Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | ARAÚJO BARROS | ||
Descritores: | SOCIEDADES COMERCIAIS OFENSAS À HONRA CONDENAÇÃO EM QUANTIA A LIQUIDAR EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA | ||
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Nº do Documento: | SJ200506090016167 | ||
Data do Acordão: | 06/09/2005 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 7627/04 | ||
Data: | 11/30/2004 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
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Sumário : | Para as sociedades comerciais, a ofensa do bom nome, reputação e imagem comercial apenas pode produzir um dano patrimonial indirecto, isto é, o reflexo negativo que, na respectiva potencialidade de lucro, opera aquela ofensa, não sendo, por isso, susceptível de indemnização por danos não patrimoniais. 2. A decisão que relega para liquidação em execução de sentença a indemnização respeitante a danos patrimoniais, nos termos do no art. 661º, nº 2, do C.Proc.Civil, pode estabelecer qualquer montante que tenha por apurado (liquidado) como limite máximo da indemnização a liquidar. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" - Abastecedora de Combustíveis, SA" intentou, no Tribunal Cível de Lisboa, acção declarativa com processo ordinário contra "B - Comércio de Combustíveis, L.da", pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 545.981,80 Euros, acrescida de juros de mora vincendos, contados a partir de 01/04/2002, sobre 471.318,35 Euros, à taxa legal e até integral pagamento. Alegou, para tanto, em síntese, que: - no exercício da sua actividade, forneceu à ré, mediante solicitação desta, entre Outubro de 1994 e Janeiro de 2001, os combustíveis a que se reportam as facturas juntas aos autos, no montante global de 471.318,35 Euros; - tais facturas deveriam ser pagas nas datas das respectivas emissões, sendo que a ré não as pagou, nem na data dos respectivos vencimentos, nem posteriormente. Contestou a ré, sustentando, em resumo, que: - não são exactos os factos alegados pela autora quer no que respeita aos fornecimentos do mês de Janeiro de 2001 quer à falta de pagamento de todas as facturas em causa; - as facturas discriminadas sob o artigo 7º da contestação já foram pagas através de acordo, referido sob os artigos 4º, 5º e 6º da mesma peça; - foi a autora que deixou de cumprir o acordado com a ré. Deduziu reconvenção, peticionando a condenação da autora a pagar-lhe a quantia de 486.327,95 Euros, acrescida de juros de mora desde a citação e até integral pagamento, fundamentando-se essencialmente em que: - em Agosto/Setembro de 2000, a autora começou a atrasar as entregas de gasóleo fornecido nos termos descritos sob os n°s 55º a 59º da contestação/reconvenção, a que acresce que as quantidades de gasóleo que a ré contratava com os clientes e que depois transmitia à autora não eram satisfeitas por esta; - em consequência desses atrasos nos fornecimentos e dos erros nas quantidades de produto distribuídas, a ré passou a ser alvo de criticas dos seus clientes que deixaram de lhe comprar gasóleo; - a autora cortou os fornecimentos à ré sem qualquer aviso prévio, não entregando as encomendas que esta ia fazendo; - em consequência de tais factos o nome comercial da ré foi afectado, passando esta a ser tida como empresa não cumpridora quer junto dos clientes, quer junto da banca, passando de uma posição dominante no mercado de Santarém para praticamente deixar de operar no mercado; - os clientes deixaram de trabalhar com a ré, não mais efectuando encomendas; sendo que os seus 48 melhores clientes, que representavam um volume de 5.000.000 de litros/ano, cessaram os contactos e as relações que há muito mantinham com a ré, tudo em virtude dos atrasos e problemas de fornecimentos que por culpa da Autora se verificaram, o que levou a que a ré sofresse as perdas de lucros descritas sob os artigos 91º a 95º da contestação/reconvenção; - os danos na imagem, credibilidade e bom nome da ré e a perda de clientes derivadas do comportamento da autora ascendem a 399.038,32 Euros. Respondeu a autora, impugnando o invocado pagamento parcial do montante peticionado, dizendo que o invocado acordo se reporta a outras facturas diferentes das que são objecto do pedido formulado nestes autos, e negando os factos que lhe são imputados relativos aos atrasos nos fornecimentos e às divergências nas quantidades de produtos encomendados e entregues. Mais sustentando que: - em consequência dos atrasos de pagamento por parte da ré a autora também passou a atrasar o pagamento dos combustíveis que lhe eram fornecidos pela BP Portuguesa, situação que implicou que a BP reduzisse o volume dos seus abastecimentos à autora e que esta, por sua vez, se visse obrigada a reduzir alguns abastecimentos à ré; - é falso que a autora atrasasse sistematicamente e por sua culpa as entregas de combustíveis a partir de Agosto/Setembro de 2000 ou que tenha unilateralmente reduzido as margens de comercialização da ré; - foi a ré que, desde 9 de Janeiro de 2001, deixou de encomendar gasóleo à autora. Findos os articulados, exarado despacho saneador e condensados e instruídos os autos, procedeu-se a julgamento, com decisão acerca da matéria controvertida, após o que foi proferida sentença em que se decidiu: a) julgar a acção procedente, por provada, e, consequentemente, condenar a ré a pagar à autora o montante de 471.318,35 Euros, acrescido de juros vencidos e vincendos contados desde a data de emissão de cada uma das facturas e sobre o correspondente montante, até integral pagamento, à taxa legal em vigor em tais datas; b) julgar a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, condenar a autora a pagar à ré o montante que se liquidar em sede de execução de sentença, a título de danos não patrimoniais resultantes da perda dos 30 clientes a que se reporta o n° 32 dos factos provados; c) no mais, absolver a autora do pedido reconvencional. Inconformadas apelaram a autora e a ré/reconvinte, tendo, na sequência, o Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 30 de Novembro de 2004, decidido alterar a sentença recorrida pela forma seguinte: vai a autora absolvida do pedido reconvencional a título de danos não patrimoniais; vai a autora condenada a pagar à ré os prejuízos (danos patrimoniais) por esta sofridos em virtude dos factos descritos sob os nºs 17 a 31 dos "factos provados", ou seja, resultantes da perda de 30 clientes que representavam um volume de 4 milhões de litros por ano, a liquidar em execução de sentença, com o limite máximo de 87.289,63 Euros. Interpôs, agora, a ré recurso de revista, pretendendo a revogação do acórdão recorrido e a condenação da autora reconvinda no pagamento dos danos morais e patrimoniais. Não houve contra-alegações. 2. Os factos provados de 27 a 31 são concludentes no sentido de que não só a recorrente sofreu danos daquela natureza específica, mas ainda que a vastidão dos mesmos foi assinalável e de relevo considerável. 3. In casu, estamos perante danos patrimoniais indirectos, isto é, que são constituídos pelos danos morais que se repercutem no património do ofendido, cuja reparação abrange o duplo aspecto de puro dano não patrimonial e das suas consequências materiais, sendo certo que para merecerem a tutela do direito terão de ser graves como impõe o art. 496º do C.Civil. 4. Que outra coisa se poderá mais reflectir no património de uma empresa de cariz familiar e de âmbito regional, que passar a ser alvo de críticas dos seus clientes, que dos mesmos recebe várias reclamações, mas fundadamente, cuja imagem no mercado é prejudicada, que passa a ser tida como não cumpridora pelo seu maior património que é a clientela, vendo afectado o seu bom nome comercial, levando os clientes a abandoná-la. 5. Apesar de ter decidido em sentido contrário, é o próprio acórdão recorrido que aponta a grande maioria da doutrina e da jurisprudência como sustentando a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais no âmbito da responsabilidade contratual; é prejuízo seguramente ressarcível neste domínio, já que os arts 798° e 804°, n° 1, ambos do C.Civil não estabelecem a menor restrição ou limitação atinente ao dano indemnizável com tal fundamento. Destarte, a sua reparação justifica-se face ao disposto no art. 496º, n° 1 do C.Civil (o qual reflecte um princípio geral válido para toda a responsabilidade civil) se as circunstâncias que acompanham a violação do contrato contribuírem decisivamente para uma lesão grave de bens ou valores patrimoniais (neste sentido e por todos - Ac. STJ de 21/03/95). 6. Para uma sociedade comercial não existe maior moralidade que aquela que, derivando da culpa de outrem, causa à mesma o prejuízo da sua imagem no mercado e afecta de forma concludente o seu bom nome empresarial/comercial. Refere o acórdão sob recurso que tais factos nunca seriam de tal maneira graves que justificassem a tutela do direito em sede de danos morais, só se impondo à recorrente questionar, se esses factos não justificam a tutela do direito, quais serão aqueles que a justificam. 7. Trata-se de um dano real, concretizado por factos devidamente provados na sua sede própria, pelo que, salvo o respeito por entendimento diferente, deveria ter-se lançado mão do mecanismo legal que se impunha, ou seja, fazer operar o art. 496º do C.Civil, que é o aplicável para efeitos de determinação do montante dos danos não patrimoniais, e o qual aflora um princípio geral, aplicável em ambos os tipos de responsabilidade civil delitual, englobando também a obrigacional (v.g. Pessoa Jorge, Ensaios, pags. 365 e seguintes). 8. A reparação pelos danos não patrimoniais, para além de compensar a recorrente, consubstanciaria ainda uma sanção à autora lesante, deveria ser imediata, tanto mais havendo a perda de prestígio e de reputação da recorrente, o prejuízo da sua imagem no mercado e do respectivo bom nome comercial, factos que ficaram provados sem qualquer margem de dúvida ou incerteza. 9. Impunha-se, assim, a medição da gravidade daquele dano, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto. Por para isso existirem bases mais que suficientes havia de se ter concedido à recorrente uma quantia monetária que fosse adaptada a proporcionar-lhe a satisfação que de algum modo reparasse os factos provados de 27 a 31. 10. Haveria, enfim, de se determinar o montante indemnizatório ou compensatório de acordo com critérios de equidade, atendendo ainda, não só à gravidade e extensão dos danos, também ao grau de culpa da autora, às situações económicas das partes, assim como a todas as outras circunstâncias que contribuíssem para uma solução equitativa. Não se vislumbram razões que, de facto ou de direito, levassem a entendimento contrário. 11. Acresce que, considerando-se que a ré recorrente perdeu 30 clientes, que representavam um volume de 4 milhões de litros de combustível por ano, a única alternativa que resta é a de necessariamente ter por certa a verificação de danos patrimoniais e a assunção dos mesmos pela ora recorrente, o que a decisão sob recurso aceita. 12. Aqui não pode existir margem de dúvidas de que a perda de um volume de 4 milhões de litros de combustível por ano representa um dano patrimonial que, como tal, é susceptível de avaliação pecuniária o que nos parece, também, ter merecido o atendimento do Tribunal da Relação de Lisboa. 13. Nestes danos concretos justifica-se plenamente a sua relegação para execução de sentença, uma vez que não há elementos para fixar a quantidade, esta entendida, não como consequência do fracasso da prova na acção declarativa, mas em virtude de ainda se não conhecerem com exactidão as unidades componentes para o cálculo da indemnização. 14. A perda anual de 4 milhões de litros de combustível representa um reflexo directo no património da reconvinte, tratando-se de prejuízo concreto de que se só se não tem a específica expressão pecuniária, mas cuja pecuniariedade é seguramente susceptível de avaliação. 15. Não se resigna, contudo, a ré recorrente com o tecto estabelecido pelo acórdão recorrido de 87.289,63 Euros para a indemnização estabelecida a este título. Este limite máximo que o tribunal recorrido aponta para a compensação dos danos patrimoniais não encontra o menor fundamento na matéria fáctica provada e sendo baseado no art. 95º da contestação/reconvenção da ré recorrente, como é, representa uma leitura linear e superficial daquele articulado. 16. O referido montante tange a um período anual, reportado à margem de lucro obtido pela ré em virtude da sua actividade ao longo de 12 meses e só durante 12 meses. Nada no articulado da ora recorrente inculca a ideia de que os seus prejuízos, derivados da não obtenção do lucro da venda dos produtos (gasóleo c gasóleo agrícola) se resumiram a um lapso temporal de 12 meses. 17. Muito pelo contrário, o incumprimento da autora deu azo a que os prejuízos da ré se mantivessem durante os últimos anos. Há muito, desde 1994, que as relações comerciais entre as partes perduravam, não obstante, depois da autora não cumprir com os fornecimentos que lhe eram solicitados, os prejuízos daí advindos para a ré perduraram e ainda perduram, em momento algum ficando limitados ao período de um ano, como é entendido pelo acórdão recorrido. 18. É óbvio que o facto descrito em 95º da contestação/reconvenção da ré não é uma confissão pura e simples de que o seu prejuízo orçou na aí mencionada quantia. O facto aí alegado reporta-se a um período restrito de 12 meses, e assim tem de ser considerado. Mais do que isso é uma interpretação errada, que não corresponde à vontade, nem ao sentido com que foi invocado pela ré, ora recorrente. 19. Em suma, o acórdão recorrido, ao não condenar a autora em danos não patrimoniais e ao estabelecer um limite máximo da indemnização por danos patrimoniais, é susceptível do reparo devido, por violação da lei substantiva, seja por erro de interpretação e aplicação da norma aplicável, seja por erro na sua determinação, em concreto, face ao disposto nos arts. 661°, nº 2, do CPC, bem assim nos arts 494º, 496° e 566º, todos do C. Civil. Encontram-se, em definitivo, assentes os seguintes factos: i) - a autora é uma sociedade comercial que tem por objecto a distribuição e comercialização de produtos derivados do petróleo; ii) - no exercício da sua actividade comercial a autora, a solicitação da ré, forneceu-lhe entre Outubro de 1994 e, pelo menos, Dezembro de 2000, combustíveis (gasóleo normal e gasóleo agrícola); iii) - os referidos combustíveis foram entregues pela autora directamente aos clientes da ré, a solicitação e por indicação desta; iv) - a ré comercializava gasóleo e gasóleo agrícola da autora no distrito de Santarém e zonas fronteiriças do mesmo; v) - por força da referida relação comercial, além de passar a vender o gasóleo da autora aos clientes que já faziam parte da sua carteira, a ré entrava em contacto com potenciais clientes de combustíveis, fazendo a prospecção de mercado, aliciando clientes para os produtos da autora, dando-lhes conta das condições vantajosas e preços praticados por aquela; vi) - a ré negociava o preço dos combustíveis, procurando obter os melhores resultados, não só para si, como também para a autora; vii) - sendo que, depois de concluir os negócios, indicava à autora os nomes dos clientes, bem como o local onde o combustível deveria ser colocado; viii) - no exercício da sua actividade comercial e para além dos fornecimentos acima referidos em ii) a autora, mediante solicitação da ré, forneceu-lhe combustíveis durante o mês de Janeiro de 2001; ix) - nos termos acordados, os fornecimentos deveriam ser pagos à autora pela ré nas datas constantes das respectivas facturas; x) - as facturas relativas a parte dos fornecimentos acima referidos em ii) e viii) totalizam o montante de 94.490.845$00, correspondente a 471.318,35 Euros, pelos valores e datas de vencimento individuais discriminados nos documentos de fls. 947 a 950, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; xi) - apresentadas a pagamento, tais facturas não foram pagas nas datas acordadas, nem posteriormente, apesar das diligências efectuadas nesse sentido pela autora; xii) - em 19 de Outubro de 2000 autora e ré acordaram no pagamento em prestações mensais de 500.000$00, com início em 20 de Fevereiro, de outros fornecimentos que se encontravam por pagar, distintos dos acima referidos em viii), tendo, para garantia do bom cumprimento desse acordo, a ré subscrito uma letra que entregou à autora, sendo certo que a ré tem cumprido na íntegra esse acordo, já se encontrando pagas parte das facturas englobadas no mesmo; xiii) - em Agosto/Setembro de 2000, a autora começou a atrasar sistematicamente as entregas de gasóleo; xiv) - os prazos de entrega acordados com os clientes, não eram cumpridos; xv) depois de contratar com os clientes, a ré indicava à autora o local onde deveria ser o combustível descarregado; xvi) - a autora não procedia às entregas nos prazos acordados com a ré, e as quantidades de gasóleo e gasóleo agrícola que a ré contratava com os clientes, e que depois era comunicada à autora, também não eram satisfeitas por esta última e não correspondiam às solicitadas pela ré e seus clientes; xvii) - a autora apenas entregava produto a alguns clientes (e mesmo a estes com diminuição das quantidades encomendadas), deixando outros sem gasóleo; xviii) - estes factos repetiram-se por sistema durante um largo período; xix) - era a ré que tudo estabelecia no que respeita aos fornecimentos de combustíveis com os vários clientes, xx) - em consequência dos atrasos verificados, e de as quantidades do produto não corresponderem às solicitadas, a ré passou a ser alvo de críticas pelos seus próprios clientes; xxi) - em consequência dos factos antes descritos a ré recebeu várias reclamações dos seus clientes; xxii) - com as condutas da autora supra referidas, a imagem da ré no mercado foi prejudicada e o seu bom nome comercial afectado, já que a autora passou a ser tida como empresa não cumpridora ao nível da clientela; xxiii) - em virtude dos factos acima descritos de xiii) a xxii) a ré perdeu 30 clientes, que representavam um volume de 4 milhões de litros por ano; xxiv) - a "A" é distribuidora de combustíveis da marca BP e eram estes e só estes que a ré lhe adquiria, a crédito; xxv) - havia, apenas, um acordo no preço final de venda, beneficiando a ré de um desconto por litro. Face ao teor das conclusões da recorrente (a nosso ver desnecessariamente extensas e argumentativas) importa, no âmbito do recurso, conhecer tão só de duas questões relativamente às quais ela discorda da solução a que chegou o acórdão impugnado: I. A invocada indemnização por danos não patrimoniais. II. A impossibilidade de fixação do limite máximo constante do acórdão da Relação para a indemnização pelos danos patrimoniais a liquidar em execução de sentença. Quanto à primeira questão - e dando de barato algumas considerações feitas pela recorrente que não relevam para a apreciação do recurso, por não apresentarem qualquer verdadeira divergência com a decisão recorrida (por exemplo, é sabido que a indemnização por danos não patrimoniais é devida também no domínio da responsabilidade contratual) - impõe-se apenas averiguar se, in casu, sendo a autora uma sociedade comercial, ainda assim se justifica considerar que sofreu danos de natureza não patrimonial susceptíveis de ressarcimento, ou seja, de compensação pecuniária. Resulta do art. 496º, nºs 1 e 3, do C.Civil que "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito" e que o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção as circunstâncias referidas no art. 494º, isto é, tomando em consideração o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. Há, no entanto, em ordem a resolver o problema, que distinguir, nestes casos, entre o bem jurídico atingido e o dano que resulta da lesão. Ora, as sociedades comerciais operam no mundo dos negócios com o objectivo do lucro. É próprio da sua natureza que o bom nome, a reputação e a imagem comercial lhes interessam na justa medida da vantagem económica que deles podem tirar. Toda a ofensa ao bom nome comercial acaba por se projectar num dano patrimonial revelado pelo afastamento da clientela e na consequente frustração de vendas (e perda de lucros) por força da a partir da repercussão negativa no mercado que à sociedade advém por causa da má imagem que se propaga.(4) Assim, para as sociedades comerciais, a ofensa do crédito e do bom nome produz, portanto (como a própria recorrente parece admitir) um dano patrimonial indirecto, isto é, o reflexo negativo que, na respectiva potencialidade de lucro, operou aquela. Os prejuízos estritamente morais implicados nas ofensas ao bom nome e reputação apenas calham aos indivíduos e às pessoas morais, para os quais a dimensão ética é importante, independentemente do dinheiro que poderá valer.(6) E é, no fundo, o que expressamente resulta dos factos provados: em consequência do comportamento da reconvinda (e das reclamações que a reconvinte recebeu dos seus clientes, do facto de a sua imagem no mercado ter sido prejudicada, passando a ser considerada como empresa não cumpridora ao nível da clientela) a recorrente perdeu 30 clientes que representavam um volume de vendas de 4 milhões de litros de combustível por ano. Vê-se do artigo 95º da contestação/reconvenção que a ré quantificou o combustível que deixou de vender, correspondente a 48 clientes (e não 30) que perdeu em 5.000.000 de litros por ano, no valor (que deixou de ganhar) de 87.289,63 Euros. a) - julgar improcedente o recurso de revista interposto pela ré/reconvinte "B - Comércio de Combustíveis, L.da"; b) - confirmar o acórdão recorrido; c) - condenar a recorrente nas custas da revista. Lisboa, 9 de Junho de 2005 Araújo Barros, Oliveira Barros, Salvador da Costa. ------------------------------------------- (1) Fernando Pessoa Jorge, "Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil", in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, Lisboa, 1972, pag. 375. |