Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 07625/14 |
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Secção: | CT - 2.º JUÍZO |
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Data do Acordão: | 05/15/2014 |
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Relator: | PEDRO MARCHÃO MARQUES |
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Descritores: | RESSUPOSTOS LEGAIS PARA A AVALIAÇÃO INDIRECTA ÓNUS DA PROVA |
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Sumário: | I. Nos termos do disposto no artigo 74.º, n.º 3, da LGT, compete à AT o ónus da prova dos pressupostos que lhe permitem aplicar métodos indirectos na determinação da matéria tributável e, feita essa prova, compete ao contribuinte o ónus da prova do excesso na quantificação da matéria tributável efectuada. II. Evidenciados movimentos bancários a crédito (depósitos) divergentes em mais de EUR 100.000,00 em relação aos rendimentos declarados, sem justificação efectuada pelo contribuinte, consideram-se verificados os pressupostos legais para a avaliação indirecta do seu rendimento tributável desse ano (art.s 85.º, n.º 1, e 87.º, n.º 1, al.s b) e f) da LGT). III. Verificados os pressupostos legais de aplicação dos métodos indirectos, por força do disposto no artigo 89.º-A, n.º 3, da LGT é ao sujeito o passivo que incumbe a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados. IV. Não faz essa prova o contribuinte que, alegando que as quantias em causa derivam de proventos obtidos em jogos de casino e jogos on-line, para o demonstrar se limita a juntar cópia de três cheques bancários (frente) de EUR 50.000,00, de EUR 25.000,00 e de EUR 5.000,00, não datados, emitidos por Estabelecimento com autorização para promover jogos de fortuna e azar, sem fazer prova do seu efectivo depósito nas contas bancárias referenciadas. V. Esses cheques, desacompanhados de outra prova, não permitem inferir nem a proveniência dos depósitos bancários das quantias em questão, nem sequer a existência de ganhos de jogo. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório ... e ... (doravante, Recorrentes), não se conformando com a sentença da Mma. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente o recurso judicial que apresentaram da decisão de fixação da matéria colectável para o ano de 2009 em sede de IRS, no montante de EUR 165.345,63, nos termos do disposto no art. 89.º-A da LGT, dela vieram interpor o presente recurso jurisdicional, culminando com as seguintes conclusões: “a) Os rendimentos provenientes do acréscimo patrimonial não justificado, têm como origem verbas provenientes de jogos de casino e jogos de poker na internet. b) Atente-se no facto de os jogos de casino serem taxados na base, logo não são sujeitos a declaração em sede de IRS. c) Por outro lado, os prémios de jogo on-line estão ainda isentos, atendendo-se ao facto de não existir regulamentação para a respectiva tributação. d) Neste sentido, os referidos ganhos, não poderão ser objecto de incidência em sede de IRS; e) Assim, não tinham os contribuintes recorrentes obrigatoriedade de declarar os referidos rendimentos, atento o facto de não estarem previstos no âmbito de incidência do artigo 9.º do C.I.R.S.; f) Porquanto o legislador previu neste supra citado normativo o que pretendeu tributar no que respeita aos jogos, ficando assim de fora do respectivo âmbito o que nele não se encontra especificamente previsto, designadamente, os jogos de casino e os jogos on-line, cuja tributação ainda nem se encontra regulamentada. g) Desta forma, não é considerada legítima a fixação da matéria colectável por métodos indirectos, derivada da exclusão da figura de incrementos patrimoniais não justificados, como alude o artigo 9.º do C.I.R.S., por não se encontrarem preenchidos os pressupostos a que alude o artigo 89.º da L.G.T. h) Também daqui se retira que a fonte das manifestações de fortuna, neste caso, por serem ganhos provenientes de jogos de casino e de poker na internet, não estão assim, sujeitos a declaração em sede de IRS. i) Discordando do teor da douta sentença, também neste particular, donde se poderá concluir que não poderá haver lugar à avaliação indirecta da matéria colectável com fundamento em manifestações de fortuna sempre que o sujeito passivo comprove, nos termos dos n.ºs. 3 e 4, do artº 87, da L.G.Tributária, que correspondem à realidade os rendimentos por si declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna, como é o caso vertente no presente recurso, atenta a demonstração da proveniência dos ganhos não sujeitos a tributação de IRS; j) De facto, lograram os recorrentes provar que os ganhos obtidos e que constituem o alegado incremento patrimonial não são sujeitos ao âmbito de incidência de IRS, porquanto derivam de proventos obtidos em jogos de casino e jogos on line. k) Assim, uma vez que os rendimentos em causa, não são sujeitos a declaração em sede de IRS, não há legitimidade por parte da AT, ao abrigo do disposto no artigo 89.º da L.G.T, para tributação por via de avaliação indirecta, por se encontrarem excluídos da categoria incrementos patrimoniais não justificados. Termos em que e nos mais de direito, que V. Exa. muito doutamente suprirá, deverá o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente, deverá V. Exa. decidir pela revogação da Douta sentença ora em crise, e em consequência, substituindo-a por outra que revogue a decisão de fixação do rendimento colectável para o ano de 2009, com base nos métodos indirectos. • A Directora de Finanças de Lisboa (Recorrida), apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido (cfr. fls. 154-155). • Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, concluindo que o acto de fixação de matéria colectável sindicado nos autos é legal e não violou os artigos 87.º, n.º 1, al. f) e 89.º-A, n.º 5 da LGT, pelo que a sentença que assim decidiu deve ser mantida. • Com dispensa de vistos, dada a sua natureza urgente, o processo é submetido à Secção de Contencioso Tributário para julgamento do recurso. • I. 1. Questões a apreciar e decidir: As questões suscitadas pelos Recorrentes, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões traduzem-se em apreciar: i) se o Tribunal a quo errou na apreciação da prova ao ter considerado que aqueles não lograram provar que o acréscimo do património evidenciado em 2009 se devia a ganhos em jogos de casino e jogos de internet; e ii) se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito ao ter considerado improcedente o recurso judicial contra a fixação da matéria tributável nos termos do disposto no art. 89.º-A da LGT. • II. Fundamentação II.1. De facto É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa e que aqui se reproduz: A) No âmbito de uma acção inspectiva à sociedade «... – Companhia de Segurança Privada, Lda», os Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças do Porto verificaram que as contas bancárias de ... , sócio gerente daquela empresa e esposa, ... , "apresentam movimentos a crédito que representam entradas de dinheiro de montantes superiores aos rendimentos declarados à Administração Fiscal."- cfr. relatório de inspecção de fls. 5 a 11 do processo administrativo apenso;
E) No âmbito da acção inspectiva aos ora Recorrentes, foi elaborado relatório de inspecção, do qual destaco o seguinte teor: ( ...) IV- Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos (...) Do confronto efectuado entre os movimentos bancários a crédito constante dos extractos bancários e os rendimentos declarados pelo SP em sede de IRS, constata-se que estes se afastam significativamente para menos, sem razão justificada, sendo incompatíveis com as manifestações de fortuna evidenciadas pelos movimentos a crédito das contas bancárias em causa, motivo pelo qual se encontram preenchidos os requisitos de aplicação da avaliação indirecta nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 85.º e as alíneas b) e j) do n.º 1 do artigo 87.º da LGT. A impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável funda-se no previsto artigo 88.º al. d) da LGT. Da incompatibilidade dos acréscimos patrimoniais, consubstanciados nos movimentos a crédito das contas bancárias atrás referidas, com os rendimentos declarados e constantes da declaração de rendimentos «IRS - mod. 3» decorre a exigência do sujeito passivo comprovar a origem dos mesmos- artigo 89.ºA, n.0s 1 e 3 da LGT. Questionado o sujeito passivo sobre a origem dos depósitos nas contas bancárias anteriormente referidas, de montante superior ao que declarou à Administração Tributária afirmou que «essa pergunta deve ser feita à empresa/entidade patronal em questão, visto os depósitos, transferências serem feitos pela mesma, assim como a declaração de rendimentos». Não forneceu o sujeito passivo qualquer elemento, qualquer comprovativo da justificação para os movimentos bancários a crédito constantes dos extractos bancários. Desta forma, os créditos que ocorreram nas mencionadas contas de depósitos à ordem nãoforam comprovados pelo sujeito passivo, quanto à sua origem e destino. Ora, cabendo ao sujeito passivo, nos termos do disposto no artigo 89.º A, n.º 3 da LGT, a comprovação de que não correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte do acréscimo patrimonial, e não tendo o mesmo procedido a tal prova, estamos perante uma divergência não justificada entre rendimentos declarados e acréscimos patrimoniais evidenciados, legitimadora de tributação por via de avaliação indirecta. Desta forma, não sendo possível averiguar a origem das quantias movimentadas pelo sujeito Passivo, nem tendo o mesmo logrado provar a proveniência dos referidos acréscimos patrimoniais, os mesmos terão de ser tributados pelas regras da categoria «G» do IRS, previstas no artigo 9.º n.º 1 da alínea d) do CIRS – Acréscimos patrimoniais não justificados –, sendo a avaliação indirecta feita nos termos do n.º 1 da alínea f) do artigo 87.º da LGT. V- Critérios de Cálculo Face ao exposto e em conformidade com o disposto na alínea a) do número 2 do artigo 75.º da LGT, a presunção de veracidade da declaração do contribuinte para o exercício de 2009, é pois afastada. A existência de divergência não justificada entre os rendimentos declarados pelo sujeito passivo e constante da declaração de rendimentos – IRS - Mod. 3 e o acréscimo de património de valor superior a 100.000,00 € no exercício em análise, constitui pressuposto do recurso à avaliação indirecta, de acordo com o disposto no artigo 87.º n.º 1, al. f) da LGT. E, tal situação determina que se considere como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na Categoria G, quando não existem indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90.º da LGT, que permitam à Administração Tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo patrimonial e os rendimentos declarados pelos sujeitos passivos no período de tributação de 2009, conforme previsto no artigo 89.º-A da LGT. IRS -Incrementos Patrimoniais Anexo G – Artigo 9.º n.º 1, al. d) CIRS
F) Em 25/06/2013, a Directora de Finanças de Lisboa proferiu despacho que fixou para efeitos de IRS de 2009, "ao abrigo dos arts. 9.º, n.º 1, alínea d) e n.º 3 do CIRS, 87.º, n.º 1, alínea f) e 89.º-A, n.º 5 da LGT, o rendimento colectável dos Recorrentes – categoria G, no montante de 165.345,63€ – cfr. despacho do relatório de inspecção tributária de fls. 1do processo administrativo apenso; K) os valores dos cheques, referidos em J) foram creditados nas contas bancárias dos recorrentes – cfr. artigo 10.º da petição de fls. 4. Inexistem outros factos não provados com relevância para a decisão da causa. O Tribunal a quo alicerçou a motivação da matéria de facto nos seguintes termos: Considero provados os factos A a H e J, com base no teor dos documentos juntos aos autos e identificados nas várias alíneas do probatório. Considero provado o facto I, por não ter sido impugnado. Considero não provado o facto K por, não terem sido apresentados extractos bancários demonstrativos do depósito dos cheques referidos em J. • II.2. De direito Considerada a factualidade dada por assente, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso jurisdicional. Os Recorrentes alegam que a Mma. Juiz do TT de Lisboa errou na apreciação da prova produzida, pois que entendem, segundo se pode presumir da leitura das alegações e conclusões do recurso interposto, que dos elementos juntos aos autos teria ficado demonstrado que os ganhos obtidos e que constituem o alegado incremento patrimonial não são sujeitos ao âmbito de incidência de IRS, porquanto derivam de proventos obtidos em jogos de casino e jogos on line. Assim, importaria que os Recorrentes, para impugnar com eficácia a decisão sobre a matéria de facto proferida pela Mma. Juiz do TT de Lisboa que os Recorrentes demonstrassem que o incremento patrimonial que esteve na base do recurso ao método indirecto derivava efectivamente de proventos obtidos em jogos de casino e jogos on-line. O que não fizeram. Neste domínio, a verdade é que se limitaram a afirmar que tinha ficado demonstrado que os ganhos obtidos e que constituem o dito alegado incremento patrimonial derivavam de proventos obtidos em jogos de casino e jogos on-line (conclusão j. do recurso). De nenhum passo precisando que concretos elementos de prova, individualmente ou pela sua apreciação conjunta, imporiam conclusão diversa da alcançada pelo tribunal a quo. E necessário é ter presente que nos termos do artigo 640.º do CPC, incumbe ao recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto o ónus de especificar, sob pena de rejeição, para além dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. É o que dispõe o art. 640.º do CPC, sob a epígrafe “Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto”: 1- Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. 2- (…) Resulta pois do citado artigo 640.º do CPC a consagração de um ónus especial de alegação quando se pretenda impugnar a matéria de facto, o qual impende sobre os aqui Recorrentes e que os mesmos, de forma manifesta, não satisfizeram. É sabido que a este tribunal de recurso assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal a quo, desde que ocorram os pressupostos previstos no art. 662.º do CPC, incumbindo-lhe reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos. Porém, considerando que os Recorrentes não dão cumprimento aos normativos legais aplicáveis, não indicando os concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida, sendo que não se apresenta como manifesto que a prova produzida imponha decisão diversa, está vedado a este tribunal de recurso conhecer do eventual erro de julgamento da matéria de facto. Com efeito, não basta afirmar-se de modo genérico que as verbas em questão haviam sido “creditadas nas contas bancárias de que são titulares os recorrentes – discordando-se aqui do teor da douta sentença em causa, que considera como não provado que os referidos montantes tenham sido depositados na conta bancária de que são titulares os recorrentes” (cfr. art. 8.º das alegações de recurso); impunha-se sim que a efectiva ocorrência desses putativos factos fossem suportados por indicação de um concreto meio de prova, o que, de todo, não foi feito. Pelo que, nada havendo a aditar, alterar ou corrigir no respeitante à decisão sobre a matéria de facto proferida em 1.ª instância, tem nesta parte o recurso que improceder. Estabilizada a matéria de facto, vejamos agora se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter considerado como verificados os pressupostos legais dos quais depende a determinação da matéria tributável por parte da administração tributária nos termos previstos na norma do artigo 89.º-A da LGT, com a consequente fixação do rendimento tributável em sede de IRS do ano de 2009, no montante de EUR 165.345,63. Na sentença recorrida, após se transcrever (parcialmente) o teor do facto vertido em E) do probatório, escreveu-se o seguinte: “(…) Nos termos do artigo 1.º do CIRS, o imposto sobre o rendimento das pessoas singulares incide sobre o valor anual dos rendimentos das categorias, ali enunciadas, mesmo que provenientes de actos ilícitos, depois de efectuadas as correspondentes deduções e abatimentos. A categoria que interessa aos presentes autos é a categoria G – incrementos patrimoniais, que está definida no artigo 9.º do CIRS. E, nos termos do citado artigo 9.º, n.º 1, alínea d) constituem incrementos patrimoniais «os acréscimos patrimoniais não justificados, determinados nos termos dos artigos 87.º, 88.º ou 89.ºA da lei geral tributária». O n.º 3 do citado artigo 9.º do CIRS acrescenta que "São igualmente considerados incrementos patrimoniais aqueles a que se refere o n.º 5 do artigo 89.ºA da lei geral tributária". Pelo que, há uma remissão para os artigos que regem a avaliação indirecta da matéria tributável. Nos termos do citado artigo 87.º, n.º 1, alínea f) e 89.º-A, n.º 5 da Lei Geral Tributária, a avaliação indirecta só pode efectuar-se em caso de «acréscimo de património … de valor superior a € 100.000, verificados simultaneamente … com a existência, no mesmo período de tributação, de uma divergência não justificada com os rendimentos declarados.» Pelo que, atendendo ao teor do relatório e documentos juntos pela Administração Fiscal, estão verificados os pressupostos de fixação da matéria colectável por avaliação indirecta, cabendo ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas não constituem rendimentos sujeitos a declaração em sede de impostos sobre o rendimento (cfr. artigo 89.º-A, n.º 3 da LGT).” [sublinhado nosso]. Como provado em E) do probatório, e afirmado no discurso fundamentador da sentença recorrida, a Administração Tributária fundamentou o recurso à avaliação indirecta na alínea d) do artigo 88.º da LGT (introduzida pela Lei nº 30-G/2000, de 29 de Dezembro), que veio permitir o recurso à tributação indirecta quando seja manifesta uma divergência significativa entre as declarações dos contribuintes e a matéria tributável real, presumida a partir de factos externos que manifestem ou patenteiem uma capacidade contributiva superior à declarada. Cabendo à Administração Tributária (art. 74.º, n.º 1, da LGT e art. 342.º, n.º 1, do C. Civil) provar o facto que, segundo a lei, constitui uma manifestação de fortuna e ao sujeito passivo cabe o ónus de provar que os rendimentos declarados correspondem à realidade e que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou do acréscimo do património ou da despesa efectuada (ou seja, ocorre uma inversão do ónus da prova). Ora, segundo o relatório de inspecção que suporta o acto de liquidação impugnado, a Administração Tributária considerou patenteada uma capacidade contributiva dos impugnantes, ora Recorrentes, significativamente maior do que a declarada, com base nos movimentos a crédito nas contas bancárias destes (que ascenderam aos montante total de EUR 165.345,63, sendo o rendimento declarado de EUR 48.750,00), cuja origem e/ou proveniência os impugnantes não lograram justificar e, por isso, foram considerados por aquela como acréscimos patrimoniais não justificados (rendimentos da categoria G - artigo 9.º, n.º 1, alínea d), do CIRS). Como no mesmo relatório se refere. “(…) não sendo possível averiguar a origem das quantias movimentadas pelo sujeito passivo, nem tendo o mesmo logrado provar a proveniência dos referidos acréscimos patrimoniais, os mesmos terão de ser tributados pelas regras da categoria «G» do IRS, previstas no art. 9.º, n.º 1, al. d) do CRIS – Acréscimos patrimoniais não justificados -, sendo a avaliação indirecta feita nos termos do n.º 1 da alínea f) do artigo 87.º da LGT” (cfr. E) do probatório). Importa, em primeiro lugar, evidenciar que o recurso ao método indirecto foi fundamentado na alínea d) do artigo 88.º da LGT, por ocorrer uma impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável, estando, nessa medida e face à factualidade que vem provada, justificado. Com efeito, de acordo com o provado, os ora Recorrentes não conseguiram provar a origem dos depósitos nas contas bancária, não tendo fornecido qualquer elemento justificativo para tanto. E, em segundo lugar, existe uma divergência apurada – e que não é questionada –, no ano de 2009, entre as entradas em dinheiro/depósitos (no montante total de EUR 165.345,63) e o rendimento declarado em sede de IRS (de EUR 48.750,00), superior a EUR 100.000,00. Concluindo, quanto a este ponto, está, pois, justificado o recurso ao método indirecto, tal como decidido pelo Tribunal a quo (art.s 85.º, n.º 1, 87.º, n.º 1, al.s b) e f) e 88.º, al. d) da LGT). E tendo o Tribunal recorrido considerado – acertadamente, como se viu – que a Administração Tributária fez a prova da verificação dos pressupostos legais do recurso a métodos indirectos para a determinação da matéria tributável que suporta a liquidação em crise, passou então a recair sobre os Recorrentes o ónus da prova da inexistência dos factos tributários ou de erro ou excesso na quantificação da matéria tributável efectuada. No sentido de justificar o acréscimo de património detectado, os Recorrentes invocaram no Tribunal a quo – o que neste TCAS reiteram – que as verbas em causa resultavam de ganhos em jogos de casino e jogos na internet, os quais não seriam sujeitos a declaração para efeitos de IRS, juntando com a p.i. cópias de três cheques. Porém, tal como salientou a Mma. Juiz a quo, esses cheques – identificados em J) do probatório – não são suficientes, por si só, para comprovar a origem daquelas operações, nada se comprovando quanto aos negócios subjacentes, adiantamos nós. Aliás, não ficou provado, o que se encontra devidamente estabilizado (v. supra), que os valores desses cheques tenham sido sequer creditados nas contas bancárias dos ora Recorrentes (cfr. o facto não provado “K)”). Deste modo, como referido pelo Ministério Público no parecer emitido neste Tribunal, também não pode sufragar-se a alegação dos Recorrentes consubstanciada no argumento de que os referidos prémios de jogo não constituíam rendimentos sujeitos a IRS, por não se encontrarem especificamente previstos. Na verdade, necessário é ter presente que não ficou provado que os valores dos cheques em questão tivessem sido creditados nas contas bancárias dos Recorrentes (cfr. o facto K) não provado), factos alegados pelos Recorrentes e que, na sua óptica, justificariam o acréscimo patrimonial detectado pela Administração Tributária. Com efeito, provados os pressupostos de aplicação do n.º 1 do artigo 89.º-A da LGT, passa a caber ao sujeito passivo a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, nomeadamente, herança ou doação, rendimentos que não esteja obrigado a declarar, utilização do seu capital ou recurso a crédito (art.s 74.º, n.º 3, e 89.º-A, n.º 3, da 89º-A da LGT). A lei ao dizer que o sujeito passivo tem de provar que “é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciada” pretende o sujeito passivo indique a “fonte”, o mesmo é dizer, a origem da manifestação de fortuna, como é que ela se materializou (também neste sentido o acórdão do TCAN de 13.09.2013, proc. n.º 2395/10.9BEPRT, por nós relatado). Como naquele acórdão se disse, “não atinge tal desiderato provar fontes de rendimentos suficientes para a realização de determinada manifestação de fortuna. Porque, não se sabendo se os rendimentos foram utilizados naquela específica manifestação de fortuna, podem servir para justificar toda e qualquer manifestação de fortuna, logo, não servem para justificar nenhuma.” E como de igual modo se concluiu no Acórdão do STA de 12.04.2012, processo nº 298/12: “Para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta não basta ao contribuinte demonstrar que no ano em causa detinha meios financeiros de valor superior ao dos consumos realizados, mas também quais os concretos meios financeiros que afectou à realização de tais consumos sendo a melhor interpretação do art. 89.º-A, n.º 3, da LGT, a que exige que o contribuinte prove a relação causal de afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna evidenciada. (…) Patenteia-se que o sistema criado de controlo das manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados exige ao sujeito passivo que comprove a realidade dos rendimentos declarados e que é outra a fonte do acréscimo do património ou do consumo efectuado - cfr. art.° 89°-A n.° 3 da LGT. não lhe bastando fazer a demonstração de factos que permitam duvidar da existência do facto tributário ou da sua quantificação, antes se lhe impondo, que para além disso demonstre quais os concretos meios financeiros não sujeitos a declaração que foram afectos ao consumo evidenciado. A demonstração de que se fala é, pois, a da afectação concreta dos recursos brotados da referida fonte (rendimentos não sujeitos a tributação) ao concreto consumo ou acréscimo patrimonial [sublinhado nosso]. (…).” Ora, a mera existência dos cheques, aliás não datados como assinalou a sentença recorrida, sem prova do seu efectivo depósito nas contas bancárias, não permite sustentar, por si só, o incremento patrimonial evidenciado. Por outro lado, a circunstância de vir provado que os ora Recorrentes são jogadores de casino e de jogos de Poker há vários anos (cfr. I) do probatório), também não altera ou sequer perturba a conclusão alcançada, pois que desse facto, desacompanhado de outros, nada legitimamente se pode retirar para além de isso mesmo. Ou seja, do singelo facto constante de I) do probatório não é possível inferir nem a proveniência dos depósitos bancários das quantias em questão, nem mesmo a existência de ganhos de jogo (como referido pela Recorrida nas suas contra-alegações). Deste modo, este facto não é sequer minimamente hábil para consubstanciar uma eventual situação de fundada dúvida, a reverter a favor dos contribuintes de acordo com o disposto no art. 100.º, n.º 1, do CPPT. Assim, perante a assinalada ausência de prova, não merece censura a conclusão alcançada pelo Tribunal a quo: “Não tendo os Recorrentes feito a prova de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas não são rendimentos sujeitos a declarações de IRS, exigida pelo artigo 89.º-A, n.ºs 3 e 4 da LGT, deve manter-se a avaliação indirecta da matéria tributável efectuada nos presentes autos”. Improcedendo, portanto, o presente recurso integralmente, terá que confirmar-se a sentença recorrida que julgou improcedente o recurso da decisão da Directora de Finanças de Lisboa que fixou nos termos dos art.s 87.º, n.º 1, al. f) e 89.º-A, n.º 5, da LGT, em sede de IRS do ano de 2009, o rendimento colectável dos ora Recorrentes – categoria G – no montante de EUR 165.345,63. • III. Conclusões Sumariando: I. Nos termos do disposto no artigo 74.º, n.º 3, da LGT, compete à AT o ónus da prova dos pressupostos que lhe permitem aplicar métodos indirectos na determinação da matéria tributável e, feita essa prova, compete ao contribuinte o ónus da prova do excesso na quantificação da matéria tributável efectuada. • III. DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas pelos Recorrentes. ____________________________ ____________________________ ____________________________ |