Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
| Processo: | 07714/14 |
| Secção: | CT- 2º JUÍZO |
| Data do Acordão: | 10/30/2014 |
| Relator: | JOAQUIM CONDESSO |
| Descritores: | DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO. PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO. EXECUÇÃO DE JULGADO. ARTº.100, DA L. G. TRIBUTÁRIA. TEORIA DA RECONSTITUIÇÃO DA SITUAÇÃO ACTUAL HIPOTÉTICA. ORDEM DE IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO INFERIOR AO DEVIDO. ARTº.40, Nº.4, DA L.G.T. |
| Sumário: | 1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário). 2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação. 3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. 4. Nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução da decisão. Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética. 5. A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios, cuja atribuição ao sujeito passivo, nos termos da lei, não está dependente da formulação de pedido nesse sentido, posição esta que está de acordo com os efeitos consequentes que decorrem da anulação do acto tributário, tal como do facto do pagamento de juros não estar dependente de pedido (cfr.artº.100, da L.G.Tributária; artº.61, nº.3, do C.P.P. Tributário). 6. A ordem de imputação do pagamento inferior ao devido prevista no artº.40, nº.4, da L.G.T., é a generalizadamente adoptada para o pagamento das dívidas tributárias, estando também prevista nos artºs.89, nº.2, e 262, nº.2, do C.P.P.T., para a compensação de créditos e pagamento em execução fiscal, respectivamente. Sem nos esquecermos que o artº.102, nº.2, da L.G.T., consagra o direito a juros de mora por parte do sujeito passivo, no caso da execução de sentença implicar a restituição de tributo já pago a efectuar pela Fazenda Pública, o certo é que, quando este pagamento for inferior ao devido, a sua imputação deverá seguir a regra prevista na norma sob exame, a qual, de resto, é generalizadamente utilizada pela lei para situações semelhantes, tendo consagração geral no artº.785, nº.1, do C.Civil, embora sem as especificidades do direito tributário. |
| Aditamento: |
| 1 |
| Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO X O DIRECTOR-GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.208 a 224 do presente processo, através da qual julgou parcialmente procedente a execução de julgado de sentença exarada em processo de impugnação que decidiu anular totalmente liquidações adicionais de I.V.A. e juros compensatórios relativas aos anos fiscais de 1998 e 1999.RELATÓRIO X X O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.232 a 235 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:1-Ao julgar procedente o pedido de imputação das quantias em dívida nos termos do n°.4, do artigo 40, da LGT, incorreu a sentença recorrida em erros de julgamento em matéria de facto e de direito, conforme seguidamente procuraremos demonstrar; 2-No ofício n°01.971, de 13 de Março de 2009, do Chefe de Finanças Adjunto do 2º. Serviço de Finanças de Lisboa, que serviu de base ao facto dado como provado no nº.13 do probatório da douta sentença - especificou-se que os € 25.578,61 e os € 26.365,09 pagos à requerente eram uma restituição de imposto - restituição do IVA pedido pela contribuinte; 3-Este facto significa que, através do pagamento em causa, a executada pretendeu, de forma expressa, proceder ao pagamento da quantia correspondente ao IVA que havia sido cobrado, não estando aí em causa quaisquer juros; 4-Como fez notar o Ilustre Conselheiro Jorge Lino ao apreciar questão semelhante à sub judice: "(...) no caso, está expressamente resolvido um eventual problema da imputação do cumprimento efectuado pela Direcção Geral dos Impostos (...), uma vez que está assente (...) que a quantia de € 96.816,67 paga à ora recorrente foi «correspondente ao imposto cobrado» (e não corresponde a qualquer outra componente da dívida restituenda" (cfr.voto de vencido que o Conselheiro Jorge Lino proferiu no Acórdão do STA de 17/10/2007, processo 0447/07, em que a sentença ora recorrida baseia a sua decisão); 5-Assim, porque se trata de um facto que influi decisivamente na decisão da causa, ao tê-lo ignorado no referido nº.13 do probatório, não o dando (também) como provado, incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento em matéria de facto; 6-Padece, também, a sentença recorrida de erro de julgamento em matéria de direito e isso, nomeadamente, por nela se ter procedido a uma menos correcta interpretação e aplicação do n°4 do artigo 40 da LGT; 7-Salvo melhor opinião, a norma do n.°4 do artigo 40 da LGT deve ser "lida" no contexto do artigo em que se insere, desde logo tendo em atenção a sua epígrafe: "Pagamento e outras formas de extinção das prestações tributárias"; 8-Nessa norma, pretendeu o legislador, expressa e claramente, regular os pagamentos que os contribuintes efectuam ao Estado; 9-Não se previu aí forma de cumprimento da obrigação (comum) de "restitutio in integrum" a cargo da Administração Fiscal no caso de reembolso ao contribuinte da prestação tributária indevidamente paga; 10-A ordem de imputação aí determinada refere-se, pois, apenas ao pagamento de dívidas tributárias; 11-É de acolher, também aqui, o entendimento do Conselheiro Jorge Lino (cfr. o supra referido voto de vencido, proferido no Acórdão do STA em que a sentença ora recorrida baseia a sua decisão): "Juridicamente há que afastar a possibilidade (que não está, e precisava de estar, expressamente prevista na lei) de aplicação deste modo do artigo 785 do Código Civil de imputação do cumprimento das obrigações às obrigações do Estado. Deve igualmente dizer-se que o artigo 40 da Lei Geral Tributária prevê, evidentemente, a forma de extinção das obrigações tributárias (do contribuinte, não do Estado) - e não prevê a forma de cumprimento da obrigação (comum) de "restitutio in integrum" a cargo da Administração Fiscal no caso de reembolso ao contribuinte da prestação tributária indevidamente paga. Para esta última situação prevê a lei que são devidos juros de mora, a pedido do contribuinte, a partir do termo do prazo da sua execução espontânea até ao seu pagamento - artigo 102, nº.2, da Lei Geral Tributária. (...) o critério de imputação sucessiva prescrito nos art.°s 40, n.° 4, da LGT e 785 do CC não é critério de imputação do cumprimento das dívidas do Estado aos particulares."; 12-Ao assim não entender, padece a sentença recorrida de ilegalidade, por desconforme com todas as disposições legais supra referidas; 13-E dados os vícios que a inquinam não pode ser mantida na ordem jurídica. X Não foram apresentadas contra-alegações.X O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.252 dos autos).X Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.X A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.213 a 215 dos autos - numeração nossa):FUNDAMENTAÇÃO X DE FACTO X 1-Entre os dias 21 de Junho e 24 de Outubro de 2001, a ora exequente foi objecto de uma acção de inspecção externa geral, com referência aos anos de 1997, 1998 e 1999, em matéria de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Imposto sobre o Valor Acrescentado ("IVA") e Imposto de Selo (cfr.documento junto a fls.35 e seg. dos presentes autos); 2-No que à matéria em questão concerne, do teor do relatório final de inspecção tributária resultou entenderem os serviços da Administração Tributária ter a ora exequente omitido a liquidação de IVA na alienação de salvados (cfr.documento junto a fls.35 e seg. dos presentes autos); 3-Em consequência, a ora exequente foi, com referência ao ano de 1998, notificada da liquidação adicional de imposto nº………..das liquidações de juros compensatórios nºs. ………., no montante de EUR 4.484,33, 02003079, no montante de EUR 5.602,94, ………., no montante de EUR 1.825,04, e 02003081, no montante de EUR 7.685,34, datadas de 31 de Janeiro de 2002 (cfr.documentos juntos a fls.69 a 74 dos presentes autos); 4-Paralelamente, a ora exequente foi, com referência ao ano de 1999, notificada da liquidação adicional de imposto nº……….., no montante de EUR 66.046,72 (dos quais EUR 51.157,21 se referiam a salvados), e das liquidações de juros compensatórios nºs. ………, no montante de 3.127,65 (dos quais EUR 1.422,74 se referiam a salvados), ………, no montante de EUR 2.651,47 (dos quais EUR 2.371,52 se referiam a salvados), ………, no montante de EUR 2.329,10 (dos quais EUR 1.923,73 se referiam a salvados) e …….., no montante de EUR 2.029,73 (dos quais EUR 1.923,04 se referiam a salvados), datadas de 31 de Janeiro de 2002 (cfr.documentos juntos a fls.76 a 81 dos presentes autos); 5-No dia 30 de Abril de 2002, por não se conformar com o teor dos actos tributários acima identificados, a ora exequente apresentou duas reclamações graciosas dos mesmos, no âmbito das quais requereu a sua anulação parcial com fundamento na carência de base legal da posição sustentada pelos serviços da Administração Tributária quanto à alegada falta de liquidação de imposto sobre a alienação de salvados (cfr.documentos juntos a fls.86 e seg. dos presentes autos); 6-No dia 27 de Dezembro de 2002, ao abrigo do regime excepcional de regularização de dívidas ao Estado, aprovado pelo Decreto-Lei 248-A/2002, de 14 de Novembro, a ora exequente procedeu ao pagamento de metade do imposto que lhe havia sido imputado pelos serviços da Administração Tributária, no montante de EUR 51.943,70 (EUR 26.365,09 relativos ao ano de 1998 e EUR 25.578,61 relativos ao ano de 1999), através do documento de cobrança Modelo 50 (cfr.documento junto a fls.83 dos presentes autos); 7-No dia 12 de Janeiro de 2005, e na sequência do exercício do seu direito de audição prévia, a ora exequente foi notificada do teor das decisões das reclamações graciosas apresentadas, nos termos das quais os serviços da Administração Tributária propugnaram pela aplicação do regime de tributação pela margem, decorrente do entendimento sufragado pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais no âmbito do seu Despacho nº. 1854/2000 XV (cfr.documentos juntos a fls.85 a 98 e 100 a 113 dos presentes autos); 8-Não se conformando com as motivações de facto e de Direito propulsoras das referidas decisões, a ora exequente deu entrada da petição de impugnação acima identificada (cfr.processo principal); 9-Por sentença proferida a 16 de Setembro de 2008, a impugnação judicial apresentada foi julgada totalmente procedente, tendo, em consequência, esse Douto Tribunal determinado: i.) A anulação das liquidações adicionais de imposto e juros compensatórios acima identificadas; ii.) A condenação da Administração Tributária no pagamento de juros indemnizatórios; e iii) A condenação da Administração Tributária no pagamento das respectivas custas processuais (cfr.processo principal); 10-A sentença a que se refere o número anterior transitou em julgado no passado dia 10 de Outubro de 2008; 11-No passado dia 31 de Outubro de 2008, a ora exequente deu entrada na Direcção-Geral dos Impostos, nos termos do artigo 33-A do Código das Custas Judiciais ("CCJ"), de nota discriminativa e justificativa das custas de parte a cujo pagamento a Fazenda Pública havia sido condenada em sede da supra identificada sentença (cfr.documento junto a fls.129 a 132 dos presentes autos); 12-Nesse sentido, foi solicitado à Direcção-Geral dos Impostos o pagamento de custas de parte no montante global de EUR 854,40, correspondendo: i.) EUR 712,00, à taxa de justiça inicial suportada pela ora exequente; ii) EUR 142,40, à procuradoria fixada nos termos do artigo 41, nº.2, do CCJ e considerando o disposto no artigo 13, nº.2, do CCJ; TOTAL: EUR 854,40 (cfr.documento junto a fls.129 a 132 dos presentes autos); X A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou…”.X Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Todos os factos têm por base probatória, o exame dos documentos referidos em cada ponto, o processo principal e o acordo das partes…”.X Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):14-O dispositivo da decisão recorrida tem o seguinte conteúdo: “(…) Pelo exposto, nos termos das disposições legais citadas: -julgo extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto aos montantes já reembolsados à exequente; -julgo improcedente o pedido de pagamento dos juros de mora sobre as custas de parte; -no mais, julgo procedente o pedido de pagamento dos montantes ainda em dívida, considerando, por um lado, as regras de imputação previstas no artigo 40, nº.4, da LGT e, por outro, que a contagem do prazo de execução espontânea se inicia com o trânsito em julgado da decisão exequenda e, também, que se conta nos termos do artigo 72, do CPA. (...)" (cfr.sentença exarada a fls.208 a 224 do presente processo). X Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a execução de julgado da sentença exarada no processo de impugnação judicial apenso, nos termos constantes do nº.14 do probatório, para onde se remete.ENQUADRAMENTO JURÍDICO X X Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).O recorrente dissente do julgado alegando, em primeiro lugar e como supra se alude, que no ofício n°01.971, de 13 de Março de 2009, do Chefe de Finanças Adjunto do 2º. Serviço de Finanças de Lisboa, que serviu de base ao facto dado como provado no nº.13 do probatório da decisão recorrida especificou-se que os € 25.578,61 e os € 26.365,09 pagos à requerente eram uma restituição de imposto - restituição do I.V.A. pedido pelo contribuinte. Este facto significa que, através do pagamento em causa, a executada/recorrente pretendeu, de forma expressa, proceder ao pagamento da quantia correspondente ao I.V.A. que havia sido cobrado, não estando aí em causa quaisquer juros. Porque se trata de um facto que influi decisivamente na decisão da causa, ao tê-lo ignorado no referido nº.13 do probatório, não o dando (também) como provado, incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento em matéria de facto (cfr.conclusões 2, 3 e 5 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de facto da sentença recorrida. Dissequemos se a decisão recorrida padece de tal vício. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.). Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário). O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72). “In casu”, o recorrente pede que se adite ao probatório que os montante já pagos pela Fazenda Pública ao exequente visavam, de forma expressa, proceder ao pagamento da quantia correspondente ao I.V.A. que havia sido cobrado, não estando aí em causa quaisquer juros (cfr.nº.13 do probatório). Julga-se improcedente tal pedido de aditamento ao probatório, com base nos seguintes vectores: 1-Do exame dos documentos juntos a fls.194 e 195 dos presentes autos, os quais basearam a estruturação do nº.13 do probatório, não se pode retirar a conclusão de que tais pagamentos não visavam quaisquer juros; 2-Encontramo-nos perante meros juízos conclusivos de facto, que não matéria de facto. (1) Concluindo, não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente este fundamento do recurso, mais se confirmando a decisão do Tribunal “a quo”, neste segmento. O apelante aduz, igualmente e como supra se alude, que padece a sentença recorrida de erro de julgamento em matéria de direito por nela se ter procedido a uma menos correcta interpretação e aplicação do artº.40, nº.4, da L.G.T. Que nesta norma pretendeu o legislador, expressa e claramente, regular os pagamentos que os contribuintes efectuam ao Estado. Não se prevê na mesma a forma de cumprimento da obrigação (comum) de "restitutio in integrum" a cargo da Administração Fiscal no caso de reembolso ao contribuinte da prestação tributária indevidamente paga. Que a ordem de imputação aí determinada refere-se apenas ao pagamento de dívidas tributárias. Que ao assim não entender, padece a sentença recorrida de ilegalidade (cfr.conclusões 6 a 12 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida. Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha. Nos termos do artº.100, da L.G.Tributária, em virtude da procedência total ou parcial de impugnação a favor do sujeito passivo, a A. Fiscal está obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto objecto do litígio, tal dever compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, se for caso disso, computados a partir do termo do prazo da execução da decisão (cfr.artº.43, da L.G.T.). Em face de tal postulado, a anulação judicial do acto tributário implica o desaparecimento de todos os seus efeitos “ex tunc”, tudo se passando como se o acto anulado não tivesse sido praticado, mais devendo a reintegração completa da ordem jurídica violada ser efectuada de acordo com a teoria da reconstituição da situação actual hipotética (cfr.Diogo Freitas do Amaral, A execução das sentenças dos Tribunais Administrativos, 2ª. edição, Almedina, 1997, pág.70; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.868 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, 6ª. edição, 2011, pág.526 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc.5110/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 17/9/2013, proc.6718/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13). A A. Fiscal está, assim, obrigada a reconstituir a situação legal que hipoteticamente existiria se não houvera sido objecto de um acto lesivo ou de uma ofensa por si cometida contra os direitos e interesses protegidos dos administrados. Tal constitui uma simples explicitação do princípio geral de direito que nos diz que devem ser apagados todos os efeitos jurídico-práticos consequentes de um acto ilícito (cfr.artº.562, do C.Civil). A reconstituição da situação hipotética actual justifica a obrigação de restituição do imposto que houver sido pago, tal como do pagamento de juros indemnizatórios, cuja atribuição ao sujeito passivo, nos termos da lei, não está dependente da formulação de pedido nesse sentido, posição esta que está de acordo com os efeitos consequentes que decorrem da anulação do acto tributário, tal como do facto do pagamento de juros não estar dependente de pedido (cfr.artº.100, da L.G.Tributária; artº.61, nº.3, do C.P.P. Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/2/2009, rec.1003/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/7/2006, proc.1258/06; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/1/2007, proc.205/04; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.869). No caso "sub judice", haverá que saber se a ordem de imputação de pagamento inferior ao devido prevista no artº.40, nº.4, da L.G.T., somente se aplica aos pagamentos que os contribuintes efectuam ao Estado, conforme defende o recorrente, ou, pelo contrário, tal norma também se pode aplicar às restituições de imposto efectuadas pela Fazenda Pública em relação a tributos indevidamente pagos pelo sujeito passivo, como entendeu o Tribunal “a quo”. A ordem de imputação do pagamento inferior ao devido prevista no artº.40, nº.4, da L.G.T., é a generalizadamente adoptada para o pagamento das dívidas tributárias, estando também prevista nos artºs.89, nº.2, e 262, nº.2, do C.P.P.T., para a compensação de créditos e pagamento em execução fiscal, respectivamente. Sem nos esquecermos que o artº.102, nº.2, da L.G.T., consagra o direito a juros de mora por parte do sujeito passivo, no caso da execução de sentença implicar a restituição de tributo já pago a efectuar pela Fazenda Pública, o certo é que, quando este pagamento for inferior ao devido, a sua imputação deverá seguir a regra prevista na norma sob exame, a qual, de resto, é generalizadamente utilizada pela lei para situações semelhantes, tendo consagração geral no artº.785, nº.1, do C.Civil, embora sem as especificidades do direito tributário (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 17/10/2007, rec.447/07; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª.edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.333 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.229 e seg.). Revertendo ao caso dos autos, verificando-se uma situação de restituição em singelo das liquidações tributárias pagas e entretanto anuladas (cfr.nºs.9 e 13 do probatório), deve concluir-se que o mesmo pagamento foi inferior ao devido e, em consequência, aplicar a regra de imputação prevista no examinado artº.40, nº.4, da L.G.T., assim se devendo confirmar a decisão da 1ª. Instância, também neste segmento. Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão. X Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.DISPOSITIVO X X Condena-se o recorrente em custas.X Registe.Notifique. X Lisboa, 30 de Outubro de 2014 (Joaquim Condesso - Relator) (Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto) (Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto) (1) (quanto à destrinça entre matéria de facto e juízos conclusivos de facto vide António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, pág.237 e seg.; José Lebre de Freitas e Outros, C.P.Civil anotado, Volume II, Coimbra Editora, 2008, pág.605 e seg.). |