Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 12116/03 |
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Secção: | Contencioso Adminisstrativo - 1º Juízo Liquidatário |
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Data do Acordão: | 06/01/2006 |
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Relator: | Elsa Esteves |
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Descritores: | UNIVERSIDADES AUTONOMIA DISCIPLINAR RECURSO CONTENCIOSO |
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Sumário: | I - "As universidades são pessoas colectivas de direito público e gozam de autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa, financeira e disciplinar". II- Considerando que a matéria disciplinar não se compreende em nenhuma das concretizações da competência tutelar exemplificativamente enunciadas no nº 2 do art. 28º da Lei 108/88, de 24-09, e que o nº 1 deste preceito apenas estabelece uma «cláusula de referência» das áreas susceptíveis de intervenção tutelar, a especificar concretamente em disposição legal expressa, que não existe naquela matéria, é de entender, em face do disposto no 2 do art. 76º da CRP, nº 1 do art. 3º e nº 1 do art. 25º, ambos da Lei 100/88, e, ainda, do art. 177º, nº 2 do CPA, que o direito de recurso referido no transcrito nº 3 do art. 9º, é um direito ao recurso contencioso imediato. III- Assim, é de rejeitar o recurso contencioso do despacho do Ministro da Ciência e do Ensino Superior, de 11-12-2002, que indeferiu o recurso gracioso da deliberação da Subsecção dos Assuntos Disciplinares do Senado da UTL, de 18-07-2002, que aplicou ao Recorrente a pena disciplinar de inactividade graduada em 2 anos. |
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Aditamento: | ![]() |
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 1º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL * JOSÉ .... veio interpor recurso contencioso de anulação do acto MINISTRO DA CIÊNCIA E DO ENSINO SUPERIOR, de 11-12-2002, que indeferiu o recurso hierárquico interposto da deliberação da Subsecção do Senado dos Assuntos Disciplinares de 18-07-2002 que aplicara ao Recorrente a pena de inactividade graduada em dois anos. Na resposta, a Autoridade Recorrida vem dizer que, embora o despacho de 11-12-2002 venha identificado no proémio da petição inicial, entende que, em face do teor do artigo 7º dessa peça processual, o acto que, de facto, está impugnado é a deliberação de 18-07-2002, pelo que o recurso é extemporâneo, devendo ser rejeitado. Notificado nos termos e para os efeitos do art. 54º, nº 1 da LPTA, o Recorrente veio, a fls 81, prestar o seguinte esclarecimento: «1. O despacho de que se recorre é o de 11/12/2002, notificado ao signatário em 2002-12-02, conforme consta dos autos (doc. nº 2 adjunto com o requerimento inicial). 2. Deve, assim, ser corrigido o lapso do art. 7º passando a constar que o acto é o despacho de 11/12/2002 do Senhor Ministro da Ciência e do Ensino Superior que indeferiu o recurso hierárquico necessário». O conhecimento da questão prévia foi relegado para final. Dado cumprimento ao disposto no art. 67º do RSTA, só o Recorrente apresentou alegações, formulando as seguintes conclusões: «O acto administrativo que aplicou ao recorrente a pena de inactividade graduada em dois anos é nulo e de nenhum efeito, porquanto: 1- Provém de um órgão da Administração – Ministro da Ciência e Tecnologia – que não tem competência para o exercício da acção disciplinar. 2- Aliás, todo o processo disciplinar é nulo, a partir de fls. 3, porquanto o Reitor da UTL que determinou a instauração do mesmo é incompetente para o efeito, cabendo tal competência ao Senado Universitário. 3.Um processo disciplinar que não se apoie numa decisão da única autoridade com competência para o ordenar ou promover deve considerar-se inexistente. 4- Sem conceber, não foram consideradas as atenuantes especiais previstas no art. 29º do Decreto-Lei nº 24/84 e bem assim a circunstância da atenuação temporária prevista no art. 30º do mesmo Diploma. 5- A pena aplicada ao recorrente é desproporcional aos factos dados como provados. 6- Pela aplicação dos artigos 29º e 30º do Dec.-Lei nº 24/80 a medida abstracta da pena deveria ser, quanto muito, a de suspensão graduada entre 20 a 120 dias ou 121 a 240 dias, não podendo ninguém ser punido em abstracto, sendo nula a punição aplicada, bem como todo o processado. 7- As duas penas de suspensão estão a coberto da Lei da Amnistia, Lei nº 29/99, de 12 de Maio, plenamente aplicável ao caso vertente. 8- A Acta da reunião do Senado sendo formalmente correcta está materialmente viciada pois não se permitiu a discussão em matéria de facto e de direito do processo. 9- Não há motivação em matéria de facto e em matéria de direito a sua ausência é absoluta. 10- Além disso a deliberação do Senado foi proferida em reunião sem quorum, com violação flagrante do art. 27º, nº 1 do Regulamento do Senado. 11- A pena aplicável é injusta e inoportuna. 12- Os arts 24º, alínea c) e 25º nº 1, ambos do Estatuto Disciplinar, aprovado pelo Decreto-Lei nº 24/84 de 16 de Janeiro, que teve autorização legislativa da Lei nº 10/83, de 13 de Agosto, estão inquinadas pelo vício da inconstitucionalidade orgânica, em virtude de não ter sido respeitado o prazo de 120 (cento e vinte) dias fixado no art. 2º da supra citada Lei, com violação do nº 2 do art. 168º (hoje 165º) da Constituição da República Portuguesa». O Exmº Magistrado do Ministério emitiu parecer no sentido da rejeição do recurso, com fundamento em que o acto impugnado é irrecorrível por a deliberação de 18-07-2002 ser o acto lesivo contenciosamente recorrível, atendendo a que, «De acordo com a 4ª conclusão do parecer do CC da PGR, de 26-09-2002 “No âmbito da sua autonomia disciplinar, os órgãos de Governo das universidades têm competência para aplicação aos docentes, investigadores e demais funcionários e agentes de todas as penas disciplinares previstas nos nºs 1 e 2 do art. 11º do Estatuto Disciplinar aprovado pelo Decreto-Lei 24/84, de 16 de Janeiro, delas cabendo recurso contencioso directo (artigos 3º, nº 1 e 9º, nºs 1 e 3 da Lei nº 108/88 e 268º, nº 4 da Constituição)». O Recorrente foi notificado de novo nos termos e para os efeitos do nº 1 do art. 54º da LPTA, mas nada disse. Colhidos os vistos legais, foi o processo submetido à conferência para julgamento. II- OS FACTOS a)- Na sequência das conclusões do processo de sindicância à Faculdade de Arquitectura da UTL, no capítulo disciplinar, apontadas no relatório do Juiz-Conselheiro sindicante, o Reitor da Universidade Técnica de Lisboa, por despacho nº 3/2000, de 10-08-2000, determinou instaurar processo disciplinar ao Recorrente, Professor Catedrático naquela Faculdade, para “apuramento de factos e graduação das responsabilidades decorrentes de acções ou omissões verificadas no período em que exercera funções de direcção nos órgãos de gestão da Faculdade, ou em sectores de actividade da Faculdade que tiveram a seu cargo, e dos quais possam ter resultado prejuízos institucionais e pessoais”; b)- Àquele processo foram apensos os processos disciplinares nºs 11.05/05-2001 (cfr. despacho do Reitor da UTL de fls. 1934 e auto de fls. 1938) e 11.06/12-000 (cfr. despacho de fls. 1941), instaurados ao Recorrente, respectivamente, por eventual acumulação ilegal de funções de docente da Faculdade de Arquitectura (FA) com funções igualmente docentes da Universidade Moderna, no ano lectivo de 1999/2000, e pela redacção de sumários da disciplina de Projecto IV, no ano lectivo de 2000/01, de que o Arguido era professor, em desconformidade com os objectivos daquele instrumento pedagógico, tal como vem definido no art. 66º do Estatuto da Carreira Docente Universitária; c)- Instruído o processo disciplinar, foi o mesmo enviado à Subsecção do Senado dos Assuntos Disciplinares, relativa a docentes e funcionários não docentes que, em reunião de 18-07-2002, deliberou concordar com a proposta da Instrutora, aplicando ao Recorrente a pena de inactividade graduada em dois anos; d)- O Recorrente interpôs recurso hierárquico dessa deliberação; e)- Sobre esse recurso foi emitido, em 11-11-2002, o parecer nº 2002/54/DSRHFP, a fls 23 a 35 que se dão por integralmente transcritas, e no qual se concluiu o seguinte: «15. Assim, face ao exposto, somos de parecer que deve ser mantida a deliberação de 18 de Julho de 2002, da Subsecção de Assuntos Disciplinares do Senado da UTL pela qual aplicou ao Professor Catedrático José Deodoro Faria Trofa Real, a pena de inactividade graduada em dois anos, assim se indeferindo o recurso interposto com os fundamentos do presente parecer»; f)- Por despacho de 11-12-2002, a Autoridade Recorrida, nos termos e com os fundamentos desse parecer, indeferiu o recurso hierárquico referido em d). III- O DIREITO O Recorrente interpôs recurso contencioso de anulação do despacho proferido pela Autoridade Recorrida em 11-12-2002, que indeferiu o recurso hierárquico interposto da deliberação da Subsecção do Senado dos Assuntos Disciplinares, de 18-07-2002, que aplicou ao Recorrente a pena disciplinar de inactividade graduada em dois anos. O Exmº Magistrado do Ministério Público suscitou a questão prévia da irrecorribilidade daquele despacho por a deliberação da Subsecção do Senado ser o acto lesivo contenciosamente recorrível. Cumpre decidir. O art. 76º, nº 2 da CRP consagra que “As universidades gozam, nos termos da lei, de autonomia estatutária, científica, administrativa e financeira, sem prejuízo de adequada avaliação da qualidade do ensino”. A Lei 108/88, de 24-09, concretizando essa autonomia, estabelece, no nº 1 do seu art. 3º, que “As universidades são pessoas colectivas de direito público e gozam de autonomia estatutária, científica, pedagógica, administrativa, financeira e disciplinar”. A Faculdade de Arquitectura (FA) é, em conformidade com a al. g) do nº 1 do art. 2º dos Estatutos da Universidade Técnica de Lisboa (UTL), uma das escolas (na terminologia do nº 2 do art. 1º dos Estatutos da FA, “unidade orgânica”) que integram esta Universidade, «todas pessoas colectivas de direito público, dotadas de autonomia estatuária, científica, pedagógica, administrativa e financeira”. As dimensões de auto-administração das universidades são asseguradas, em auto-governo, por órgãos electivos, emergentes da própria universidade e não designados pelo Governo, estando sujeitas ao poder tutelar “do departamento governamental com responsabilidade pelo sector da educação” (cfr. art. 28º, nº 1 da Lei nº 108/88), só e onde expressamente a lei o preveja. Relativamente à autonomia disciplinar dispõe a alínea i) do art. 25º da citada Lei 108/88, que compete ao Senado Universitário exercer o poder disciplinar, em conformidade com o disposto no seu art. 9º, quanto às infracções disciplinares praticadas por docentes, investigadores, e demais funcionários e agentes, sendo, por isso, o Senado Universitário o órgão competente para exercer o poder disciplinar e para aplicar as penas disciplinares elencadas nos nºs 1 e 2 do art. 11º do DL 24/84, de 16-01, competência reiterada no corpo e al. a) do art. 28º dos Estatutos da UTL. Estabelece o citado art. 9º da Lei 108/88, que «1- As universidades dispõem do poder de punir, nos termos da lei, infracções disciplinares praticadas por docentes, investigadores e demais funcionários e agentes» e «3- Das penas aplicadas ao abrigo da autonomia disciplinar cabe sempre direito de recurso nos termos da lei». Ora, uma vez que a matéria disciplinar não se compreende em nenhuma das concretizações da competência tutelar exemplificativamente enunciadas no nº 2 do art. 28º da lei que vimos citando e que o nº 1 deste preceito apenas estabelece uma «cláusula de referência» das áreas susceptíveis de intervenção tutelar, a especificar concretamente em disposição legal expressa, que não existe naquela matéria, é de entender, em face do disposto no 2 do art. 76º da CRP, nº 1 do art. 3º e nº 1 do art. 25º, ambos da Lei 100/88, e, ainda, do art. 177º, nº 2 do CPA, que o direito de recurso referido no transcrito nº 3 do art. 9º, é um direito ao recurso contencioso imediato (vide, neste sentido, ac. do TCA de 30-09-2004, proc. nº 00219/04, e Parecer nº 74/2002, de 24-10, do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República). Sendo assim, o acto lesivo verticalmente definitivo era a deliberação da Subsecção dos Assuntos Disciplinares do Senado da UTL, de 18-07-2002, e não o despacho de 11-12-2002, contenciosamente recorrido, que não tendo lesividade própria, não satisfaz a exigência de impugnabilidade assegurada no nº 4 do art. 268º da CRP. * Por todo o exposto e em conformidade com o § 4º do art. 57º do RSTA, acordam em negar provimento ao recurso por manifesta ilegalidade na interposição de recurso do despacho . Custas pelo Recorrente, fixando-se a taxa de justiça e a procuradoria respectivamente em 150 € (cento e cinquenta) e 100 € (cem). Lisboa, 1 de Junho de 2006 Relator (Elsa P. Esteves) 1º Adjunto (Cristina Santos) 2º Adjunto (Teresa de Sousa) |