Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 05374/01 |
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Secção: | Contencioso Administrativo - 1º Juízo Liquidatário |
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Data do Acordão: | 05/05/2005 |
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Relator: | Magda Geraldes |
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Descritores: | APLICAÇÃO ARTº 150º CPC A PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO |
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Sumário: | I - Um dos princípios preconizados pelo CPA, é o princípio da desburocratização e da eficiência previsto no seu artº 10º: "A Administração Pública deve ser estruturada de modo a aproximar os serviços das populações e de forma não burocratizada, a fim de assegurar a celeridade, a economia e a eficiência das suas decisões." II - De acordo com este princípio, de que o artº 79º do CPA (que prevê o envio de requerimento pelo correio) é uma emanação legal, deve a Administração evitar o excessivo formalismo, interpretando as normas de procedimento administrativo segundo o princípio "in dubio pro actione", (princípio do favorecimento do processo), isto é, de forma favorável à admissão e decisão final das petições dos administrados, o que implicará, em matéria de procedimento administrativo, que os formalismos devam ser interpretados em favor do administrado, consagrando-se uma interpretação mais favorável ao exercício do direito de petição, visando assegurar uma decisão de fundo sobre a questão objecto do procedimento. III - Deste princípio antiformalista decorre que o procedimento administrativo não se deverá traduzir em formalismos exagerados conduzindo a uma Administração complicada, deixando o procedimento administrativo de constituir uma garantia dos particulares. IV - Ora, é precisamente à luz deste princípio, acolhido quer pelo CPC, quer pelo CPA, que se deve admitir, supletivamente, a aplicação do regime jurídico previsto no artº 150º, nº1 do CPC, na sua totalidade, isto é, admitir-se que, nos casos de remessa de petições, requerimentos, reclamações, ou outros papéis referentes a actos procedimentais, remetidos pelo correio, como permite o citado artº 79º do CPA, a data da efectivação do respectivo registo postal, vale como a data da prática do acto procedimental em causa. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam no TCAS, Secção Contencioso Administrativo, 1º Juízo LUÍS ......, identificado a fls. 2 dos autos, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do SECRETÁRIO DE ESTADO DOS RECURSOS HUMANOS E DA MODERNIZAÇÃO DA SAÚDE, datado de 22.12.2000, que rejeitou, por extemporaneidade, o seu recurso hierárquico necessário. Em sede de alegações, formulou as seguintes conclusões: a) O presente recurso vem interposto do Despacho do Senhor Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Modernização da Saúde, proferido em 22.12.2000, que rejeitou por extemporaneidade o recurso tutelar necessário interposto pelo alegante, 4.° classificado em três vagas no concurso interno geral para o provimento de chefe de serviço de medicina interna da carreira médica hospitalar do quadro de pessoal do Hospital do Espírito Santo, aberto pelo Aviso n.° 5074/99, publicado no DR, 2 ª série, n.° 62, de 15.03.99. b) O recurso gracioso foi entregue nos serviços dos CTT no Aeroporto de Lisboa em 22.02.2000, tendo sido distribuído em Évora em 23.02.2000. c) No entanto, os serviços do expediente do Hospital do Espírito Santo apenas deram entrada de tal recurso um dia depois, ou seja em 24.02.2000. d) Ao recorrente não pode ser imputada a responsabilidade por tal facto, devendo o recurso ser considerado tempestivo, porquanto apenas não deu entrada em 23.02.2000 por atraso nos serviço de expediente do referido Hospital. e) Por outro lado, refiram-se as reiteradas violações dos preceitos que regulam o procedimento do concurso (CPA e o regulamento aprovado pela Portaria n.° 177/97, de 11 de Março) por parte da Administração, sendo patente o incumprimento dos prazos para a pronúncia da entidade recorrida e dos contra-interessados e para a entidade competente decidir. f) Com efeito, a entidade competente, ora, recorrida, decidiu o recurso gracioso 300 dias depois da sua interposição. g) Parecendo significar que apenas para o administrado o prazo previsto na lei se assume como vinculativo, não resultando, para a Administração qualquer consequência face ao manifesto atraso na prática do acto definitivo e executório. h) Por outro lado, mesmo que se admitisse por mera hipótese académica, que o recurso registado no correios em 22.02.2000, apenas tivesse sido entregue no Hospital em 24.02.2000, ainda assim, no caso concreto, justificar-se-ia a apreciação do mérito do mesmo e não a sua rejeição por extemporaneidade. i) Com efeito, se no n.° 35 do Regulamento aprovado pela portaria que regula o presente concurso prevê a aplicação supletiva do DL n.° 204/98, de 11 de Julho. j) Se, este último diploma prevê que no caso da apresentação das candidaturas se atenda ao registo postal (vide art 30 °, n.° 2) e nos restantes prazos nada dispõe. k) Conclui-se que, neste Decreto-Lei que aprovou o Regime Geral de Recrutamento e Selecção de Pessoal da Administração Pública, existe um lacuna que deverá ser integrada por recurso à analogia, in casu com a situação prevista no referido art. 30.°, n.° 2. I) Porquanto as razões que justificam a consideração da data do registo postal para a contagem do prazo para a apresentação das candidaturas devem proceder no caso da contagem do prazo para a interposição de recurso gracioso. m) E, se se considerar, nos concursos regulados por tal diploma, que os recorrentes podem interpor recurso até ao último dia do prazo, contando como a prática do acto a data do registo postal, no caso concreto - ao qual se aplica supletivamente o DL 204/98 - podia o recurso ter sido entregue nos correios um dia depois do que o foi na realidade! n) A relevância da data do registo postal assume-se, igualmente, como um costume - verdadeira fonte de direito - nos serviços públicos que, inclusivamente guardam os envelopes através dos quais são remetidos os recursos respectivos graciosos. o) Mas, para além da razão de ser do diploma e do costume da Administração, poderá ainda a Jurisprudência marcar diferença na reformulação do procedimento administrativo, ora em curso. p) Pois carece de razão, salvo o devido respeito, a entidade recorrida que se prevalece de uma interpretação restritiva da lei quando não considera dentro do prazo (com terminus em 23.02.2000) um recurso entregue nos serviços postais, em Lisboa, em 22.02.2000 com data de distribuição em Évora de 23.02.2000, porque o registo da entrada feito pelos serviços do Hospital data de 24.02.2000. q) Pelo que o acto se encontra ferido do vício de violação: - do princípio da igualdade previsto no art. 13 ° da CRP, nas vertentes da igualdade das armas e da posição dos sujeitos, - do princípio da proporcionalidade (art. 5 °, n.º 2 do CPA) face ao atraso na sua decisão; - do princípio da boa fé (art. 6.°-A do CPA); - do princípio da colaboração da Administração com os particulares (art. 7.° do CPA); - do princípio do acesso à justiça, e consequentemente ao contencioso administrativo (artigos 12.° do CPA, 20.° e 268, n.°s 4 e 5 da CRP), porque o recorrente não pode discutir, nesta sede, a questão de mérito, objecto do recurso gracioso. E que, tal princípio se encontra igualmente violado pois o prazo de 10 dias previsto no n.º 67 do Regulamento aprovado por Portaria contraria a regra geral dos 30 dias prevista no art. 175.° do CPA (que foi aprovado por Decreto-Lei) conduzindo à inconstitucionalidade do primeiro diploma. E, ainda, a não consideração da data do registo postal como relevante para efeitos de prazo de interposição, leva a uma diminuição do prazo dos 10 dias, que, no caso sub judice seriam 8 dias (descontados que fossem os dias de correio). r) Logo, da violação dos princípios invocados decorre, nos termos do art. 133 °, nº 2, alínea d) a necessária nulidade do acto recorrido, ou, caso assim não se entenda, a sua anulabilidade. s) Encontra-se ainda o acto recorrido ferido do vício de violação de lei pelo incumprimento do prazo legal para decidir previsto no n.º 67.2 do Regulamento e no art. 175º, n.° 1 do CPA e do dever de celeridade previsto no art. 57.º do CPA. t) A declaração de nulidade ou da anulação do acto ora recorrido possibilitará a apreciação do mérito do recurso tutelar necessário interposto por parte da entidade ora recorrida, ou quem lhe sucedeu na sua competência. u) Pelo que se requer que o acto recorrido seja declarado nulo ou anulado, pelos fundamentos constantes nas presentes alegações e na petição de recurso que se roga que seja dada como reproduzida.” Em contra-alegações, a autoridade recorrida disse: “1- A única questão que constitui objecto do presente recurso contencioso é a da tempestividade ou intempestividade de interposição do recurso hierárquico. 2- O despacho recorrido rejeitou o recurso por intempestividade. 3- Vem o recorrente dizer que o recurso hierárquico foi tempestivamente interposto pois, tendo o respectivo requerimento sido expedido por carta expedida por correio, em 22/2/2000, chegou ao destino no dia 23/2/2000, último dia do prazo legal para a interposição 4- Contrapõe a entidade recorrida que, sendo certo que o último dia do prazo era o dia 23/2/2000, e que o recurso foi expedido por correio registado em 22/2/2000, este só foi distribuído pelo correio e só deu entrada na entidade recorrida - o Hospital do Espírito Santo de Évora - em 24/2/2000, portanto um dia depois do temo do prazo. 5- Argumenta o recorrente que no verso do sobrescrito de expedição consta um carimbo dos correios de Évora com data de 23/2/2000. 6- Mas tal carimbo apenas prova que a correspondência chegou à estação de correio de destino no dia 23 e não que a distribuição do correio ao destinatário - o Conselho de Administração do Hospital - tenha sido feita naquela data. 7- Esta distribuição foi efectivamente feita no dia 24/2/2000, conforme carimbo aposto pelo serviço de entrada de documentos no Hospital, com esta data. 8- A entidade recorrida não mantém a sua posição de considerar o recurso hierárquico intempestivo pela simples vontade de fazer prevalecer uma opinião mas porque se baseia em factos concretos e porque tem obrigação de defender a solução que lhe parece legal até por respeito dos direitos dos contra interessados no concurso. 9- O próprio recorrente, inseguro quanto ao que alega quanto à data em que o recurso teria sido recebido no Hospital, vem alegar, embora subsidiariamente, a aplicabilidade do art° 150° do C.P.Civil ao caso presente, dizendo que o recurso, mesmo que tivesse dado entrada no dia 24, sempre seria tempestivo pois a data relevante seria sempre a data da expedição de correio sob registo. 10- Como é sabido esta alegação não colhe pois a referida norma dirige-se apenas ao processo judicial e não ao procedimento administrativo, sendo que nem no Código do Procedimento Administrativo nem em lei especial aplicável aos concursos de pessoal do tipo do que se ocupam os autos, consta qualquer norma equivalente ao are 150° do C.P.Civil. 11- Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência. 12- Também não colhe o argumento, ainda subsidiariamente apresentado, de que o recurso se deve considerar interposto na data da expedição do correio por força do n° 2 do art° 30° do Decreto-Lei n° 204/98, de 11 de Julho. 13- Esta disposição legal, especial, manda considerar a data do registo postal mas apenas para efeitos de apresentação de candidatura aos concursos e não para efeitos de apresentação de recurso hierárquico. 14- Haja em vista que o n° 2 do art° 43° do mesmo diploma legal não prevê idêntico procedimento para a interposição dos recursos hierárquicos da lista de classificação final, quando o poderia ter feito se fosse essa a vontade do legislador. 15- A arguição da inconstitucionalidade do n° 67 do Regulamento dos Concursos aprovado pela Portaria n° 177/97, de 11 de Março também não colhe. 16- O Regulamento dos Concursos foi aprovado por Portaria mas tendo como suporte o Decreto-Lei n° 73/90, de 6 de Março que, no n° 2 do seu art° 15°, previu expressamente que o processo de concurso seria regulamentado por Portaria do Ministro da Saúde que assim, regulamentou ao abrigo de um Decreto-Lei. 17- Também o facto de o prazo de recurso hierárquico ser de 10 dias e assim constituir um prazo especial não representa qualquer violação de direitos constitucionais dos concorrentes. 18- Mantém-se o direito ao recurso e a Constituição não exige a consagração, pelo legislador, de um prazo único para o exercício desse direito. 19- Também o facto de o acto recorrido ter rejeitado o recurso hierárquico interposto, por intempestividade, não afecta qualquer direito constitucional do recorrente, mas antes constitui um dever legal que é imposto a quem tem que apreciar a questão prévia da tempestividade de interposição. 20- O argumento do recorrente de que deste modo fica impedido de discutir a questão de fundo do recurso é uma consequência natural legal e constitucionalmente admitida, decorrente de facto imputável ao próprio recorrente como é o da interposição extemporânea do recurso. 21- Como é também evidente que, caso o Tribunal viesse a anular o acto recorrido por entender que o recurso é tempestivo, a matéria de fundo teria que vir a ser apreciada e, na sequência dessa apreciação e da decisão que viesse a ser tomada sempre caberia recurso, então sim quanto à matéria de fundo, caso tal decisão não satisfizesse o interessado.” Neste TCAS, a Exmª Magistrada do MºPº pronunciou-se pela improcedência do recurso. OS FACTOS Tendo em atenção os docs. juntos aos autos mostram-se assentes os seguintes factos com interesse para a decisão: a) - por aviso n° 2460/2000, foi publicada no DR, nº33, II série, de 09.02.00, a lista de classificação final, homologada pelo Conselho de Administração do Hospital Espírito Santo, de Évora, do concurso interno geral para provimento de três vagas na categoria de chefe de serviço de medicina interna da carreira médica hospitalar do quadro de pessoal daquele Hospital, aberto pelo aviso n° 5074/99, publicado no DR nº 62, II série de 15.03.99. b) - o recorrente ficou classificado em 4º lugar, em tal concurso; c) - desta classificação o recorrente interpôs recurso dirigido à Ministra da Saúde, nos termos do nº 67 do Regulamento dos Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor e de Provimento na Categoria de Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar, aprovado pela Portaria n° 177/97, de 11.03; d) - a petição de recurso apresentada pelo recorrente, foi enviada pelo recorrente para o Conselho de Administração do Hospital Espírito Santo, em Évora, pelo registo do correio, registo este datado de 22.02.00, efectuado nos serviços dos CTT do Aeroporto, em Lisboa, na mesma data (doc. de fls. 36 e fls. do pa); e) - o expediente referido em d) tem o carimbo do registo postal da distribuição dos CTT de Évora , com data de 23.02.00 (doc. de fls. 37 e fls do pa); f) - o carimbo aposto no ofício que acompanhou a petição de recurso, tem a data de entrada no referido Hospital de 24.02.00, com o n° 663 ( cfr. fls. pa); g) - por despacho do Secretário de Estado dos Recursos Humanos e da Administração da Saúde de 22.12.00, foi rejeitado o recurso interposto pelo recorrente, por extemporaneidade, nos termos e com os fundamentas do parecer nº 00/276, emitido pela Secretaria Geral do Ministério da Saúde, (doc. fls.16 e fls. do pa) h) - o recorrente foi notificado do despacho referido em g) (despacho recorrido) em 10.01.01( aviso de recepção fls. pa). O DIREITO O objecto do presente recurso contencioso de anulação é o despacho da autoridade recorrida, datado de 22.12.00, que rejeitou o recurso hierárquico interposto pelo recorrente da deliberação do Conselho de Administração do Hospital Espírito Santo de Évora, que homologou a lista de classificação final do concurso interno geral para provimento de três vagas da categoria de chefe de serviço de medicina interna do quadro daquele Hospital. A rejeição do recurso hierárquico fundamentou-se na extemporaneidade do mesmo. Nos ternos do nº 67 do Regulamento dos Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor e de Provimento na Categoria de Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar, aprovado pela Portaria n° 177/97, de 11.03, o prazo para recorrer hierarquicamente, com efeito suspensivo, para o Ministro da Saúde ou para a entidade em quem tenha sido delegada a competência, é de 10 (dez) dias úteis, após a publicação ou afixação da lista classificativa, conforme o tipo de concurso. A lista de classificação final do concurso dos autos, devidamente homologada, foi publicada no DR, nº33, II série, na data de 09.02.00. Assim, o prazo de 10 dias úteis para o competente recurso hierárquico terminava em 23.02.00, como entendem recorrente e autoridade recorrida. Tendo a petição do recurso hierárquico do recorrente dado entrada nos serviços do referido Hospital na data de 24.02.00, a autoridade considerou a mesma extemporânea e rejeitou o recurso hierárquico com esse fundamento, nos termos do disposto no artº 173º, d) do CPA. O recorrente defende a tempestevidade do seu recurso, de acordo com o disposto no artº 150º do CPC, por entender que o mesmo deve ser considerado interposto na data de expedição pelo correio, defendendo ainda a aplicação, por analogia, do disposto no nº2 do artº 30º do DL 204/98, de 11.06. Antes de se apreciar esta questão, importa referir que o recorrente imputa ainda o recorrente ao acto impugnado o vício de violação da lei pelo incumprimento do prazo legal para decidir previsto no n° 67.2 do Regulamento já citado e no artº 175º nº 1 do CPA, assim como a violação do dever de celeridade previsto no art. 57º do CPA. Conforme refere a Exmª Magistrada do MºPª, “O disposto no art. 57° do CPA tem como intenção a afirmação «de que os órgãos administrativos devem adequar as formalidades, por um lado, à rapidez do procedimento e, por outro, à convicção de que as diligências efectuadas são suficientes para uma decisão justa e oportuna» (cfr. Diogo Freitas do Amaral, João Caupers, João Martins Claro, João Raposo, Maria da Glória Dias Garcia, Pedro Siza Vieira e Vasco Pereira da Silva, in C.P.A anotado, 3ª edição). Ora, o não cumprimento de tal dever poderá acarretar como consequência o incumprimento do prazo legal para decidir. Todavia, o incumprimento do prazo legal de decisão tem como única consequência o disposto no art. 109° do CPA, ou seja o da presunção de acto tácito, o qual como é jurisprudência corrente, se trata de uma ficção legal estabelecida em benefício exclusivo dos particulares, para permitir a abertura da via contenciosa e a protecção dos direitos e interesses legítimos dos interessados, que não são obrigados a impugna-lo, podendo aguardar pela prática de acto expresso, que prevalecerá. Mas ainda que se entendesse o acto tácito como um acto verdadeiramente administrativo, sempre o acto expresso que se lhe siga corresponde a uma revogação, por substituição, daquele por este. Poderia o recorrente, pois, decorrido que fosse o prazo legal de decisão, ter presumido o acto tácito de indeferimento e recorrido contenciosamente do mesmo, o que não fez, preferindo aguardar pelo acto expresso ora impugnado.” Assim sendo, não existe a alegada violação de lei, por violação dos citados preceitos. Retomando a questão jurídica suscitada nos autos e que se reconduz à possibilidade de aplicação do disposto no artº 150º,nº1 do CPC, na prática de actos em procedimentos administrativos: - no caso dos autos a questão surge-nos no âmbito de um recurso hierárquico, aquando da prática do acto de “interposição de recurso hierárquico”. Nos termos do disposto no nº 67 do Regulamento dos Concursos de Habilitação ao Grau de Consultor e de Provimento na Categoria de Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar, aprovado pela Portaria nº 177/97, de 11.03, “Os candidatos dispõem de 10 dias úteis, após publicação ou afixação da lista, conforme o tipo de concurso, para recorrer, com efeito suspensivo, para o Ministro da Saúde ou para a entidade em quem tenha sido delegada a competência.” O recorrente fez a apresentação da sua petição de recurso por correio registado. Atentas as datas apuradas nos autos, designadamente a data de publicação da lista classificativa, o prazo referido no citado nº 67 do Regulamento do Concurso, prazo para apresentação do recurso hierárquico, terminava em 23.02.00. O recorrente, atentos os factos apurados nos autos, fez a expedição da sua petição de recurso, via postal, na data de 22.02.00, conforme consta do carimbo aposto no registo postal, tendo o seu expediente sido distribuído pelos CTT de Évora na data de 23.02.00 . O nº 67 do Regulamento supra citado, ou o DL 204/98, de 11.07, não contêm norma que estabeleça qual o momento a considerar para efeitos da prática do acto - interposição do recurso hierárquico. Apenas dispõe que o mesmo tem de ser interposto no prazo supra referido e a partir de que momento se inicia tal prazo. Considerando o disposto no artº2º do CPA, designadamente o constante do seu nº6, “As disposições deste Código são ainda supletivamente aplicáveis a procedimentos especiais, desde que não envolvam diminuição das garantias dos particulares.” O CPA, no que respeita à interposição do recurso hierárquico, refere no seu artº 169º, nº1 que: “1 - O recurso hierárquico interpõe-se por meio de requerimento no qual o recorrente deve expor todos os fundamentos do recurso, podendo juntar os documentos que considere convenientes. 2 - (...).3- (...).” A apresentação de requerimentos deve ser feita nos serviços dos órgãos aos quais são dirigidos - regra geral do artº 77º, nº1 do CPA, não afastada por qualquer preceito especial quer do Regulamento do Concurso referido quer do DL 204/98, de 11.07. Esta disposição - artº 77º do CPA - é aplicável, “com as devidas adaptações, às exposições, reclamações, respostas e outros escritos semelhantes apresentados pelos interessados”, conforme dispõe o artº 82º do CPA. Isto é, tal disposição é aplicável aos requerimentos que não sejam requerimentos iniciais, mas outros quaisquer escritos, como por exemplo, os de natureza impugnatória. Estes requerimentos podem ser apresentados junto dos respectivos serviços quer pessoalmente, quer pelo correio - artº 79º do CPA: “Salvo disposição em contrário, os requerimentos dirigidos a órgãos administrativos podem ser remetidos pelo correio, com aviso de recepção.” Ora, no âmbito do recurso hierárquico assume particular importância a observância do prazo legal da sua interposição, já que a sua apresentação extemporânea levará à rejeição liminar do mesmo. O artº 80º, nº2 do CPA, em que a ilustre Magistrada do MºPº se escuda para defender a não aplicação do disposto no artº 150º do CPC, à apresentação do recurso hierárquico, refere que: “2 - Os requerimentos são registados segundo a ordem da sua apresentação, considerando-se simultaneamente apresentado os recebidos pelo correio na mesma distribuição .” Esta norma, que não contempla expressamente a data da prática do acto, tem a sua ratio legis na necessidade de se estabelecer precedências entre pretensões concorrentes, formuladas em requerimentos iniciais de procedimentos administrativos, como se extrai da sua inserção sistemática (Cap. IV, Secção I “Do início”), e não sobre requerimentos de recurso hierárquico, embora a estes as normas contidas em tal secção possam ser aplicadas, com as devidas adaptações (cfr. artº 82º citado), pois não existe qualquer vantagem para os recorrentes na apresentação antecipada do recurso. Para estes apenas importa apresentá-los em tempo. E para se apurar tal circunstância importa definir a data da prática de tal acto, isto é, o momento da apresentação do recurso hierárquico, quando expedida a petição do mesmo pelo correio. Aqui chegados importa lembrar a letra do artº 150º, nº1 do CPC: “1. Os articulados, requerimentos, respostas e as peças referentes a quaisquer actos que devam ser praticados por escrito pelas partes no processo podem ser entregues na secretaria judicial ou a esta remetidos pelo correio, sob registo, acompanhados dos documentos e duplicados necessários, valendo, neste caso, como data do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal.” Esta norma, introduzida pela reforma de 1997, obsta à manutenção de formalismos inúteis ou desproporcionados, na prática dos actos processuais das partes, clarificando o momento da prática do acto processual - a da efectivação do respectivo registo postal - nos actos praticados pelo correio, pondo termo às velhas querelas suscitadas à volta do conceito de justo impedimento quando, designadamente, os atrasos nos serviços de comunicações eram invocados como tal. Ora, um dos princípios preconizados pelo CPA, é o princípio da desburocratização e da eficiência, previsto, precisamente, no seu artº 10º: “A Administração Pública deve ser estruturada de modo a aproximar os serviços das populações e de forma não burocratizada, a fim de assegurar a celeridade, a economia e a eficiência das suas decisões.” De acordo com este princípio, de que o supra citado artº 79º do CPA (que prevê o envio de requerimento pelo correio) é uma emanação legal, deve a Administração evitar o excessivo formalismo, interpretando as normas de procedimento administrativo segundo o princípio “in dubio pro actione”, (princípio do favorecimento do processo), isto é, de forma favorável à admissão e decisão final das petições dos administrados, o que implicará, em matéria de procedimento administrativo, que os formalismos devam ser interpretados em favor do administrado, consagrando-se uma interpretação mais favorável ao exercício do direito de petição, visando assegurar uma decisão de fundo sobre a questão objecto do procedimento. Deste princípio antiformalista decorre que o procedimento administrativo não se deverá traduzir em formalismos exagerados conduzindo a uma Administração complicada, deixando o procedimento administrativo de constituir uma garantia dos particulares. Ora, é precisamente à luz deste princípio, acolhido quer pelo CPC, quer pelo CPA, que se deve admitir, supletivamente, a aplicação do regime jurídico previsto no artº 150º, nº1 do CPC, na sua totalidade, isto é, admitir-se que, nos casos de remessa de petições, requerimentos, reclamações, ou outros papéis referentes a actos procedimentais, remetidos pelo correio, como permite o citado artº 79º do CPA, a data da efectivação do respectivo registo postal, vale como a data da prática do acto procedimental em causa. Assim sendo, procedem as conclusões das alegações da recorrente, mostrando-se o acto recorrido ferido de vício de violação de lei, por inobservância do disposto no artº 150º, nº1 do CPC, ao rejeitar liminarmente a autoridade recorrida o recurso hierárquico apresentado pela recorrente em 22.02.00. Mostra-se, deste modo, procedente o presente recurso, pelo que o acto recorrido carece de ser anulado. Pelo exposto, acordam os juizes do TCAS, Secção Contencioso Administrativo, 1º Juízo, em: a) - conceder provimento ao recurso contencioso; b) - sem custas, por isenção. LISBOA, 05.05.05 |