Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 12600/15 |
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Secção: | CA- 2º JUÍZO |
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Data do Acordão: | 10/20/2016 |
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Relator: | CONCEIÇÃO SILVESTRE |
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Descritores: | PLURALIDADE SUBJECTIVA SUBSIDIÁRIA |
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Sumário: | I - Nos termos do disposto no artigo 39º do CPC, é admitida a figura da pluralidade subjectiva subsidiária, permitindo-se ao autor a formulação de um pedido principal contra quem considera ser o provável devedor e de um pedido subsidiário contra o hipotético titular passivo do débito. II - Não configura uma situação de pluralidade subjectiva subsidiária a dedução do pedido de condenação das duas rés no pagamento da indemnização que os autores entendem ser-lhes devida, referindo os mesmos (no corpo da petição inicial) que as importâncias reclamadas devem ser pagas pela ré ou rés que vier(em) a ser considera(s) responsável(eis) |
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Votação: | UNANIMIDADE |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL: RELATÓRIO LUCINDA ………………………………., MARCO ……………….. e ELISABETE …………………………., instauraram no Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal acção administrativa comum contra a CÂMARA MUNICIPAL DO FUNCHAL e a CONSTRUTORA ……………………., SA, para efectivação da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito. Em 21/05/2015 o TAF do Funchal proferiu decisão que “julgo[u] verificada a excepção de pluralidade subjectiva subsidiária ilegal e, em consequência, absolv[eu] as rés da instância”. Inconformados, os autores interpuseram recurso jurisdicional, apresentando alegações onde são formuladas as seguintes conclusões: “1. Os autores não se conformam com a Sentença constante de fls. dos autos proferida pelo Meritíssimo Juiz do T.A.F do Funchal, nos termos da qual julgou procedente por provado a excepção de pluralidade subjectiva subsidiária ilegal, e entendeu existir distintos factos em que os Autores sustentam a causa da acção, os quais não são os mesmos para ambos os Réus; 2. Contrariamente ao explanado na douta sentença, os pedidos de condenação dos Réus radicam em acções ilícitas e culposas, deduzidos na petição inicial, que emergem da mesma e única causa de pedir, constituída pelos factos resultantes da queda de um conjunto de blocos rochosos do maciço basáltico sobranceiro às instalações da Ré Construtora ..........., S.A, sobre a cantina e o laboratório, destruindo-os e atingindo mortalmente, Eduardo …………………….., respectivamente marido e pai dos aqui Autores, que naquele dia e hora se encontrava junto das daquelas instalações da Ré ..........., para a qual trabalhava, conforme melhor resulta da factualidade descrita no articulado inicial; 3. Os pedidos deduzidos pelos Autores pressupõem uma relação de dependência funcional existente entre os Réus, já que o exercício da actividade da sociedade, Construtora ..........., S.A, nas respectivas instalações dependeu dos licenciamentos, emitidos pelo Município do Funchal, tanto de construção dos imóveis, como de funcionamento, sem os quais não poderia laborar naqueles espaços; 4. Assim, o licenciamento, pelo Réu Município, da construção dos mencionados imóveis e do exercício da actividade daquela empresa, aliado à localização dos mesmos por se encontrar na base de uma escarpa, numa zona em que a exposição à queda de blocos rochosos era considerada elevada e previsível, por ser habitual desprenderem-se, da mesma, blocos rochosos, eram factos do conhecimento de qualquer um dos réus, responsabilizando-os pelas consequências da derrocada que vitimou o familiar dos autores, em sede de responsabilidade extracontratual. 5. Por ser do conhecimento de ambos os Réus o facto da base do maciço basáltico encontrar-se fracturado com disjunção colunar, por se encontrar sem apoio de base em cerca de 3 a 4 metros sobranceira às instalações da Ré Construtora ..........., SA, conforme alegado no artigo 14 da PI; 6. Ambos os Réus tinham conhecimento das condições físicas e morfológicas do maciço em consola porque sem suporte de base, evidenciar o risco iminente de ruir, pela verificação de queda frequente e habitual de blocos rochosos sobre aqueles edifícios da Ré Construtora ..........., SA, muito antes da derrocada em apreço. 7. Ao contrário do que também foi decidido na Sentença em crise, nada obsta a que, ao lado do Município do Funchal, permaneça na lide a Ré, Construtora ..........., SA, enquanto entidade particular demandada conjuntamente com aquele Município quer a título principal, quer a título subsidiário; 8. Desde logo porque, a efectivação da responsabilidade por omissão obedece aos parâmetros fixados nos artigos 486º e 487º do Código Civil, segundo o qual há responsabilidade por omissão se se verificar dano decorrente da abstenção de cumprimento de um dever de acção legalmente configurado, de culpa in vigilando, em razão da inversão do ónus; 9. Ao abrigo da lei processual civil (aplicável nos termos do art.º 1º da LPTA) é permitida a pluralidade subjectiva subsidiária (art.º 39.º do CPC) sendo admitida a dedução subsidiária do mesmo pedido ou de pedido subsidiário do autor contra réu diverso do demandado ou demandado a título principal, no caso de dúvida fundamentada sobre o sujeito da relação material controvertida; 10. A situação dos presentes autos apresentava-se, perante os Autores, como sendo de dúvida fundada quanto à titularidade passiva do dever de indemnizar, para efeitos do disposto no art.º 39.º do Cod. Proc. Civil, como o demonstram as contestações dos Réus e o Relatório Pericial do Laboratório Regional do Equipamento Social junto à P.I., através dos quais se vê que o Município e a empresa demandada declinam a responsabilidade pelas consequências da derrocada dos blocos rochosos; 11. É uma dúvida que radica num especial concurso de circunstâncias, considerando: i) Que o acidente resultou da queda da base do maciço basáltico fracturado com disjunção colunar, por se encontrar sem apoio em cerca de 3 a 4 metros acima das instalações da Ré Construtora ..........., SA, conforme alegado no artigo 14 da PI; ii) O facto desta Ré não se ter coibido de edificar a Norte da respectivas instalações e abaixo de tal deformação da encosta, que consistia numa consola rochosa que se encontrava em suspensão poucos metros acima do anexo, usado como cantina e laboratório, que viria a ficar totalmente soterrado aquando da queda do blocos rochosos que constituem tal consola; iii) O facto de no local do acidente, a formação da consola do maciço basáltico assentar numa camada de materiais piroclásticos sob os blocos rochosos, resultante do rasgo aberto na escarpe para efeitos de abertura e do alargamento do já mencionado Caminho Municipal, denominado Caminho da Ribeira dos Socorridos, cujo traçado foi aberto a meio daquela encosta; iv) Aliado ao facto do peso dos veículos a circular por tal caminho municipal, ao longo do tempo determinar a queda progressiva de blocos rochosos da respectiva base, ao ponto de se formar aquela consola rochosa em suspensão, desprovida de qualquer base de sustentação, pela queda continuada de blocos rochosos. 12. Foram tais factos que tornaram a opção arriscada entre demandar um ou outro Réu ou ambos nos moldes efectuados na P.I. e, na perspectiva dos Autores, o risco maior era o de perder a acção e com ela o direito se já não estivessem em tempo de intentar nova acção contra a outra pessoa colectiva; 13. Foi a conjugação da incerteza de atribuição de responsabilidade pelo evento danoso e a alegada falta de consolidação e conservação do maciço basáltico, aliada à edificação pela Ré empresa, autorizada pelo Réu Município, numa zona de comprovado elevado risco de desabamento de blocos rochosos conforme supra mencionado, conciliado com a atitude dos órgãos daquelas pessoas colectivas potencialmente responsáveis que desde sempre declinaram qualquer responsabilidade por tal ocorrência, que fez com que os Autores os demandassem conjuntamente, a título principal, e a título subsidiário; 14. Para situações deste género, em que a fronteira da imputação de responsabilidade comporta razoável grau de incerteza, pela sobreposição, de jure ou de facto, de actuação de órgãos ou agentes pertencentes a pessoas jurídico diversas, o expediente de configuração da instância com pluralidade subjectiva subsidiária, nos termos do citado artigo 39.º do CPC, vem proporcionar, com economia processual, uma solução adequado a evitar a perda do direito ou decisões contraditórias; 15. Ora, perante a descrita situação de incerteza, os Autores procuraram obter a tutela que este preceito permite para casos do género dos presentes autos; 16. Além do mais, a douta Decisão recorrida errou ao vislumbrar, em qualquer desses pedidos, a necessidade de um litisconsórcio voluntário passivo, segundo a qual tal implicaria uma "obrigação comum" partilhada pelos Réus, que não se verifica no caso dos autos, por entender não existir entre os mesmos contitularidade ou comunhão nas relações jurídicas, de tal modo que se pudesse, em última análise, falar de solidariedade na responsabilidade. 17. Neste particular, sempre se dirá que existe obrigatoriamente comunhão e/ou dependência funcional nas relações jurídicas que se estabeleceram entre os Réus demandados, dado que a construção inicial daquele complexo industrial na Ribeira dos Socorridos, e a sua ampliação posterior, bem como o facto daquela sociedade nelas laborar há muitos anos sem qualquer condicionamento/proibição imposto pelo Município, acabaram por ser administrativamente consentidas pelo Réu, Município do Funchal, o qual se conformou com as mesmas e as deferiu, ainda que as mesmas tivessem sido iniciadas e até concluídas sem as respectivas licenças municipais. 18. Além do mais é consabido que no domínio da responsabilidade civil extracontratual por actos ilícitos, matéria submetida à regra do art. 497º/1 do C. Civil, igualmente aplicável no domínio da responsabilidade civil do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público vigora o princípio segundo o qual "se forem várias as pessoas responsáveis pelos danos, é solidária a sua responsabilidade"; 19. Significando essa solidariedade passiva, nos termos previstos, no art. 512º/1 do C. Civil, que "cada um dos devedores responde pela prestação integral e esta a todos liberd”; 20. Neste sentido veja-se o Acórdão do Tribunal de Conflitos de 28-11-2007 RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL ESTADO, ACTO DE GESTÃO PÚBLICA, COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS - Relator POLÍBIO HENRIQUES: I - Os tribunais da ordem administrativa são os competentes para conhecer de um pedido de indemnização baseado em responsabilidade civil extracontratual, por acto de gestão pública, formulado contra um município. II - Não afasta essa competência a eventualidade de o autor pedir a condenação solidária e/ou alternativa do município e de entidades particulares e o facto de para o conhecimento do pedido formulado contra estas últimas ser competente o tribunal comum. 21. Deste modo, independentemente da intervenção do Município do Funchal, a decisão que vier a ser proferida regulará definitivamente a situação concreta dos Autores e daquela outra Ré relativamente aos pedidos formulados, isto é, produzirá o seu efeito útil normal; 22. Caso porém se considere existirem várias causas de pedir, e que a eventual responsabilidade civil extracontratual das Rés assente em factualidade distinta e que não se encontram preenchidos os pressupostos da admissibilidade da pluralidade subjectiva subsidiaria (o que só se concede por mera cautela), mesmo assim tal verificação não era fundamento para decretar a absolvição da instância dos Réus; 23. De facto, atendendo ao Princípio da Justiça Material, bem como o Princípio da Cooperação, segundo o qual na condução e intervenção no processo devem os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes cooperarem entre si. 24. Recaía sobre o Juiz, o poder-dever de convidar as partes a suprir as irregularidades dos articulados, fixando o prazo para o suprimento ou correcção do vício; 25. Não obstante o Juiz a quo não logrou dar cumprimento ao disposto no artigo 88,º, n.º 2 do CPTA: em vez de ter sido proferido despacho de aperfeiçoamento (fixando aos aqui Autores o prazo de 10 dias para o suprimento da excepção da pluralidade subjectiva subsidiaria ilegal), foi logo proferida a sentença, que julgou procedente a excepção suscitada oficiosamente e consequentemente absolveu os Réus da instância. 26. Se o tribunal entendia que só um dos réus devia ser demandado, incumbia-lhe absolver o outro da instância, por ilegitimidade. 27. E se entendesse conter a petição inicial deficiências deveria convidar os Autores a supri-las. 28. Deste modo, contra um ou contra ambos os Réus, deveria a acção prosseguir com fixação dos temas de prova e mais termos. 29. Sendo que, ao não ter cumprido o Tribunal a quo com tal poder-dever, cometeu uma nulidade processual, nos termos do art. 195.º do C.P.C., aplicável ex vi art. 1º da LPTA; 30. Pois a omissão desse dever constitui nulidade que influiu no exame e decisão da causa na medida em que teve como resultado prático a declaração de verificação da excepção em apreço e consequente absolvição da instância dos Réus; 31. O Tribunal a quo escusa-se assim a conhecer factos que servem de fundamento à causa de pedir dos Autores e plasmados na P.I., o que consubstancia ilegalidade e nulidade que desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos. 32. Não o fazendo, sonegou em último termo a realização da JUSTIÇA; 33. Pelo que deve ser revogada a douta sentença proferida nos autos. 34. Foram violados os artigos 487.º, 497.º, n.º 1, 521.º do Código Civil e 39.º, 195.º do Cód. de Processo do Civil, e artigo 88.º, n.º 2 do CPTA.” Apenas a ré Construtora do ..........., SA apresentou contra-alegações, nas quais formulou, a final, as seguintes conclusões: “a) Da Pluralidade Subjectiva Subsidiária A. Vem o presente recurso interposto da Sentença a fls., que julga verificada a excepção de pluralidade subjectiva subsidiária ilegal, e em consequência absolveu as Rés da instância. B. Na verdade, não merece qualquer reparo a Douta sentença recorrida, a qual deverá ser mantida nos precisos termos em que foi exarado pelo mui douto tribunal a quo. C. Nos termos do artigo 39º do CPC, admite-se a figura da pluralidade subjectiva subsidiária que visa a satisfação de um único pedido quando haja dúvida fundamentada sobre quem seja o sujeito passivo da relação jurídica em debate, a qual tem por objectivo eliminar peias processuais que dificultem a realização do direito material e, por outro, obviar à celeridade processual. D. O que não sucede in casu, uma vez que, "os Autores imputam ao Réu Município do Funchal, o licenciamento da edificação onde funcionava o laboratório de ensaios da outra Ré, a omissão de sinalização da existência de deslizamento e risco de queda de pedras, a não consolidação da frente respectiva do talude e/ou o não escoramento da escarpa e a não desobstrução dos caminhos de percolação de águas", conforme Sentença proferida pelo Tribunal a quo. E. Tal como ficou provado pela Douta Sentença, "a pretensão dos Autores contra as Rés assenta na matéria que se vier a apurar, tomando-se o direito às indemnizações que lhes assistem efectivos face a quem vier a revelar responsável. Ou seja, o pedido dirige-se a ambas as Rés, no entanto, face à factualidade que vier a ser decidida, deverá incidir sobre a Ré responsável”; F. Por isso, "dos factos alegados pelos Autores não resulta que os mesmos tenham qualquer dúvida, muito menos fundamentada, sobre o sujeito da relação material controvertida"; G. E que, "os factos que sustentam a causa e pedir da acção não são os mesmos para ambas as Rés. A pretensão deduzida pelos Autores, o direito à indemnização, procede de distintos factos jurídicos consoante a Ré em causa”; H. E não, na teoria peregrina criada pelos Recorrentes, de que alegadamente existe uma relação de dependência funcional entre a ora Recorrida e o Município do Funchal, porque o exercício da actividade da Construtora do ........... dependeu dos licenciamentos emitidos pelo Município do Funchal. I. Sucede que, não é a atribuição desse licenciamento, que remonta há muitos anos atrás, a causa de pedir que originou o facto trágico ocorrido; ou seja, não é a atribuição desse licenciamento que demonstra a situação jurídica que os Recorrentes querem fazer valer. J. Assim, considerando que a causa de pedir corresponde a diferentes factos constitutivos da situação jurídica que os ora Recorrentes pretendem fazer valer, continua a não resultar das alegações que a ora Recorrida seja demandada a título principal ou a título subsidiário. K. Pelo que, não se encontrando cabimento legal para prosseguir com uma acção contra múltiplos Réus, apenas por mera cautela, no sentido de se apurar em sede de julgamento, qual o responsável e obter, desta forma a procedência da respectiva pretensão, deverá manter-se integralmente a Decisão proferida pelo Tribunal a quo; e L. Em consequência, sendo a pluralidade subjectiva subsidiária ilegal, e fora dos casos previstos no artigo 39.º, constitui uma excepção dilatória prevista no artigo 577.º al. g), pelo que, deverá a ora Recorrida ser sempre absolvida da instância, nos termos e para os efeitos do artigo 576.º, n.º 2, todos do CPC. b) Da Responsabilidade por Omissão M. Vêm os Recorrentes imputar à Recorrida Construtora do ..........., a responsabilidade por omissão, uma vez que alegadamente se verifica a abstenção de um cumprimento de um dever de acção por parte da mesma, tendo em conta que, a ora Recorrida alegadamente "tinha conhecimento das condições físicas e morfológicas do maciço em consola"; Ora, tal conjectura não pode proceder. N. Os Recorrentes não provaram que é a recorrida Construtora do ........... a detentora da zona da encosta existente no Parque Industrial da Zona Oeste, nem que é a mesma responsável pela vigilância de forma a providenciar que o dano seja evitado, tomando as medidas adequadas. O. Pelo que, a ora Recorrida não é a proprietária, nem tem qualquer obrigação de proceder a obras de manutenção, fiscalização e vigilância da zona que originou o desabamento. Portanto, à Construtora do ........... não pode ser imputada uma responsabilidade por omissão de um dever de acção que não lhe era exigível. P. Por outro lado, o regime legal de reparação dos acidentes de trabalho não visa reparar a morte, pelo que não são reparáveis os danos não patrimoniais ou morais (excepto se o acidente de trabalho tiver ocorrido por culpa da entidade empregadora), conforme dispõe o artigo 18º n.º 1 da LAT; contrariamente ao requerido pelos Recorrentes, dado os avultados montantes de indemnização exigidos a título de danos não patrimoniais. Q. Assim, se o desabamento apenas provocou o abalo, a reparação desse dano não ocorre ao abrigo da lei dos acidentes de trabalho. R. A aquisição por mortis causa, resultante do desabamento, o que se tem em vista é a integridade produtiva do sinistrado, do qual certas pessoas dependem, pelo que não é o direito à vida que é reparável, mas sim a expectativa de rendimento que a prestação de trabalho e as suas contrapartidas remuneratórias criaram no agregado familiar. S. Não se trata de um direito sucessório, mas de um direito pessoal e irrenunciável dos familiares e equiparados (art. 57.º e 78.º da LAT), em função da dependência presumida ou da dependência real, para cujo sustento data do acidente, o sinistrado tinha de contribuir com regularidade. T. A LAT enuncia situações em que apesar de se mostrarem preenchidos os requisitos que permitem qualificar determinado evento como sendo um acidente de trabalho, fica excluída a obrigação de reparar. U. Tratam-se de situações em que o acidente se deve exclusivamente a forças inevitáveis da natureza, isto é, a eventos que o legislador considerou adequado colocar fora da esfera dos riscos decorrentes da actividade do empregador. V. Assim, a LAT prevê a exclusão da responsabilização por acidentes de trabalho o acidente causado por motivo de força maior (acontecimento imprevisível e que poderia ser evitado com as precauções normais), não constituindo risco criado pelas condições de trabalho nem se produza ao executar serviço exigido pelo empregador em situação de perigo. W. Pelo que, segundo o disposto no artigo 15.º da LAT, "o empregador não tem de reparar o acidente que provier de motivo de força maior”. X. Caso de força maior é visto como um fenómeno natural de ordem física que desafia toda a previsão e cuja causa é totalmente independente da empresa, como é o presente caso. Y. O conceito de motivo de força maior é o vertido no n.º 2 do mesmo preceito legal. Trata-se da causa devida a forças inevitáveis da natureza, independentes de intervenção humana, desde que não constitua risco criado pelas condições de trabalho, nem se produza ao executar serviço expressamente ordenado pela entidade empregadora em condições de perigo evidente. Z. E Portanto, não se pode alcançar o pretendido pelos Recorrentes, uma vez que dado que o acidente se deveu a causas naturais, encontra-se excluída a responsabilidade da ora Recorrida. c) Da Transferência da Responsabilidade para a Seguradora AA. De todo o modo, e se assim não se entender, a Lei obriga a entidade patronal, ora Recorrida, a transferir a responsabilidade pela reparação dos danos resultantes de acidente de trabalho para uma companhia de seguros relativamente aos trabalhadores por conta de outrem que tem ao seu serviço. BB. Neste sentido, tendo a responsabilidade por danos emergentes de acidente de trabalho sido transferida para a Companhia de Seguros Tranquilidade, através de seguro contratado, é responsável pelas consequências do acidente de trabalho a companhia de seguros. CC. Na verdade, o cônjuge sobrevivo, ora Recorrente, não demandou igualmente a Seguradora, não obstante a mesma gozar de legitimidade para o efeito, porque se encontra desde 01.01.2008 a receber através da seguradora anualmente uma pensão no valor de € 6.507,19 (seis mil, quinhentos e sete euros e dezanove cêntimos). DD. O que corresponde à quantia de 30% da retribuição do sinistrado, nos termos e para os efeitos dos artigos 56.º, n.º 1, 59.º, n.º 1 al. a) da LAT. EE. Efectivamente, a ora Recorrida, através da Seguradora, já se encontra a cumprir a prestação por morte prevista na Lei, concretamente, a quantia a 30% da retribuição do sinistrado até perfazer a idade de reforma por velhice do cônjuge sobrevivo. FF. Ainda assim, contra legem, os Recorrentes numa tentativa de extravasar o sentido da lei pretendem duplicar as quantias que já se encontram a receber, demandando ilegitimamente a ora Recorrida para o efeito. GG. Tal como ficou provado pelo Tribunal a quo, não pode a ora Recorrida, aceitar tais alegações apresentadas pelos Recorrentes, pelo que deverá a Recorrida Construtora do ........... ser absolvida da instância por ilegitimidade, nos termos e para os efeitos dos artigos 577.º al. e); e 576.º n.º 2, todos do CPC. HH. Perante a argumentação que se vem expondo, conclui-se que não pode ter como cominação o resultado que os Recorrentes pretendem, designadamente a revogação da decisão recorrida e nem se vislumbra a substituição por outra. II. Motivo pelo qual deve manter-se a decisão contida na douta Sentença recorrida. d) Da isenção de custas e o Processo Especial de Revitalização JJ. A ora Recorrida, Construtora do ..........., S.A., socorreu-se do Processo Especial de Revitalização, o qual correu os seus termos no Tribunal da Comarca de Lisboa, Instância Central de Lisboa, 1ª Secção de Comércio, J4, sob o processo n.º 52/13.3TYLSB, tendo sido aprovado e homologado por sentença um Plano de Revitalização a 06. 11.2014, a qual transitou em julgado no pretérito dia 09.12.2014. KK. Para os devidos efeitos, a ora Recorrida encontra-se em situação da isenção subjectiva a que faz referência o art. 4.º, n.º 1, a. u), o Regulamento de Custas Processuais - RCP -, que atenta pela natureza do processo de recuperação de empresa a que a Recorrida está abrangida, é aplicável a quaisquer custas nos termos do art. 3.º, n.º 1, do RCP (nesse sentido vide Ac. Relação de Lisboa de 11.02.2010, proferido no processo n.º 1242/09.9TYLSB.L1-2; Ac. Relação de Lisboa de 15.06.2011, proferido no processo n.º 25489/10.2T2SNT-A.L1-1; Ac. Relação de Évora de 113.08.2013, proferido no processo n.º 589/13.2TBSTR.E1; Ac. Relação de Porto de 06. 11.2012, proferido no processo n.º 352/ 11.7TBPVZ-B.P1).” O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146.º do CPTA, não emitiu parecer. * Tendo presentes as conclusões formuladas pelos recorrentes, as questões que cumpre apreciar e decidir consistem em saber (i) se a decisão recorrida errou ao considerar verificada a excepção de pluralidade subjectiva subsidiária ilegal e (ii) se ocorre nulidade processual. * Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento.FUNDAMENTAÇÃO Os ora recorrentes instauraram no TAF do Funchal acção para efectivação da responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito contra a Câmara Municipal do Funchal e a Construtora do ..........., SA, com vista a obter indemnização pelos danos decorrentes do acidente ocorrido no dia 22/11/2007, do qual resultou a morte do cônjuge da 1.ª autora e pai dos 2.º e 3.º autores. Tal acidente resultou da derrocada de parte da encosta existente no Parque Industrial da Zona Oeste do Funchal, que atingiu as instalações da ré Construtora do ..........., SA. Os autores, ora recorrentes, imputam a verificação do acidente a ambas as rés: - À ré Câmara Municipal do Funchal, na medida em que (i) foram os seus serviços que procederam ao alargamento do Caminho da Ribeira dos Socorridos, para o que efectuaram escavações na camada de materiais piroclásticos sob os blocos rochosos que caíram, o que colocou em consola, sem apoio na base, um volume considerável de rocha (cfr. artigos 10º a 19º da petição inicial), (ii) sabendo da possibilidade e risco de queda de rochas naquela zona, “não se coibiu de aprovar em 03.10.2002 o projecto de alteração e ampliação das instalações da ré empresa, através do qual a ré ........... obteve o licenciamento camarário da edificação de um novo anexo localizado a Norte, onde funcionava o laboratório de ensaios que ficou soterrado pela derrocada” (cfr. artigos 35º a 39º da petição inicial), (iii) não sinalizou a “existência do deslizamento e o risco de queda de pedras, para alertar os utentes e os que ali trabalhavam para a instabilidade do maciço rochoso no dito local e a possibilidade de queda de pedras” (cfr. artigo 38º da petição inicial), (iv) não cuidou, como era seu dever, de proceder à consolidação daquela frente do talude e do escoramento da escarpa, nem de desobstruir os caminhos de percolação das águas para permitir o escoamento do excesso de água retida no interior do maciço rochoso, nem de construir muros, projecções de betão e redes metálicas, nem de proceder ao encerramento das instalações da ré Construtora do ..........., SA após as mesmas terem sido atingidas por blocos de pedra e existirem indícios sérios de repetição da situação (cfr. artigos 40º a 45º da petição inicial) - À ré Construtora do ..........., SA, uma vez que a mesma, tendo conhecimento da instabilidade que o maciço basáltico apresentava no local e tendo capacidade técnica para avaliar e prever o risco elevado de queda de blocos rochosos, “não se coibiu” de construir as suas instalações naquele local (cfr. artigos 23º a 34º da petição inicial). Pedem, a final, que “a presente acção se[ja] julgada procedente por provada e em consequência ser(em) a(s) ré(s) condenados a pagar as seguintes importâncias (…)”. Apesar de, a final, formularem este pedido de condenação de ambas as rés, os autores referem que: - “Razão pela qual os autores reclamam através da presente peça, a condenação da Ré que vier a ser considerada responsável pela liquidação do respectivo valor em função da prova produzida” (cfr. artigo 45º da petição inicial); - “Devendo as importâncias aqui reclamadas ser pagas pela(s) ré(s) que vier(em) a ser considerado(s) responsável(is) consoante a matéria que se vier a apurar, tornando-se o direito às indemnizações que assistem aos autores efectivos face a quem se vier a revelar responsável pelos mesmos” (cfr. artigo 83º da petição inicial). No saneador-sentença que proferiu, o TAF do Funchal entendeu que “dos factos alegados pelos autores não resulta que os mesmos tenham qualquer dúvida, muito menos fundamentada, sobre o sujeito da relação material controvertida. Ou seja, os factos relativamente aos quais os autores pretendem a responsabilização do réu Município do Funchal são distintos dos factos que fundamentam a eventual responsabilidade da ré Construtora do ..........., SA. A eventual ilicitude da acção ou omissão de cada uma das rés não advém dos mesmos factos”. Em suma, concluiu o TAF que “não é alegada qualquer dúvida fundamentada que legalmente torne admissível a dedução subsidiária do mesmo pedido, nem uma das rés é demandada a título principal” e, por isso, “julgo[u] verificada a excepção de pluralidade subjectiva subsidiária ilegal e, em consequência, absolv[eu] as rés da instância”. Vejamos se é correcta esta decisão. Nos termos do artigo 39º do CPC, aditado pelo artigo 2º do DL nº 329-A/95, de 12/12 - anterior artigo 31º-B - “é admitida a dedução subsidiária do mesmo pedido, ou a dedução de pedido subsidiário, por autor ou contra réu diverso do que demanda ou é demandado a título principal, no caso de dúvida fundamentada sobre o sujeito da relação controvertida”. O relatório do Decreto-lei n.º 329-A/95, de 12/12, justifica este regime nos seguintes termos: "Dentro da ideia base de evitar que regras de índole estritamente procedimental possam obstar ou criar dificuldades insuperáveis à plena realização dos fins do processo - flexibilizando ou eliminando rígidos espartilhos, de natureza formal ou adjectiva, susceptíveis de dificultarem, em termos excessivos ou desproporcionados, a efectivação em juízo dos direitos - propõe-se a introdução no nosso ordenamento jurídico-processual da figura do litisconsórcio eventual ou subsidiário. Torna-se, por esta via, possível a formulação de pedidos subsidiários - na configuração que deles dá o art.º 469º do Cod. Proc. Civil - contra réus diversos dos originariamente demandados, desde que convole para uma relação jurídica diversa da inicialmente controvertida. Supõe-se que, com esta solução inovadora, se poderão prevenir numerosas hipóteses de possível "ilegitimidade" passiva, permitindo-se ao autor a formulação de um pedido principal contra quem considera ser o provável devedor e de um pedido subsidiário contra o hipotético titular passivo do débito (v. g. em situações em que haja fundadas dúvidas sobre a identidade do verdadeiro devedor, designadamente por se ignorar em que qualidade interveio exactamente o demandado no negócio jurídico)”. Com esta solução inovadora, o legislador veio permitir ao autor a formulação de um pedido principal contra quem considere ser o provável devedor e de um pedido subsidiário contra o hipotético titular passivo do débito, nas situações em que haja fundadas dúvidas sobre a identidade do verdadeiro devedor. Ou seja, em situação de dúvida fundada, o recurso à via judicial deixou de exigir ao autor a prévia averiguação do seu direito no aspecto subjectivo. Refere a este propósito o Prof. Remédio Marques (in “Acção Declarativa à Luz do Código Revisto”, 3.ª edição, pág. 397): “o artigo 31º-B do CPCivil, permite deduzir um mesmo pedido por autor ou contra réu diverso do que aquele que demanda ou é demandado a título principal, o que só é possível desde que haja uma dúvida fundada sobre os sujeitos titulares da relação material controvertida”. Também Abrantes Geraldes sublinha, a este propósito (in “Temas da Reforma do Processo Civil”, Volume I, 2ª Edição, pág. 157), que “no regime anterior constituía entendimento generalizado da inadmissibilidade de subsidiariedade quanto aos sujeitos passivos, questão que foi resolvida pelo novo quadro legal do artigo 31º-B, visando-se economizar meios e processos, e prevenir os resultados negativos que poderiam ocorrer nos casos em que existiam sérias dúvidas quanto à titularidade da relação material controvertida”. Isto posto, regressemos ao caso dos autos. Analisando a petição inicial, é absolutamente claro e inequívoco que os autores formulam um único pedido, qual seja a condenação das rés (de ambas as rés) a pagar as quantias que discriminam; é exactamente isso (e nada mais) que consta do petitório. Acontece, porém, que, nos artigos 45º e 83º da petição inicial os autores referem que pretendem obter a indemnização da ré ou rés que vier(em) a ser considerada(s) responsável(eis), consoante a matéria que se apurar. Esta alegação dos autores não configura, ao contrário do que entendeu o TAF, a “dedução subsidiária do mesmo pedido, ou a dedução de pedido subsidiário”; isto é, não estamos perante uma situação de pluralidade subjectiva subsidiária, tal como prevista no artigo 39º do CPC. Na verdade, os autores limitam-se a referir que a condenação deve incidir sobre a ré que se apurar ser a responsável, ou sobre ambas, se assim resultar da factualidade apurada. Ora, tal alegação não integra a formulação de qualquer pedido e muito menos de um pedido subsidiário, tal como o mesmo se mostra previsto no artigo 554º, n.º 1 do CPC. Aliás, a mesma era absolutamente desnecessária e inútil, pois, como é evidente, se após a instrução da causa o TAF concluir que a responsabilidade só cabe a uma das rés, só ela é objecto da pronúncia condenatória, pese embora tenha sido pedida a condenação das duas. Ser a responsabilidade de atribuir a uma ou a ambas as rés é questão que há-de ser decidida pelo tribunal depois de produzida a prova e analisada que seja a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por acto ilícito. Assim sendo, concluímos que, ao ter julgado verificar-se a excepção de pluralidade subjectiva subsidiária ilegal, o TAF do Funchal incorreu em erro de julgamento, o que determina a procedência do recurso e a revogação da decisão recorrida, resultando, por isso, prejudicada a apreciação da alegada nulidade processual invocada pelos recorrentes. * SUMÁRIO (artigo 663º, n.º 7 CPC): I - Nos termos do disposto no artigo 39º do CPC, é admitida a figura da pluralidade subjectiva subsidiária, permitindo-se ao autor a formulação de um pedido principal contra quem considera ser o provável devedor e de um pedido subsidiário contra o hipotético titular passivo do débito. II - Não configura uma situação de pluralidade subjectiva subsidiária a dedução do pedido de condenação das duas rés no pagamento da indemnização que os autores entendem ser-lhes devida, referindo os mesmos (no corpo da petição inicial) que as importâncias reclamadas devem ser pagas pela ré ou rés que vier(em) a ser considera(s) responsável(eis). DECISÃO Nestes termos, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a decisão recorrida e determinar a baixa dos autos ao TAF do Funchal para aí prosseguirem os seus ulteriores termos, caso a tal nada obstar. Sem custas. Lisboa, 20 de Outubro de 2016 _________________________ (Conceição Silvestre) _________________________ (Carlos Araújo) _________________________ (Paulo Pereira Gouveia) |