Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06235/02
Secção:Contencioso Administrativo - 1º Juízo Liquidatário
Data do Acordão:06/08/2006
Relator:Fonseca da Paz
Descritores:EFEITOS DO ACTO RECORRIDO
Sumário:O reconhecimento da invalidade dos efeitos produzidos pelo acto recorrido implica a destruição retroactiva desses efeitos, reportada ao momento da emissão de tal acto, quer se trate de uma sentença de anulação, quer de uma sentença declarativa de nulidade.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª. SECÇÃO, 1º. JUÍZO, DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1. - Maria ...., residente na Rua ..., em Vale Rosal, Charneca da Caparica, interpôs, no TAC de Lisboa, recurso contencioso de anulação da deliberação, de 30/6/99, do Conselho dos Oficiais de Justiça (COJ), que lhe atribuiu a classificação de "Bom Com Distinção", na inspecção realizada ao seu serviço no período de 5/4/95 a 6/10/98.
A esse recurso contencioso foi concedido provimento, tendo-se declarado, ao abrigo do art. 133º, nº 2, al. b), do C.PA., a nulidade da referida deliberação.
Inconformado com a sentença, o C.O.J. interpôs, para este Tribunal, recurso jurisdicional, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões:
"1ª. - Ainda que as normas dos arts. 95º. e 107º al. a) do D.L. 376/87, de 11/12, que, à data da prática do acto, atribuíam competência ao C.O.J. para apreciar o mérito e exercer a acção disciplinar sobre os funcionários de justiça fossem inconstitucionais que não são tal inconstitucionalidade não gera nulidade do acto recorrido;
2ª. - Para ser decretada a nulidade de um acto administrativo ao abrigo da al. b) do nº 2 do art. 133º. do C.P.A. há-de a autoridade administrativa que o praticou desrespeitar a norma que atribua a competência para a prática do mesmo acto a outra autoridade;
3ª. - Ora, no caso concreto, o COJ praticou o acto recorrido ao abrigo de normas ordinárias que expressamente lhe atribuíam essa competência própria e exclusiva, não sendo, por isso, de aplicar o art. 133º nº 2 al. b) do CPA, como fez o Tribunal "a quo";
4ª. - Pelo que, a existir inconstitucionalidade o que não se admite , o acto estaria ferido de mera anulabilidade e não de nulidade. E é sabido que os efeitos são bem diferentes;
5ª. - Tem sido jurisprudência firme do Ven. STA que o acto que aplica norma inconstitucional não é nulo, estando viciado por erro nos pressupostos de direito, que integra violação de lei, causal de mera anulabilidade;
6ª. - Assim, a douta sentença recorrida não devia ter declarado a nulidade do acto como declarou;
7ª. - Mas também não o devia declarar anulável, pois, ao contrário do decidido, os arts. 95º. e 107º. do D.L. nº. 376/87, de 11/12, não são inconstitucionais, pois não violam quer o art. 218º. nº 3 da CRP, quer qualquer outro comando constitucional, pois,
8ª. - o art. 218º. nº 3 da C.R.P. não atribui qualquer competência, muito menos exclusiva, ao CSM, em matéria de jurisdição sobre os funcionários judiciais;
9ª. - Permite apenas, como claramente resulta do seu teor, que o legislador ordinário alargue a composição do CSM, definida no nº 1 deste preceito constitucional, de forma a que dele façam parte funcionários de justiça eleitos pelos seus pares e com intervenção restrita à discussão das matérias relativas à apreciação do mérito e exercício da função disciplinar se a lei ordinária lhe atribuir tal competência;
10ª. - Ora, não há qualquer lei ordinária que atribua tal competência ao CSM. Pelo contrário, tal competência já esteve atribuída àquele Conselho, mas foi-lhe retirada pelo legislador ordinário da Lei nº. 10/94, de 5/5, que alterou o disposto nos arts 136º., nº 2, 137º, nº 2 e al. b) do art. 149º., todos da Lei nº 21/85 (Estatuto dos Magistrados Judiciais);
11ª. - Com estas alterações, é axiomático que actualmente o CSM não tem competência para exercer a jurisdição sobre os funcionários judiciais;
12ª. - Mas também a C.R.P. não atribui tal competência ao CSM. Se o pretendesse, fá-lo-ia na sede legal própria onde se prevê as competências do CSM o art. 217º. da CRP. E em tal preceito não constam estas competências;
13ª. - Acresce que a questão da inconstitucionalidade material dos arts. 95º. e 107º. al. a) do D.L. 376/87, de 11/12, foi afastada pelo STA, entre outros, no Ac. de 8/3/94 Proc. nº. 30652, bem como pelo TAC de Lisboa, através das decisões referidas no ponto 20º. destas alegações;
14ª. - Ao decidir como decidiu, o Tribunal "a quo" violou o art. 133º. nº 2 al. b) do C.P.A.;
15ª. - Assim como violou os arts. 95º. e 107º do D.L. nº 376/87, de 11/12 e o art. 218º. nº 3 da CRP".
A recorrida não contra-alegou.
A digna Magistrada do M.P. junto deste Tribunal emitiu parecer, onde concluíu pela improcedência do recurso.
Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à Conferência para julgamento
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2.1. A matéria de facto pertinente é a que foi considerada provada na sentença recorrida, a qual se dá aqui por reproduzida, nos termos do nº 6 do art. 713º. do C.P. Civil.
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2.2. A sentença recorrida, considerando inconstitucionais as normas dos arts. 95º. e 107º. do Estatuto dos Oficiais de Justiça aprovado pelo D.L. nº. 376/87, de 11/12, por violação do nº 3 do art. 218º da CRP, entendeu que a deliberação impugnada enfermava de nulidade, por falta de atribuições do COJ para exercer a avaliação do mérito profissional da recorrente contenciosa, tendo, por isso, concedido provimento ao recurso e declarado a nulidade daquela deliberação.
Nas conclusões 7ª. a 13ª. e 15ª. da sua alegação, o ora recorrente contesta que as referidas normas sejam inconstitucionais, por o art. 218º., nº 3, da CRP, não atribuir ao Conselho Superior de Magistratura competência para avaliar o mérito profissional dos funcionários judiciais.
Mas essas conclusões não podem proceder.
Efectivamente, pelo Ac. nº. 73/2002, de 20/2/2002 (publicado no D.R., I Série A, de 16/3/2002), o Tribunal Constitucional declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, das normas constantes dos arts. 95º e 107º., al. a), do D.L. nº. 376/87, na parte em que delas resultava a atribuição ao C.O.J. da competência para apreciar o mérito e exercer a acção disciplinar relativamente aos oficiais de justiça.
Ora, a declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, que produz efeitos desde a entrada em vigor das normas legais em causa, é vinculativa para todas as entidades públicas e privadas.
Assim, tendo este Tribunal que respeitar a referida declaração, não há dúvidas que as aludidas normas são inconstitucionais, motivo por que a sentença recorrida não merece, nesse aspecto, a censura que lhe é dirigida pelo recorrente.
Nas conclusões 1ª. a 6ª. e 14ª da sua alegação, o recorrente sustenta que, a verificar-se a inconstitucionalidade em questão, a sanção não seria a da nulidade da deliberação recorrida mas a da mera anulabilidade.
Afigura-se-nos, porém, que essa questão de saber se o vício em causa deve ser sancionado com a nulidade ou com a anulabilidade mostra-se, no caso, completamente irrelevante e destituída de qualquer efeito prático.
Efectivamente, o reconhecimento da invalidade dos efeitos produzidos pelo acto recorrido implica a destruição retroactiva desses efeitos, reportada ao momento da emissão de tal acto, quer se trate de uma sentença de anulação, quer de uma sentença declarativa de nulidade. As consequências da anulação ou da declaração de nulidade serão, pois, exactamente iguais.
Assim, porque o recorrente em nada pode beneficiar da procedência das referidas conclusões, não deve o Tribunal delas conhecer
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3. Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.
Sem custas
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Entrelinhei: retroactiva
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Lisboa, 8 de Junho de 2006

as.) José Francisco Fonseca da Paz (Relator)
António Ferreira Xavier Forte
Carlos Evêncio Figueiredo Rodrigues de Almada Araújo