Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 725/12.8 BESNT |
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Secção: | CT |
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Data do Acordão: | 06/01/2023 |
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Relator: | PATRÍCIA MANUEL PIRES |
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Descritores: | MAIS VALIAS CUSTOS DE CONSTRUÇÃO FATURAÇÃO E PAGAMENTO POR TERCEIRO |
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Sumário: | I-De harmonia com o consignado nos artigos 9.º e 10.º do CIRS, são tributadas em sede de IRS as mais-valias, nele plasmadas, designadamente, os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem da alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis. II-Para efeitos de cálculo das mais-valias, o legislador consagrou que no caso de imóveis construídos pelo próprio sujeito passivo, e para concreto apuramento da determinação do valor de aquisição, que o mesmo corresponde ao VPT inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele (cfr. artigo 46.º, nº3 do CIRS). III-Infere-se da letra e da ratio legis subjacente ao normativo 46.º, nº3 do CIRS que para efeitos da assunção do valor de aquisição, a construção tem de ser materializada, suportada e devidamente comprovada pelo sujeito passivo. IV-Subjacente à tributação enquanto mais valias encontra-se um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito passivo alienante, que tem como norteador o princípio da capacidade contributiva, daí derivando que só poderá ser aditado enquanto valor integrativo ao montante do terreno os custos de construção que forem, efetivamente suportados e devidamente comprovados, pelo próprio sujeito passivo, na medida em que o incremento na esfera patrimonial deve ser proporcional ao concreto aumento do poder aquisitivo, donde, tributado em razão da concreta contribuição/capacidade contributiva. V-Esta é interpretação que se coaduna com o princípio da realização ínsito na tributação e cômputo das mais valias, com o princípio do rendimento acréscimo norteador do IRS, e que se visa a igualdade a própria neutralidade. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | I-RELATÓRIO
A… veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o ato de liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) n.º 2013 5000020742, relativa ao ano de 2010, no valor de €66.545,65. A Recorrente apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “I - MATÉRIA DE FACTO 1. No ponto 8 da Fundamentação de facto da douta sentença recorrida, lê-se: “Em 19/5/2008, a moradia descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra, sob o registo n.º 2… e com o artigo matricial 6… da freguesia de S. P… era propriedade de A… e de B… (cf. fls. 12 dos autos).” O que não corresponde à verdade. 2. Certo é que, como resulta do doc. adiante junto (certidão do Registo Predial), em 19/05/2008, do prédio em causa nos presentes autos, eram, respectivamente, - proprietária: A… (cfr. doc 1, pag.14, inscrição G-7, adiante junto e aqui dado por integralmente reproduzido); e - usufrutuários: Anna M… e de B…. (cfr. doc 1, pag.14, inscrição F-7, adiante junto e aqui dado por integralmente reproduzido). 12 3. Assim, deverá o ponto 8 da Fundamentação de facto ser alterado, passando a ter a seguinte redação: “Em 19/5/2008, a moradia descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra, sob o registo n.º 2… – fracção autónoma designada pelas letras “D-AB”- e com o artigo matricial 6… da freguesia de S. P… era propriedade de A…, com usufruto simultâneo e sucessivo registado a favor de B… e mulher Anna M….” II – QUESTÃO DE DIREITO 4. Entendeu a Mmª. Juiz a quo que: os custos de construção da moradia ficaram provados nos autos, porém, a Impugnante não pode deduzir fiscalmente custos que não tenha suportado, porque o direito à dedução fiscal de custos não é transmissível entre sujeitos passivos, nem pela consolidação da propriedade por extinção do usufruto. 5. Este entendimento, carece em absoluto de fundamento porque confunde os custos de construção - que, naturalmente, respeitam à moradia e cujos valores nela se integraram – com um alegado direito (pessoal) à dedução fiscal de custos. 6. Nos presentes autos está em causa, apenas, a determinação do Valor de aquisição de bem imóvel a título oneroso. 7. Está provado nos autos que o valor do terreno, acrescido dos custos de construção, devidamente comprovados, é superior ao valor patrimonial do imóvel inscrito na matriz. 8. Os custos a que a Lei manda atender, são os custos inerentes ao processo de construção da moradia edificada /incorporada no terreno, desde que devidamente comprovados, independentemente de terem sido suportados pelo sujeito passivo ou por outrem (cfr. douta decisão arbitral proferida pelo CAAD citada no corpo da presente alegação). 9. Os custos de construção são um elemento de valorização directa do imóvel não tendo a natureza de “direito a dedução fiscal”. 10. Se o imóvel atingiu o valor de €578.046,00 (preço de venda) foi porque nele se incorporou o custo de construção da moradia, preço que seria muito inferior se nele não tivesse sido incorporado o valor da moradia, ou se o custo de construção da mesma tivesse sido substancialmente inferior. 11. A AT não pode deixar de considerar o valor do terreno, com a moradia, como valor de aquisição, sob pena, caso contrário, de, em vez de taxar a mais-valia realizada, taxar o património, o que carece em absoluto de suporte legal. 12. Foi considerado que as facturas e comprovativos de pagamentos juntos aos autos demonstram que as despesas que titulam dizem respeito à construção da moradia em causa. 13. Após a compra pela Apelante da raiz ou nua propriedade do lote de terreno para construção em causa, quer o lote, quer a moradia nele construída posteriormente, independentemente de quem custeou a respectiva construção, sempre pertenceram à Apelante. 14. O sujeito passivo, com direito à dedução fiscal dos custos, é o proprietário, alienante do imóvel construído (artigos 10º, nº1, al. a) e 46º, nº. 3 do CIRS). 15. No presente caso, esse direito de propriedade (que foi gozado temporariamente pelos seus pais, enquanto usufrutuários), foi adquirido pela ora Apelante em 29-09-1995 e a moradia, construída em 1997, incorporou-se no terreno, pelo que, a raiz ou nua propriedade de todo o imóvel – terreno e moradia – sempre pertenceu à Apelante (art. 1212º, nº. 2 do C.C.). 16. O “direito à dedução dos custos de construção” que é inerente ao próprio imóvel, nasceu, ab initio, na esfera jurídica da Apelante e não na esfera jurídica dos seus Pais, não tendo ocorrido qualquer transmissão, nem por via sucessória, nem por via da consolidação da nua-propriedade com o usufruto. 17. Assim, a Apelante adquiriu o direito de propriedade do terreno em 29-09-1995, pelo preço de €49.879,79, os custos de construção da moradia nele implantada, ascenderam a €406.008,64, pelo que, para efeito de liquidação do IRS, deverá ser considerado como valor de aquisição do imóvel alienado o de €455.888,43, por ser um valor superior ao valor patrimonial tributário do imóvel que, em 11.12.2009, era de 169.654,84€. 18. O referido valor de aquisição do imóvel de €455.888,43, depois de corrigido por aplicação do coeficiente legal de 1,39, (1997), correspondia a €633.684,91, à data da venda, (artigo 50º, nº 1 e nº 2, al. a) do CIRS e Portaria n.º 282/2011, de 21 de Outubro). 19. Tendo em conta que o valor de alienação foi de €578.046,00, a Apelante não realizou qualquer mais-valia com a venda do imóvel, pelo que não há lugar ao pagamento de imposto, impondo-se a revogação da douta sentença recorrida. 20. Com o devido respeito e salvo melhor opinião, entende a Apelante que feita errada interpretação do disposto no nº. 3 do artigo 46º do CIRS ao considerar como valor de aquisição o valor patrimonial tributário quando deveria ter considerado o valor do terreno acrescido dos custos de construção da moradia. 21. Fundamento específico da recorribilidade: decisão proferida em causa com valor superior à alçada da 1ª instância, que põe termo à causa, desfavorável à Impugnante/Apelante. Nestes termos e nos mais de direito, que Vossas Excelências doutamente se dignarão suprir, deverá a presente Apelação ser julgada integralmente procedente e, consequentemente, revogada a douta sentença recorrida, que deverá ser substituída por acórdão que julgue a acção procedente, com a consequente condenação da Ré nos pedidos, com as inerentes consequências legais e custas a seu cargo. Assim fazendo esse Venerando Tribunal, como é seu timbre, a habitual JUSTIÇA!” *** O Recorrido não apresentou contra-alegações. *** A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso. *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:
1. Em 29/9/1995, por escritura lavrada a fls. 28 e segs. do Livro n.º 180-G do 1° Cartório Notarial de Lisboa, a sociedade C…, S.A. vendeu à Impugnante A… a raiz ou nua propriedade da fracção autónoma individualizada pelas letras D-AB, Lote 1…, número …, constituída por lote destinado moradia a construir, de 2 pisos com jardim, pátio e terraços, sendo uma das frações autónomas em que se desdobra a fração autónoma designada pela letra “D”, fração autónoma esta que corresponde ao Aldeamento Turístico designado pela letra “B”, sito na freguesia de S. P…, concelho de Sintra, a qual, por sua vez faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal situado nas freguesias de S. P…, da 1.ª Conservatória do Registo Predial de Sintra, omisso na respetiva matriz, pelo preço de EUR 49.879,79 (cf. cópia da escritura constante de fls. 26 a fls. 31 dos autos). 2. Através da escritura descrita no ponto que antecede, a sociedade C…, S.A. vendeu ainda a B… e mulher Anna M… o usufruto simultâneo e sucessivo do terreno urbano identificado no ponto que antecede pelo preço de EUR 14.664,66 (cf. cópia da escritura constante de fls. 26 a fls. 31 dos autos). 3. Em 5/7/1994, foi celebrado o contrato de construção no lote descrito no ponto 1 que antecede, entre a C…, S.A. a Impugnante e B… e mulher Anna M…, no valor total de ESC 69.674.754$00, constante de fls. 32 a fls. 38 dos autos, cujo conteúdo se dá por reproduzido. 4. Os pagamentos efetuados à construtora C…, S.A., para pagamento da construção no lote descrito no ponto 1, foram realizados através de cheques e transferências efetuadas por B…, a quem foram emitidas pela construtora todas as faturas, conforme cópias das faturas e cheques constantes de fls. 41 a fls. 69 dos autos. 5. Em 8/9/1998, o município de Sintra emitiu a licença de utilização n.º 7…/98 – processo n.º OB/2257/1994, relativa a uma moradia, sito na Estrada da L…, n.º …, na localidade de L…, freguesia de Sintra (São P…, do Concelho de Sintra) (certidão constante de fls. 70 dos autos). 6. Em 19/10/2004, faleceu Anna M… (cf. fls. 71 dos autos). 7. Em 27/4/2008, faleceu B… (cf. fls. 73 dos autos). 8. Em 19/5/2008, a moradia descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra, sob o registo n.º 2… e com o artigo matricial 6… da freguesia de S. P… era propriedade de Anna M… e de B… (cf. fls. 12 dos autos). 9. Em 15/1/2009, a Impugnante A… celebrou com a “M…, Lda.” o contrato de mediação imobiliária constante de fls. 83 dos autos. 10. Em 11/12/2009, o valor patrimonial da fração autónoma designada pela letra situado na freguesia de São P…, concelho de Sintra, descrito na primeira conservatória do Registo Predial de Sintra sob p n.º 2…, e inscrito na matriz sob o artigo 6…. da freguesia de S. P… era de EUR 169.654,84 (cf. fls. 72 do PAT). 11. Em 26/2/2010, no Cartório Notarial, em Sintra, a Impugnante A… por intermédio de procuradora, vendeu a E…, pelo preço EUR 578048,00, a fração autónoma designada pela letras D-AB, correspondente ao lote …, n.º …, formada por moradia de dois pisos, resultante do desdobramento da fração autónoma designada pela letra D que corresponde ao Aldeamento turístico designado pela letra B, situado na freguesia de São P…, concelho de Sintra, descrito na primeira conservatória do Registo Predial de Sintra sob p n.º 2…, e inscrito na matriz sob o artigo 6…. da freguesia de S. P… (cf. cópia da escritura de compra e venda constante de fls. 77 a fls. 79 dos autos). 12. Na Escritura de Compra e venda descrita no ponto que antecede é mencionado que no negócio de compra e venda interveio a mediadora imobiliária “M…, Lda.” (cf. cópia da escritura de compra e venda constante de fls. 77 a fls. 79 dos autos). 13. Em 26/1/2012, após a liquidação do IRS do ano de 2010, foi apresentada pela Impugnante a declaração modelo 3 de IRS constante de fls. 61 do PAT, cujo conteúdo se dá por reproduzido, na qual declarou como valor de aquisição o preço de aquisição do lote de terreno no valor de EUR 49.879,79 mais o valor de EUR 14.664,66 relativo ao valor pago pelos pais da Impugnante pelo usufruto do terreno. 14. Em 22/2/2012, a Administração Tributária emitiu a liquidação de IRS n.º 2012 5000020742, relativa ao exercício de 2010, no valor de EUR 89.994,35 (cf. demonstração constante a fls. 99 do PAT) 15. Em 5/4/2012, a Impugnante apresentou nova declaração modelo 3 de IRS constante de fls. 64 do PAT, cujo conteúdo se dá por reproduzido, na qual declarou o valor de aquisição do imóvel e os custos de construção, bem como as despesas e encargos com a mediação imobiliária. 16. Em 2/3/2012, a Administração Tributária emitiu a liquidação oficiosa de IRS n.º 2012 5000024447, relativa ao exercício de 2010, no valor de EUR 95.386,42 (cf. demonstração constante a fls. 102 do PAT) 17. Em 16/4/2012, a Impugnante apresentou a reclamação graciosa constante de fls. 2 a fls. 67 do PAT, cujo conteúdo se dá por reproduzido, na qual contesta as liquidações de IRS relativas aos anos de 2010, n.º 20742 e a liquidação n.º 24447. 18. Em 29/1/2013, o Chede de Divisão no âmbito de subdelegação de competências proferiu o despacho de deferimento parcial da reclamação apresentada, constante de fls. 96 e seguintes do PAT, cujo conteúdo se dá por reproduzido, com os seguintes fundamentos: “(…) Vem o contribuinte supra identificado, nos termos do disposto no art.° 68° do Código de Procedimento e Processo Tributário, reclamar contra a(s) liquidação(ões) de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, relativa(s) a(os) rendimentos do(s) ano(s) de 2010, respectivamente com o(s) n.°(s) 5530024447, efectuada(s) em 20/02/2012 na(s) quantia(s) de € 95.386,42, cujo prazo de apresentação se iniciou em 11/04/2012. A reclamação em causa, foi apresentada em 16/04/2012, com os fundamentos que se reproduzem resumidamente de seguida: O requerente vem contestar a liquidação de IRS referente ao ano de 2010 com os fundamentos que sucintamente se descrevem: por escritura de 1995-09-29, a reclamante adquiriu pelo preço de € 49 879,79, a nua propriedade do prédio descrito na 1o Conservatória de Registo Predial com o n° 0…….-D-AB da freguesia de S. P…, omisso na matriz predial urbana da mesma freguesia. Na mesma data, foi adquirido pelos seus pais, o " usufruto simultâneo e sucessivo ", pelo preço de € 14. 664,66. O referido prédio era constituído por um lote de terreno para construção, onde os usufrutuários, construíram uma moradia, tendo suportado encargos com a construção na quantia de € 406 008,64. A casa foi concluída em Abril de 1996, sendo emitida a respetiva licença de habitação em 1998-09-08. Em 2004-10-19 faleceu a mãe da reclamante e em 2008-04-27 faleceu o pai, consolidando-se a " propriedade do prédio no sujeito passivo ora reclamante "; esta, em 2010-02-26 vendeu o imóvel em causa, pelo preço de € 578 046,00, tendo sido interveniente na venda, a mediadora imobiliária " M…, Lda ". A reclamante apresentou, já após uma liquidação de IRS, uma declaração Mod. 3, na qual por lapso, indicou como valor de aquisição o preço de aquisição do lote identificado no anterior artigo 2o (valor do terreno= € 49.879,79 + € 14 664,66 ), não tendo sido indicado o custo da construção da referida moradia. Assim, pretende a reclamante, que seja considerado como valor de aquisição do imóvel alienado o valor de € 455 888,43 ou seja: valor do terreno - nua propriedade- acrescido de custos de construção) no ano de 1997. Pretende ainda, que seja considerado o valor das despesas na quantia de € 21 600,00, II - ANÁLISE DA RECLAMAÇÃO GRACIOSA A presente reclamação graciosa é legal (art.° 68° do CPPT), tempestiva (n.°s 1 do art.° 70° do CPPT) e o reclamante tem legitimidade (art.° 65° LGT e art.° 9.º do CPPT), pelo que é necessário apreciar do mérito da sua pretensão. O Serviço de Administração do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares procedeu à liquidação de imposto, resultando a(s) liquidação(ões) n.°(s) 5530024447 efectuada(s) em 20/02/2012, e em função dos elementos constantes deste processo e consultados os dados informáticos através do sistema central de informação da Autoridade Tributária e Aduaneira, verifica-se que as alegações do reclamante, têm parcialmente fundamento, dado que: Compulsados os elementos constantes dos autos em apreciação, foi possível concluir o seguinte : A reclamante por escritura de 1995-09-29, adquiriu pelo preço de € 49 879,79 a " Nua propriedade" do prédio descrito na 1a Conservatória do Registo Predial com o n° 0……-D-AB da freguesia de S. P… ; Na mesma data, os pais da reclamante, adquirem o " usufruto simultâneo e sucessivo" , pelo preço de € 14.664,66. Os usufrutuários, ( pais da reclamante ) construíram no terreno uma moradia, tendo suportado encargos com a construção no valor de € 406 008,64, tendo a casa ficado concluída em Abril de 1996 . Após a morte dos pais, a reclamante adquire a " Consolidação da propriedade do prédio “. Em 2010-02-26 procedeu à venda do prédio em questão, pela quantia de € 578 046,00. Pelo exposto, verificamos que a aquisição do citado prédio pela reclamante em 2008, foi uma " aquisição a título gratuito ", e assim sendo, para determinação dos ganhos sujeitos a IRS considera-se como valor de aquisição dos bens adquiridos a título gratuito, o estabelecido na alinea a) n° 1 do art° 45° do CIRS - Código do IRS, que preceitua: " o valor que tenha sido considerado para efeitos do imposto do selo Após, consulta ao sistema informático vigente nesta ATA - Autoridade Tributária e Aduaneira, nomeadamente, na consulta à liquidação do imposto de Selo, foi possível verificar, conforme consta a fls. 72, dos autos em apreciação, que o Valor Tributável, resultante da liquidação é na quantia de € 169 654,84. Dada a situação fática, será o valor de € 169 654,84, que será colocado no Quadro 4 - na coluna da aquisição - campo 402 do " Anexo G " da declaração de rendimentos Mod. 3 de IRS/ 2010, por ser o valor correcto. Importa referir, que as despesas com a construção da moradia, não são consideradas, uma vez que não foram suportadas pela reclamante, mas sim, pelo seu pai, Sr. B… . Quanto aos serviços de mediação, efectuados pela empresa " M…, Lda " cuja cópia da factura se encontra a fls. 60 dos autos em análise , somos a informar o seguinte : prevê o n° 5 do art° 36 do Código do IVA que " ... as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos, alínea a) ...os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ,ou do prestador de serviços e do destinatário ou do adquirente, bem como os números de identificação fiscal dos sujeitos passivos do imposto. Ora após análise da factura, emitida pela citada Mediadora, constante a fls. 60 dos autos, verifica-se que na mesma, não consta o nome do adquirente a quem o serviço foi prestado, nem o respectivo número de identicação fiscal, obviamente , a consequência lógica de tal facto, é a não aceitação da mesma , sendo de retirar do Anexo G, as despesas e encargos aí constantes. Pelas razões aduzidas, propomos um Deferimento Parcial da presente reclamação, sendo de proceder à correcção da liquidação reclamada, como se propõe : aceitando como valor de aquisição o VP de € 169 654,84, cfr. consta a fls. 72, que será inscrito no Quadro 4 do Anexo G, da declaração Mod. 3 de IRS/2010 como anteriormente se disse. Contudo as despesas suportadas , com a mediação do imóvel, serão retiradas, pois a factura não obedece ao preceituado no n° 5 do art° 36° do já citado Código do IVA. III - EXERCÍCIO DO DIREITO DE AUDIÇÃO Assim sendo, e porque se propôs que a presente reclamação graciosa não fosse deferida na totalidade, houve lugar a audição prévia nos termos da alinea b) do n.° 1 do art.° 60° da Lei Geral Tributária, tendo o reclamante apresentado exposição, conforme consta a fl(s). 84 a 95, de onde se retira as seguintes conclusões: (…) A reclamante apresentou a sua declaração de rendimentos para efeitos de IRS do ano de 2010, tendo considerado no Anexo G, como valor de Aquisição, o valor de compra da nua propriedade em 1995, de € 49 879,79 e ainda o valor de aquisição a título gratuito correspondente à data em que se deu a consolidação da nua propriedade, no montante de € 14 664,66 correspondente ao valor do usufruto à data. Verificou a reclamante ter havido erro nos valores de aquisição, pois não indicou o valor da construção da moradia (€ 406 008,64). Pretende assim, seja considerado o valor de aquisição € 455 888,43, constituído pelo valor de aquisição da nua propriedade acrescido dos custos de construção. Tal pretensão, não é passível de atendimento, como já se explanou anteriormente no projecto de decisão. Importa referir que não há evidências nos autos de que as despesas com a construção da moradia, tenham sido suportadas pela reclamante, dado que as facturas, se encontram emitidas em nome de " Eng. B… " assim como, também se verifica pelas cópias dos cheques emitidos pelo Banco Espirito Santo, que os mesmos são do Sr. B…. Alega a reclamante, que não está provado nos autos que tenham sido os usufrutuários a fazer a construção. Porém, dos documentos juntos aos autos, retira-se precisamente o contrário, pois como já foi dito, encontram-se todos emitidos em nome do usufrutuário, pelo que não podem colher os fundamentos alegados no que a este assunto concerne, na medida em que se encontram destituídos de fundamento legal. Quanto à factura da empresa de mediação M… junta aos documentos do direito de audição, constante nos autos em apreço, a fls. 94, não se aceita, uma vez que existem indícios de que a mesma foi posteriormente corrigida. Dada a situação fática, sou de parecer que a decisão dada anteriormente no Projecto de Decisão, se deve manter, pelas razões aduzidas . (…)” 19. Em 26/2/2013, a Administração Tributária emitiu a liquidação oficiosa de IRS n.º 2013 5000020742, relativa ao exercício de 2010, no valor de EUR 66.545,65, na qual foram consideradas como despesas de aquisição o valor despendido com o terreno no valor de EUR 49.879,79 e o valor patrimonial do imóvel construído de EUR 169.654,84 (cf. demonstração constante a fls. 118 a fls. 121 dos autos)
Consta na decisão recorrida como factualidade não provada o seguinte: “A - Não provado que a Impugnante tenha despendido o valor de EUR 21.600,00 com os serviços de mediação imobiliária, por inexistência de documento comprovativo válido do pagamento.” *** Resulta expresso em termos de motivação da matéria de facto que “não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afetar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados. Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na documentação junta com os articulados e no processo administrativo junto aos autos, cuja veracidade não foi posta em causa.” *** III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRS, referente ao ano de 2010, no montante de €66.545,65. Em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso. Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao ter decidido que os custos de construção da moradia não podem ser computados para efeitos do apuramento da mais valia, concretamente do valor de aquisição, na medida em que não foram suportados pela Impugnante, ora Recorrente, mas antes pelos usufrutuários do imóvel. Vejamos, então. Previamente à alteração da matéria de facto e eventual aditamento, no âmbito dos poderes de cognição deste Tribunal, e por a mesma contender com a documentação junta com as alegações de recurso cumpre aferir da admissibilidade do visado documento. A lei processual civil, concretamente o artigo 425.º e bem assim o normativo 651.º do CPC, possibilita a junção de documentos ao processo em fase de recurso apenas quando não tenha sido possível a respetiva apresentação em momento anterior (artigo 425.º, nº1, do CPC) ou quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância (artigo 651.º, nº.1, do CPC); O STA, por Acórdão proferido em Recurso de Revista (1) Cfr. Acórdão de 27-5-2015, proferido no processo n.º 570/14; Vide, igualmente, o Acórdão do TCA Sul proferido no processo nº 07915/14, de 08 de junho de 2017. julgou que “são três, e não dois, os fundamentos excepcionais justificativos da apresentação de documentos com as alegações de recurso: (i) quando os documentos não tenham podido ser apresentados até ao termo do prazo para apresentação das alegações a que se refere o art. 120.º do CPPT (encerramento da discussão da causa na 1.ª instância); (ii) quando os documentos se destinem a provar facto posteriores aos articulados ou a sua junção se tenha tornado necessária, por virtude de ocorrência posterior; (iii) quando a sua apresentação apenas se revele necessária devido ao julgamento proferido em 1ª instância”. Sendo certo que, a verificação das circunstâncias supra identificadas têm, necessariamente, como pressuposto basilar que os factos documentados sejam pertinentes à decisão a proferir, o que decorre, desde logo, da circunstância dos documentos cuja junção se pretende visarem a prova dos fundamentos da ação e/ou da defesa e, bem assim da circunstância de o juiz se encontrar vinculado a ordenar o desentranhamento do processo dos que sejam impertinentes ou desnecessários (2) Vide José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.96 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 4ª. Edição, 2017, pág.229 e seg.. In casu, o documento constante de fls. 624 a 639 da plataforma SITAF, cumpre os aludidos requisitos, na medida em que a sua apresentação apenas se revelou necessária devido ao julgamento proferido em 1ª instância, sendo certo que a realidade de facto neles retratada é não controvertida. Com efeito, ambas as partes aquiescem que a Impugnante era titular da nua propriedade –aliás realidade plasmada nos pontos 1 a 3 da factualidade assente- sendo que a AT, com base na caderneta predial, vem patentear que a mesma se encontra declarada, em nome dos usufrutuários e enquanto titulares do rendimento e “propriedade plena”. Note-se, neste concreto particular, que foi o teor do número 8 da factualidade assente que demandou a necessidade de junção da aludida certidão da caderneta do registo predial. E por assim ser, admite-se o aludido documento e com base nele, na medida em que documentalmente demonstrada e não controvertida adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade: 20) Mediante Apresentações 53/990310 e 54/990310 e 2401/20090910, foram registadas junto da Conservatória do Registo Predial de Sintra, relativamente ao bem imóvel descrito em A), as inscrições que infra se descrevem: «Imagem no original» «Imagem no original» «Imagem no original» (cfr. fls. 624 a 639 da plataforma SITAF, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido); *** Prosseguindo com o erro de julgamento de facto. Com base no documento junto a fls. 624 a 639 da plataforma SITAF, requer a Recorrente que se proceda à alteração do facto contemplado no ponto 8, por a asserção nele contemplada se encontrar em desconformidade com o teor da certidão da Conservatória do Registo Predial de Sintra, peticionando, assim, que passe a constar a seguinte redação: “Em 19/5/2008, a moradia descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra, sob o registo n.º 2… – fracção autónoma designada pelas letras “D-AB”- e com o artigo matricial 6… da freguesia de S. P… era propriedade de A…, com usufruto simultâneo e sucessivo registado a favor de B… e mulher Anna M….” Atentemos, então, no teor do ponto 8 da factualidade assente, do qual resulta a seguinte redação: “8. Em 19/5/2008, a moradia descrita na Conservatória do Registo Predial de Sintra, sob o registo n.º 2… e com o artigo matricial 6…. da freguesia de S. P… era propriedade de Anna M… e de B… (cf. fls. 12 dos autos).” De facto, o teor do aludido ponto do probatório não se pode manter na medida em que, por um lado, é conclusivo, e por outro lado, não representa a asserção constante do meio probatório evidenciado, concretamente do teor do documento de fls. 12 dos autos, estando inclusive em contradição com a factualidade evidenciada em 1 a 3. No entanto, a redação proposta pela Recorrente não pode lograr provimento na medida em que, igualmente, conclusiva. Assim, o Tribunal procede à alteração da factualidade constante no ponto 8, por forma a que fique a retratar a realidade de facto que se encontra contemplada no documento de fls. 12 e 13 dos autos, concretamente, da caderneta predial, passando, assim, a assumir a seguinte redação: 8. A 19 de maio de 2008, resultava inscrito na Caderneta Predial emitida pelo-Serviço de Finanças de Sintra-1, respeitante ao bem imóvel sito na Estrada da L…, na Quinta da P…, melhor identificado em 1) e 5) supra, no campo inerente à titularidade, o que infra se descreve: «Imagem no original» (cfr. fls. 12 e 13 dos autos e 18 e 19 da plataforma SITAF, cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido); *** Aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto, cumpre, então, aquilatar do erro de julgamento por errónea apreciação dos pressupostos de facto e de direito. Apreciando. A Recorrente alega que não obstante a decisão recorrida consigne provados os custos de construção da moradia, ajuíza, erroneamente, que os mesmos não podem ser deduzidos, na medida em que não foram suportados por si, mas sim pelos usufrutuários, o que carece em absoluto de fundamento legal porquanto confunde os custos de construção com um alegado direito pessoal à dedução fiscal de custos. Mais propugna que, os custos a que a Lei manda atender, são os custos inerentes ao processo de construção da moradia edificada /incorporada no terreno, desde que devidamente comprovados, independentemente de terem sido suportados pelo sujeito passivo ou por outrem, na medida em que os mesmos representam um elemento de valorização direta do imóvel não tendo a natureza de “direito a dedução fiscal”. Advoga, assim, que o sujeito passivo, com direito à dedução fiscal dos custos, é o proprietário, alienante do imóvel construído (artigos 10.º, nº1, alínea a) e 46º, nº 3, do CIRS), sendo que esse direito nasceu, ab initio, na esfera jurídica da Recorrente e não na esfera jurídica dos seus pais, enquanto meros usufrutuários. Conclui, para o efeito, que tendo a Recorrente adquirido o direito de propriedade do terreno em 29 de setembro de 1995, pelo preço de €49.879,79, e ascendendo os custos de construção da moradia nele implantada, a €406.008,64, ter-se-á de computar como valor de aquisição do imóvel alienado o montante de €455.888,43, porquanto superior ao VPT, o qual após a aplicação dos correspondentes coeficientes legais, cifrar-se-ia em €633.684,91, não comportando, por isso, qualquer valor a tributar enquanto mais valia. Assim o não entendeu o Tribunal a quo, tendo esteado a improcedência da seguinte forma: “[o]s custos de construção do imóvel foram comprovadamente suportados pelos usufrutuários do terreno, Anna M… e B…, conforme faturas e comprovativos de pagamento juntos aos autos e em consonância com esse facto, o imóvel em 19/5/2008, após o falecimento dos usufrutuários, detinha como titulares do direito de propriedade na caderneta predial Anna M… e B….” (…) “[a]consolidação da propriedade com o usufruto, através da extinção do usufruto de Anna M… e B… não transfere para a Impugnante o direito de deduzir fiscalmente os encargos suportados pelos usufrutuários na construção do imóvel. A Impugnante não pode pretender deduzir custos de construção que não comprova terem sido suportados por si, mas sim pelos seus pais, detentores do usufruto do terreno, onde a fração foi construída. A Impugnante enquanto sujeito passivo pode deduzir fiscalmente custos que efetivamente e comprovadamente tenha suportado, uma vez que o direito à dedução fiscal de custos não é transmissível entre sujeitos passivos nem por via sucessória nem pela via da consolidação do direito do usufruto com o direito de propriedade de raiz. No que se refere ao valor alegadamente pago pelos serviços de mediação imobiliária, a Impugnante efetivamente não apresenta nem em sede de reclamação, nem com a presente impugnação, documentos válidos que comprovem a efetividade da alegada despesa, os documentos juntos estão rasurados e incompletos, sem referência numerológica de um livro de recibo ou fatura, contudo, apesar da clara deficiência e insuficiência dos mesmos, também não foi apresentado qualquer comprovativo de pagamento. Face ao exposto, devem improceder na totalidade as alegações apresentadas pela Impugnante.” Vejamos, então, se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento no atinente ao âmbito e extensão dos custos de construção e se, in casu, os mesmos deveriam ter sido valorados e ponderados para efeitos de cálculo da mais valia, concretamente enquanto elementos a computar para efeitos de determinação do valor de aquisição. Comecemos, então, por convocar o quadro jurídico atinente ao efeito. De harmonia com o consignado nos artigos 9.º e 10.º do CIRS, são tributadas em sede de IRS as mais-valias, nele plasmadas, designadamente, os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de “[a]lienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afetação de quaisquer bens do património particular a atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário”. Mais preceitua o artigo 10.º, nº4, do CIRS, que: “4 - O ganho sujeito a IRS é constituído: a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso, nos casos previstos nas alíneas a), b) e c) do nº 1”. No concernente ao cálculo das mais-valias, há que chamar à colação o consignado nos artigos 43.º e seguintes do CIRS. Preceitua, desde logo, o artigo 44.º, nº1, do CIRS que se considera valor de realização o valor da contraprestação, consagrando-se, porém no seu nº2 que para efeitos de cálculo da mais-valias, se o VPT for superior é este considerado como valor de realização. Mais cumpre relevar que, no concernente à determinação do valor de aquisição, preceitua o artigo 45.º sob a epígrafe de “valor de aquisição a título gratuito” que para determinação dos ganhos sujeitos a IRS considera-se como valor de aquisição o valor correspondente ao VPT, plasmando, por seu turno, o artigo 46.º relativamente ao valor de aquisição a título oneroso de bens imóveis o seguinte: “1 - No caso da alínea a) do nº 1 do artigo 10º, se o bem imóvel houver sido adquirido a título oneroso, considera-se valor de aquisição o que tiver servido para efeitos de liquidação da sisa. 2 - Não havendo lugar à liquidação da sisa, considera-se o valor que lhe serviria de base, caso fosse devida, determinado de harmonia com as regras próprias daquele imposto. 3 - O valor de aquisição de imóveis construídos pelos próprios sujeitos passivos corresponde ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele. 4 - Para efeitos do número anterior, o valor do terreno será determinado pelas regras constantes dos nºs 1 e 2 deste artigo”. Dimanando, assim, que para efeitos de cálculo das mais-valias, o legislador consagrou que no caso de imóveis construídos pelo próprio sujeito passivo, e para concreto apuramento da determinação do valor de aquisição, que o mesmo corresponde ao VPT inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele. Feito o respetivo enquadramento normativo, atentemos, então, no que resulta do acervo fático dos autos. Mediante escritura pública outorgada a 29 de setembro de 1995, a sociedade C…, S.A. vendeu à Impugnante A… a raiz ou nua propriedade da fração autónoma individualizada pelas letras D-AB, Lote …, número …, constituída por lote destinado moradia a construir, pelo preço de €49.879,79, vendendo, igualmente, a B… e sua mulher Anna M… o usufruto simultâneo e sucessivo do visado terreno urbano pelo preço de €14.664,66. Tendo, por seu turno, sido celebrado um contrato de construção visando o aludido lote, entre a C…, S.A. a Impugnante, B… e mulher Anna M…, computando-se o valor total das obras em €347.536,21. Dimanando, igualmente, provado que as faturas respeitantes à visada construção foram emitidas em nome de B…, tendo, por seu turno, os pagamentos efetuados à construtora C…, S.A., sido realizados por cheques e transferências efetuadas, integralmente, por B…. E nessa conformidade, foi emitida em 8 de setembro de 1998, pelo município de Sintra a correspondente licença de utilização n.º 786/98. Mais resultando assente que, a 19 de outubro de 2004, faleceu Anna M… e a 27 de abril de 2008, faleceu B…, cifrando-se, a 11 de dezembro de 2009, o competente VPT da visada fração, em €169.654,84. Promanando, in fine, que a 26 de fevereiro de 2010, foi outorgada escritura pública de compra e venda do visado imóvel entre A… a E…, pelo preço total de €578.048,00. Ora, do supra expendido resulta inequívoco que, de facto, até 27 de abril de 2008, a ora Impugnante era apenas titular da nua propriedade, detendo Anna M… e B… a qualidade de usufrutuários, data a partir da qual se consolidou na esfera jurídica da Recorrente a propriedade plena do visado imóvel. Dimanando, outrossim, demonstrado que a construção da visada moradia foi, integralmente, faturada a B…, o qual procedeu ao integral pagamento das mesmas. Logo, do probatório resulta perentório que quem suportou, na íntegra, as despesas com a visada construção foi B… e não a Recorrente-não sendo, in casu, controvertido e questão decidenda a própria relevância fiscal da extinção do usufruto, mas, tão-só, a valoração dos custos de construção no cômputo da mais valia, concretamente do valor de aquisição, conforme, aliás, a Recorrente, expressamente, reconhece e aduz nas suas alegações. E a verdade é que, inversamente ao propugnado pela Recorrente, ajuizamos que tal circunstância tem de ser, devidamente, ponderada para efeitos do cômputo da mais valia, na medida em que, se infere da letra e da ratio legis subjacente ao normativo 46.º, nº3 do CIRS, que o legislador apenas pretendeu subsumir enquanto elementos integrativos e a acrescer ao valor do terreno as despesas suportadas pelo próprio sujeito passivo. Expliquemos, então, porque assim o ajuizamos. Ab initio, importa relevar que, em ordem ao consignado no artigo 9.º, nº2, do Código Civil e seguindo os ensinamentos de BAPTISTA MACHADO, ter-se-á de ter como assente que o texto da lei, constitui o ponto de partida do processo hermenêutico e também um seu limite, na medida em que não é possível considerar aqueles sentidos que não tenham nas palavras da lei qualquer apoio, “um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.(3) Cfr. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, págs. 182, 188 e 189. ” Mais cumpre salientar que “[a] letra da lei tem duas funções: a negativa (ou de exclusão) e positiva (ou de selecção). A primeira afasta qualquer interpretação que não tenha uma base de apoio na lei (teoria da alusão); a segunda privilegia, sucessivamente, de entre os vários significados possíveis, o técnico-jurídico, o especial e o fixado pelo uso geral da linguagem. Temos de pensar que o legislador soube exprimir correctamente o seu pensamento e se serviu do vocábulo jurídico adequado e que o legislador se dirige a todos os cidadãos, sendo necessário que o entendam (sobre esta matéria cfr. i.a.: Cabral de Moncada, Lições de Direito Civil, pág. 163; Castanheira Naves, Interpretação Jurídica, págs. 362/363; Baptista Machado, Introdução ao Direito, pág. 182; Oliveira Ascensão, O Direito, págs. 406/407; Santos Justo, Introdução ao Estudo de Direito, 4ª ed., págs. 334 e ss.) (4) In citação no Acórdão do STA, proferido no processo nº 0701/10, de 29.11.2011..” Com efeito, tendo por base o supra aludido e como norteador que interpretar a lei é fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivos (5) Neste sentido, vide, Manuel Andrade, Ensaio Sobre a Interpretação das Leis, págs. 21 a 26; Pires de Lima e A. Varela , Noções Fundamentais de Direito Civil, pág. 130, aquiesce-se que da sua letra a seguinte interpretação: Na hipótese do bem imóvel ter sido construído pelo próprio sujeito passivo, o valor de aquisição pode ser apurado mediante duas formas, concretamente: mediante consideração do VPT, ou se superior, o valor do terreno acrescido dos custos de construção desde que devidamente comprovados. Ora, da letra da lei infere-se que para assunção do valor de aquisição por reporte aos custos de construção, a construção tem de ser materializada, suportada e devidamente comprovada pelo sujeito passivo. É certo que a letra da lei não faz expressa menção ao custeamento direto e efetivo pelo próprio sujeito passivo, no entanto, tal realidade infere-se do uso das expressões “pelo próprio sujeito passivo” e devidamente “comprovada”. Aliás, tal é a interpretação que se coaduna e harmoniza com a ratio legis subjacente ao próprio cômputo das mais valias, e bem assim ao princípio da realização ínsito nas mesmas e ao princípio do rendimento acréscimo, o qual, como é consabido, é norteador do IRS. Com efeito, como doutrina Paula Rosado Pereira (6) Estudos sobre o IRS-Rendimentos de Capitais e Mais Valias, Almedina: fevereiro de 2005, pp. 88 e 89. “As mais-valias correspondem a ganhos ou rendimentos de carácter ocasional ou fortuito, e que não decorrem de uma actividade do sujeito passivo especificamente destinada à sua obtenção, mas relativamente aos quais o princípio da capacidade contributiva determina a sujeição a imposto [Conforme refere ANDRÉ SALGADO DE MATOS, "a tributação das mais valias surge na medida em que a alienação de um determinada bem por um valor superior àquele por que foi adquirido tem por resultado um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito alienante, em relação ao qual princípio da capacidade contributiva reclama a existência de normas de incidência objectiva". In ANDRÉ SALGADO DE MATOS, Código do Imposto do Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) Anotado, Instituto Superior de Gestão, Lisboa, 1999, p. 163.]” Prosseguindo, ainda, no sentido de que “constituem mais-valias os ganhos decorrentes da transmissão onerosa de um bem ou direito, sem que tal transmissão constitua o objecto específico de uma actividade empresariaI [SALDANHA SANCHES refere que "as mais-valias, como uma espécie real o conceito mais vasto de acréscimos patrimoniais que se podem definir com a totalidade das mais-valias e de outros rendimentos que podem ser imputados a uma certa pessoa (centro de imputação de um património), têm sempre como pressuposto a alienação de um determinado bem sem que se possa considerar tal alienação como estando integrada numa actividade comercial ou empresarial". In SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 2ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2002, pp. 220.”] Resulta, assim, que subjacente à tributação enquanto mais valias se encontra um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito passivo alienante, que tem como norteador o princípio da capacidade contributiva, daí derivando que ao valor de realização seja deduzido o valor de aquisição, no qual se terão de englobar as realidades que foram, efetivamente, suportadas pelo alienante e por essa via possam ser deduzidas enquanto tal. Aliás, tal é a expressão do princípio vertido no artigo 4.º, n.º 1 da LGT, no sentido de que a capacidade contributiva será revelada pela existência de rendimentos, riqueza e a utilização que o sujeito faz da mesma. Note-se, e reitere-se, que é preciso ter presente que o princípio que subjaz à tributação em sede de IRS é o princípio do rendimento acréscimo, do qual resulta que é qualificado como rendimento qualquer incremento patrimonial, independentemente da respetiva proveniência e num dado período de tributação, sendo certo que no caso das mais valias e como doutrina Rui Duarte Morais (7) Sobre o IRS, Almedina, 2.ª edição, pág. 134.,“[e]stão em causa ganhos resultantes da alienação de um bem económico, na medida em que esta alienação não constitui objecto específico de uma actividade empresarial”. O que significa que, resultando demonstrado que os custos de construção foram integralmente faturados e suportados por terceiro que não a Recorrente, não podem ser deduzidos ao ganho obtido com essa alienação (valor de realização) despesas que não foram custeadas/suportadas pelo próprio sujeito passivo, sob pena de se subverter a ratio legis inerente ao acréscimo de tais custos de construção. Até porque, e secundando-se o doutrinado na decisão recorrida, o direito à dedução fiscal de custos não é transmissível entre sujeitos passivos nem por via sucessória nem pela via da consolidação do direito do usufruto com o direito de propriedade de raiz. É certo que, como evidencia a Recorrente tais custos se circunscrevem a um processo de construção no seu todo, e que os mesmos se incorporam no visado imóvel, mas a verdade é que tal em nada desvirtua o princípio subjacente à tributação do ganho por reporte ao concreto acréscimo patrimonial na esfera jurídica do alienante, no fundo, ao respetivo aumento do poder aquisitivo do contribuinte. Com efeito, só poderá ser aditado enquanto valor integrativo ao montante do terreno os custos de construção que forem, efetivamente suportados e devidamente comprovados, pelo próprio sujeito passivo, na medida em que o incremento na esfera patrimonial deve ser proporcional ao concreto aumento do poder aquisitivo, donde, tributado em razão da concreta contribuição/capacidade contributiva. De relevar, in fine, que esta é a interpretação que se compagina com a igualdade horizontal e bem assim com o princípio da neutralidade, no sentido de que, por um lado, sujeitos passivos com a mesma capacidade económica serão tratados da mesma forma e por outro lado, não se admite que nenhuma forma de consumo ou de rendimento seja favorecida em relação às demais. Não logrando o alcance que lhe pretende granjear a Recorrente quanto à extensão do direito à dedução fiscal dos custos, concretamente do mesmo se refletir, exclusivamente, na esfera do proprietário, na medida em que não é, de todo, controvertido que a tributação recai na esfera jurídica do proprietário. Contudo, são realidades não confundíveis e com alcances, naturalmente, distintos a esfera de tributação e a concreta medida de tributação, a qual, justamente, tem de refletir o peso contributivo para efeitos da valorização do imóvel e inerente ganho. Carecendo, por isso, de relevo o aduzido em 11) das conclusões, porquanto o que se está, efetivamente, a tributar é o incremento patrimonial enquanto mais valias, na Categoria G. Como se sumaria no Aresto do STA, prolatado no processo nº 02782/18, de 09 de dezembro de 2021: “I - O artigo 46.º n.º 3 do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), objetivamente, supõe, na sua previsão normativa, as situações de não existirem dúvidas sobre a realidade do imóvel construído e da respetiva responsabilidade/autoria a cargo do sujeito passivo (de IRS). Esclarecendo, ulteriormente, na sua fundamentação jurídica quanto à concreta ponderação dos valores e princípios gizados que: “[m]esmo que a solução cause alguma incompreensão (como parece ter sucedido com o tribunal recorrido), quando se sabe que, realmente, na inicial parcela de terreno para construção, foi implantado um edifício e que, no momento da alienação, apesar de ter sido transmitida aquela parcela (Alínea A) dos factos provados.), por consubstanciar, à data, a única realidade jurídico-tributária (matricial), tal transmissão haver englobado a construção, aí, implantada, pelo impugnante. Assim, face a todo o expendido anteriormente, não obstante resulte provado que o imóvel se encontra edificado, a verdade é que resulta do probatório que as obras foram faturadas e pagas por um sujeito passivo que não o proprietário alienante-como visto predicado essencial para esse acréscimo- logo não pode ser assacada à AT a aduzida ilegalidade atinente à concreta desconsideração dos custos de construção na medida em que não resultam preenchidos os pressupostos constantes na lei para essa concreta computação e acréscimo ao valor do terreno. Uma nota final para que relevar que, não obstante inexista uma concreta sindicância atinente à despesa com a comissão de mediação imobiliária, a verdade é que tal realidade resulta, expressamente, consignada como não provada e não impugnada, o que, per se, inviabiliza qualquer dedução em conformidade. Destarte, não se verifica o apontado erro de julgamento quanto ao concreto cômputo do valor de aquisição (8) Vide Ac. STA, proferido no processo nº 0214/17, de 17.02.2021., inexistindo, assim, a arguida ilegalidade do ato de liquidação. E por assim ser, a decisão recorrida que assim o entendeu não padece do erro de julgamento que lhe é assacado, devendo manter-se, na íntegra. *** IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença recorrida. Custas pela Recorrente. Registe e notifique. Lisboa, 01 de junho de 2023 (Patrícia Manuel Pires) (Jorge Cortês) (Luísa Soares) |