico conteúdo constam nos art.ºs 38.º do CIRS e 52.º do CIRC, relativamente a estes impostos. A utilização de tal método presuntivo ou indiciário, traduz-se no recurso por banda da AT, a elementos de facto conhecidos que, utilizados segundo as regras da experiência, pautados por critérios de razoabilidade e normalidade, conduzem à extrapolação de outros desconhecidos que servem de suporte ao juízo valorativo extraído pela mesma. Consequentemente e necessariamente tal conclusão não tem, na generalidade dos casos, de corresponder ao resultado de um raciocínio dedutivo, sustentado em elementos de facto concretos, mas tão só prováveis, justificando a utilização de parâmetros gerais comuns adequados àquele juízo valorativo que se impõe apurar. Por outro lado, muito embora as situações que constituem os pressupostos que legitimam o recurso ao método indirecto de avaliação constituam as mais das vezes contra-ordenações fiscais, a aplicação de tais métodos não visa nunca a punição desses factos mas tão somente, nas palavras de Génova Galván, in La estimación indirecta, Tecnos, Madrid, 1985, «alcançar senão aquela certeza que o método directo atinge pelo menos atingir a máxima verosimilhança que seja possível alcançar no caso concreto através da utilização de inferências probabilísticas». Ou como refere Jorge Lopes de Sousa(5), nestas situações em que é impossível determinar directamente a matéria tributável, há sempre dúvidas sobre a sua quantificação real, pois os métodos indirectos tomam em consideração indicadores que apenas podem fornecer uma indicação aproximada do valor que a matéria tributável provavelmente teria. O recurso ao método indirecto está legitimado por força do princípio da capacidade contributiva que só se respeita fielmente quando se mede directamente a matéria tributável sendo por isso uma faculdade da AT no exercício do seu poder/dever de liquidar quando comprovadamente demonstre não poder por via directa alcançar o rendimento tributável. Para que assim não suceda, imperioso se torna que aquele a quem possa ser oposto o método em causa, faculte os elementos necessários e indispensáveis à decisão a tomar, de forma a que os resultados a que permitam chegar se mostrem reais, efectivos, concretos e credíveis, assim excluindo, necessariamente, a possibilidade da utilização de tais métodos. Por outro lado, no caso de utilização de métodos indiciários/indirectos, para que as extrapolações a que o mesmo venha a conduzir, se mostrem casuìsticamente adequadas, bastará que se suportem na utilização de elementos obtidos segundo as regras da experiência, norteados pelos aludidos critérios de normalidade e de razoabilidade. Caberá, então, àquele a quem o método em questão venha a ser oposto, e sendo caso disso, a demonstração que, no caso, a realidade é diversa do resultado a que conduziu a utilização das mencionadas regras da experiência, nomeadamente porque os critérios que as nortearam, não se mostram razoáveis e/ou normais. No caso em apreço, de acordo com a matéria das petições iniciais de impugnação judicial, a fundamentação da sentença recorrida e as conclusões das alegações de recurso e que delimitam o seu objecto, não se encontra em causa os fundamentos ou pressupostos para o imposto ser apurado por métodos indiciários/indirectos, pelo que agora aqui em sede de recurso, também não se encontra em causa as deficiências de organização contabilística detectadas e que permitem a aplicação de tais métodos indiciários, mas tão só se existe errada quantificação da matéria colectável assim fixada, por os recorrentes não terem vindo invocar essa falta de pressupostos, como fundamento da anulação dos impostos liquidados adicionalmente. O acto que veio a fixar aos recorrentes o IVA e o IRS de que resultaram as liquidações impugnadas, foi a decisão do Presidente da Comissão de Revisão, na falta de acordo dos vogais, consubstanciada nas actas cujas cópias constituem fls 333 e segs. dos autos de PA apensos ao processo de impugnação n.º 145/02 e doc. n.º8 (sem numeração) dos autos de PA apensos à mesma impugnação n.º 145/02, suportando-se para além do mais no relatório do exame à escrita. Cabe referir que no direito adjectivo fiscal, art.º 40.º n.º1 do CPT, e hoje no art.º 99.º da LGT e 13.º do CPPT, e no direito adjectivo civil, art.º 265.º n.º3 do CPC, ambos regidos pelos princípios da aquisição processual e do inquisitório do tribunal em matéria de provas, o que interessa em ordem à solução jurídica do litígio é o que resulte provado, seja por via das partes seja por via do tribunal. Nesta medida, o ónus da prova da factualidade alegada pelas partes tem a natureza de ónus objectivo, por decorrência do princípio da oficialidade, e não de ónus subjectivo tal como em sede de alegação, embora hoje este ónus subjectivo de alegação se apresente mitigado por disposição expressa do art.º 264.º n.ºs 2 e 3 do CPC, que introduziu o conhecimento oficioso de factos instrumentais e complementares. A consequência do ónus de prova objectivo é que vem a...suportar as desvantagens da incerteza do facto de que não tenha logrado prova, por via das partes ou do tribunal, a parte a quem interesse a aplicação da norma de que ele for pressuposto...cfr. Anselmo de Castro in Direito Processual Civil Declaratório, Almedina/1982, V-III, pág. 163. O impugnante não deve limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida a existência e a quantificação do acto tributário. Cabe-lhe o ónus de prova de tais factos, sem embargo de o juiz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los - cfr. Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, in CPT, Comentado e Anotado, 3.ª Edição, anotação 8. ao art.º 121.º, págs. 267 e 268. E mais adiante: No caso previsto neste último normativo, uma vez que o ónus da prova do «excesso» da quantificação da matéria colectável fixada por métodos indiciários cabe ao impugnante(6)... A possível incerteza da quantificação da matéria colectável mais não é do que a normal consequência do próprio método presuntivo ou indiciário dessa quantificação, que lhe é inerente, surgindo como uma ultima ratio fisci para apuramento de uma matéria colectável que por culpa da contribuinte não foi apurada através da forma normal que é a sua escrita comercial, mercê das deficiências que apresenta ou perante a sua falta pura e simples. No caso, face aos elementos antes referidos, carreou a Administração Fiscal para os autos, dados certos e objectivos, baseados no relatório do exame à escrita já analisado, em que por amostragem elaborada pela fiscalização assente e em conformidade com as declarações prestadas pela então impugnante, os valores de MBs sobre os custos se cifram nos citados 38% encontrados, desta forma conduzindo com um elevado grau de probabilidade, segundo juízos de causalidade usuais e normais no comércio, que os ora recorrentes tenham, efectivamente, praticado tais margens brutas de vendas sobre os custos, critério utilizado que, à partida, se não vislumbra que esteja errado, afigurando-se-nos antes, como lógico, normal. Por sua vez, cabia aos impugnantes terem alegado e provado factos certos e concludentes que pusessem em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou aquele juízo de probabilidade elevado feito pela Administração Fiscal para prova do erro nessa quantificação por métodos indiciários. Ou que no caso, haviam ocorrido circunstâncias especiais que levaram a que em relação a tais anos de 1992 a 1996, não tinham obtido tais margens, ou quaisquer outras razões, logo sendo inferior o montante das mesmas, mercê dessas particularidades. Situação que colocavam os impugnantes nas melhores condições para o esclarecerem e provarem. E tal prova não lograram os impugnantes fazê-la, como acima, já em pormenor se analisou, como lhes cabia, nos termos do disposto no art.º 342.º do Código Civil(7) e hoje do art.º 74.º da LGT, para demonstrar o excesso de quantificação, base da liquidação adicional impugnada, e que constituiria a causa de anulação da liquidação, a verificar-se, o que não é o caso, tendo por isso a causa de ser julgada contra os mesmos. E não chegando mesmo a colocar em dúvida séria, fundada, que tais pressupostos se mostrem errados, como lhe cabia, para a liquidação poder ser anulada, por fundada dúvida, ao abrigo do disposto no então art.º 121.º do CPT e hoje do art.º 100.º do CPPT, não podem as impugnações judiciais, na parte sob recurso, deixarem de improceder. A repartição do ónus da prova em sede de impugnação judicial, após a entrada em vigor do CPT, ao vir introduzir um novo preceito - o do art.º 121.º e hoje o art.º 100.º do CPPT - afigura-se-nos como exprimindo um princípio estruturante do processo contencioso tributário, como do processo administrativo tributário, que a «fundada dúvida sobre a existência do facto tributário» deve implicar que a administração fiscal se abstenha, quer da respectiva quantificação, quer da subsequente liquidação do imposto. No dizer de Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão(8), é a consagração do princípio de que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio «in dubio pro fisco» que, na prática, era acatado no regime anterior à Reforma Fiscal. O preceito em anotação, todavia, carece de aprofundado esforço interpretativo, a fim de se aferir do seu correcto alcance. A «dúvida fundada» a que alude o referido art.º 121.º do CPP, que implica a anulação do acto impugnado, não pode assentar na ausência ou inércia probatória das partes, sobretudo do impugnante(9). Este não deve limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida a existência e quantificação de facto tributário. Cabe-lhe o ónus da prova de tais factos, sem embargo de o juíz, no âmbito do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também comprová-los. Só mediante a prova concludente de tais factos é que é possível pelo fundamento daquela dúvida. Também, A. José de Sousa e José da Silva Paixão, in Código de Processo Tributário, Comentado e Anotado, 4.ª Edição, pág. 292, nota 7., se pronunciam em igual sentido: "O impugnante tem, por conseguinte, o ónus da alegação dos factos integradores da ilegalidade do acto tributário a anular"...E na nota 10., pág. 293: Sem embargo do ónus da prova de tais factos que recai sobre o impugnante (art.º 342.º do Código Civil)"... E também Vieira de Andrade, a propósito do ónus da prova, escrevia(10): há-de caber, em princípio, à Administração o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos. Quando se coloca o problema de apurar se existiu, ou não, determinado facto tributário, como no caso acontece, há que analisar em pormenor se a administração fiscal fez assentar os pressupostos da sua pretensão segundo juízos de probabilidade, necessariamente elevada, sem exigir uma certeza do facto tributário, resultando a legitimação do uso, pela administração fiscal, dessa mera probabilidade da violação pelo contribuinte de alguns dos seus deveres legais. Não sendo possível, a maior parte das vezes, ter a certeza sobre a existência do facto tributário, daí não resulta que o contribuinte não seja tributado, pois, para que tal tributação não se verifique, necessário será que aquele alegue e prove factos (através de prova concludente) que ponham em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou o juízo de probabilidade elevado feito pela Administração para prova da existência do facto tributário ou da sua quantificação(11). Por outro lado, só releva para a anulação da liquidação do imposto a dúvida legítima ou fundada sobre a existência e quantificação do facto tributário, ou seja, quando aquela dúvida não seja imputável ao impugnante(12), e no caso, a eventual dúvida a estes lhes cabe, por não apresentarem uma contabilidade devidamente organizada, como os mesmos em parte reconhecem, que assim foram apuradas pela AF, com o recurso a outros elementos como se diz no mesmo relatório da fiscalização cujas cópias constam juntas aos PAs apensos. No caso, face aos elementos antes referidos, carreou a Administração Fiscal para os autos, dados certos e objectivos, baseados na referida amostragem elaborada de acordo com as diferentes categorias dos produtos vendidos e respectiva percentagem relativa de cada uma delas, referidas, na falta de quaisquer outros, que conduzem com um elevado grau de probabilidade, segundo juízos de causalidade usuais e normais no comércio em causa, que os ora recorrentes terão exercido a sua actividade de acordo com aqueles padrões contidos nessa amostragem elaborada, em análogas condições em todos os outros exercícios em causa, donde ocorreu a extrapolação – 1992 a 1996 quanto ao IVA, e de 1993 a 1996 quanto ao IRS - onde praticou as margens de comercialização dos produtos vendidos, que lhe foram imputadas pela AF, critério utilizado que, à partida, se não vislumbra que esteja errado, afigurando-se-nos antes, como apto para o fim em vista. Por sua vez, cabia aos recorrentes, terem alegado e provado factos certos e concludentes que pusessem em dúvida (fundada) os pressupostos em que assentou aquele juízo de probabilidade elevado feito pela Administração Fiscal para prova do erro nessa quantificação por métodos indiciários/indirectos. Ou que no caso, haviam ocorrido circunstâncias especiais que levaram a que em relação a tais exercícios dos anos em causa, a actividade fora prestada em condições diferentes das de outros exercícios, logo sendo inferior a margem de comercialização, mercê dessas particularidades. Situação que colocava os impugnantes nas melhores condições para o esclarecerem e provarem, o que não fizeram. Acresce, que para os recorrentes seria muito mais fácil fazer a prova da prática de uma menor margem de comercialização dos produtos vendidos nesses exercícios em causa, do que as consideradas, do que para a Administração Fiscal fazer a prova da manutenção dessa taxa, já que ninguém melhor do que os impugnantes saberão a forma como exerceram a sua actividade nesses exercícios, que por serem factos pessoais àqueles, melhor do que ninguém poderiam ter vindo trazer aos autos as provas concretas desses factos, como lhes cabia, improcedendo também a matéria a tal atinente. 4.3. Também o facto de o Exmo Representante da Fazenda Pública (RFP) não ter contestado as presentes impugnações judiciais, tal facto não importa confissão dos factos articulados pelos impugnantes – art.º 110.º n.º6 e 7 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, na redacção introduzida pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, art.º 112.º na redacção anterior, então já vigente – antes sendo de livre apreciação pelo tribunal, não se vendo em que medida é que tal falta de contestação poderia interferir com o ónus da prova que sobre os impugnantes impende, nos termos supra citados e nem os mesmos o vêm invocar e explicar – cfr. matéria da sua conclusão d). Como refere João António Valente Torrão(13), a falta de contestação não importa a confissão dos factos articulados pelo impugnante ...não tendo efeito cominatório. Deste modo, o impugnante não fica dispensado do ónus da prova que por lei lhe competir. No mesmo sentido vai o acórdão do STA de 5.4.2000, recurso n.º 24 713, ao escrever: O direito processual fiscal não estabelece o princípio da contestação especificada e, por isso, não só o ilustre Representante da Fazenda Nacional está dispensado de contestar, facto por facto, as alegações do oponente, como também o julgador não pode concluir pela verificação de um facto só porque este não foi contestado. Improcedem assim, todas as conclusões do recurso sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu. C. DECISÃO. Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida. Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em catorze UCs. Eugénio Sequeira ( Relator) Francisco Rothes Jorge Lino - ( Vencido. O apuramento do valor tributável por métodos indiciários em IVA e IRS obdece a pressupostos e critérios diferenciados pelo que não me é possivel subscrever o presente acórdão que, a meu ver, não faz essa diferenciação.) Lisboa, 07/06/2005 (1) Cfr. entre outros, os acórdãos do STA de 2.10.1996 (ambos), recursos n.ºs 20472 e 20491 (2) Cfr. neste sentido, entre outros, os acórdãos do STA de 9.4.1997 e de 25.6.1997, recursos n.ºs 21 109 e 20 289, respectivamente. (3) Cfr. Código de Processo Civil Anotado, Vol.V. (Reimpressão), pág. 139 e segs. (4) Cfr. o acórdão do STA de 3.7.1996, recurso n.º 19 672, bem como os demais aí citados. (5) In Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª Edição revista e aumentada, 2000, VISLIS, pág. 473, nota 7. (6) Pág. 320, nota 9. (7) Todas as liquidações em causa ocorreram antes da entrada em vigor da LGT, como se vê dos respectivos PAs apensos. (8) In Código de Processo Tributário, Comentado e Anotado, 4.ª Edição, pág. 275, notas 7. e 8. (9) Cfr. neste sentido o acórdão do STA de 15.1.1997, recurso n.º 17 914. (10) In A Justiça Administrativa (Lições), 2.ª Edição, pág. 269. (11) Cfr. neste sentido o acórdão do então Tribunal Tributário de 2.ª Instância de 5.12.95, recurso n.º 63 479. (12) Cfr. neste sentido, entre outros, o acórdão deste Tribunal de 21.12.1999, recurso n.º 2 417/99, de que o aqui relator foi adjunto. (13) In Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 2005, Almedina, pág. 491, nota 6. |