Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 6573/02 |
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Secção: | Contencioso Tributário |
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Data do Acordão: | 06/04/2002 |
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Relator: | João António Valente Torrão |
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Descritores: | IRC CUSTOS FACTURAS INDICIADAS PELA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA COMO FALSAS ÓNUS DA PROVA DA AT E DO CONTRIBUINTE |
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Sumário: | 1. A presunção da veracidade da escrita do contribuinte cessa quando a Administração Tributária recolhe indícios sérios e credíveis de que as operações constantes das facturas não se realizaram efectivamente. 2. Cabe, por isso, ao contribuinte desfazer aqueles indícios apresentado prova da qual resulte que as facturas titulam os fornecimentos ou serviços delas constantes, sob pena de os respectivos valores não poderem ser considerados custos fiscais. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo: 1. “H..., Lda”, pessoa colectiva nº..., com sede na Travessa..., São Julião - Figueira da Foz, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Coimbra que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação adicional do IRC do ano de 1993, no montante de 31.712.706$00, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: a) Na determinação da matéria de facto dada como provada, a sentença recorrida limitou-se a seguir o relatório da Inspecção Fiscal, sem considerar o depoimento das testemunhas, deu como provado tudo quanto se escreveu neste relatório, porque considerou relevante a pseudo-confissão feita por um dos sócios-gerentes da ora impugnante, a qual é legalmente ineficaz em relação à ora impugnante. b) Nos termos da certidão do Registo Comercial da Figueira da Foz, a ora impugnante obriga-se com a assinatura de dois gerentes, pelo que, tendo a dita confissão produzida apenas por um dos sócios-gerentes, não sendo aceite pelo outro e não tendo sido prestado perante o juiz, o depoimento daquele gerente nenhum valor tem. Acontece por fim, c) Aliás, resulta do depoimento do gerente do impugnante, requerido pela própria Fazenda Pública não as confirma perante Vª. Ex.cia, pelo que tal meio de prova cai pela base, tendo o referido sócio gerente esclarecido as condições concretas em que prestou esse depoimento e que revelam bem o seu estado psicológico. d) considerando desviante do normal comportamento de uma empresa o recurso a facturas falsas, não se quis saber, nem como, nem porquê foi obtida a confissão e nada foi considerado perante a relevância dessa confissão. e) É que a referida pseudo-confissão não corresponde à realidade, pois as ditas “facturas falsas” são facturas que obedecem a todos os requisitos legais, dado que têm a indicação do destinatário, o respectivo número de identificação de pessoa colectiva ou comerciante individual, liquidação de IVA devido, etc., não sendo exacto que se trate de documentos falsos, dado que os mesmos correspondem a mercadorias e serviços utilizados, pagos e prestados pela ora impugnante nas empreitadas que adjudicou. f) Acresce que as mesmas foram lançadas nas respectivas contabilidades pelas pessoas singulares ou colectivas que com a ora impugnaste transaccionaram e que resultam confirmados dos depoimentos prestados nos autos. g) Face ao que se deixa exposto, deve ser alterada a decisão da matéria de facto , no sentido de: a) serem eliminadas as conclusões de factos não alicerçados em factos concretos como acontece com as primeiras 11 conclusões de facto da sentença ora recorrida e b) deverem considerar-se não provados os factos relativos à Associação Naval 1º de Maio, pois não existe prova documental dos mesmos. h) Com base nos factos que devem ser correctamente dados como provados, verifica-se que o acto de liquidação impugnado está ferido de invalidade, por vício de fundamentação e por não demonstrar a invalidade da presunção a favor da ora recorrente. i) O acto impugnado fundamenta-se em factos que não são exactos, pelo que padece de vício de fundamentação, por erro nos pressupostos de facto e, por falta ou vício de fundamentação, tem de ser anulada a liquidação adicional de IVA notificada à ora recorrente. j) Além disso, a impugnante goza da presunção de verdade das declarações fiscais por si emitidas, consagrada no artº 121º do CPT, não podem ser consideradas as quantias liquidadas adicionalmente. k) Existe, aliás, dúvida fundada sobre os valores quantificados no relatório final, pois suspeitando os técnicos tributários que tais facturas são falsas - a declaração do gerente é apenas um princípio de prova - caber-lhes -ia o ónus da prova de que as referidas facturas não correspondem a trabalhos efectuados. l) Por falta de descoberta das contabilidades de outros contribuintes não pode a ora recorrente ser responsabilizada, cabe à Fazenda Pública a prova dessa veracidade dos factos que alega, pois, nos termos do artº 350º nº 1 do Código Civil “quem tem a seu favor uma presunção legal, escusa de provar o facto a que ela conduz”. m) Ao contrário do que refere a sentença recorrida, o ónus da prova impende sobre a Fazenda Pública e não sobre a ora recorrente, pelo que, na falta de prova adequada, prevalece a declaração M22 de IRC efectuada pela ora recorrente e que foi alterada com base no relatório da Inspecção Tributária. n) Deste modo, mostrando-se incorrectamente apreciada e valorada a prova produzida, deve ser alterada a decisão da matéria de facto, nos termos que se deixam expostos. o) Por outro lado, a decisão recorrida, viola por erro de interpretação e aplicação, entre outros, os artºs 141º e 344º do CPPenal, aplicáveis subsidiariamente, o artº 121º do CPT e o artº 350º do Código de Processo Civil, pelo que deve ser revogada e substituída por outra decisão, que, julgando procedente a presente impugnação, anule a liquidação adicional de IRC relativa ao ano de 1993 feita à ora impugnante, com todas as consequências legais, como é de lei. 2. O MºPº é de parecer que o recurso não merece provimento (v. fls. 339-vº). 3. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir. 4. São os seguintes os factos dados como provados em 1ª Instância: a) Durante o período que o relatório dos SPIT evidencia, junto aos autos, nunca foram efectuadas reconciliações bancárias. b) Apresentando a contabilidade lançamentos de alguns cheques que nunca aparecem movimentados nos extractos bancários e outros muitos meses depois. c) As contas correntes com os fornecedores evidenciam, em muitos períodos, saldos que não correspondem à realidade. d) Através de visita fiscalizadora a alguns desses fornecedores, verificou-se que muitos dos fornecimentos contabilizados correspondem a transacções que nunca existiram na realidade. e) Havendo, muitas vezes, apenas a factura do fornecedor, não aparecendo qualquer recibo referente à mesma. f) Em diversos períodos, a numeração dos documentos em arquivo não confere com a constante dos extractos de contabilidade. g) Em alguns meses chega a haver diferenças de 3 e 4 dígitos. h) Foram detectados diversos documentos lançados na contabilidade cuja numeração não corresponde com a aposta no respectivo documento de suporte em arquivo. I) Existem documentos cuja numeração foi emendada e rasurada. j) Também foram detectados nas pastas de arquivo, alguns documentos sem qualquer numeração e classificação que, não obstante, se encontram lançados na contabilidade. l) Em muitos casos, as facturas emitidas pelos fornecedores são “liquidadas contabilisticamente” 6, 8 e 12 meses depois da emissão. m) Algumas das sedes de tais fornecedores, mencionadas nas facturas, não existiam ou encontravam-se encerradas. n) Procurados sócios das firmas, alguns não foram encontrados. o) Outros, cujo contacto foi possível, não contabilizaram quaisquer facturas emitidas. p) Alguns, apesar de contabilizarem os documentos não declararam nem entregaram os impostos devidos. q) Estes últimos são, sobretudo, sujeitos passivos que vendem ou prestam serviços a consumidores finais particulares, que não solicitam documentos. r) Destarte, o contribuinte J..., tendo cessado a actividade em 28 de Fevereiro de 1990, continuou a emitir facturas e recibos de montantes individualizados, desde a data da cessação até finais de 1993, não tendo contabilizado nenhum destes documentos. s) Os seus livros de contabilidade apenas se encontram escriturados até Fevereiro de 1990. t) O contribuinte A...(verdete) encontra-se em Angola, vindo, por vezes, a Portugal. u) As facturas que emitiu para a “ H..., Lda...” não foram contabilizadas. v) Nem entregou nos Cofres do Estado o IVA liquidado, nem declarou os valores para efeitos de IRS. x) As duas facturas emitidas por “F..., Lda...”, emitidas em Novembro e Dezembro de 1991, encontravam-se por saldar à data de 31 de Dezembro de 1993. z) O contribuinte C... apesar de notificado para apresentar a contabilidade não a apresentou. Z1) No período a que se referem as facturas emitidas não enviou meio de pagamento de IVA devido ao Estado, tendo apenas enviado a declaração periódica. Z2) A contribuinte “M..., Lda... “ declarou para o exercício de 1991, em que emitiu as facturas para a “H..., Lda...”, declarou como volume de negócios valor inferior às três facturas emitidas. Z3) O contribuinte M ... emitiu duas facturas à “H..., Lda...”, tendo apenas contabilizado uma. Z4) Tal contribuinte utiliza, em simultâneo, pelo menos 3 ordens de facturas, não referenciadas. Z5) Relativamente à “N..., Lda...”, estão em causa três facturas. Z6) Não contabilizou uma delas. Z7) Não existe consonância entre as datas de liquidação das facturas, pois da contabilidade da “H..., Lda...” constam as de Outubro de 19983 para 149 e Dezembro de 1993 para as 161 e 162. Z8) Enquanto que na contabilidade da “N..., Lda..., constam as de Outubro de 1992 para a 149 e Novembro de 1992 para a 161. Z9) O IVA liquidado e correspondente à factura nº 162 não foi entregue nos Cofres do Estado. Z10) A contribuinte “Construções R..., Ldª” não enviou as declarações periódicas de IVA referente ao ano de 1993 em que se inserem as facturas em causa. Z11) Não entregando, igualmente, o imposto nas mesmas liquidadas. Z12) A factura questionada e emitida pela “F..., Ldª”, encontrava-se em arquivo sem numeração nem classificação. Z13) Constando da contabilidade com o nº 8952, o qual, por sua vez, no arquivo correspondia a um documento de seguros, no montante de 611.818$00. Z14) Quanto à “Associação N...”, como de resto os documentos juntos aos autos, a ela respeitantes, evidenciam, do total facturado, apenas 15% dava entrada nos Cofres do Club. Z15) Sendo os restantes 85% devolvidos à impugnante, geralmente através de cheque. Z16) Ou seja, a impugnante passava um cheque pela factura da Associação, que era depositado na conta desta. Z17) Mas, posteriormente, era emitido pela Associação um outro cheque correspondente a 85% do valor facturado e que era depositado nas contas da “H..., Lda...” ou dos sócios desta. Z18) O IVA era sempre entregue na totalidade à Associação que, por sua vez, o não entregava ao Estado. Z19) As sociedades “H..., Ldª” e “A ..., Ldª “, têm a mesma sede, a qual se encontra encerrada. Z20) A primeira não apresentou as declarações modelo 22 dos anos de 1992 e 1993 e nunca enviou declarações periódicas de IVA, desde finais de 1990. Z21) A sociedade “R..., Ldª “, não apresentou qualquer declaração modelo 22 do IRC desde o início da actividade. Z22) Enviou a declaração periódica de IVA, referente ao período de 93-12T, em que se inserem as facturas questionadas, mas em branco, não entregando nos Cofres do Estado o imposto liquidado nas mesma. Z23) O contribuinte J..., não apresentou qualquer declaração de rendimentos modelo 2 ou do IRS e não enviou quaisquer declarações periódicas de IVA. Z24) Inclusive do período a que respeitam as facturas emitidas e questionadas. Z25) O sócio-gerente da impugnante srº Engenheiro M..., declarou que, por vezes, recorreu a esses fornecedores para obter algumas facturas de favor. Z26) Em auto de declarações identificou os documentos falsos. Z27) Que constituem o anexo 3 do relatório de exame à escrita. Z28) Durante os anos de 1991,1992 e 1993, contabilizou na firma de que é sócio-gerente, como compras, diversos documentos referentes a transacções que nunca foram efectivamente realizadas. Z29) Que tal se deveu, sobretudo, ao facto de ter feito diversas despesas, que não pode documentar. Z30) Tais como o pagamento ao seu sócio antigo senhor F..., do valor de 120 mil contos, referentes a cedência de quotas aos outros sócios. Z31) Pagamento de gratificações a empregados e a terceiros, sem poder especificar valores concretos. Z32) Refere, ainda que alguns cheques teriam sido depositados em contas dos sócios. Z24) Que, por sua vez, pagavam aos emitentes dos documentos, antes referidos, algumas verbas. Z25) A título de “compra de papel”, que variava entre os 3% e os 5%, sem poder especificar valores concretos. Z26) Relativamente a todos os emitentes, verifica-se que o IVA era sempre entregue ao emitente. Z27) Mais declarou que todos os documentos constantes das 19 relações anexas a tal auto de declarações correspondem a transacções que nunca foram realizadas. Z28) No que respeita à caldeira de alcatrão, do respectivo documento de aquisição (anexo 19 do relatório) decorre que o preço de aquisição, depois de descontos de pronto pagamento, foi de 436.500$00. Z29) No caso C... (relatório, ponto 3.4.1-IV) foi recusada a escrita para confronto. Z30) Tornando-se impossível apurar se os documentos emitidos à “H..., Lda...” se encontravam contabilizados. Z31) No entanto, já no ano de 1991 emitiu quatro facturas que não correspondem a quaisquer transacções ou serviços, no montante de 5.620.985$00. Z32)A que corresponde o IVA de 955.568$00. Z33) A última declaração apresentada por este C..., respeita ao ano de 1991, não tendo apresentado as de 1992 e 1993. Z34) Na individualização de “M..., Lda” (relatório ponto 3.4.21.V), este sujeito passivo, já no ano de 1991 emitiu 3 facturas no montante de 18.652.200$00. Z35) A que corresponde o IVA de 3.170.874$00. Z36) Não tendo sido apresentados pela empresa (M..., Lda...) quaisquer elementos de contabilidade. Z37) Consultado o terminal do IVA revelou não ter sido enviada a declaração periódica referente ao período em que foram emitidas tais facturas (Fevereiro e Março 1991). Z38) A soma das facturas encontradas na “H..., Lda...” com outras encontra das na firma “L..., Ldª” referentes ao mesmo ano, totalizam 18.962.050$00 de serviços prestados. Z39) Da declaração mod. 22 do ano de 1991 consta como total do volume de negócios o montante de 18.925.732$00. Z40) Valor inferior à soma das ditas facturas. Z41) Na consideração da “N..., Lda.” (relatório ponto 3.4.2.1- VII) esta empresa, já no ano de 1992 emitiu 3 facturas à “H..., Lda...”, no montante de 10.367.500$00. Z 42) A que corresponde o IVA de 1.658.800$00. Z43) Da mesma conta corrente não consta a factura nº 162º, de 20.12.1992, no montante de 3.650.000$00, com IVA de 584.000$00. Z44) Não tendo, assim, sido contabilizada pelo emitente. Z45) Não existe consonância entre as datas de liquidação das facturas, Z46) Pois, da contabilidade da “H..., Lda...” constam as de Outubro de 1993 para a 149 e Dezembro de 1993 para as 161 e 162, Z47) Ao passo que na contabilidade da “N..., Lda...” constam as de Outubro de 1992, para a 161. Z48) No circunstancialismo da “Fozconta (relatório, ponto 3.4.2.1. IX), no ano de 1991 emitiu uma factura à “H..., Lda...”, no valor de 1.200.000$00, Z49) A que corresponde o IVA de 204.000$00, liquidado na mesma, Z50) Sem correspondência, na realidade, da operação económica individualizada. Z51) A fls. 67 dos autos, o sócio-gerente da impugnante, srº Engenheiro M..., admitiu que “durante os anos de 1991, 1992 e 1993, contabilizou na firma de que é sócio-gerente, como compras e despesas, diversos documentos referentes a transacções que nunca foram efectivamente realizadas, Z53) Bem como “que todos os documentos constantes das 19 relações anexas a tal auto de declarações, correspondem a transacções que nunca foram realizadas... “ 5. De acordo com as conclusões das alegações os vícios da decisão recorrida são os seguintes: a) Errada apreciação da matéria de facto ao dar como provado tudo quanto se escreveu no relatório da fiscalização tributária, bem como ao dar relevância ao depoimento do sócio-gerente da impugnante (conclusões das alíneas a) a g) e n) ). b) A falta de fundamentação do acto tributário e a dúvida fundada a favor do contribuinte que não foram tidos em conta na decisão recorrida (conclusões das alíneas h) a k) ). c) Violação das regras do ónus da prova (conclusões das alíneas l) e m) ). 5.1. Comecemos por apreciar a questão da matéria de facto fixada pelo Mmº Juiz recorrido. Desde logo se vê, atenta a petição de impugnação, que grande parte dos factos fixados são irrelevantes para a decisão de mérito já que está apenas em causa o exercício de 1993. Por outro lado, constam também do probatório factos conclusivos, sendo certo que dele devem constar apenas factos e não conclusões. Com efeito, na petição de impugnação o que está em causa é a liquidação do IRC referente ao ano de 1993, sendo certo que tal liquidação decorre de correcções técnicas. Logo, não interessam aos autos os factos referidos na sentença a propósito das irregularidades da contabilidade da recorrente, os quais seriam relevantes para justificar o recurso a métodos indiciários que não foram utilizados no caso concreto (V. os parágrafos 5º a 7º de fls. 313, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º de fls. 314, 8º e 9º de fls. 316, por exemplo). Pela mesma razão são também irrelevantes os factos que se referem a facturas emitidas quanto aos anos de 1991 e 1992, ou seja a matéria referente à A ..., “F..., Ldª”, a C..., “M..., Lda”, “L..., Ldª “ e “N..., Lda..., Ldª”. O facto referido no 1º parágrafo de fls. 314 é meramente conclusivo. Tendo em atenção o pedido formulado pela recorrente na petição inicial há então e apenas que considerar as facturas referentes ao ano de 1993 e às seguintes empresas e empresários em nome individual: a) J... (v. fls. 25). b) “Construções R..., Ldª ” (v. fls. 32). c) “ H.S.B…., Ldª” (v. fls. 35). d) “A ..., Ldª” (v. fls. 36). e) “ R..., Ldª” (v. fls. 37). f) J… (v. fls. 38). Em face do que ficou dito, iremos reformular o probatório, eliminando os factos conclusivos e os que não se reportam a facturas e factos relativos ao exercício de 1993, dando-se parcial provimento ao recurso, nesta parte. 5.2. São os seguintes os factos provados nos autos e que relevam para a decisão: a) A ora recorrente é uma empresa que se dedica à construção civil e obras públicas de montagem de instalações eléctricas de alta, média e baixa tensão e outros trabalhos (v. relatório de fls. 17 nº 1.2.). b) A recorrente encontra-se colectada na 2ª Repartição de Finanças da Figueira da Foz. c) A recorrente foi notificada para proceder ao pagamento da quantia de 31.712.706$00, resultando a referida liquidação de correcções técnicas a que procedeu a DGCI nos termos do artº 77º do CIRC com referência ao exercício do ano de 1993 (v. doc. de fls. 8). d) A recorrente foi alvo de outras liquidações de IRC relativas aos anos de 1991 e 1992 que se basearam num relatório da DF de Novembro de 1994 (v. artº 30º da petição e doc. de fls. 13 e segs.). e) A liquidação adicional referida na c) supra resultou do facto de, com base no relatório acima referido e que constitui fls. 13 e segs., se ter entendido que a recorrente contabilizou facturas que não correspondiam a transacções efectivamente realizadas ou serviços prestados (v. relatório acima referido a fls. 40). f) O contribuinte J... emitiu em 1993 facturas para a recorrente no montante de 10.815.000$00 (v. fls. 25, 72, 128 e 131). g) O referido contribuinte iniciou a sua actividade em 9.9.88 com trabalhos que concorrem para a construção de edifícios - CAE 500040, tendo cessado a actividade em 28.2.90, tendo apresentado a declaração de cessação de actividade em 24.7.91 reportada aquela data (V. fls. 25). h) O mesmo continuou a emitir facturas desde aquela data de cessação até finais de 1993, não tendo contabilizado nenhum destes documentos, nem apresentado declaração periódica de IVA ou declaração de rendimentos relativas a esses períodos (v. fls. 25). i) A contribuinte “C..., Lda...” emitiu no ano de 1993 seis facturas para a recorrente, no montante total de 14.708.000$00 (v. fls. 32, 84, 248, 250, 252, 253, 254 e 257). j) Esta empresa desde o início da sua actividade nunca apresentou qualquer declaração modelo 22, não tendo igualmente enviado declarações periódicas de IVA a que respeitam as facturas emitidas referidas na i) supra (v. fls. 32). l) Apesar de, em acção de fiscalização tributária a esta empresa, esta ter sido notificada para apresentar a sua escrita, nunca o fez, acabando por ser tributada com recurso aos métodos indiciários (v. fls. 32). m) A contribuinte “H.S.B...., Ldª ” emitiu no ano de 1993 facturas para a recorrente, no montante total de 23.438.330$00 (v. fls. 35, 81, 223, 226, e 229). n) Esta empresa, à data da acção de fiscalização, encontrava-se encerrada, não tendo sido possível contactar o sócio-gerente srº H... e tendo o encarregado da contabilidade declarado desconhecer a localização da sede da empresa (v. fls. 35). o) A referida empresa não apresentou a declaração modelo 22 referente aos anos de 1992 e 1993, não tendo igualmente enviado declarações periódicas de IVA desde finais de 1990 (v. fls. 35). p) A contribuinte “A ..., Ldª ” emitiu no ano de 1993 seis facturas para a recorrente, no montante total de 15.082.500$00 (v. fls. 36, 85, 259, 262, e 263). q) Esta empresa tem como sócios gerentes os mesmos da empresa referida na m) supra, não tendo sido possível à fiscalização tributária contactá-los, sendo certo que a respectiva sede se encontrava encerrada (v. fls. 36). r) Esta empresa nunca apresentou a declaração modelo 22 de IRC, não tendo igualmente enviado declarações periódicas de IVA desde finais de 1990 (v. fls. 36). s) A contribuinte “R..., Lda...” emitiu em Dezembro de 1993 duas facturas para a recorrente, no montante total de 6.810.000$00 (v. fls. 37, 86, 266, 267). t) O sócio gerente desta empresa J..., que também emitiu para a recorrente diversas facturas, em nome individual (v. f) supra), apesar de contactado para exibir a escrita da empresa nunca mais apareceu, apesar de diversas vezes procurado pela fiscalização (v. fls. 37). u) A mesma empresa nunca apresentou qualquer declaração modelo 22 desde o início da sua actividade, tendo enviado a declaração periódica de IVA correspondente ao período 93-12T, a que respeitam as facturas emitidas, mas em branco (v. fls. 37). v) O contribuinte J... emitiu em Novembro e Dezembro de 1993 duas facturas para a recorrente, no montante total de 2.679.000$00 (v. fls. 38, 86, 266, 267). x) Este contribuinte é sócio gerente da empresa “Construções R..., Ldª”, referida na i) supra e nunca foi possível contactá-lo (v. fls. 38, 87, 269 e 271). z) Este contribuinte nunca apresentou qualquer declaração de rendimentos, não tendo igualmente enviado declarações periódicas de IVA no período a que se reportam as facturas emitidas (v. fls. 38). Z1) Os peritos de fiscalização tributária solicitaram ao sócio gerente da recorrente srº Engenheiro M... os extractos bancários e fotocópias de diversos cheques que, eventualmente, teriam servido para liquidar determinadas facturas, tendo o mesmo declarado que não eram necessários esses elementos e tendo colaborado na identificação dos documentos cujos custos não correspondiam à realidade e que constam de fls. 69 a 87 (v. fls. 39, 67 e 68). Z2) Na contabilidade da recorrente aparecem lançados cheques que nunca aparecem movimentados nos extractos bancários, sendo certo que nos anos de 1991 a 1993, nunca foram efectuadas reconciliações bancárias (v. fls. 18, ponto 2.3.). 6. Pela análise do probatório se verifica que, tal como havia sido decidido no tribunal recorrido, os factos dados como provados se baseiam exclusivamente no relatório da fiscalização tributária e documentos a ele anexos e no doc. junto pela recorrente. Diremos agora porquê. 6.1. A pretensão da recorrente de se dar relevância à prova testemunhal não pode ser atendida pelas seguintes razões: a) A testemunha C..., relativamente às facturas emitidas pelas empresas e contribuintes referidos no probatório, nada referiu de concreto, limitando-se a referir genericamente que várias empresas trabalhavam para a recorrente. Sendo assim, tal depoimento de modo nenhum poderia ser aceite para contrariar o conteúdo do relatório baseado em documentos extraídos da contabilidade da recorrente (v. fls. 288). b) Quanto à testemunha M...a, o seu depoimento incidiu apenas sobre as relações da recorrente com a empresa “F...”, sendo certo que, quanto a esta empresa, não existem facturas relativas ao exercício de 1993. Sendo assim, o depoimento desta testemunha é absolutamente irrelevante para a decisão dos autos(v. fls. 289) c) Quanto ao depoimento da testemunha Ma..., limita-se também a aspectos genéricos sobre o funcionamento da recorrente, não apresentando concretamente um único facto que demonstre que os serviços referidos nas facturas em causa foram efectivamente prestados ou as transacções foram efectivamente realizadas. Quanto ao mais do seu depoimento é irrelevante já que, como acima se referiu, está apenas em causa o exercício de 1993 e a “F...” e a “A ...” não estão em causa quanto a esse exercício, como resulta do probatório. 6.2. Posto isto, cabe justificar a razão da relevância dada às declarações do sócio gerente da recorrente, facto também contestado pela recorrente. Por um lado, não estamos no domínio do processo penal, nem perante um arguido, carecendo assim de valor o facto de o tal sócio gerente não ter prestado as declarações perante um juiz. É também irrelevante que o outro sócio esteja ou não de acordo com as declarações prestadas, pois não estamos no domínio da confissão em processo civil. As declarações foram prestadas a nível individual pelo sócio gerente e nada têm a ver com a forma como a sociedade se obriga legalmente. É também irrelevante que o mesmo sócio gerente tenha negado as declarações prestadas perante o juiz, já que os argumentos invocados não convencem, tanto mais que o referido sócio gerente é engenheiro, pessoa que não pode ser considerada “um simplório” que se deixa amedrontar pelos peritos da fiscalização tributária que lhe fazem ver as consequências de as facturas serem falsas. De todo o modo, aliás, é de notar que ele nem queria prestar depoimento perante o juiz, o que só foi feito pela própria iniciativa do Mmº juiz “a quo”. Não fora este facto e nem sequer teria negado as declarações ou invocado os irrisórios motivos para prestar e assinar aquelas declarações. Sendo assim, as referidas declarações têm de aceitar-se como um elemento de prova livremente apreciado pelo juiz, conjugando essa prova com as outras que os autos fornecem, nomeadamente o facto de ter indicado aos peritos as facturas acima referidas, a coincidência de algumas empresas estarem encerradas, de os sócios de algumas empresas serem as mesmas e de existir identidade entre a qualidade de empresário em nome individual e sócio gerente de algumas das empresas em causa. 6.3. Aqui chegados, cabe agora apreciar as outras questões das conclusões das alegações. 6.3.1. Quanto ao vício de falta de fundamentação do acto tributário desde já diremos que ele não ocorre. Na verdade, se é certo que a notificação da liquidação se não fazia acompanhar da fundamentação, a verdade é que ela existia e a recorrente dela tinha conhecimento, tal como refere no artº 30º da petição. Se alguma dúvida tivesse, no entanto, poderia ter usado da faculdade referida no artº 22º do CPT, requerendo a certidão da fundamentação ou a notificação desta. De qualquer modo, a fundamentação destina-se a permitir ao contribuinte conhecer os motivos pelos quais a Administração decidiu em certo sentido e não noutro, de modo a que aquele acate a decisão ou a impugne graciosa ou contenciosamente. No caso dos autos, resulta da petição inicial que a recorrente compreendeu bem os motivos da decisão, de tal modo que veio alegar que as facturas eram verdadeiras. Sendo assim, não se pode dizer que o acto padece de falta de fundamentação, pelo que improcede a conclusão da h) das alegações. 6.3.2. Quanto ao facto de as facturas se apresentarem formalmente correctas isso, só por si, não significa que traduzam a realidade das operações que titulam, cessando a presunção da veracidade da escrita no caso da existência de indícios sérios de que aquelas operações se não realizaram. Nesse caso - e aqui entramos já na questão do ónus da prova também invocado pela recorrente - provando a Administração Tributária a existência de indícios sérios e credíveis de que aquelas operações não são verdadeiras, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade das mesmas. Sobre esta matéria escreveu-se no Acórdão deste Tribunal de 21.5.2002 - Recurso Jurisdicional nº 6376/2002: “Visto que a factura constitui um documento demonstrativo das operações efectuadas entre o comprador e o vendedor, tendo por finalidade a comprovação das transacções ou serviços prestados por quem a emite, por forma a permitir que a fiscalização tributária possa controlar as componentes do lucro tributável e os respectivos impostos, a questão que se coloca ... é a de saber se a Administração Fiscal podia ... rejeitar a dedução do IVA. Ora, cumprindo à Administração Fiscal fiscalizar a conformidade da actuação dos contribuintes com a lei - artº 76º do CIVA- daí decorre, naturalmente, que sempre que se lhe suscitem dúvidas legítimas quanto à veracidade das transacções referidas nas facturas, pode e deve solicitar esclarecimentos e documentos complementares por forma a aferir da legalidade... da dedução do respectivo IVA. Daí que seja curial rejeitar como custo uma quantia titulada por facturas quando, após averiguações, a Administração Fiscal conclui haver sérios indícios de que aquelas operações são simuladas e, consequentemente, que tais custos não são reais. Na verdade, pretendendo-se, em sede de IRC, tributar o lucro real, não pode, obviamente, consentir-se a dedução de custos fictícios, nem autorizar-se, em sede de IVA, a dedução de impostos que resulte de operação simulada, sob pena de aceitação de fraude fiscal. E perante esses indícios, cessa a presunção de veracidade das operações constantes das facturas, passando a competir ao contribuinte o ónus de provar que as operações se realizaram efectivamente... “ (Acórdão deste Tribunal de 27.3.2001 - Recurso nº 3599/2000; no mesmo sentido, entre outros, v. os Acórdãos de 11.12.2001-Recurso nº 5489/2001 e de 22.1.2002 –Recurso nº 5844/2001). Ora, resulta dos autos que a Administração Tributária recolheu indícios sérios e credíveis de que as facturas poderiam não corresponder a operações efectivamente realizadas entre os emitentes e a recorrente. Com efeito, o contribuinte J..., um dos emitentes das facturas do ano de 1993, continuou a emitir facturas após a cessação da actividade, nunca apresentou declaração de IVA nem de rendimentos. O mesmo era também sócio gerente da “R...”, por sinal também emitente de facturas postas em causa, sendo certo que nunca apresentou a escrita para efeitos de fiscalização, nem apresentou também a declaração de rendimentos ou para efeitos de IVA (v. alíneas f), g), h), s), t) e u) ). Será que este factos são mera coincidência? Quanto a “Construções R..., Ldª” será também mera coincidência o facto de o seu sócio gerente J... ter emitido também facturas de duvidosa autenticidade e de nunca ter comparecido perante os peritos da fiscalização tributária, nem ter também apresentado declarações de rendimentos e para efeitos de IVA (v. alíneas i), j), l), v), x) e z) ) ?. E que dizer do facto de as restantes duas empresas emitentes de facturas duvidosas, “A ...” e “H.S.B..., Ldª”, serem geridas pelos mesmos sócios, terem as sedes encerradas e não terem também apresentado declarações periódicas para efeitos de IVA e declarações de rendimentos (v. alíneas m) a p) )? Mera coincidência também? Pensamos que qualquer observador atento logo concluirá que existem indícios sérios de que tais serviços e transacções constantes das facturas poderão não ser verdadeiros. É certo que a recorrente não pode ser responsabilizada pelo facto de as empresas estarem encerradas, ou por não terem contabilizado as facturas na sua escrita, ou por aquelas não terem apresentado declarações de rendimentos ou declarações para efeitos de IVA ou ainda por não terem apresentado a sua escrita à fiscalização tributária. Na verdade, trata-se de actos de terceiros pelos quais só eles devem responder, quer perante a Administração Tributária, quer, eventualmente, perante os tribunais. Todavia, como já acima se referiu, cabe ao contribuinte, em situações idênticas às indicadas, colaborar com a Administração Tributária no sentido de esclarecer os factos, provando que os serviços ou as transacções titulados pelas facturas se realizaram efectivamente. E, naturalmente que, sendo verdadeiros tais serviços e transacções, ao contribuinte não faltarão meios concretos de prova daquela veracidade, como por exemplo, apresentação de testemunhas que tenham prestado os serviços ou entregue os bens constantes das facturas, a data da sua prestação ou entrega, a prova do pagamento através de cheques e extractos de contas bancárias, etc. Hoje em dia as sociedades não podem mais ser “um negócio de família”, pelo que toda a escrita deve estar organizada de modo a poder demonstrar perante o fisco e os credores a sua total realidade contabilística, independentemente do modo como os seus fornecedores se comportem. Ora, no caso da recorrente, esta nenhuma prova concreta apresentou no sentido de demonstrar a veracidade das operações tituladas pelas facturas, nomeadamente, que os cheques indicados no relatório da fiscalização como sendo destinados a pagamento de algumas facturas foram debitados nas suas contas bancárias e recebidos pelos destinatários os respectivos montantes, ou que os serviços foram efectivamente prestados. Como tal, a recorrente não destruiu os fortes indícios da falsidade das facturas colhidos pela Administração Tributária. E não se diga, como a recorrente pretende, que cabe à Administração Tributária a prova da falsidade, já que tratando-se de facto negativo cabe ao contribuinte provar o correspondente facto positivo, até porque é o contribuinte que está em melhor posição para efectuar essa prova. E não se diga também que tal entendimento viola as garantias dos contribuintes pois, como é óbvio, a apreciação dos referidos indícios pode ser submetida à apreciação dos Tribunais, sendo sindicados judicialmente. A entender-se de outro modo estaria descoberto o caminho para a fraude fiscal legalmente consentida: bastaria emitir facturas formalmente válidas, que teriam forçosamente de ser aceites pela Administração Tributária sem que esta as pudesse por em causa porque, devido a conluio dos emitentes das facturas (devido ao seu desaparecimento, como é o caso dos autos), nunca poderia provar a falsidade das facturas. Imagine-se a seguinte hipótese: A emite uma factura a favor de B de aquisição material informático. A Administração Tributária recolhe indícios de que tal fornecimento não existiu, mas, porque o emitente desapareceu não pode efectuar a prova da falsidade da transacção. Será que o espírito da lei tributária e os fins que presidem à arrecadação dos impostos, vai no sentido de que se proteja o contribuinte B, dispensando-o de colaborar no sentido de provar a realidade da transacção? Parece-nos que não e, por isso, mantemos o entendimento seguido quanto ao ónus da prova referido nos Acórdão acima referidos. 6.3.3. Cabe, finalmente, apreciar a questão da dúvida fundada sobre a existência e quantificação do facto tributário. Também aqui a recorrente não tem razão. Com efeito, para funcionar o disposto no artº 121º do CPT necessário era que tal dúvida subsistisse após produzida toda a prova legalmente permitida às partes e também aquela que o juiz pudesse realizar oficiosamente (v. neste sentido, Alfredo José de Sousa e S. Paixão- CPT Anotado, 2ª edição, pág. 249). No caso dos autos, verifica-se que a recorrente não produziu a prova que lhe competia, pelo que não estamos perante a dúvida a que se refere o normativo citado, mas antes perante ausência de prova de factos que à recorrente cabia fazer por força da repartição do ónus da prova. Por tudo o que ficou dito, improcedem as conclusões das alegações (excepto as que se referem a alguns factos conclusivos e a outros irrelevantes para os autos, mas que não alteram a decisão final) e, em consequência o recurso. 7. Nestes termos e pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida com a fundamentação exposta, e mantendo-se a liquidação impugnada. Custas pela recorrente com três UC de taxa de justiça. Lisboa, 4 de Junho de 2002 |