Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | MANUEL AUGUSTO DE MATOS | ||
Descritores: | CONCLUSÕES CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO ADMISSIBILIDADE DE RECURSO DETENÇÃO ILEGAL DE ARMA CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES CORREIO DE DROGA MEDIDA CONCRETA DA PENA CULPA ILICITUDE PREVENÇÃO GERAL PREVENÇÃO ESPECIAL IMAGEM GLOBAL DO FACTO SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA | ||
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Data do Acordão: | 01/27/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE | ||
Área Temática: | DIREITO PROCESSUAL PENAL – RECURSOS / RECURSOS ORDINÁRIOS / TRAMITAÇÃO. DIREITO PENAL – CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / PENAS / SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA DE PRISÃO. | ||
Doutrina: | - JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2.ª Edição, Coimbra Editora, p. 309 , 343, 635, 636, 638 e 639 ; Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas Do Crime, Editorial de Notícias, p. 227 e ss.; - M. MIGUEZ GARCIA e J. M. CASTELA RIO , Código Penal, Parte Geral e Especial, 2015, 2.ª Edição, Almedina, p. 460 e 462; - PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Código Penal, Universidade Católica Editora, 2015, p. 452 e 456. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 412, N.º 2, E 417.º, N.º 3. CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 50.º E 53.º. LEGISLAÇÃO DE COMBATE À DROGA, DL 15/93, DE 22-01: - ARTIGO 21.º, N.º 1. MEDIDAS DE COMBATE À CRIMINALIDADE ORGANIZADA, LEI 5/2002 DE 11-01: - ARTIGO 7.º, N.º 1. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 20-01-2010, PROCESSO N.º 18/06.GAVCT.S1; - DE 15-12-2011, PROCESSO N.º 706/10.6PHLSB.S1; - DE 03-07-2014, PROCESSO N.º 1081/11.7PAMGR.C1.S1; - DE 27-05-2015, PROCESSO N.º 445/12.3PBEVR.E1.S1; - DE 11-06-2015, PROCESSO N.º 41/10.0JBLSB.S1, IN WWW.DGSI.PT; - DE 18-06-2015, PROCESSO N.º 270/09.9GBVVD.S1. -*- ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL: - DE 08-11-1991, ACÓRDÃO N.º 426/91; - DE 10-02-1999, ACÓRDÃO N.º 10/99,; - DE 20-06-2012, ACÓRDÃO N.º 319/2012, TODOS IN WWW.TRIBUNALCONSTITUCIONAL.PT. | ||
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Sumário : | I - O art. 417.º, n.º 3, do CPP determina, que, se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente tais indicações contidas no art. 412.º, n.º 2, do CPP, o relator convida o recorrente a completá-las, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada. II - É de concluir, pela não rejeição do recurso, se o recorrente apresentou conclusões e não foi chamado a completar ou esclarecer essa peça processual e embora as menções referidas no art. 412.º, n.º 2, do CPP, não constem das conclusões, elas figuram expressamente na fundamentação, no final do capítulo dedicado a cada uma das questões objecto do recurso, sendo admissível o aproveitamento da motivação recursória, sob pena de irrazoável rigorismo. III - O crime de detenção de arma proibida, bem como das munições de armas de fogo configura, um crime de perigo abstracto em que o que está em causa é a perigosidade das próprias armas, residindo a lesividade jurídica no mero facto de o agente possuir ou deter a munição sem autorização, consumando-se o crime com a simples conduta de possuir a munição - trata-se de um crime de mera conduta ou de perigo abstracto. IV - Resultando dos factos provados que o recorrente detinha uma munição de uma arma de fogo de calibre 6,35 mm, no interior de uma balança na cozinha, em bom estado de conservação, não sendo titular de licença para uso ou porte de arma de qualquer natureza e que o recorrente conhecia as características da referida munição e ainda assim, quis detê-la sem qualquer justificação para tal, ignorando que a detenção de tal objecto é proibida e que configura ilícito criminal, tem-se por verificada a existência de uma atitude pessoal do arguido-recorrente que não cuidou em inteirar-se da licitude da detenção da munição, revelando um comportamento de indiferença relativamente à detenção de um artefacto que, encontrando-se em bom estado de conservação e, em princípio, em condições de ser utilizado, se revela perigoso para qualquer pessoa. V - O recorrente revelou face aos factos provados uma atitude displicente, juridicamente desvaliosa que impediu a consciência ética de decidir correctamente a questão do desvalor jurídico do facto, pelo que, terá forçosamente de se concluir pela censurabilidade da falta de consciência do ilícito, improcedendo a pretensão do recorrente quanto à absolvição relativamente ao crime de detenção de arma proibida/munição, sendo justa e adequada a pena de multa que lhe foi aplicada no acórdão recorrido. VI - É improcedente o recurso interposto, na parte concernente ao perdimento dos bens a favor do Estado, se o tribunal a quo declarou perdidas a favor do Estado a substância estupefaciente apreendida, e objectos que a acondicionavam, e face ao património do arguido, entendeu-se não ser proporcional ao mesmo a aquisição lícita dos bens elencados no n.º 90 dos factos provados atendendo quer ao seu valor, quer ao seu número e o recorrente contestou os fundamentos em que o Tribunal assentou essa presunção, mas não impugnou, como era seu direito, a matéria de facto dada como provada, e mormente a que respeitava ao mencionado ponto n.º 90, o que não pode por conseguinte deixar de significar que não pretendeu, de todo, sindicar a matéria em causa. VII - O problema suscitado no recurso de saber se foi ou não ilidida a aludida presunção densificada no n.º 1 do art. 7.º da Lei 5/2002, configura uma questão apenas conexa com a matéria de facto, que extravasa, nesta sede, o âmbito dos poderes de cognição do STJ. VIII - Resultando da factualidade provada que durante um período de quase 3 anos e até ser detido, o recorrente dedicou-se de forma ininterrupta e exclusiva à venda de heroína e cocaína em contacto directo a inúmeros toxicodependentes da Ilha Terceira, em pequenas quantidades, sucedendo que, em ocasiões em que fornecia droga, o mesmo aproveitava também para satisfazer o vício, pois que também era consumidor; assumindo a ilicitude uma limitada gravidade; sendo o grau da culpa revelada pelo arguido atenuado pela sua própria situação de toxicodependência enquanto se dedicou à actividade de tráfico, e reduzidas as necessidades de prevenção especial (há cerca de 3 anos que deixou de consumir estupefacientes e afastou-se do convívio em locais e com pessoas conotadas com o consumo e tráfico de drogas e mantém no momento presente uma estável inserção familiar e actividade laboral), consideramos justa e adequada a condenação na pena de 5 anos de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, assim se reduzindo a pena de 6 anos de prisão que lhe foi aplicada no acórdão recorrido, procedendo, nesta parte, o recurso interposto. IX - Ao abrigo do disposto nos arts. 50.º e 53.º, do CP, por se considerar que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidade da punição, se o arguido-recorrente não tem antecedentes criminais e na sequência do processo iniciou tratamento adequado para problemática aditiva, sem registo de recaídas, demonstrando possuir capacidades de autocritica, dispondo de uma situação familiar equilibrada e estável, exercendo igualmente actividade profissional, suspende-se a execução da pena de prisão pelo período de 5 anos, ficando o arguido sujeito a regime de prova, em cumprimento de plano de reinserção social a elaborar um plano de reinserção social a elaborar pelos competentes Serviços de Reinserção Social com especial atenção ao passado aditivo do arguido. | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
I - RELATÓRIO
1. Nos autos de processo comum e perante o Tribunal Colectivo, n.º 23/10.1PEAGH.L1.S1 do (extinto) 2.º Juízo do Tribunal Judicial de ---, actual Instância Central, 2.ª Secção Cível e Criminal – J1, da Comarca dos ---, AA, ali identificado, foi submetido a julgamento e condenado, por acórdão proferido em 2 de Junho de 2014: a) Pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo 21, n.º 1, do Decreto-lei n.º 15/93, de 22/01I, na pena de 6 (seis) anos de prisão; b) Pela prática, em autoria material, de crime de detenção de arma proibida de munição, p. e p. pelos artigos 86°, n.º 1, alínea d), e 3°, n.º 4, a) , da Lei n.º 5/2006, de 23/02, na pena de 40 (quarenta) dias de multa, à taxa diária de 5,00 € (cinco euros); Foi ainda determinada: - a perda da substância estupefaciente apreendida, e objectos que a acondicionavam, em benefício do Estado Português, e ordenar a sua destruição após trânsito em julgado; - a perda do fio em ouro, com 48 centímetros; o telemóvel Nokia 5130 c¬2, o telemóvel Motorola W220; o telemóvel G7002; o telemóvel Nokia X2-00; o telemóvel Nokia 6100; o dinheiro; a máquina fotográfica Sony DSC-W210; o trie da máquina fotográfica; o relógio Nike; o relógio RipCurl; o computador portátil Samsung; o disco externo/interno; o telemóvel Samsung GT-E2550, o telemóvel Samsung Duo, que se encontravam na posse do arguido.
2. Inconformado, interpôs o arguido recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes:
«CONCLUSÕES 1. A pena de prisão aplicada ao recorrente pelo crime de tráfico de estupefacientes é excessiva, desadequada e desproporcional, não cumprindo os fins das penas. 2. Uma pena de prisão que próxima do limite mínimo previsto para tal crime seria suficiente para atingir as finalidades da punição, não devendo ultrapassar os 5 anos. 3. A pena de prisão a aplicar ao recorrente, não superior a 5 anos, deve ser suspensa na sua execução, ainda que sujeita a imposição de deveres, regras de conduta ou regime de prova, conforme seja entendido mais conveniente à prossecução das finalidades da punição. 4. A falta de consciência da ilicitude por parte do recorrente relativamente ao crime de detenção de arma proibida, pela munição que este detinha, não lhe é censurável, devendo por isso este ser absolvido desse crime. 5. Os objectos e dinheiro apreendidos ao recorrente não são de presumir como provenientes de lucros obtidos com tráfico de estupefacientes, pelo que não devem ser declarados perdidos a favor do Estado. 6. O M.P. não promoveu na acusação, ou até ao 30.º dia anterior à data designada para a primeira audiência de julgamento, a perda dos bens a favor do Estado, bem como a liquidação do valor que deve ser considerado como tal, pelo que tal perda não pode ser decretada. Termos em que deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente e, em consequência: a) Revogar-se a pena de prisão de 6 anos em que o recorrente foi condenado e substituir-se esta por pena de prisão não superior a 5 anos; b) Apreciar-se e aplicar-se a suspensão da execução da pena de prisão que venha a ser aplicada ao recorrente, em resultado do referido na alínea anterior, sujeita ou não ou não a imposição de deveres, regras de conduta ou regime de prova; c) Revogar-se a condenação do recorrente pelo crime de detenção de arma proibida, por a falta de consciência da ilicitude não ser censurável; d) Revogar-se a determinação de perda dos bens do recorrente a favor do Estado.»
3. O Ministério Público na 1.ª instância respondeu ao recurso interposto, dizendo: «(…). Pelas razões que adiante serão aduzidas, antecipamos que, a nosso ver, o recurso não merece provimento. II A prova por declarações produzida na audiência foi registada em suportes magnetofónicos. Lido o texto do douto acórdão recorrido e analisado segundo as regras da lógica e da experiência comum, não vislumbramos que ele padeça de qualquer vício de conhecimento oficioso, designadamente dos consignados no art. 410.º, n.º2, do Cód. Proc. Penal (doravante, CPP), ou que enferme de nulidade insanável. O recorrente não impugnou o julgamento sobre a matéria de facto. Donde, deverá considerar-se assente a factualidade havida por provada no acórdão recorrido. Versando exclusivamente sobre matéria de direito, constata-se que no recurso foi omitida indicação das normas legais que entenda terem sido violadas no acórdão recorrido, do sentido com que foram interpretadas e aplicadas e do sentido e alcance em que o deviam ter sido; Assim incumprindo os ónus legais prescritos no art. 412.º, n.º2, als. a) e b), do CPP. Tal omissão verifica-se nas conclusões e bem assim na fundamentação do recurso. De sorte que não é possível descortinar as concretas razões que suportam as pretensões do arguido. A apontada deficiência é insuprível, posto que o adequado aperfeiçoamento do recurso necessariamente importaria inadmissível ampliação do respectivo objecto. Assim, o recurso é manifestamente improcedente e como tal deve ser julgado em decisão sumária. No caso de entendimento diverso, louvando-nos na sucinta mas certeira motivação jurídica do acórdão recorrido, deve julgar-se totalmente improcedente o recurso. De facto, o acórdão recorrido analisou e solucionou correctamente todas as questões trazidas à instância recursiva. Os graus de ilicitude e de culpa das condutas do arguido têm relação directa com o prolongado período de tempo que persistiu na actividade de tráfico de estupefacientes (cerca de 3 anos) e no significativo número de consumidores por ele abastecidos - vinte e três identificados e os mais que não foi possível identificar, como consta dos factos provados n.ºs 3 e 78 e ordinariamente se verifica em tal "ramo de actividade". O grau de ilicitude dos factos respeita ainda à nocividade das substâncias traficadas - heroína e cocaína - para a saúde pública, sendo das que maior potencial danoso têm sobre aquele bem jurídico, especialmente tutelado com a incriminação. A frequência do crime em causa nos autos na sociedade portuguesa e a sua também frequente repetição por agentes antes condenados, certamente atraídos pelo lucro fácil e ainda pela possibilidade de custeio dos próprios consumos de substâncias estupefacientes e a já referida danosidade sociaI de tais condutas traduzem as prementes necessidades de prevenção geral; A satisfazer eficazmente pelo efeito dissuasor da punição. A pena de prisão aplicada é inteiramente justificada pelas ditas necessidades de prevenção geral, de defesa do ordenamento jurídico, que não podem ser postergadas por razões de prevenção especial e a medida daquela pena não ultrapassa o grau, a barreira, da culpa. A pena de prisão e a sua necessária efectividade, para satisfação das exigências preventivas da punição, estão perfeitamente justificadas no acórdão recorrido. A censurabilidade da provada falta de consciência da ilicitude da detenção de munições está correctamente justificada no acórdão. Acrescentamos ser difícil, quase impossível, entendimento diverso, posto ser consabido que são objectos ou mercadorias de venda, posse e circulação condicionados administrativamente, que não são vendidas em estabelecimentos de comércio de bens de utilidade comum, designadamente em mercearias, drogarias ou supermercados, mas só em estabelecimentos para tanto especificamente autorizados. Os objectos declarados perdidos a favor do Estado são produto do crime de tráfico cometido pelo arguido, como se houve por provado nos pontos n.os 90 a 92 da fundamentação de facto, em lógica coerência com o que antes se houve por provado sobre a situação e fluxos patrimoniais do arguido no período em que desenvolveu a actividade de tráfico de estupefacientes sujeita a julgamento. Toda a factualidade a respeito provada é proveniente da narração fáctica da acusação. A acusação fez precisa caracterização da situação patrimonial do arguido, por forma a evidenciar o património incongruente com os seus rendimentos lícitos. A finalidade descritiva de tais factos, alheia à tipicidade penal é, obviamente, a declaração de perdimento do património adquirido sem suporte em rendimentos lícitos. Tanto basta para inscrever a questão no objecto do julgamento e, provados os factos, juridicamente suportar a decisão de perdimento. Inexiste exigência legal de liquidação autónoma do património incongruente bem como de expressa promoção pelo Ministério Público de decisão de perdimento daquele a favor do Estado. O acórdão recorrido não incorreu em excesso de pronúncia.
III Por tudo o exposto, deve ser integralmente confirmado o douto acórdão recorrido, que declarou correctamente o direito do caso, e julgar-se o recurso totalmente improcedente.»
4. Neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer, que se transcreve:
«1 – Recorrente: O arguido AA, com os demais sinais dos autos. 1.1 – Recurso interposto: do Acórdão final do Tribunal Colectivo do (extinto) 2.º Juízo do Tribunal Judicial de ... [actual Instância Central, ... Secção Cível e Criminal – J1, da Comarca dos ...], datado de 2-06-2014 e exarado a fls. 769 e segs., que, como decorre do respectivo dispositivo, condenou o arguido, ora recorrente, nos termos seguintes: a) Pela prática de um crime de “tráfico de estupefacientes”, da previsão do art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos de prisão; b) Pela prática de um crime de “detenção de munição de arma de fogo”, da previsão dos arts. 86.º, n.º 1/d), 3.º e 4.º/a) da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 40 dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros); c) Determinou a perda, e oportuna destruição, da substância estupefaciente apreendida e objectos que a acondicionavam; d) Decretou a perda a favor do Estado dos bens indicados no ponto 90., por reporte aos pontos 79 e 80, todos da decisão de facto proferida, a saber: «o fio de ouro, com 48 centímetros; o telemóvel Nokia 5130 c-2; o telemóvel Motorola W220; o telemóvel G7002; o telemóvel Nokia X2-00; o telemóvel Nokia 6100; o dinheiro [duas notas de 20 euros, oito notas de 10 euros e três notas de cinco euros]; a máquina fotográfica Sony DSC-W210; o tripé da máquina fotográfica; o relógio Nike; o relógio RipCurl; o computador portátil Samsung; o disco externo/interno; o telemóvel Samsung GT-E2550; e o telemóvel Samsung Duo.
2 – Do recurso: Do sobredito veredicto condenatório interpôs o arguido o presente recurso, directo, para o STJ, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do art. 432.º do CPP, limitado efectivamente à pretensão de reexame de matéria de direito, sede em que colocou as seguintes questões: (i) Contesta a condenação pelo crime de detenção de munição de arma de fogo, ponto em que pugna pela sua absolvição, isto com fundamento em que, tal como se deu como assente no ponto 97 da decisão de facto, ignorava que a detenção da munição em causa era proibida e, assim, passível de configurar ilícito criminal, do mesmo passo que discorda do entendimento, firmado na decisão, no sentido da censurabilidade da falta de consciência da ilicitude desse segmento da sua provada conduta; (ii) Questiona a decisão de perdimento a favor do Estado dos objectos e dinheiro que estão identificados na alínea d) do dispositivo – [acima indicados em 1.1/d)] –, alegando para tanto que não há fundamento para presumir que os mesmos eram provenientes de lucros obtidos pelo tráfico de estupefacientes; (iii) Impugna por último a escolha e a medida concreta da pena aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes, pugnando pela sua redução para medida não superior a 5 anos de prisão e subsequente substituição pela suspensão da execução, ainda que sujeita a imposição de deveres, regras de conduta ou regime de prova. 3 – Do mérito do recurso: Emitindo parecer, como nos cumpre, sobre cada uma das questões que o recorrente submete ao reexame deste Supremo Tribunal, cabe dizer o seguinte:
3.1 – Quanto à primeira questão: condenação pelo crime de detenção de munição de arma de fogo: Tal como meridianamente decorre dos pontos 80, 81, 86 e 97, 1.º segmento, da decisão de facto proferida, deu o Tribunal Colectivo como provado que o arguido detinha na sua residência, sita na ---, sendo de sua pertença, uma munição de arma de fogo de calibre 6,35mm, e que conhecia as características da mesma e quis detê-la não obstante não ser titular de licença de uso e porte de arma de qualquer natureza. Mas, como decorre do 2.º segmento do sobredito ponto 97 da mesma decisão de facto, deu também como provado que o arguido não tinha conhecimento de que era proibido deter aquela munição, tendo reconduzido a situação ao art. 17.º do Código Penal [erro sobre a ilicitude]. Ainda que não possa deixar de admitir-se que seja bem ténue, in casu, a fronteira delimitadora dos pressupostos deste tipo de erro, no seu confronto com o erro sobre as circunstâncias do facto, densificado no art. 16.º do mesmo corpo normativo, estamos no entanto em crer, salvo melhor opinião, que o que se nota nesta concreta situação não será a falta de consciência ética do arguido, um embotamento da sua personalidade, o que seria sem dúvida característico da mencionada falta de consciência da ilicitude porque impediria que ele, arguido, na posse dos conhecimentos necessários, valorasse devidamente a situação, mas antes uma falta de informação de elementos que são imprescindíveis para se tomar conhecimento da proibição da conduta, situação que se reconduz ao erro do referido art. 16.º, n.º 1, o que afasta a punição a título de dolo e a punibilidade da conduta por não existir correspondente tipo negligente. Note-se que está em questão a detenção de uma única munição, e que não deixa de ser relativamente recente a tipificação e tutela penal da respectiva conduta. Por isso, e reconhecendo que a questão não deixa de suscitar dúvidas de subsunção jurídico-penal, propenderíamos, no quadro da decisão de facto proferida, no sentido da absolvição do arguido pela prática do mencionado crime de detenção de munição de arma de fogo.
3.2 – Quanto à segunda questão: perda de bens a favor do Estado: Como pode ler-se no Acórdão do STJ de 20-01-2010, proferido no âmbito do Processo n.º 18/06.GAVCT.S1, desta 3.ª Secção, o Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, dispõe de regulamentação própria no que concerne à perda dos instrumenta e producta sceleris, bem como às vantagens e direitos retirados do facto, estabelecendo que as vantagens e os direitos dele decorrentes, bem como os eventuais juros, lucros e outros benefícios obtidos através daqueles, são declarados perdidos a favor do Estado – artigos 35º a 38º. Ora, e revisitando a decisão de facto proferida no aresto recorrido, verifica-se que neste se deu como provado, no seu respectivo ponto n.º 90, que, citamos (com sublinhados nossos), «o fio de ouro, com 48 centímetros; o telemóvel Nokia 5130 c-2; o telemóvel Motorola W220; o telemóvel G7002; o telemóvel Nokia X2-00; o telemóvel Nokia 6100; o dinheiro [duas notas de 20 euros, oito notas de 10 euros e três notas de cinco euros]; a máquina fotográfica Sony DSC-W210; o tripé da máquina fotográfica; o relógio Nike; o relógio RipCurl; o computador portátil Samsung; o disco externo/interno; o telemóvel Samsung GT-E2550; e o telemóvel Samsung Duo, que se encontravam na posse do arguido, era ou foram utilizados e foram obtidos através da actividade de tráfico de droga que desenvolvia». E foram precisamente estes, e apenas estes, os bens objecto da decisão de perdimento ora em equação [vide ponto d) do respectivo dispositivo]. Por outro lado, e tal como igualmente se lê no mencionado acórdão do STJ, o artigo 7º da Lei n.º 5/02, de 11 de Janeiro (alterada pelo lei n.º 19/08, de 21 de Abril), estabelece uma presunção, aplicável, entre outros, aos crimes de tráfico de estupefacientes, segundo a qual se presume constituir vantagem da actividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito, sendo certo que tal presunção tem sido considerada consonante com os princípios e normas constitucionais. No caso em apreço, a simples e singela leitura dos pontos n.º 87 a 91 do acervo factual dado como assente mostra, com meridiana clareza e sem necessidade de qualquer esforço complementar de demonstração, que estão verificados os pressupostos integrantes daquela presunção juris tantum. O recorrente contesta os fundamentos em que o Tribunal assentou essa presunção. Mas a verdade é que não impugnou, como era seu direito, a matéria de facto dada como provada, e mormente a que respeitava ao mencionado ponto n.º 90. O que não pode por conseguinte deixar de significar que não pretendeu, de todo, sindicar a matéria em causa. A ser de outro modo, estar-se-ia então perante uma forma de impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, na modalidade mais restrita, a determinar a competência da Relação, que conhece de facto, nos termos do art. 428.º do CPP, enquanto o Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, só conhece sobre matéria de direito, nos termos do art. 434.º do mesmo código. Convenhamos portanto, dito isto, que o problema de saber se foi ou não ilidida a aludida presunção densificada no n.º 1 do art. 7.º da Lei n.º 5/2002, não pode deixar de configurar questão apenas conexa com a matéria de facto, que extravasa, nesta sede, o âmbito dos poderes de cognição do STJ. Cremos por isso, pelo sumariamente exposto, que a decisão de perda dos bens em causa não pode deixar de ser confirmada, claudicando pois, nesta parte, a pretensão do recorrente.
3.3 – Quanto à terceira questão: Consequências jurídicas/escolha da pena pelo crime de tráfico de estupefacientes: Com base no acervo factual neste ponto dado como assente, decidiu o Tribunal qualificá-lo como integrador do crime de tráfico de estupefacientes, da previsão do art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, se 22 de Janeiro. Decisão que, em nosso juízo, é sem dúvida de secundar, posto que sem no entanto deixar de evidenciar aqui que essa mesma factualidade nem sequer distará muito daquela a que poderia ser aplicada a reacção criminal cominada no art. 25.º, alínea a), do mesmo diploma [tráfico de menor gravidade]. Só assim não poderá sê-lo atendendo ao tempo durante o qual o arguido se dedicou à provada actividade (cerca de 3 anos), tal como à natureza dos produtos traficados (heroína e cocaína), se bem que as quantidades em equação, pelo menos a ajuizar por aquelas que, efectivamente, lhe foram apreendidas, não podem deixar de ter-se por relativamente pequenas. Por outro lado, essa mesma actividade ilícita, ou pelo menos uma parte dela, só não pode também ser abrangida pelo tipo do art. 26.º [traficante – consumidor], uma vez que, desde logo por força do disposto no n.º 3 deste mesmo preceito, sempre aquele referido período de tempo a tal obstaria. Tudo isto para evidenciar pois que estamos perante uma conduta que, não deixando de assumir alguma relevância, tanto mais que empreendida num meio social relativamente confinado, também se não se afasta muito da gravidade da ilicitude mínima pressuposta pelo tipo incriminador – o convocado art. 21.º do DL n.º 15/93. Tendo assim em conta, no quadro do acervo factual provado, essa limitada gravidade da ilicitude, o grau de culpa que a reflecte, o qual é também atenuado pela própria situação de toxicodependência do agente, ao tempo da acção delituosa, e bem assim as, hoje, muito mais reduzidas necessidades de prevenção especial, já que o arguido, tal como igualmente se provou, há cerca de 3 anos que deixou de consumir produtos estupefacientes, afastou-se da frequência e convívio em locais e com pessoas conotadas com o consumo e tráfico de drogas, do mesmo passo que mantém e privilegia, no momento presente, a sua, actual, estável inserção familiar e actividade laboral; tudo atendendo, afigura-se que pena concreta a aplicar pelo sobredito crime não deverá fixar-se em medida que se distancie muito do mínimo da respectiva moldura abstracta, o mesmo é dizer entre os 4 anos e 6 meses e os 5 anos de prisão. Por outro lado, e agora na perspectiva da escolha da pena, estamos também em crer que os factores acima apontados, relativos às necessidades de prevenção, geral e especial, apontam igualmente, em nosso juízo, para a desnecessidade de imposição ao arguido de uma pena de prisão efectiva, tanto mais que este não tem antecedentes criminais, vem mantendo um comportamento e imagem social integrada e, como se deu como provado no ponto 113 da decisão de facto, demonstra possuir agora capacidades de autocrítica, descentração e pensamento consequencial. Impor por isso, numa situação com os apontados contornos, o cumprimento de uma pena efectiva de prisão, como foi a decidida pela 1.ª Instância, para mais com a dimensão escolhida, poderia muito provavelmente contribuir, de forma decisiva, para que todos os progressos de reintegração do arguido até agora alcançados, que em muito foram despoletados pela própria instauração do presente processo, fossem completamente anulados, desiderato que de todo não pode estar contido na filosofia subjacente às finalidades das penas a que se refere o n.º 1 do art. 40.º do Código Penal. Já uma pena a graduar entre os acima propostos 4 anos e 6 meses e os 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo e com regime de prova, tudo nos termos dos arts. 50.º, n.º 1 e 53.º do Código Penal, bem pelo contrário, não deixando de reafirmar a vigência da norma violada, estamos em crer que poderia contribuir decisivamente para sedimentar a alteração do comportamento do arguido, assim prevenindo mais eficazmente o perigo de reincidência. *** 4 – Parecer: Pelo exposto, e sem necessidade de mais desenvolvidos considerandos, é o seguinte o nosso parecer: 4.1 – Na procedência, parcial, do recurso, é de ponderar a revogação do acórdão recorrido, pelos fundamentos sumariamente enunciados em 3.1, no segmento em que condenou o arguido, ora recorrente, pelo sobredito crime de detenção de munição de arma de fogo, substituindo-o por um veredicto absolutório; 4.2 – É de negar provimento ao recurso, confirmando o decidido, aqui pelos fundamentos explicitados em 3.2, na parte em que decretou a perda de bens do arguido; 4.3 – Também na procedência, parcial, do mesmo recurso – agora no que diz respeito à questão relativa à medida e escolha da pena pelo crime de tráfico de estupefacientes –, será de ponderar a redução dessa pena para a medida, acima proposta em 3.3, substituindo-a subsequentemente pela suspensão da execução da prisão, com regime de prova.»
5. Foi dado cumprimento ao disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal (CPP), nada tendo sido dito.
6. Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o recurso é apreciado em conferência, nos termos dos artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.
7. Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir. II - Questão prévia suscitada
O Ex.mo Magistrado do Ministério Público na 1.ª instância suscita, na resposta ao recurso, a questão da omissão nas conclusões do mesmo das menções previstas no artigo 412.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPP, referindo que: «Versando exclusivamente sobre matéria de direito, constata-se que no recurso foi omitida indicação das normas legais que entenda terem sido violadas no acórdão recorrido, do sentido com que foram interpretadas e aplicadas e do sentido e alcance em que o deviam ter sido; Assim incumprindo os ónus legais prescritos no art. 412-º, n.º2, als. a) e b), do CPP. Tal omissão verifica-se nas conclusões e bem assim na fundamentação do recurso. De sorte que não é possível descortinar as concretas razões que suportam as pretensões do arguido. A apontada deficiência é insuprível, posto que o adequado aperfeiçoamento do recurso necessariamente importaria inadmissível ampliação do respectivo objecto. Assim, o recurso é manifestamente improcedente e como tal deve ser julgado em decisão sumária.»
O artigo 412.º, n.º 2, do CPP estabelece que, versando matéria de direito, as conclusões do recurso devem indicar, no que interessa para o caso presente, as normas jurídicas violadas e o sentido em que, no entendimento do recorrente, o tribunal recorrido interpretou cada norma ou com que a aplicou e o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada – alíneas a) e b). O artigo 417.º, n.º 3, do CPP determina, por sua vez, que, se das conclusões do recurso não for possível deduzir total ou parcialmente tais indicações, o relator convida o recorrente a completá-las, no prazo de 10 dias, sob pena de o recurso ser rejeitado ou não ser conhecido na parte afectada. O artigo 420.º do CPP, relativo à rejeição do recurso, estabelece que o recurso é rejeitado, entre outras condições, sempre que o recorrente não apresente, complete ou esclareça as conclusões formuladas e esse vício afectar a totalidade do recurso [n.º 1, alínea c)]. No caso em apreço, o recorrente apresentou conclusões e não foi chamado a completar ou esclarecer essa peça processual. Por outro lado, é admissível, sob pena de irrazoável rigorismo, o aproveitamento da motivação recursória. De facto, muito embora as menções referidas não constem das conclusões, elas figuram expressamente na fundamentação, no final do capítulo dedicado a cada uma das questões objecto do recurso.
Conclui-se, pois, pela não rejeição do recurso, nada obstando ao conhecimento do seu mérito.
III - FUNDAMENTAÇÃO
1. Enquadramento e questões a apreciar
Conforme jurisprudência assente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, relativas aos vícios da decisão quanto à matéria de facto, a que se refere o n.º 2 do artigo 410.º do CPP, e às nulidades, a que alude o n.º 3 do mesmo preceito, é pelo teor das conclusões apresentadas pelo recorrente, onde resume as razões do pedido (artigo 412.º, n.º 1, do CPP), que se define e delimita o objecto do recurso. O recorrente delimita exactamente o objecto do recurso dizendo «discorda[r] da decisão por que foi condenado, tanto no que respeita à concreta pena que lhe foi aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes, como no que se refere à sua condenação pelo crime de detenção de arma proibida, como, finalmente no concernente à decisão de determinar a perda a favor do Estado dos objectos que lhe foram apreendidos». São estas as questões que se irão apreciar, pela ordem seguinte: - A condenação pelo crime de detenção de munição de arma de fogo; - A perda a favor do Estado dos objectos e dinheiro apreendidos; - A escolha e a medida concreta da pena aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes.
2. Matéria de facto
O Tribunal Colectivo deu como assente a seguinte matéria de facto: «Realizada a audiência de julgamento, resultaram provados os seguintes factos: 1. Desde data não concretamente apurada, mas situada, pelo menos, no período que decorre de finais do ano de 2009 até 9 de Outubro de 2012, data em que foi detido em flagrante delito, que o arguido se dedicou de forma ininterrupta e exclusiva à venda de heroína e cocaína a inúmeros toxicodependentes da ..., logrando satisfazer-lhes, a troco de dinheiro, a quantidade de droga que aqueles necessitavam para satisfazer o seu consumo. 2. A distribuição directa do produto estupefaciente era feita pelo arguido em pequenas quantidades, geralmente divididas em pequenos pacotes (vulgo sacos ou panfletos). 3. O arguido, no período em apreço, tinha um leque de clientes toxicodependentes (alguns dos quais se encontram, infra-discriminados), que o procuravam especificamente para a venda e o consumo de estupefacientes, designadamente heroína, pois era o arguido que sabia quando, como e a quem se dirigir para adquirir o estupefaciente que fornecia a esses indivíduos, sendo que ele, também consumidor, aproveitava, por vezes, para satisfazer tal vício. 4. Para tanto, o arguido adquiria previamente a heroína e a cocaína, nomeadamente no Bairro --- ou, ainda, na zona do ---, a indivíduos cuja identidade se desconhece, em doses individuais, normalmente designadas por quartas, meias e gramas, a preços que variavam, consoante o peso e a qualidade, entre os 10 a 20 euros. 5. Para além do contacto directo, o arguido usava também os telemóveis, nomeadamente os apreendidos nos autos, cujo número fornecia aos toxicodependentes, por essa via combinando as quantidades e os locais onde se procederia à venda, deslocando-se, após tais contactos, aos locais previamente combinados. 6. Pelo menos desde Dezembro de 2009 até ao dia 9 de Outubro de 2012, pela forma supra-descrita, o arguido efectuou as seguintes vendas de produto estupefaciente: 7. Durante o período de um mês, não concretamente apurado mas que se situa entre Junho e Agosto de 2010, o arguido procedeu à venda, por cerca de quatro a cinco vezes, de uma quantidade que varia entre um a dois sacos de heroína, a --- pelo preço de 10 euros, cada um. 8. As vendas ocorreram na residência do arguido sita no ---. 9. Em data não concretamente apurada mas que se situa no verão de 2010, o arguido procedeu à venda, de forma quase diária, de uma quantidade que varia entre um a dois panfletos de cocaína, a ---, pelo preço de 10 a 20 euros, cada dose. 10. As vendas ocorriam na zona do --- e nas traseiras dos pavilhões municipais localizados no referido---. 11. No período que se situa entre o fim de 2010 e o fim de 2011, o arguido procedeu à venda, a BB, de uma quantidade que varia entre um a dois panfletos de heroína, ao preço de 10 a 20 euros, cada dose. As vendas realizaram-se duas a três vezes por mês. 12. Ocorriam no ---. 13. Regra geral, BB entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos com vista à aquisição da produto estupefaciente; já na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de BB e com ele consumia o estupefaciente. 14. Por duas ou três vezes, BB contactou previamente o arguido, por telemóvel, e quando chegou junto do arguido este entregou-lhe o produto estupefaciente negociado, tendo recebido como contrapartida, o dinheiro correspondente. 15. Durante três a quatro meses, em período que não é possível de determinar em concreto, mas que se situa durante o Verão de 2010, o arguido procedeu à venda de uma quantidade que varia entre um a dois panfletos de heroína, a CC, pelo preço de 10 a 20 euros, cada dose. 16. Fê-lo cerca de duas a três vezes por mês. 17. As vendas ocorriam no Largo .... 18. Regra geral, CC entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos com vista à aquisição da produto estupefaciente; já na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de CC e com ele consumia o produto estupefaciente. 19. Por vezes, CC, depois de receber o produto estupefaciente entregue pelo arguido, afastava-se dele e consumia sozinho a sua totalidade. 20. Durante cerca de ano e meio, no período compreendido entre os anos de 2010 e 2011, o arguido vendeu, a DD, uma quantidade que varia entre um a dois panfletos de heroína, pelo preço de 20 euros, cada dose. 21. As vendas eram realizadas três vezes por semana. 22. As vendas ocorriam no Largo .... 23. Regra geral, DD entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos com vista à aquisição da produto estupefaciente; já na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de DD e com ele consumia o produto estupefaciente. 24. Por vezes, quando DD o procurava, o arguido tinha o produto estupefaciente consigo, que logo entregava a DD e consumiam juntos. 25. Durante cerca de três meses, em período que não é possível de determinar concretamente mas que se situa 2010 e 2011, o arguido vendeu, em número não concretamente apurado de vezes, a EE, uma quantidade que varia entre duas a três panfletos de heroína, a preços de 10 e de 20 euros, cada dose. 26. As vendas realizaram-se uma a duas vezes por semana. 27. As vendas ocorriam na ..., em .... 28. Por vezes, EE entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos com vista à aquisição da produto estupefaciente; já na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de EE e com ele consumia o produto estupefaciente. 29. Outras vezes, EE, após receber o produto estupefaciente que lhe era entregue pelo arguido, levava-o consigo e consumia sozinho a sua totalidade. 30. Durante cerca de seis meses, em período que não é possível de determinar em concreto, mas que se situa entre 2010 até Janeiro de 2011, o arguido vendeu heroína a FF, num número não concretamente apurado de vezes, pelos preços de 10 e 20 euros a dose. 31. As vendas realizavam-se duas a três vezes por semana. 32. Por vezes, FF entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos com vista à aquisição da produto estupefaciente; já, na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de FF e com ele consumia o produto estupefaciente. 33. Outras vezes, FF, após receber o produto estupefaciente que lhe era entregue pelo arguido, levava-o consigo e consumia sozinho a sua totalidade. 34. Por uma ou duas vezes, quando procurou o arguido, este já tinha o produto estupefaciente consigo, não tendo sido necessário ao arguido deslocar-se a qualquer outro local para o ir buscar. 35. Durante cerca de um ano, em data que não é possível de determinar concretamente mas que se situa entre 2010 e 2011, o arguido vendeu heroína a GG, num número de vezes que não se determinaram ao certo, pelo preço de 10 e 20 euros, cada dose. 36. Por vezes, o arguido dividia uma dose de heroína com GG, pelo preço de 5 euros e, outras vezes, juntava dinheiro seu ao dinheiro que lhe era entregue por GG e, ambos, deslocavam-se em conjunto à ... ou ao Largo ..., onde o arguido se ia abastecer de heroína a indivíduos não identificados. 37. Na posse do produto estupefaciente, o arguido consumia o mesmo juntamente com GG. 38. Fê-lo duas a três vezes por semana. 39. No período que decorreu de 2010 a 2012, em diversos locais de ..., entre os quais a Praça Velha, num número de vezes não concretamente apurada, cerca de duas a três vezes por semana, o arguido vendeu heroína a HH, pelo valor de 10 euros, a dose e, algumas das vezes, por 5 euros ou, ainda menos, consoante o dinheiro que este consumidor tivesse. 40. O HH ia com o arguido, a quem entregava o dinheiro, adquirir a droga e, depois, consumia-a conjuntamente com este. 41. Durante o mês de Agosto de 2010, o arguido cedeu heroína a II e consumiu heroína juntamente com a mesma na residência desta, situada na Travessa .... 42. Por vezes, esta consumidora entregava ao arguido, como forma de pagamento, artigos pessoais, como maquilhagem, em troca de estupefaciente. 43. Durante cerca de três meses, em período que não é possível de determinar em concreto, mas entre Outubro de 2009 e Fevereiro de 2010, o arguido procedeu à venda de heroína a JJ, pelo valor de 10 euros a dose. 44. Fê-lo cerca de seis a sete vezes. 45. As vendas ocorriam em locais não concretamente apurados mas que se situam por ..., designadamente junto à Praça de Touros. 46. No período que se situa entre 2010 a 2012, o arguido vendeu heroína a LL, uma quantidade que varia entre 1 a 2 panfletos de heroína, ao preço de 10 euros, cada dose. 47. Fê-lo uma a duas vezes por semana. 48. LL recebia o produto estupefaciente do arguido, a quem entregava o dinheiro correspondente, e não consumia juntamente com ele. 49. No período que se situa entre Janeiro a Novembro de 2011, inclusive, o arguido vendeu heroína a MM. 50. As vendas realizaram-se duas a três vezes por mês, tendo MM adquirido doses globais, de cada vez, no valor de 20 a 40 euros. 51. Por vezes, MM entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos, com vista à aquisição da produto estupefaciente; já na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de MM e com ele consumia o produto estupefaciente. 52. Outras vezes, MM, após receber o produto estupefaciente que lhe era entregue pelo arguido, levava-o consigo e consumia sozinho a sua totalidade. 53. Outras vezes, ainda, quando procurou o arguido, este já tinha o produto estupefaciente consigo, não tendo sido necessário ao arguido deslocar-se a qualquer outro local para lho entregar. 54. Durante cerca de quatro meses, em período não concretamente apurado que se situa no ano de 2011, o arguido vendeu heroína a Luís NN, ao preço de 10 euros, cada dose. 55. Fê-lo uma vez por semana, em quantidades correspondentes a 10 e a 20 euros. 56. Por vezes, o arguido consumia o estupefaciente com OO, o que só não sucedeu por duas vezes. 57. Durante cerca de onze meses no ano de 2011, o arguido vendeu heroína a PP, pelo valor de 25 a 30 euros, cerca de 3 a 4 vezes por semana. 58. Nessas ocasiões, o arguido e PP frequentavam as casas de cada um, para fumarem a droga adquirida pelo arguido a indivíduos não identificados. 59. No período que se situa entre Janeiro de 2010 a Novembro de 2011, o arguido vendeu heroína a QQ, por três ou quatro vezes, ao preço de 10 euros cada dose. 60. Em nenhuma dessas vezes QQ consumiu o produto adquirido com o arguido. 61. No período que se situa em finais do ano de 2010 até Novembro de 2011, o arguido, durante um período de quinze dias a um mês, vendeu heroína a RR, ao preço de 10 euros cada panfleto. 62. As vendas realizaram-se duas ou três vezes, tendo RR adquirido produto estupefaciente equivalente a 10 euros de cada vez. 63. Carlos Azevedo entregava ao arguido o dinheiro necessário para a aquisição da droga pretendida, que este recebia; após, dirigia-se aos locais supra-referidos com vista à aquisição da produto estupefaciente; já na posse do produto estupefaciente, o arguido voltava para junto de RR e, por vezes, com ele consumia o produto estupefaciente. 64. Numa das ocasiões, como este toxicodependente tinha apenas consigo 8 euros para comprar a sua dose, o arguido exigiu que lhe entregasse a sua carta de condução, para servir como "caução" do remanescente em falta, no valor de 2 euros, o que aquele fez. Tal carta veio a ser apreendida ao arguido. 65. Em período que não é possível de determinar, mas que se situa entre finais do ano de 2010 e inícios de Janeiro de 2012, quase diariamente, o arguido vendeu heroína a SS, pelo preço entre 10 e 15 euros, cada dose. 66. Normalmente, este consumidor dava boleia ao arguido até ao Bairro ..., nesta comarca, para que o arguido pudesse ir comprar droga para lhe vender; quando ali chegavam, SS estacionava na rua traseira ao Império do Bairro ... e o arguido dirigia-se ao Império para adquirir a heroína pretendida a indivíduo não identificado. 67. Por vezes consumiam o produto estupefaciente em conjunto; quando não o faziam, procediam à sua divisão e cada um levava a sua parte. 68. Em período que não é possível de determinar mas que se situa no verão de 2011, o arguido vendeu heroína a TT, por duas a três vezes, pelo preço de 10 euros cada dose. 69. Algumas das transacções ocorreram no Largo de S. Bento. 70. Durante cerca de um ano, em período que não é possível de determinar mas que se situa entre 2011 a 2012, o arguido vendeu heroína a UU por um número não concretamente apurado de vezes, pelo preço entre 10 e 20 euros, cada dose. 71. Fê-lo duas a três vezes por semana. 72. O arguido dirigia-se ao ... para adquirir a heroína que aquele precisava. 73. Umas vezes, UU consumia com o arguido, o produto assim adquirido; outras vezes, levava-o consigo e consumia sozinho. 74. Durante cerca de um mês, em período que não é possível de determinar mas que se situa entre Dezembro de 2011 a meados do mês de Janeiro de 2012, o arguido vendeu heroína a VV, por um número não concretamente apurado de vezes, pelo preço entre 10 e 20 euros, cada dose. 75. Aquelas vendas realizaram-se duas a três vezes, na primeira semana, e diariamente, nas semanas seguintes. 76. Nestas ocasiões, o arguido dirigia-se ao Bairro Social ... para adquirir a heroína que aquele precisava, depois a droga era consumida por ambos, ajudando o arguido na preparação do caldo, pois João Santos não o sabia preparar. 77. Em datas não concretamente apuradas do mês de Maio de 2012, o arguido vendeu duas doses de heroína, pelo valor de 10 euros, cada dose, a XX. 78. Em Setembro de 2012, o arguido encontrou-se diariamente com diversos toxicodependentes na esplanada do bar "Aliança", localizado na Praça Velha, nesta comarca, para lhes vender estupefaciente, designadamente heroína, actividade esta que foi confirmada pelas autoridades policiais, mediante vigilâncias permanentes referentes à movimentação deste arguido e de outras pessoas, adquirentes de produtos de natureza estupefaciente. 79. No dia 13 de Abril de 2011, pelas 8:30 horas, na sequência da busca domiciliária efectuada à casa do arguido, situada na ..., nesta comarca, foram-lhe apreendidos os seguintes objectos: • um panfleto de heroína revestido em papel prata e acondicionado dentro de um maço de tabaco, que acusou o peso líquido de 0,084 gramas; • um fio em ouro, com 48 cm de cumprimento, que o arguido levava ao pescoço, avaliado em 510 euros; • telemóvel "Nokia", 5130c-2, preto, com o IMEI n.º 00000000, avaliado em 35 euros; • telemóvel "Motorola" W220, preto, com o IMEI n.º 000000000, avaliado em 15 euros; • telemóvel TMN G7002, preto, com o IMEI n° 000000000, avaliado em 15 euros; • telemóvel NOKIA X2-00, cinza, com o n° de série 0000000000, avaliado em 50 euros e comprado pelo arguido no dia 27 de Janeiro de 2011, pelo preço de 99 euros (cfr. recibo de fls 132); • telemóvel NOKIA 6100, azul escuro, com o n.º de série 00000000, avaliado em 15 euros; • duas notas de vinte euros; • oito notas de dez euros; • três notas de cinco euros; • máquina fotográfica digital Sony DSC- W21O, cinza, com o n.º de série 000000, avaliada em 110 euros; • tripé de máquina fotográfica, de cor laranja, avaliado em 150 euros; • relógio NIKE VD57-5050, com o n.º de série ON 1019, avaliado em 30 euros; • óculos de sol SPEEDO, castanhos, avaliado em 10 euros; • relógio SWATCH IRONY, de cor prata avaliado em 20 euros; • relógio RIPCURL A2045-MGNET, cinza escuro avaliado em 70 euros; • computador portátil ACER CL 32, preto, com o n.º de série 000000000 avaliado em 60 euros; • um cordão em prata, com 67 cm de cumprimento, encontrado na sala de estar, dentro de um "bibelot", avaliado em 43 euros; • um fio em prata, com 71 cm de cumprimento, encontrado na sala de estar, dentro de um "bibelot", avaliado em 13 euros; • dois pingentes em prata, em forma de coroa do Espírito Santo, encontrado na sala de estar, dentro de um "bibelot", avaliados em 8 euros; • 1 anel em prata, com mesa de cor preta, circundado com brilhantes, encontrado na sala de estar, dentro de um "bibelot", avaliado em 25 euros; 80. No dia 19 de Janeiro de 2012, pelas 09:40 horas, na sequência da busca domiciliária à casa do arguido, sita na ..., nesta comarca, foram-lhe apreendidos os seguintes objectos: • Leitor de DVD LG GP08NU6B, com o n.º de série 011 ZCYQ040066, avaliado em 28 euros; • Computador portátil SAMSUNG, NP-RV510-A03PT, com o n.º de série ZZNC93KB500054Z E, avaliado em 300 euros; • Disco externo/interno IG, HDD HXD5 500 GB, com o n.º de série 101NMEQH40092, avaliado em 90 euros; • Disco flash/pen drive KINGSTON DATA TRAVEL 4GB, avaliado em 5 euros; • Telemóvel SAMSUNG GT-E 2550, com o na de série 00000000, avaliado em 48 euros e 81. Tal munição, em bom estado de conservação, tem as seguintes características: - mede 2,3 cm x 0,7 cm; - o projéctil é de chumbo, ogival; -o invólucro ou estojo, em latão cilíndrico, com o cumprimento de 1,5 cm x 0,7 cm; -a munição é de percussão central, com a base de sem i-aro, tendo a espoleta ou escorva no centro, ostentando a inscrição "25AUTO P" 82. No dia 09 de Outubro de 2012, cerca das 12h00, quando se encontrava na esplanada bar "...", situada na Praça Velha, área desta comarca, o arguido escondeu na boca um panfleto de heroína no intuito de o vender a YY, que, momentos antes, lhe havia entregue para pagamento da aludida heroína, uma nota de 10 euros. 83. Quando se preparava para o entregar a YY, o arguido foi interceptado por elementos das forças policiais que o detiveram. 84. O panfleto continha o peso líquido de 0,165 gramas de heroína. 85. Na referida ocasião, o arguido tinha ainda consigo a quantia de 43 euros (uma nota de vinte, duas de dez e três euros), sendo tal quantia proveniente da venda de produto estupefaciente que tinha efectuado até àquela altura e, ainda, possuía um telemóvel NOKlA com o n.º de série 0000000, com o cartão n.º .... 86. Aquela munição pertencia ao arguido, o qual não era, nessas circunstâncias, titular de licença para uso ou porte de arma de qualquer natureza. 87. O arguido, no espaço temporal em que foi alvo de investigação, nunca exerceu qualquer actividade licita remunerada, nem auferiu, no período em apreço (2010 a 2012), qualquer prestação social, designadamente do Centro de Prestações Pecuniárias de Angra do Heroísmo, sendo a comercialização de estupefacientes o seu meio de subsistência e meio de fazer face às suas despesas diárias, para além vencimento da esposa. 88. ZZ, esposa do arguido, auferiu no ano de 2011, a remuneração líquida mensal de cerca de 650,00 €. 89. O arguido e a sua esposa viveram em casas arrendadas, pagando entre 250 e 350 euros de renda. 90. O fio em ouro, com 48 centímetros; o telemóvel Nokia 5130 c-2, o telemóvel Motorola W220; o telemóvel 000000; o telemóvel Nokia X2-00; o telemóvel Nokia 6100; o dinheiro; a máquina fotográfica Sony OSC- W21 O; o trie da máquina fotográfica; o relógio Nike; o relógio RipCurl; o computador portátil Samsung; o disco externo/interno; o telemóvel Samsung OT -00000, o telemóvel Samsung Duo, que se encontravam na posse do arguido, eram ou forma utilizados e foram obtidos através da actividade de tráfico de droga que desenvolvia. 91. O arguido não tinha trabalho e fontes de rendimento regulares, vivendo essencialmente dos lucros que retirava da diferença entre o preço de compra da heroína e cocaína e o maior preço que obtinha na sua venda a retalho. 92. Lucros como aqueles que lhe foram encontrados no dia 09 de Fevereiro de 2011, pelas 11:00 horas, no Arruamento B, no Bairro ..., nesta comarca, verificando-se no decurso de uma operação policial, que o arguido detinha a quantia de 135 euros, distribuídas em cinco notas de vinte euros, três notas de dez euros e uma nota de cinco euros. 93. Entre 2011 e Janeiro de 2012, o arguido adquiriu uma mota de cor vermelha, de marca Honda, com a matrícula ...-ZG, avaliada em quantia nunca inferior de 1 5OO euros. 94. O arguido quis deter, ceder e vender as substâncias estupefacientes acima mencionadas a terceiros consumidores, com o intuito de obter para si compensações pecuniárias, resultado que logrou alcançar. 95. O arguido conhecia a natureza e a característica estupefaciente daqueles produtos que detinha e comercializava, estando perfeitamente consciente que a sua aquisição, detenção, cedência elou venda, sem as necessárias autorizações, como era o caso, são proibidas e punidas por lei penal; ainda assim, agiu da forma descrita' 96. O arguido agiu com consciência de que a sua conduta é proibida e punida por lei. 97. O arguido conhecia as características da referida munição; ainda assim, quis detê-la sem qualquer justificação para tal, ignorando que a detenção de tal objecto é proibida e que configura ilícito criminal. 98. O arguido não regista condenações anteriores pela prática de crimes. 99. O arguido nasceu em 1976 em ..., num agregado de nível sócio-económico baixo, considerando ter vivenciando uma infância equilibrada, sem referenciar uma história familiar de vitimação, tendo sempre os seus progenitores assegurado de forma adequada as suas necessidade básicas, quer materiais quer afectivas e educativas. 100. Efectivou o seu percurso escolar entre os seis e os dezasseis anos de idade, tendo abandonado a escola após um percurso regular até ao 3.º ciclo, contexto em que após reprovar o 8° ano decide terminar os estudos e ingressar no mundo do trabalho. 101. AA começou por trabalhar como empregado de mesa num restaurante local, situação que manteve durante cerca de 2 anos e que deixou por decisão própria para se dedicar à actividade de servente de pedreiro por na altura ser melhor remunerada. Nesta área trabalhou durante vários anos de forma regular, ainda que para diversas entidades e em situações legalizadas por vínculo laboral, ou por conta própria, sobretudo a partir de 2006, tendo-se colectado para o efeito. A partir de 2010 o arguido revela maiores dificuldades em manter actividade laboral regular, indissociável da sua problemática aditiva, donde emergem progressivas dificuldades também económicas. 102. Após cerca de 4 anos de namoro, AA contraiu, há cerca de 12 anos, relação conjugal, que mantem desde então e que descreve como estável e emocionalmente gratificante. 103. Manteve o consumo de estupefacientes durante cerca de 3 anos, tendo na sequência do presente processo iniciado tratamento adequado não registando desde Outubro de 2012 qualquer recaída. 104. Tal como à data dos factos, AA coabita com a conjugue, funcionária efectiva do Hospital ..., dispondo de uma situação familiar equilibrada, estável e valorizada pelo próprio. 105. O casal não tem filhos. 106. Residem em habitação arrendada numa freguesia limítrofe da cidade de ... considerando dispor de adequadas condições de habitabilidade. 107. Sem ocupação laboral regular há alguns anos e inscrito na Agência para a Qualificação, Formação e Emprego, o arguido foi integrado no programa RECUPERAR encontrando-se desde há cerca de 2 meses a trabalhar na Câmara Municipal de .... 108. AA aufere no presente cerca de € 453,00 líquidos e a esposa cerca de € 800,00, vindo o arguido ainda a realizar alguns trabalho de jardinagem por conta própria, nomeadamente ao fim-de-semana, auferindo cerca de € 30,00 ao dia. 109. Como principal despesa fixa mensal conta com a renda da habitação, no valor de € 320,00, sendo a situação económica do agregado precária ainda por força das dívidas do arguido à segurança social e finanças por não pagamento das respectivas contribuições aquando do exercício de actividade por conta própria. 110. No presente ocupa a maioria do seu tempo no exercício de actividade profissional e junto da família, não tendo retomado, pelo menos de forma regular, as actividades desportivas a que se dedicou durante a infância, o atletismo. 111. Desde 2012 que se afastou da frequência e convívio em locais conotados com o consumo e tráfico de drogas, indiciando socialmente um maior recato da sua conduta, o que contribuiu para a melhoria da sua imagem social, em tempos associada ao consumo e tráfico de estupefacientes. 112. Mantém-se em tratamento para a problemática aditiva, sem registo de recaídas. 113. AA demonstra possuir capacidades de autocritica, descentração e pensamento consequencial. 114. Pese embora o receio de eventual reclusão e do mal-estar pessoal e familiar inerente à sua situação jurídico-penal, AA optou por salientar o impacto positivo decorrente do facto de ter sido constituído arguido no presente processo, considerando que tal foi determinante do seu afastamento de contextos problemáticos, da sujeição a tratamento e abandono do consumo de estupefacientes e da manutenção da sua relação conjugal. 115. Pese embora a postura crítica da família, nomeadamente da esposa, o arguido sente o apoio desta e não verbalizou particulares sentimentos de rejeição ou hostilidade social.
Factos Não Provados Realizada a audiência de julgamento, não se provaram os seguintes factos: A. O arguido se dedicou à venda de heroína e cocaína também a troco de objectos que tivessem valor monetário. B. A distribuição directa do produto estupefaciente era feita pelo arguido em pequenas quantidades, geralmente divididas em pequenos pacotes visando iludir uma eventual acção policial. C. O arguido adquiria previamente a heroína e a cocaína, após o que a dividia em doses individuais. D. O arguido procedeu à venda, de forma diária, a AAA, até três sacos de heroína. E. Em data não concretamente apurada mas que se situa no verão de 2010, arguido procedeu à venda, de forma diária, de uma quantidade que varia entre 2 a 3 panfletos de heroína, a ... e a ... ("Fantomas"), pelo preço de 10 euros, cada dose. As vendas ocorriam na residência do arguido sita no ... e, posteriormente, no ..., freguesia para onde o arguido, entretanto, passou a residir. F. No período que se situa entre o verão de 2010 até Agosto de 2011, o arguido procedeu diariamente à venda de heroína a BB, G. Por duas a três vezes, o arguido pediu a este consumidor que lhe fosse vender peças de ouro, tais como, alianças, cordões, crucifixos, provenientes das suas transacções de droga, nos estabelecimentos de compra de ouro, como o "Cashfácil",recebendo o dinheiro resultante da venda. H. O arguido procedeu à venda, de forma diária, de heroína a CC. I. O arguido vendeu a DD, de forma diária, de heroína. J. O arguido vendeu heroína a FF também a 17 euros a dose. L. O arguido vendeu heroína a GG pelo preço de 5 e 10 euros, cada dose. M. Em per lodo que não é possível de determinar em concreto, mas que se situa entre os meses de Janeiro de 2011 e Março de 2011, o arguido vendeu heroína a ---, num número não concretamente apurado de vezes, pelos preços de 6, 7 e 10 euros, conforme eram as disponibilidades económicas deste consumidor. Algumas das vendas de heroína ocorreram na residência do arguido, na ---. N. O arguido realizou com HH as transacções ocorreram nos dias 27 de Setembro de 2012, pelas 11:55 horas; no dia 28 de Setembro de 2012, pelas 12:17 horas; no dia 1 de Outubro de 2012, pelas 11:45 horas e, no dia 2 de Outubro de 2012, pelas 12:10 horas, todos eles na esplanada do bar "Aliança", na Praça Velha, área desta comarca. O. Durante o mês de Agosto de 2010, o arguido cedeu heroína a --- e consumiu heroína juntamente com a mesma na residência desta, situada na .... P. Por vezes, esta consumidora entregava roupa ao arguido, como forma de pagamento do produto estupefaciente. Q. O arguido procedeu à venda de heroína a ---, duas a três vezes por semana. R. O arguido vendeu heroína a LL, de forma quase diária, de uma quantidade até 5 panfletos de heroína, chegando a vender-lhe entre 50, 80 e 100 euros de heroína, de uma só vez. As vendas ocorriam no ..., situado nas imediações da residência do arguido nesta data, na ---, nesta comarca. Por vezes, o arguido tinha para venda a este consumidor, deixando- S. O arguido vendeu heroína a PP até 5 vezes por semana. T. O arguido vendeu diariamente heroína a RR, em quantidades que variavam entre 4 a 5 pacotes, ao preço de 10 euros cada. U. No restante período de tempo, o arguido vendeu a heroína num número de vezes não concretamente apuradas. V. Durante cerca de três vezes por semana, o arguido vendeu heroína a SS. X. Em período que não é possível de determinar mas que se situa no verão de 2011, o arguido vendeu heroína a BBB por um número não concretamente apurado de vezes, pelo preço de 10 euros cada dose. Nestas ocasiões, o arguido dirigia-se ao Bairro Social ..., ao Bairro ... e ao ..., para adquirir a heroína que aquele precisava. Z. Entre Outubro de 2011 e Fevereiro de 2012, o arguido vendeu a ... e ..., de forma diária, entre 2 a 3 pacotes de heroína a cada um deles, pelo preço de 10 euros cada dose. As transacções ocorreram nas antigas instalações do Hospital .... AA. No dia 21 de Agosto de 2012, entre as 12:00 e as 14:00 horas, no ..., nesta comarca, o arguido abordou ... e perguntou-lhe se queria comprar heroína pelo valor de 10 euros, dizendo: "tenho uns pacotes fixes". BB. Em dia não apurado em concreto, mas que se situa na semana de 1 a 7 Outubro de 2012, o arguido vendeu a ----, na esplanada bar "---", situada na Praça Velha, 1 pacote de heroína pelo valor de 10 euros, que o arguido retirou do interior da sua boca e lhe entregou. CC. Nos dias 1 de Outubro de 2012, pelas 12:33 horas e 5 de Outubro de 2012, a hora não concretamente apurada, --- deslocou-se à Praça Velha, ao volante do seu veículo automóvel de matrícula ----IN, de cor vermelha, a pedido de um seu amigo --- toxicodependente, para comprar heroína ao arguido. DD. Os demais objectos apreendidos, com excepção dos supra-referidos em 90, eram utilizados e foram obtidos na actividade de tráfico de droga que desenvolvia. EE. A mota referida em foi apreendida pela Polícia de Segurança Pública. FF. O arguido tinha consciência que a detenção daquela munição era proibida e punida por lei.»
3. Apreciação
3.1. O crime de detenção de arma proibida
De acordo com a matéria de facto fixada (n.os 80, 81, 86 e 97), apurou-se que o recorrente detinha uma munição de uma arma de fogo de calibre 6,35 mm, no interior de uma balança na cozinha. A munição tem 0,7cm de largura e 2,3 cm de cumprimento, constitui um projéctil em chumbo ogival, com um semi-aro e um invólucro ou estojo em latão cilíndrico. Tal munição, em bom estado de conservação, pertencia ao recorrente o qual não era titular de licença para uso ou porte de arma de qualquer natureza. O recorrente conhecia as características da referida munição; ainda assim, quis detê-la sem qualquer justificação para tal, ignorando que a detenção de tal objecto é proibida e que configura ilícito criminal. Considerou-se no acórdão recorrido que, «[f]ace aos factos provados, é inequívoco que o arguido AA detinha uma munição para arma de fogo sem qualquer licença que legitimasse a sua posse. Fê-lo de forma intencional, embora sem consciência da sua ilicitude». Quanto à falta de consciência da ilicitude – afirma-se –, «julgamos que a mesma é censurável, pois para além do extenso debate a que a actual lei das armas trouxe para a praça pública, julgamos que deve ser ponto assente que, regra geral, é errado ter armas ou munições em casa, pela perigosidade que aquelas encerram, Assim, não procurar saber da licitude da sua conduta, no que respeita àquela detenção da munição, é, em nossa opinião, motivo de censura, pelo que o erro em causa é censurável, importando a sujeição da conduta do arguido à disciplina do artigo 17.º, do Código Penal». Alega o arguido-recorrente não ser de subscrever o entendimento perfilhado no acórdão recorrido, «sobretudo se atendermos ao facto de que, não olvidando o referido debate público (que geralmente consiste em debates parlamentares com escassíssima repercussão na generalidade da população e em discussões em programas de debate televisivo, entre comentadores mais ou menos habituais em tal tipo de transmissão audiovisual), as mais das vezes bem pouca repercussão tem no esclarecimento da generalidade da população. Sendo certo que, se será provável que a generalidade da população tenha conhecimento de que é em regra proibido ter uma arma de fogo em casa, já não será assim quanto a uma simples munição, uma mera bala isolada, sem qualquer mecanismo necessário para o seu uso como munição; bala essa, isolada, quantas vezes utilizada como adorno pessoal mesmo, furada e pendurada num cordão ao peito. Pois, na realidade, quando qualquer cidadão normal e comum ouve falar da proibição de deter uma arma, desconhece que tal proibição se aplique igualmente a uma mera bala». Não convence esta argumentação. Na verdade, o artigo 86.º, n.º 1, alínea d), do regime jurídico das armas e suas munições, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, incrimina, designadamente, a detenção, sem se encontrar autorizado, de munições de armas de fogo independentemente do tipo de projéctil utilizado. O crime de detenção de arma proibida, bem como das munições de armas de fogo, configura, como tem sido assinalado, um crime de perigo abstracto em que o que está em causa é a perigosidade das próprias armas. Como se refere no acórdão deste Supremo Tribunal, de 11 de Junho de 2015 (Proc. n.º 41/10.0JBLSB.S1), com a incriminação visa-se «tutelar o perigo de lesão da ordem, segurança, ou tranquilidade públicas»[1]. A lesividade jurídica reside no mero facto de o agente possuir ou deter a munição sem autorização, consumando-se o crime com a simples conduta de possuir a munição – trata-se de um crime de mera conduta ou de perigo abstracto. O crime, por ter como objectividade jurídica a tutela da segurança pública, da paz social, consuma-se com a simples conduta de possuir a munição. Estamos, como se referiu, perante um crime de mera conduta ou de perigo abstracto, em que, como ensina JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, «o perigo não é elemento do tipo, mas simplesmente motivo da proibição». Tipificam-se neste tipo de crimes «certos comportamentos em nome da sua perigosidade típica para um bem jurídico»[2]. E, importa assinalar, a munição que o recorrente detinha encontrava-se «em bom estado de conservação». Não faz sentido, assim, a referência a utilizações «como adorno pessoal» de uma bala. Em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 17.º do Código Penal, o erro sobre a ilicitude ou falta de consciência da ilicitude do facto praticado exclui a culpa, quando não for censurável. No âmbito da definição e critério dos limites da não censurabilidade da falta de consciência da ilicitude, JORGE DE FIGUEIREDO DIAS convoca a natureza da relação que se pode estabelecer entre o erro ou engano que se exprime no facto, e a personalidade da pessoa que erra ou se engana, considerando que «A. Se lograr comprovar-se que a falta de consciência de ilicitude ficou a dever-se, directa e imediatamente, a uma qualidade desvaliosa e jurídico-penalmente relevante da personalidade do agente, aquela deverá sem mais considerar-se censurável. B. Se, pelo contrário, não se logrou tal comprovação, a falta de consciência da ilicitude deverá continuar a reputar-se censurável, salvo se se verificar a manutenção no agente, apesar daquela falta, de uma consciência ético-jurídica, fundada em uma atitude de fidelidade ou correspondência a exigências ou pontos de vista de valor juridicamente relevante»[3]. Segundo o mesmo autor, «a falta de consciência do ilícito será não censurável «sempre que (mas só quando) o engano ou erro da consciência ética, que se exprime no facto, não se fundamente em uma atitude interna desvaliosa face aos valores jurídico-penais, pela qual o agente deva responder. Também a personalidade que erra sobre o sentido de uma valoração jurídica se mantém substancialmente “responsável”, parecendo por isso dever arcar com a culpa pelo ilícito-típico cometido»[4]. Acompanhando o mesmo autor, «a censurabilidade da falta de consciência do ilícito implica sempre “um certo pedaço de culpa na condução da vida” ou na preparação da personalidade. No preciso sentido em que a prova da persistência no agente, apesar do erro da consciência ética, de uma atitude de fidelidade ou de correspondência a exigências do direito depende não só do que puder concluir-se da atitude interna documentada no facto, como ainda da verificação de que o agente é um tal que se tem esforçado por assegurar o carácter jurídico (lícito) dos seus actos, até ao ponto de aquele esforço se revelar como uma forma do existir»[5]. O que se observa no caso em apreço é a existência de uma atitude pessoal do arguido-recorrente que não cuidou em inteirar-se, como se diz na decisão recorrida, da licitude da detenção da munição. Revelou um comportamento de indiferença relativamente à detenção de um artefacto que, encontrando-se em bom estado de conservação e, em princípio, em condições de ser utilizado, se revela perigoso para qualquer pessoa. Indiferença que pode radicar-se ou decorrer da actuação marginal que o arguido vinha empreendendo no âmbito do tráfico de estupefacientes a que se dedicava. O arguido-recorrente revelou, por isso, uma atitude displicente, juridicamente desvaliosa que impediu a consciência ética de decidir correctamente a questão do desvalor jurídico do facto. Nestes casos, como sublinha JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, «terá forçosamente de concluir pela censurabilidade da falta de consciência do ilícito. Tratar-se-á de casos em que é a própria qualidade juridicamente desvaliosa e censurável da personalidade (determinante de um embotamento, insensibilidade ou daltonismo da consciência ética) que vale imediatamente como censurabilidade da falta de consciência do ilícito»[6].
Em face do exposto, improcede a pretensão do recorrente quanto à absolvição relativamente ao crime de detenção de arma proibida/munição, sendo justa e adequada a pena de multa que lhe foi aplicada no acórdão recorrido.
3.2. A perda a favor do Estado dos objectos e dinheiro apreendidos
Insurge-se o recorrente contra a perda a favor do Estado dos objectos e dinheiro apreendidos, dizendo «não ser de presumir como provenientes de lucros obtidos com tráfico de estupefacientes», sendo que, afirma ainda, «o M.P. não promoveu na acusação, ou até ao 30.º dia anterior à data designada para a primeira audiência de julgamento, a perda dos bens a favor do Estado, bem como a liquidação do valor que deve ser considerado como tal».
Estabelece o artigo 109.º, n.º 1, do Código Penal que «são declarados perdidos a favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este tiverem sido produzidos, quando, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos». O instituto da perda de objectos é, como assinala PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, «exclusivamente determinada por necessidades de prevenção»[7]. Também M. MIGUEZ GARCIA e J. M. CASTELA RIO lhe apontam a mesma ratio, pois «liga-se a razões de natureza preventiva, vinculado ao objectivo da prevenção de novos factos ilícitos típicos», não se tratando «nem de uma medida de segurança, nem de uma pena, quanto muito de uma medida de natureza sui generis». O que fundamenta a perda dos instrumentos e do produto do crime são «razões ligadas à segurança das pessoas, à moral ou a ordem públicas, ou à circunstância de oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos»[8]. Todos os autores citados lembram que existe legislação extravagante com disposições concretas relativas ao destino dos objectos[9]. Como sucede com o regime especial do tráfico de estupefacientes, definido nos artigos 35.º e 36.º do Decreto-Lei n.º 15/93. Como bem se refere no acórdão recorrido, citando o acórdão deste Supremo Tribunal, de 20 de Janeiro de 2010 (Proc. n.º 18/06.GAVCT.S1), o Decreto-Lei n.º 15/93 «dispõe de regulamentação própria no que concerne à perda dos instrumenta e producta sceleris, bem como às vantagens e direitos retirados do facto, estabelecendo que as vantagens e os direitos dele decorrentes, bem como os eventuais juros, lucros e outros benefícios obtidos através daqueles, são declarados perdidos a favor do Estado – artigos 35º a 38º». Por seu lado, como também se afirma na decisão recorrida, «o artigo 7.° da Lei n.º 5/02, de 11 de Janeiro (alterada pela Lei n.º 19/08, de 21 de Abril), estabelece uma presunção, aplicável, entre outros, aos crimes de tráfico de estupefacientes, segundo a qual se presume constituir vantagem da actividade criminosa a diferença entre o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu rendimento lícito, sendo certo que tal presunção tem sido considerada consonante com os princípios e normas constitucionais (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 294/08)» Do exame do acórdão recorrido resulta que o tribunal a quo declarou perdidas a favor do Estado a substância estupefaciente apreendida, e objectos que a acondicionavam, e, face ao património do arguido, entendeu-se não ser proporcional ao mesmo a aquisição lícita dos bens elencados no n.º 90 dos factos provados, atendendo, quer ao seu valor, quer ao seu número, tendo os mesmos sido também declarados perdidos a favor do Estado Português. Como bem refere o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, «No caso em apreço, a simples e singela leitura dos pontos n.º 87 a 91 do acervo factual dado como assente mostra, com meridiana clareza e sem necessidade de qualquer esforço complementar de demonstração, que estão verificados os pressupostos integrantes daquela presunção juris tantum. O recorrente contesta os fundamentos em que o Tribunal assentou essa presunção. Mas a verdade é que não impugnou, como era seu direito, a matéria de facto dada como provada, e mormente a que respeitava ao mencionado ponto n.º 90. O que não pode por conseguinte deixar de significar que não pretendeu, de todo, sindicar a matéria em causa. A ser de outro modo, estar-se-ia então perante uma forma de impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, na modalidade mais restrita, a determinar a competência da Relação, que conhece de facto, nos termos do art. 428.º do CPP, enquanto o Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, só conhece sobre matéria de direito, nos termos do art. 434.º do mesmo código. Convenhamos portanto, dito isto, que o problema de saber se foi ou não ilidida a aludida presunção densificada no n.º 1 do art. 7.º da Lei n.º 5/2002, não pode deixar de configurar questão apenas conexa com a matéria de facto, que extravasa, nesta sede, o âmbito dos poderes de cognição do STJ.» Em face do exposto, improcede também nesta parte o recurso interposto, mantendo-se a decisão proferida quanto ao perdimento dos bens a favor do Estado.
3.3. A escolha e a medida concreta da pena aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes
3.3.1. Entende o recorrente que «a pena de prisão aplicada pelo crime de tráfico de estupefacientes é excessiva, desadequada e desproporcional, não cumprindo os fins das penas», pugnando por uma pena de prisão que não deverá «ultrapassar os 5 anos» e que «deve ser suspensa na sua execução, ainda que sujeita a imposição de deveres, regras de conduta ou regime de prova». O recorrente foi condenado pela prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro. Muito embora o recorrente não questione a incriminação operada pelo Tribunal Colectivo, concordamos com a decisão proferida neste particular. Está, pois, unicamente em questão a determinação da medida da pena correspondente ao crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93. De acordo com o disposto no n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal, a medida da pena é determinada, dentro dos limites definidos na lei, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa, conforme prescreve o artigo 40.º, n.º 2, do mesmo Código. Na determinação concreta da pena há que atender às circunstâncias do facto, que deponham a favor ou contra o agente, nomeadamente à ilicitude, e a outros factores ligados à execução do crime, à personalidade do agente, e à sua conduta anterior e posterior ao crime (artigo 71.º, n.º 2, do Código Penal). Sobre a determinação da pena, em razão da culpa do agente e das exigências de prevenção, lê-se no acórdão deste Supremo Tribunal, de 15 de Dezembro de 2011, proferido no processo n.º 706/10.6PHLSB.S1, convocado, mais recentemente no acórdão de 27 de Maio de 2015 (proc. n.º 445/12.3PBEVR.E1.S1): «Ao elemento prevenção, no sentido de prevenção geral positiva ou de integração, vai-se buscar o objectivo de tutela dos bens jurídicos, erigido como finalidade primeira da aplicação de qualquer pena, na esteira de opções hoje prevalecentes a nível de política criminal e plasmadas na lei, mas sem esquecer também a vertente da prevenção especial ou de socialização, ou, segundo os termos legais: a reintegração do agente na sociedade (art. 40.º n.º 1 do CP). Ao elemento culpa, enquanto traduzindo a vertente pessoal do crime, a marca, documentada no facto, da singular personalidade do agente (com a sua autonomia volitiva e a sua radical liberdade de fazer opções e de escolher determinados caminhos) pede-se que imponha um limite às exigências, porventura expansivas em demasia, de prevenção geral, sob pena de o condenado servir de instrumento a tais exigências. Neste sentido é que se diz que a medida da tutela dos bens jurídicos, como finalidade primeira da aplicação da pena, é referenciada por um ponto óptimo, consentido pela culpa, e por um ponto mínimo que ainda seja suportável pela necessidade comunitária de afirmar a validade da norma ou a valência dos bens jurídicos violados com a prática do crime. Entre esses limites devem satisfazer-se, quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização (Cf. FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas Do Crime, Editorial de Notícias, pp. 227 e ss.). Quer isto dizer que as exigências de prevenção traçam, entre aqueles limites óptimo e mínimo, uma submoldura que se inscreve na moldura abstracta correspondente ao tipo legal de crime e que é definida a partir das circunstâncias relevantes para tal efeito e encontrando na culpa uma função limitadora do máximo de pena. Entre tais limites é que vão actuar, justamente, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização, cabendo a esta determinar em último termo a medida da pena, evitando, em toda a extensão possível (...) a quebra da inserção social do agente e dando azo à sua reintegração na sociedade (FIGUEIREDO DIAS, ob. cit., p. 231). Ora, os factores a que a lei manda atender para a determinação concreta da pena são os que vêm indicados no referido n.º 2 do art. 71.º do CP e (visto que tal enumeração não é exaustiva) outros que sejam relevantes do ponto de vista da prevenção e da culpa, mas que não façam parte do tipo legal de crime, sob pena de infracção do princípio da proibição da dupla valoração.» Acompanhando o acórdão deste Supremo Tribunal, de 3 de Julho de 2014 (proc. n.º 1081/11.7PAMGR.C1.S1), «defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, e o máximo, que a culpa do agente consente; entre estes limites, satisfazem-se quando possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização». Vem sendo salientado por este Supremo Tribunal, como justamente se dá conta no acórdão que se vem citando, que «na concretização da pena nos crimes de tráfico de estupefacientes deve-se atender a fortes razões de prevenção geral impostas pela frequência desse fenómeno e das suas nefastas consequências para a comunidade». Na verdade, há que sublinhar que estamos perante um crime de perigo abstracto e pluriofensivo. O acórdão do Tribunal Constitucional n.º 426/91, de 8 de Novembro de 1991[10], destaca a pluralidade de bens jurídicos postos em causa por este tipo de ilícitos: «a vida, a integridade física e a liberdade dos virtuais consumidores de estupefacientes», afectando, «a vida em sociedade, na medida em que dificulta a inserção social dos consumidores e possui comprovados efeitos criminógenos», protegendo, enfim, «uma multiplicidade de bens jurídicos, designadamente de carácter pessoal – embora todos eles possam ser reconduzidos a um mais geral: a saúde pública».
Na determinação da medida da pena pelo crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, correspondendo-lhe a pena de 4 anos a 12 anos de prisão, o tribunal a quo fixou-a em 6 anos de prisão, tendo considerado que: «- a conduta do arguido revela uma ilicitude de intensidade média, considerando a natureza e quantidade da droga detida e que se comprovou que era cedida a terceiras pessoas; o proveito conseguido com essa cedência e a forma como o fazia; no que tange à munição, a intensidade da sua ilicitude é baixa; - o dolo do agente, sendo directo, não demonstra uma intensidade superior ao normal; - a censurabilidade da sua conduta cifra-se a um nível normal, quanto ao tráfico e abaixo do normal quanto à detenção da munição; - o arguido está pessoal, social e familiarmente integrado; - não regista condenações anteriores pela prática de crimes; - a sua conduta posterior é positiva, realizando o arguido tratamento da sua adição.»
Como resulta da factualidade provada, no período que decorre de finais do ano de 2009 até 9 de Outubro de 2012, data em que foi detido, o recorrente dedicou-se de forma ininterrupta e exclusiva à venda de heroína e cocaína a inúmeros toxicodependentes da Ilha Terceira. A distribuição directa do produto estupefaciente era feita pelo recorrente em pequenas quantidades, geralmente divididas em pequenos pacotes (vulgo sacos ou panfletos), sucedendo que, em ocasiões em que fornecia droga, o mesmo aproveitava também para satisfazer o vício, pois que também era consumidor (factos 1, 2 e 3). Como salienta o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal, revela-se «uma conduta que, não deixando de assumir alguma relevância, tanto mais que empreendida num meio social relativamente confinado, também não se afasta muito da gravidade da ilicitude mínima pressuposta pelo tipo incriminador – o convocado art. 21.º do DL n.º 15/93». Tendo o arguido-recorrente desenvolvido uma actividade delituosa reiterada, abrangendo um período de tempo significativo de quase três anos, abrangendo um número significativo de consumidores, certo é que tal actividade pode ser caracterizada como constituindo um tráfico em pequena escala, exercido de forma algo rudimentar, em contacto directo com os consumidores, com os quais, por vezes, também consumia. Não se observa o recurso a meios sofisticados, nem a detenção de quantidades significativas de produto estupefaciente «em armazém». O arguido pode bem ser caracterizado como um pequeno revendedor, como decorre das quantidades de substâncias estupefacientes que transaccionava e das pequenas quantias em dinheiro que lhe foram apreendidas. Sendo nesta concreta configuração que a conduta do arguido deve ser apreciada, consideramos que a ilicitude assume uma limitada gravidade. O grau da culpa revelada é atenuado pela sua própria situação de toxicodependência enquanto se dedicou à actividade de tráfico. Por seu lado, como bem pondera o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal, são hoje «muito mais reduzidas [as] necessidades de prevenção especial, já que o arguido, como igualmente se provou, há cerca de 3 anos que deixou de consumir estupefacientes, afastou-se da frequência e convívio em locais e com pessoas conotadas com o consumo e tráfico de drogas, do mesmo passo que mantém e privilegia, no momento presente, a sua, actual, estável inserção familiar e actividade laboral». Pelo exposto, e não esquecendo que estamos perante um tipo de crime onde as necessidades de prevenção geral de integração da norma e de protecção de bens jurídicos são prementes, pois o «sentimento jurídico da comunidade» apela a uma eliminação do tráfico de estupefacientes destruidor ansiando também por uma diminuição deste tipo de criminalidade e por uma correspondente censura de todos aqueles que se dedicam a estas práticas ilícitas para os efeitos altamente nefastos para a saúde e vida das pessoas, consideramos justa e adequada a condenação na pena de 5 (cinco) anos de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, assim se reduzindo a pena de 6 (seis) anos de prisão que lhe foi aplicada no acórdão recorrido, procedendo, nesta parte, o recurso interposto.
3.3.2. A suspensão de execução da pena
Estabelece o artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal que: «1. O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.» Segundo o n.º 2 deste preceito: «2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada do regime de prova.» Em conformidade com o disposto no n.º 3 do artigo 53.º do Código Penal, o regime de prova é ordenado quando a pena de prisão cuja execução foi suspensa tiver sido aplicada em medida superior a três anos. Como salienta JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, «a finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão é clara e terminante: o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes»[11]. Acompanhando-se o acórdão deste Supremo Tribunal, de 18 de Junho de 2015 (Proc. n.º 270/09.9GBVVD. S1): «É sabido que só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime. Também importa acrescentar que esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso (Cfr. Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, pag. 344). De um lado, cumpre assegurar que a suspensão da execução da pena de prisão não colida com as finalidades da punição. Numa perspectiva de prevenção especial, deverá mesmo favorecer a reinserção social do condenado. Por outro lado, tendo em conta as necessidades de prevenção geral, importa que a comunidade não encare, no caso, a suspensão, como sinal de impunidade, retirando toda a sua confiança ao sistema repressivo penal. Acresce que a aposta que a opção pela suspensão, sempre pressupõe, há-de fundar-se num conjunto de indicadores que a própria lei adianta. Personalidade do agente, condições da sua vida, conduta anterior e posterior ao crime e circunstâncias deste.»
De acordo com a matéria fáctica assente, o arguido-recorrente não regista condenações anteriores pela prática de crimes. Manteve o consumo de estupefacientes durante cerca de 3 anos, tendo na sequência do presente processo iniciado tratamento adequado não registando desde Outubro de 2012 qualquer recaída. Tal como à data dos factos, Pedro Medeiros coabita com a conjugue, funcionária efectiva do Hospital ..., dispondo de uma situação familiar equilibrada, estável e valorizada pelo próprio. Residem em habitação arrendada numa freguesia limítrofe da cidade de Angra do Heroísmo considerando dispor de adequadas condições de habitabilidade. Sem ocupação laboral regular há alguns anos e inscrito na Agência para a Qualificação, Formação e Emprego, o arguido foi integrado no programa RECUPERAR encontrando-se desde há cerca de 2 meses a trabalhar na Câmara Municipal de ---. O recorrente aufere no presente cerca de € 453,00 líquidos e a esposa cerca de € 800,00, vindo o arguido ainda a realizar alguns trabalho de jardinagem por conta própria, nomeadamente ao fim-de-semana, auferindo cerca de € 30,00 ao dia. Ocupa a maioria do seu tempo no exercício de actividade profissional e junto da família, sendo que desde 2012 se afastou da frequência e convívio em locais conotados com o consumo e tráfico de drogas, indiciando socialmente um maior recato da sua conduta, o que contribuiu para a melhoria da sua imagem social, em tempos associada ao consumo e tráfico de estupefacientes. Mantém-se em tratamento para a problemática aditiva, sem registo de recaídas. O arguido demonstra possuir capacidades de autocritica, descentração e pensamento consequencial. E tem o apoio da sua esposa, não verbalizando particulares sentimentos de rejeição ou hostilidade social. Perante o comportamento que o arguido tem tido em liberdade, a apontar para uma efectiva e procurada integração na sociedade, justifica-se que se aposte na sua reabilitação em liberdade.
Assim, ao abrigo do disposto nos artigos 50.º e 53.º do Código Penal, por se considerar que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, suspende-se a execução da pena pelo período de cinco anos sujeitando-se ao arguido a regime de prova. Competirá aos Serviços de Reinserção Social elaborar um plano de integração, que terá evidentemente por eixo fulcral, para que a suspensão se mantenha, uma abstinência total de consumo de qualquer produto estupefaciente por parte do arguido.
III – DECISÃO
Nos termos expostos, acordam em conferência os juízes que compõem a 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em:
a) Conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido, condenando-o na pena de 5 (cinco) anos de prisão pela prática do crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, assim se reduzindo a pena de prisão aplicada no acórdão recorrido; b) Suspender a execução da pena de prisão por igual período de cinco anos, ficando o arguido sujeito a regime de prova, em cumprimento de plano de reinserção social a elaborar pelos competentes Serviços de Reinserção Social com especial atenção ao passado aditivo do arguido; c) No mais, confirmar a decisão recorrida. Sem custas (artigo 513.º, n.º 1, do CPP).
Supremo Tribunal de Justiça, 27 de Janeiro de 2016 (Texto elaborado e revisto pelo relator – artigo 94.º, n.º 2, do CPP)
Os juízes conselheiros MANUEL AUGUSTO DE MATOS ARMINDO MONTEIRO
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