Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02088/06
Secção:Contencioso Administrativo - 2º Juízo
Data do Acordão:03/26/2009
Relator:Cristina dos Santos
Descritores:CONVOLAÇÃO DO PROCESSO CAUTELAR EM PROCESSO PRINCIPAL – ARTº 121º CPTA
CASO JULGADO MATERIAL
SENTIDO OBJECTIVO EXPRESSO E PERCEPTÍVEL DA VONTADE DECLARADA
OSTENSIVIDADE DO LAPSO DE ESCRITO – ARTº 249º C. CIVIL
CONHECIMENTO DA ESSENCIALIDADE DO ERRO – ARTº 247º C. CIVIL
Sumário:1. Da convolação do processo cautelar em processo principal com antecipação da decisão de mérito do litígio, ao abrigo do artº 121º CPTA, emergem duas consequências: (i) o processo permanece sob o regime da tramitação urgente, em consonância com a situação substantiva de urgência expressa no nº 1 do cit. artº 121º CPTA; (ii) o objecto da causa principal que se impõe conhecer é aquele que decorre do primitivo articulado inicial cautelar que, por convolação do meio adjectivo, assume a natureza de petição inicial do meio de tutela final urgente.
2. A decisão definitiva por convolação em processo principal do processo cautelar, admite a formação de caso julgado material o que não se verifica com as decisões cautelares que apenas assumem valor de caso julgado formal, vinculativo no âmbito do próprio processo – artº 383º nº 4 CPC.
3. Para efeitos jurídicos é a exteriorização da vontade do declarante que corporiza a declaração imputável ao declarante, valendo o sentido objectivo expresso e perceptível da vontade declarada, salvo invalidação do acto praticado por erro na declaração.
4. Em provas de exame escritas, havendo alternativas passíveis de exteriorização da escolha de resposta dentre o leque de opções fornecidas, toda e qualquer das opções expressas é imputável ao examinando e, simultâneamente, insusceptível de ser conhecida pelo avaliador antes de efectivada a entrega das provas respondidas pelo examinando, salvo fraude.
5. O referido em 4. inviabiliza a operância dos requisitos da ostensividade do lapso de escrita exigido no artº 249º C. Civil e da essencialidade do erro, conhecida ou cognoscível pelo declaratário, exigida no artº 247º C. Civil em sede de erro na declaração.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Carla ..., com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida na providência cautelar deduzida ao abrigo do artº 131º CPTA convolada em tutela final urgente ex vi artº 121º do cit. Código, dela vem recorrer concluindo como segue:

1. O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida nos autos principais que absolve o Réu dos pedidos;
2. A douta sentença deu como provados os factos 1. a 16. da sua parte III, que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
3. A sentença recorrida foi proferida ao abrigo do artigo 121° do CPTA, conhecendo assim antecipadamente o mérito da acção principal;
4. Pelo que, é recorrível nos termos gerais, ao abrigo dos artigos 144° e seguintes do CPTA.
5. A decisão recorrida é nula, ao abrigo do disposto na alínea d) do n° l do artigo 668° do CPC, aplicável ex vi artº 1° do CPTA, por omissão de pronúncia do alegado (nos artigos 104° a 109° da PI) vício de forma por preterição das formalidades essenciais previstas nos artigos 100° e seguintes do CPA;
6. A sentença recorrida apreciou erroneamente os factos da causa e fez uma má aplicação do direito.
7. A respeito da apreciação fáctica do Tribunal tenha-se presente que a testemunha inquirida nos autos só depôs relativamente aos artigos 7° a 11° do Requerimento Inicial, cfr. ponto 1. do douto despacho de fls. 336;
8. Pelo que, quanto à apreciação dos demais factos trazidos aos autos pela agora Recorrente, só foi juridicamente relevante a abundante prova documental existente,
9. Posto isto, a Recorrente considera que o Tribunal a quo escusou-se a decidir a questão mais importante dos autos qual seja determinar se houve erro no preenchimento da folha de respostas;
10. Pelo que, a apreciação jurídica do Tribunal fica desde logo prejudicada por essa omissão de decisão;
11. Da prova junta aos autos e com relevo para a decisão deverão ser dados como provados os seguintes factos:
§ "A Recorrente na secção II da prova optou por responder e respondeu ao "Subgrupo B" e
§ "Por lapso assinalou no cabeçalho o "Subgrupo C".
Estes factos são corroborados pela prova documental carreada para os autos, em especial o original da prova da Recorrente.
12. Por outro lado, e contrariamente ao que se depreende da análise do Tribunal, a possibilidade e necessidade de o Recorrido INA relevar o erro da Recorrente refere-se ao momento da decisão do recurso que resultou indeferido e não à primeira avaliação mecânica;
13. Nesta segunda apreciação, de revisão da prova, deveriam ter sido apurados e relevados eventuais factos que escapam a essa análise mecânica, como o lapso humano numa tarefa tão simples como apor uma cruz num espaço para seleccionar um subgrupo. Aliás, só assim se justifica a existência desse recurso,
14. Apurada a existência de lapso, cumpre saber se esse lapso poderia ou deveria ser relevado e rectificado pelo Senhor Presidente do INA;
15. Salvo melhor entendimento, deveria ter sido rectificado o erro de escrita ao abrigo do artigo 249° do CC, aplicável aos actos jurídicos ex vi artigo 295° do mesmo Código;
16. No caso concreto, as circunstâncias em que a declaração de escolha é feita patenteiam a ostensividade do simples erro de escrita, nomeadamente: a existência de um "b" imediatamente por baixo do "C" efectivamente assinalado; os esclarecedores rascunhos apostos no enunciado da prova entregue à Recorrente;
17. as abissais diferenças de valoração que decorrem da escolha do subgrupo "B" ou "C"; e a irracionalidade que decorreria da escolha de um subgrupo que versa sobre matéria para a qual a candidata não tem formação,
18. Todas estas circunstâncias foram dadas a conhecer ao Senhor Presidente do INA aquando da tomada de decisão final sobre a classificação da Recorrente, pelo que não poderá alegar desconhecimento das circunstâncias em que o lapso ocorreu.
19. Nestes termos, o Tribunal recorrido fez uma errada aplicação da factualidade e do direito ao não reconhecer que a avaliação final da prova da Recorrente é inválida por violação do artigo 249° em conjugação com o artigo 295° do CC.
20. Para efeitos do artigo 247° do CC, diz o Tribunal a quo que o Recorrido INA não tem de conhecer a essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o erro.
21. Quando parece óbvio que é essencial para a aqui Recorrente subscrever na folha de respostas o sub-grupo a que efectivamente respondeu,
22. A questão é determinar a cognoscibilidade do lapso ou erro e sobre ela já se discorreu abundantemente,
23. Nestes termos, a sentença recorrida fez uma errada interpretação do direito por errónea aplicação in casu do artigo 247° do Código Civil,
24. Para efeitos da alegada violação do princípio da boa fé, concorda-se com o Tribunal quando diz que para que resultasse provada "necessário era que a Requerida admitisse a existência do erro e não adequasse a sua conduta em conformidade, o que não é o caso",
25. Ora, parece claro que a Recorrente respondeu efectivamente ao sub-grupo B, malgrado o lapso no preenchimento da folha;
26. Aliás, as provas ao dispor do Requerido INA aquando da decisão do recurso não permitiriam outra conclusão senão essa.
27. Pelo que, cabia ao Tribunal pautar pela violação do princípio da boa fé plasmado no n° 2 do artigo 266° da CRP e artigo 6° - A do CPA;
28. De igual modo, devia ter concluído pela violação do princípio da justiça, previsto no n°2 do artigo 266° da CRP e artigo 6° do CPA.
29. O acto impugnado padece ainda de vício de forma por preterição da formalidade essencial dos artigos 100° e seguintes do CPA, pois a lista de classificação final não foi antecedida de uma lista de classificação provisória para efeitos de audiência dos contra-interessados.
30. Não faz sentido trazer à colação o princípio da igualdade na medida em que nenhum dos candidatos se encontra numa situação igual ou análoga à da aqui Recorrente,
31. Assim, nos termos expostos e contrariamente ao decidido, o despacho do Senhor Presidente do INA é inválido por ilegalidade: por erro nos pressupostos de facto e de direito; por violação do n° 2 do artigo 266° da CRP; - por violação do n° 2 do artigo 236° e o artigo 249°, conjugado com o artigo 295°, todos do Código Civil; por violação do artigo 247° do Código Civil; - por violação dos artigos 6° e 6°-A do CPA; e por vício de forma por preterição de formalidade, cfr. artºs. 100° e seguintes do CPA;
32. Ilegalidades que determinam a sua anulabilidade pela conjugação dos artigos 133° e 135° do CPA.
33. Finalmente, ao abrigo dos artigos 66° e seguintes do CPTA, deveria o Recorrido INA ter sido condenado a praticar acto administrativo que admita a Recorrente ao CEAGP 2005/2006.


*

A Recorrida contra-alegou, concluindo como segue:

(a) O acto impugnado nos presentes autos não padece de vício de forma por preterição da formalidade de audiência dos interessados, quer porque a mesma não é exigível em função da natureza do procedimento em causa (uma prova), quer porque o Regulamento do CEAGP afasta essa formalidade (impedindo a aplicação supletiva dos artigos 100º e seguintes do CPA);
(b) Quanto à questão do erro e da sua (eventual) tutela jurídica, remete-se para a defesa apresentada pelo ora Recorrido na oposição em sede de processo cautelar - especialmente ao que ficou dito nos artigos 4° a 12° e 38° a 62° do respectivo articulado;
(c) A sentença recorrida parte do pressuposto que existiu um erro/lapso no preenchimento da folha de respostas, concluindo pela não verificação dos requisitos que lhe confeririam tutela jurídica e pela sua não desculpabilidade;
(d) A ostensividade do lapso (artigo 249° do CC) e a essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro (artigo 247° do CC) têm que ser aferidas de acordo com o critério do homem médio colocado perante a folha de respostas da prova em causa;
(e) Impugna-se a alegada mas inexistente, violação dos princípios da boa fé e da justiça - contrapondo a tutela dos princípios da transparência e da igualdade, tal como defendido na oposição à providência cautelar.


*

Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

*

Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade;

1. Pelo Aviso n° 5599/2005 (2a Série) do INA foi publicitado que foi aberto concurso para admissão ao curso de estudos avançados em Gestão Pública (cfr. DR-II, n° 107, 3 de Junho de 2005, pp. 8383);
2. A Requerente candidatou-se ao concurso identificado em 1., tendo-se submetido à prova escrita de conhecimentos prevista no n° l do artigo 11° do Regulamento do CEAGP, com o n° 0903 (docs 2 e 3 a fls. 51 e s., e 323, os quais se dão por integralmente reproduzidos);
3. Dia 30 de Setembro de 2005, ao final do dia, atendendo o pedido da Requerente, uma funcionária do INA informou a Requerente que a sua prova tinha tido a classificação de 9,107 valores (cfr. por acordo e depoimento da testemunha, Directora Executiva do INA);
4. No mesmo dia os resultados das provas foram publicados na página do INA na Internet (depoimento da testemunha, Directora Executiva do INA, que expressamente o referiu);
5. Dia 3 de Outubro, 2a Feira, a Requerente, em encontro com a Directora Executiva do Curso, pediu para verificar qual a classificação que teria obtido caso tivesse optado pelo “Subgrupo B” do exame (cfr. depoimento da testemunha que expressamente o referiu);
6. A Directora Executiva procedeu à leitura óptica da prova da Requerente e comunicou-lhe que, optando pelo subgrupo B da Secção II da prova, tinha uma classificação de 12,864 valores (por acordo e depoimento da testemunha);
7. A Requerente constou das pautas na lista de excluídos (por acordo);
8. No dia 4 de Outubro a Requerente apresentou pedido de revisão da prova, dirigido ao Presidente do INA, no qual pede que “corrija de novo a minha prova, considerando a “opção B” que foi efectivamente a que eu respondi de boa fé” (cfr. Doc. 6 a fls. 68-69, o qual se dá por integralmente reproduzido);
9. No dia 7 a Requerente interpõe “recurso” dirigido à mesma entidade, no qual invoca “erro de escrita”, pedindo que tal “lapso” lhe seja relevado e invocando o disposto no artigo 249° do Código Civil (cfr. Doc 7 a fls. 70 e s., o qual se dá por integralmente reproduzido);
10. Por carta de 12 de Outubro de 2005 a Requerente é informada do indeferimento do recurso pelo Presidente do INA (cfr. Doc. 8 a fls. 78 e s., o qual se dá por integralmente reproduzido);
11. O despacho de indeferimento é exarado sobre a informação n.° 49/NACD/2005, na qual consta que (idem):
"(::) Desde logo o simples erro de escrita que vem alegado como ... permitindo a aplicação ao acaso do art. 249.° do Código Civil 'ex vi' artigo 295.° do mesmo código não se verifica. Para o ser teria que se tratar de erro de ostensivo, o que não é claramente a situação: para o declaratário a escolha dos subgrupos é algo que não contende obrigatoriamente com as habilitações académicas de base do candidato que àquela procede com livre arbítrio. (...) o destinatário da declaração (neste caso, o júri do concurso) não pode conhecer nem tem a obrigação de conhecer a essencialidade para o declarante do elemento sobre que incidiu o erro. De igual modo, não releva a desculpabilidade do erro que, no caso, provém de negligência imputável ao errante".
12. Antes de começar a prova a supervisora da prova deu um tempo para os candidatos lerem as instruções de preenchimento e advertiu expressamente para as consequências de um deficiente preenchimento da folha de respostas (cfr. depoimento da testemunha, que o referiu expressamente);
13. O processo de correcção é integralmente feito por leitura óptica (por acordo e depoimento da testemunha, que expressamente o referiu);
14. O INA entregou aos candidatos, previamente à realização da prova escrita, documento explicativo do modo de preenchimento da folha de resposta e no qual consta, a carregado: "ao assinalar a sua resposta certifique-se sempre que não se enganou quanto à resposta que pretende assinalar como correcta" (cfr. doc. a fls. 270-270 v., o qual se dá por integralmente reproduzido);
15. Na folha de respostas da Requerente foi assinalado no campo identificativo da “área científica de licenciatura” a área de “Ciências jurídicas”, tendo sido assinalada a opção “C” da “Secção II” (doc. original a fls. 324, o qual se dá por integralmente reproduzido);
16. A Secção II da folha de respostas tem o seguinte aspecto gráfico, tendo a Requerente seleccionado as quadrículas como segue (idem):


DO DIREITO


O discurso jurídico fundamentador em sede de sentença é o que de seguida se transcreve:
“(..)
Dispõe o invocado artº 249° do Código Civil, com a epígrafe “erro de cálculo ou de escritaque:
“O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação desta”.
Ora, nos termos do artº 249° do Código Civil, o erro de escrita revela-se no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita.
Contudo, e como a doutrina vem salientando, só haverá erro de escrita, merecedor de tutela jurídica, quando se tratar dum lapso ostensivo (sob pena de o caso ficar sobre a alçada do artº 247°).
E diz-se no artº 247° do CC — caso de erro obstáculo ou erro na declaração — que:
“Quando, em virtude de erro, a vontade declarada não corresponda à vontade real do autor, a declaração negocial é anulável, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro”.
Tal como se entende, é certo que a citada norma contida no artº 249° tem um alcance geral, não se restringindo a sua aplicação apenas às declarações negociais regidas pela lei civil, aplicando-se também noutras áreas em que se verifique a sua razão de ser.
Desde modo, é possível a rectificação de erros materiais ostensivos revelados no contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita.
Aliás, como decorre do artº 56° do Código do Procedimento Administrativo, o princípio do inquisitório rege no âmbito do procedimento administrativo.
Com efeito, os poderes inquisitórios de que goza a Administração manifestam-se, designadamente, na averiguação da verdade material — princípio da verdade real —, conferindo-lhe, a este nível, um papel activo que se pode traduzir, de alguma maneira, na correcção de erros de cálculo ou de escrita constantes dos elementos fornecidos pelos interessados.
No caso em apreço, a Entidade Requerida limitou-se a aplicar uma grelha de correcção, da qual resultou, atenta a folha de resposta da Requerente, uma determinada classificação.
Faz-se notar que a grelha de correcção usada foi a adequada em face da opção escolhida: caso viesse assinalado outro subgrupo, diferente seria a grelha aplicável.
Mas tal circunstância não impediria, em abstracto, que a Requerida não pudesse - dir-se-á mesmo que deveria -, atender a um invocado erro de escrita, nada obviando à sua correcção oficiosa.
Porém, no caso concreto dos autos tal conclusão não pode prevalecer.
Desde logo, atento o probatório (cfr. 13., 15. e 16. supra), não se pode considerar que se esteja perante um erro material ostensivo por parte da Requerente.
Com efeito, o invocado artº 249° do Código Civil, exige que o erro de escrita se revele, e se revele de modo ostensivo, no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita.
Ora, tal não sucede no caso em apreço, tendo a Requerente assinalado, e fê-lo formalmente bem, o subgrupo "C".
Assim, e radicando a escolha de um dos subgrupos da secção II nos candidatos, o júri só tem que assumir que a escolha declarada é a efectivamente escolhida.
Donde, quer atendendo ao contexto da declaração, quer às circunstâncias em que esta é efectuada, a outra conclusão não podia o júri chegar senão àquela a chegou e que constitui o objecto da presente acção.

*
Inteira razão assiste ao alegado no artº 161° da contestação da Contra-Interessada quando refere que então o júri teria que corrigir as provas aplicando a todas as grelhas de correcção, independentemente do grupo escolhido pelos candidatos, e oficiosamente atribuir a classificação à prova de acordo com o resultado que se mostrasse mais elevado.
Ou, com igual sentido, o alegado pela Requerida no artº 58.° da contestação.

*
E também não se está perante caso susceptível de ser considerado como de erro desculpável.
Com efeito, os candidatos foram devidamente alertados para a necessidade de observarem devidamente as regras de preenchimento das folhas de resposta e foram chamados à atenção para as consequências do errado preenchimento (cfr. 12. e 14. do probatório).
Mas mais do que isso, no que se reveste essencial, o aspecto gráfico da folha de resposta não é susceptível, a um destinatário normal, de criar a confusão alegadamente tida pela Requerente: o campo das opções dos subgrupos está em maiúsculas ("A", "B", "C", "D" e "E"), correspondendo cada letra a um quadrado com moldura bem definida e separada por um traço a carregado do campo das respostas às questões, as quais vêm identificadas a letra minúscula ("a", "b", "c" e "d").
São campos diferentes, diferenciados e objectivamente não confundíveis.

*
Deste modo, e em bom rigor será essa a situação, o alegado erro é, tal como configurado pela Requerente, erro na declaração.
Pelo que, para este poder operar nos termos do citado artº 247° do CC, sempre o declaratário tinha que conhecer ou não podia ignorar a essencialidade, para o declarante, do elemento sobre que incidiu o erro.
Ora, tal não logra acontecer atento o circunstancialismo específico dos autos: prova escrita em que o examinando detém liberdade de opção relativamente às questões a responder.
Invoca também a Requerente jurisprudência diversa do STA, alegando que esta trata e releva lapsos de escrita análogos (art. 77.° e s.).
Porém, sem qualquer sentido.
A "vária" jurisprudência invocada, afinal vem ilustrada com um sumário de um único aresto (ac. do STA de 8.07.2004), sendo que a situação em nada é análoga, pois que o Acórdão referenciado cuida de caso de erro — lapso evidente — na identificação do número de processo num requerimento apresentado aos autos.
*
Contrariamente ao alegado pela Requerente nos artºs. 91° e s. do r.i. não se verifica a violação do princípio da boa fé, nem do princípio da justiça.
Com efeito, para a primeira ocorrer necessário era que a Requerida admitisse a existência do erro e não adequasse a sua conduta em conformidade, o que não é o caso.
Quanto à suscitada preterição do princípio da justiça (artº 6° do CPA), diga-se que este princípio tende a funcionar naqueles casos em que uma actividade administrativa ou o seu resultado constituem uma afronta intolerável aos valores elementares da ordem jurídica, no seu todo considerada - não se trata de uma concepção de justiça subjectiva, sobre o que seria justo naquele caso singular, mas sim de um parâmetro de invalidade do acto injusto por referência a valores e critérios plasmados no ordenamento jurídico, maxime no constitucional.
Assim, devendo numa perspectiva inclusa e de sistema considerar outros princípios, avultando aqui o da igualdade (artº 13° da CRP e artº 5° do CPA), afinal seria a alteração da classificação pretendida pela Requerente que consubstanciaria, isso sim, clara violação desse princípio, o que não poderia ser admitido pela Requerida.
*
Por outro lado, a Requerida fundamentou adequadamente o acto de indeferimento, explicitando, ainda que sumariamente, a motivação de facto e de direito subjacente à decisão (cfr. 10. e 11. do probatório).
Em suma, o alegado erro na declaração aqui em causa não é merecedor de tutela jurídica, não sendo, portanto, a conduta da Requerida susceptível de censura jurídica negativa. (..)”


***

a) nulidade de sentença – artº 668º nº 1 d) CPC;
artº 121º CPTA - convolação de meios de acção;
artº 87º nº 1 b) CPTA - convolação de fases da instância;

O Tribunal incorre em omissão de pronúncia, artº 668º nº 1 d) 1ª parte CPC, quando não se pronuncia sobre questões que devesse apreciar, aqui incluída a matéria de conhecimento oficioso.
No que respeita a esta causa de nulidade, especificada na alínea d) do elenco taxativo do artº 668º nº 1 do CPC em conjugação, quanto ao respectivo conteúdo, com o disposto no artº 660º nº 2 do mesmo Código, cumpre, primeiro, salientar que o conceito adjectivo de questão, no que respeita à delimitação do conhecimento do Tribunal ad quem pedida pelo Recorrente, “(..) deve ser tomada aqui em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem (..)”. (1)
De modo que em ordem a obstar a que a sentença fique inquinada, tem-se como questões de mérito “(..) as questões postas pelas partes (autor e réu) e as questões cujo conhecimento é prescrito pela lei (..) O juiz para se orientar sobre os limites da sua actividade de conhecimento, deve tomar em consideração, antes de mais nada, as conclusões expressas nos articulados.
Com efeito, a função específica dos articulados consiste exactamente em fornecer ao juiz a delimitação nítida da controvérsia; é pelos articulados que o juiz há-de aperceber-se dos termos precisos do litígio ventilado entre o autor e o réu.
E quem diz litígio entre o autor e o réu, diz questão ou questões, substanciais ou processuais, que as partes apresentam ao juiz para que ele as resolva. (..)”. (2)
Em segundo lugar, cumpre salientar igualmente que não cabe confundir questões com considerações, “(..) São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questões de que devia conhecer e deixar de apreciar qualquer consideração argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao Tribunal qualquer questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão. (..)”. (3)

*

Em ordem a sustentar a assacada nulidade por omissão de pronúncia, considera a Recorrente na parte “V – Nulidade de sentença” do corpo alegatório que “ (..) a antecipação de conhecimento refere-se à acção principal (..) estamos perante uma decisão de fundo na acção administrativa especial e não perante uma decisão cautelar com efeitos alargados (..)”, o que, do nosso ponto de vista não reflecte com rigor a convolação da tutela cautelar em tutela final urgente por antecipação da decisão da causa principal.
No caso em apreço a sentença sob recurso foi proferida ao abrigo do mecanismo estatuído no artº 121º nº 1 CPTA de convolação do meio de acção cautelar em meio de acção principal, pelo qual pese embora se esteja no âmbito do processo cautelar, tem lugar a pronúncia jurisdicional definitiva por antecipação do seu momento próprio, de acordo com a tramitação prevista para a acção principal, forçoso é concluir que o mecanismo da convolação opera no meio adjectivo cautelar.
O que significa que o processo é o mesmo e único, apenas sendo caso de alteração da natureza adjectiva que detinha aquando da respectiva instauração, por força da verificação cumulativa no processo cautelar de dois requisitos, a saber,
1. “que existe manifesta urgência na resolução definitiva do caso”,
2. e, ouvidas das partes, “o tribunal se sinta em condições de decidir a questão de fundo, por dispor de todos os elementos necessários para o efeito(4)

Consequentemente, e em nosso entender, daqui emergem duas consequências:
(i) primeiro, e salvo o devido respeito por entendimento distinto, o processo permanece sob o regime da tramitação urgente, em consonância com a situação substantiva de urgência expressa no nº 1 do cit. artº 121º CPTA;
(ii) segundo, o objecto da causa principal que por via da convolação se impõe conhecer é exactamente aquele que decorre do primitivo articulado inicial cautelar que, por convolação do meio adjectivo de tutela cautelar, assume a natureza de petição inicial do meio adjectivo da tutela final urgente.

Nesta linha de raciocínio em contrário do sustentado pelo Recorrente no corpo alegatório [parte “V – nulidade da sentença”] temos por seguro que não é o conteúdo alegatório da petição inicial do procº nº 169/06, processo principal entretanto instaurado, mas o constante do requerimento inicial do processo cautelar convolado para meio de acção principal que determina o elenco de questões que cumpre ao Juiz conhecer.
Impõe-se o tratamento adjectivo de forma coerente e unitária do mecanismo da antecipação da decisão de mérito por convolação da tutela cautelar em tutela final urgente, o que significa que à aplicação do mecanismo convolatório do artº 121º CPTA é indiferente que o meio cautelar seja ou não deduzido em antecedência, simultaneidade ou na pendência da instauração do processo principal de que é dependente; ponto é que se verifique a “manifesta urgência na decisão definitiva” e o processo cautelar evidencie “todos os elementos necessários à decisão de fundo”, ou seja, quando a este último, exactamente o mesmo pressuposto que, tradicionalmente, a lei adjectiva desde sempre exigiu para a decisão em sede de saneador sentença.
Não se trata, pois, de “decisão cautelar com efeitos alargados”como sustenta o Recorrente, mas de decisão definitiva por convolação em processo principal do processo cautelar, o que significa que admite a formação de caso julgado material o que não se verifica, como é sabido, com as decisões cautelares cuja natureza rebus sic stantibus permite apenas que assumam valor de caso julgado formal, tão só vinculativo no âmbito do próprio processo – cfr. artº 383º nº 4 CPC.
Por terem natureza absolutamente distinta, não é passível de confundir a antecipação do conhecimento de fundo em ambiente adjectivo cautelar convolado em principal do artº 121º CPTA, com a antecipação do conhecimento de fundo no saneador-sentença do artº 87º nº 1 b) CPTA, posto que o mecanismo da convolação processual opere, em ambos os casos, no domínio de um mesmo processo: o primeiro trata da convolação de meios de acção (acção cautelar em acção principal) e o segundo da convolação de fases da instância (fase do saneador em fase da sentença).
No caso presente, pela leitura do articulado inicial do meio cautelar convolado para acção principal por força da antecipação da decisão segundo o mecanismo do artº 121º CPTA, procº nº 2506/05 na 1ª Instância junto por apenso ao presente rec. nº 2088/06, temos que a assacada “omissão de pronúncia do alegado (nos artigos 104° a 109° da PI) vício de forma por preterição das formalidades essenciais previstas nos artigos 100° e seguintes do CPA” não consta do elenco de questões trazidas a juízo.
Pelo que vem dito improcede a assacada omissão de pronúncia, questão invocada no item 5 das conclusões.

b) questão nova;

O que vem de ser dito supra significa que não cumpre conhecer do alegado vício de preterição de formalidade essencial traduzida na audiência prévia ex vi artº 100º CPA, item 29 das conclusões de recurso, por, no presente contexto, se traduzir na invocação de questão nova,
Efectivamente, da opção do legislador em atribuir aos recursos ordinários a função de permitir que o Tribunal ad quem proceda à reapreciação da decisão proferida pelo Tribunal a quo, decorre que essa reapreciação se há-de mover “(..) dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que, em regra, o Tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela não foram formulados. Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamento de questões novas.
Excluída está, por isso, a possibilidade de alegação de factos novos (ius novorum; nova) na instância de recurso, embora isso não resulte de qualquer proibição legal, as antes da ausência de qualquer permissão expressa. (..)
Embora sem aceitar a invocação de factos novos pelas partes, o recurso de apelação também se pode aproximar, numa situação específica, do modelo de recursos de reexame. Trata-se da possibilidade, prevista no artº 712º nº 3, de a Relação determinar a renovação dos meios de prova, produzidos na 1ª Instância, que se mostrem absolutamente indispensáveis ao apuramento da verdade. Nesta hipótese, o Tribunal de recurso não se limita a controlar a decisão da 1ª Instância sobre a matéria de facto, antes manda efectuar perante ele a prova produzida na instância recorrida. (..)” (5).
Dada a remissão para o regime adjectivo cível no tocante aos recursos em tudo quanto não é específico do CPTA, cumpre observar o disposto nos artºs. 715º nºs 1/2 e 712º nº 3 CPC, matéria hoje expressamente consignada no artº 149º nº 1 CPTA que deve ser aproximada do regime do artº 715º nº 1 CPC, no artº 149º nº 2 CPTA que tem o lugar paralelo no artº 712º nº 3 CPC e no artº 149º nº 3 CPTA tal como estatuído no artº 715º nº 2 CPC.
Concluímos assim que, ressalvada a possibilidade legal de apreciação de matéria de conhecimento oficioso e funcional, de factos notórios ou supervenientes, uso de poderes de substituição e de ampliação do objecto por anulação do julgado, o âmbito dos poderes cognitivos do Tribunal Central Administrativo em via de recurso, é balizado:
1. pela matéria de facto alegada em primeira instância,
2. pelo pedido formulado pelo autor em primeira instância e
3. pelo julgado na decisão proferida em primeira instância.
A não ser na circunstância de haver acordo das partes quanto à ampliação do pedido e da causa de pedir, que é possível a todo o tempo – cfr. artº 272º CPC.
Regime que continua a ser verdadeiro em sede de CPTA pois que, salvo o devido respeito por entendimento distinto (6) (7), não retiramos do contexto da lei, maxime da conjugação de regimes de recurso do CPC e CPTA, que a Reforma do Contencioso Administrativo tenha varrido a opção pelo modelo base de recurso de reponderação temperado pela inclusão expressa e tipificada de ritologias próprias do modelo de recurso de reexame.
À semelhança do que já vinha do direito adjectivo cível, o alargamento expresso das possibilidades cognitivas do Tribunal ad quem não implica que se tenha aberto portas, em sede de recurso, à alegação de factos novos e a novos meios de prova, como se a pureza do recurso de reexame tivesse obtido consagração e se admitisse a invocação de ius novorum e reapreciação global do objecto da causa pelo Tribunal ad quem.
De modo que a nosso ver e pelos motivos resumidamente expostos, tal como no direito adjectivo cível não vem consagrada, também no CPTA não se consagrou a possibilidade de invocação de factos novos na instância de recurso.
Como dito acima, não cumpre conhecer da questão suscitada no item 29 das conclusões.

c) recurso da matéria de facto – artº 690º-A nº 1, a), b) CPC;

Quanto ao recurso da matéria de facto, questão suscitada nos itens 7 a 11 das conclusões, desenvolvida no corpo alegatório na parte “VI – A – A apreciação fáctica do Tribunal recorrido”, respeitantes à impugnação da matéria levada ao probatório, o Recorrente não cumpre o ónus de alegação em sede de recurso nos termos legalmente determinados no artº 690º A nº 1, a) e b) CPC.
Efectivamente, o Recorrente suscita a questão da “abundante prova documental existente”, “o erro da Recorrente resulta manifesto atenta a prova existente”, sendo que “da prova junta aos autos e com relevo para a decisão deverão ser dado como provados os seguintes factos: a) "A Recorrente na secção II da prova optou por responder e respondeu ao "Subgrupo B" e b) "Por lapso assinalou no cabeçalho o "Subgrupo C"”.
Todavia, há dois reparos a fazer a esta questão.
Em primeiro lugar, no corpo alegatório o Recorrente não especifica qual ou quais dentre os meios de prova documental carreados para o processo, em seu critério serviriam de fundamento probatório à factualidade referida sob as alíneas a) e b) transcritas supra.
Como diz a Doutrina, “(..) Quando o recorrente impugna a decisão sobre matéria de facto, deve especificar, sob pena de rejeição do recurso, quais os pontos concretos que considera incorrectamente julgados (artº 690º-A, nº 1, al. a) CPC) e quais os meios de prova, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impõem uma decisão diversa sobre esses pontos (artº 690º-A, nº 1, al. b) CPC). (..)” (8).
Em segundo lugar, ainda que assim fosse, a matéria a levar ao probatório seguramente que não seria adjectivamente admissível na formulação sustentada nas alíneas a) e b), na medida em que à especificação e questionário, ou, como agora se pronuncia o CPC, ao elenco da factualidade assente e à base instrutória só vão factos, não sendo admitidas conclusões nem valorações, que são próprias do discurso jurídico fundamentador por via das operações de subsunção e estatuição dos normativos julgados aplicáveis ao caso concreto.
Na presente situação da alínea a) o segmento “optou por responder” não é um facto é uma conclusão e no tocante à alínea b) o segmento “por lapso assinalou” contém em si a decisão da causa na medida em que contém o efeito jurídico peticionado (interesse pretensivo) pelo Recorrente.
Dito de outro modo, a alínea b) configura justamente o que se não deve fazer, que é levar a decisão da causa ao elenco dos factos assentes (antiga especificação) ou aos quesitos da base instrutória (antigo questionário).
Pelas razões expostas, não cabe conhecer da questão suscitada nos itens 7 a 11 das conclusões.

d) lapso de escrita, artºs. 247º e 249º CC;
sentido e erro na declaração, artºs. 236º nº 1 e 247ºnº 1 CC;

O caso dos itens 12 a 28 e 30 a 33 das conclusões está em saber se, como vem sustentado pela Recorrente, se enganou relevando como lapso de escrita subsumível no artº 249º Código Civil ao assinalar a quadrícula respeitante às letras maiúsculas dentre as opções fornecidas de A a E na Secção II da folha de respostas.
Na circunstância, o documento evidencia como assinalada pelo punho da ora Recorrente, ou seja, por si manuscrita, a quadrícula sob a letra maiúscula C, matéria de facto levada ao probatório no item 16.

*
Nesta matéria acompanhamos na íntegra o discurso jurídico fundamentador em sede de sentença, para o qual se remete sem nenhuma declaração de voto em contrário, com os efeitos de confirmação do julgado nos termos e com os efeitos do artº 713º nº 5 CPC ex vi artº 140º CPTA.
Apenas se dirá que, tal como na declaração negocial, a prestação de provas de exame, sejam elas escritas ou orais, é um domínio em que a exteriorização da vontade é absolutamente fundamental, sendo que a respectiva relevância jurídica assenta no modo de exteriorização dessa mesma vontade; dito de outro modo, para efeitos jurídicos é a exteriorização da vontade do declarante que corporiza a declaração.
No caso concreto, a exteriorização da vontade de resposta, na forma escrita e pelo modo como foi aposta no documento que formaliza a prova, feita pela ora Recorrente assinalando a quadrícula referente à opção “C” da “Secção II”, constitui a declaração que corporiza a vontade juridicamente relevante que cumpre avaliar, no sentido de saber se se tratou de um lapso, como sustenta a Recorrente ou, pelo contrário, se se tratou de um erro na declaração, como julgado na sentença sob recurso.
Desde logo cumpre ter por assente que é o autor da declaração, no caso, a ora Recorrente, que suporta o ónus jurídico de expressar a sua vontade de modo adequado, em ordem a ser entendido pelo declaratário da forma por si pretendida, o que significa que este, no caso, quem afere as respostas dadas, pode confiar em que está perante o modo adequado pelo qual o declarante exteriorizou (expressou) a sua vontade, valendo, pois, aqui o sentido objectivo expresso e perceptível da vontade declarada, salvo, evidentemente, invalidação do acto praticado por erro na declaração, quer dizer, por atribuição na exteriorização da vontade, de um sentido que não foi o querido pelo declarante.
É exactamente com base na relevância normativa atribuída ao sentido objectivo da declaração decorrente do modo de exteriorização perceptível desta e consequente confiança do declaratário nessa adequação do meio de exteriorização escolhido pelo declarante e a si imputável, vd. artº 236º nº 1 Código Civil, que em sede de sentença se afirma, e bem, que “(..) tendo a Requerente assinalado, e fê-lo formalmente bem, o subgrupo "C". Assim, e radicando a escolha de um dos subgrupos da secção II nos candidatos, o júri só tem que assumir que a escolha declarada é a efectivamente escolhida. Donde, quer atendendo ao contexto da declaração, quer às circunstâncias em que esta é efectuada, a outra conclusão não podia o júri chegar senão àquela a chegou e que constitui o objecto da presente acção. (..)”.
Razões que afastam a relevância interpretativa no domínio do artº 249º CC, isto é, não releva o lapso de escrita porque o modo de exteriorização da vontade é, simultaneamente, perceptível e imputável à Recorrente mostrando-se afastado o requisito da ostensividade exigido pelo citado normativo, nos exactos termos sustentados em sede de sentença.
A inoperância do requisito da ostensividade é do domínio do óbvio porque, havendo alternativas passíveis de exteriorização da escolha de resposta dentre o leque de opções fornecidas de A a E na Secção II da folha de respostas, toda e qualquer das opções expressas é imputável ao examinando e, simultâneamente, insusceptível de ser conhecida pelo avaliador antes de efectivada a entrega das provas respondidas pelo examinando, salvo fraude - hipótese que não vem ao caso.
O que significa que, na circunstância dos autos, não há margem para levar em linha de conta o disposto no nº 2 do citado artº 236º CC na medida em que seria extraordinário sustentar que o avaliador das provas escritas, na posição jurídica de declaratário “conhecia a vontade real do declarante”, ou seja, da ora Recorrente.

*
Circunstancialismo que assume idêntico relevo no domínio do erro na declaração na medida em que não é possível sustentar, a não ser no domínio do absurdo, que a pessoa que vai aferir as respostas dadas aos exames conhece ou tem a obrigação de conhecer que os examinandos só iriam responder assinalando a quadrícula respeitante a esta ou aquela letra maiúscula dentre as opções fornecidas de A a E na Secção II da folha de respostas.
Caso se não esteja no domínio do absurdo, a alternativa será, repete-se, o domínio da fraude, pois não se vê a que propósito quem vai corrigir os testes de exame pode lícitamente ter conhecimento por antecipação que quadrícula respeitante a que letra maiúscula o examinando Fulano ou Sicrano quis assinalar.
Por isso que, para aplicação do disposto no artº 247º CC, falha o requisito da essencialidade do erro conhecida ou cognoscível pelo declaratário.
Pelas razões expostas e remetendo para a fundamentação da sentença sob recurso, improcedem todas as questões suscitadas nos itens 12 a 28 e 30 a 33 das conclusões.

***

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas a cargo da Recorrente.
Lisboa, 26.MAR.2009.


(Cristina dos Santos)

(Teresa de Sousa)

(Carlos Araújo em substituição)

(1) Anselmo de Castro, Direito processual civil declaratório, Vol. III, Almedina, Coimbra, pág.142.
(2) Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. V, Coimbra, 1981, págs. 53/54.
(3) Anselmo de Castro, Obra citada na nota (2), pág. 143.
(4) Mário Aroso de Almeida, O novo regime do processo nos tribunais administrativos, Almedina/2004, 2ª ed. pág.294/296 e 306/307.
(5) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex/1997, págs. 395 e 397.
(6) Mário Torres, Estudos em Homenagem a Francisco José VelozoTrês falsas ideias simples em matéria de recursos jurisdicionais no contencioso administrativo, Edição – Universidade do Minho, págs. 754 a 757 (7) Mário Aroso de Almeida, O novo regime do processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, pág. 289
(8) Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 1997, 2ª edição, pág. 527.