Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | LOPES DA MOTA | ||
| Descritores: | HABEAS CORPUS PRISÃO PREVENTIVA PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA ACUSAÇÃO INSTRUÇÃO FURTO QUALIFICADO BANDO | ||
| Data do Acordão: | 03/22/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | HABEAS CORPUS | ||
| Decisão: | PROCEDÊNCIA / DECRETAMENTO TOTAL | ||
| Sumário : | I - Os motivos de «ilegalidade da prisão» que constituem fundamento da providência de habeas corpus, de enumeração taxativa, têm de reconduzir-se à previsão das alíneas do n.º 2 do art. 222.º do CPP, pelo que o STJ apenas tem de verificar (a) se a prisão resulta de uma decisão judicial exequível ordenada por entidade competente, (b) se a privação da liberdade se encontra motivada por facto pelo qual a lei a admite e (c) se estão respeitados os respetivos limites de tempo fixados na lei ou em decisão judicial. II - A prisão preventiva, enquanto medida de coação de ultima ratio, está sujeita aos prazos de duração máxima previstos no art. 215.º do CPP, a contar do seu início, findos os quais se extingue. III - Encontrando-se o processo em fase de instrução e o requerente acusado da prática de crimes de furto qualificado pelas als. a) (valor consideravelmente elevado), e) (penetração em habitação, estabelecimento comercial ou industrial ou outro espaço fechado, por arrombamento, escalamento ou chaves falsas) e g) (como membro de bando destinado à prática reiterada de crimes contra o património, com a colaboração de pelo menos outro membro do bando) do n.º 2 do art. 204.º do CP, a que corresponde a pena de 2 a 8 anos de prisão, é de 8 meses o prazo de duração máxima da prisão preventiva, fixado pela al. b) do n.º 1 do art. 215.º do CPP. IV - Ao peticionante não é imputado qualquer facto de comparticipação, a qualquer título, como autor, instigador ou cúmplice (arts. 26.º e 27.º do CP), na execução dos crimes de furto de veículos automóveis, pelo que não se pode afirmar que acusação imputa a todos os arguidos a comissão de crimes de furto qualificado, sob a forma de coautoria, e que no decurso dessa atividade criminosa, imputada a todos e aos mesmos arguidos, foram furtados três veículos automóveis; a acusação não imputa aos arguidos a prática dos mesmos factos, constitutivos dos mesmos crimes, nem imputa a todos os arguidos o furto dos três veículos automóveis. V - A agravação resultante de atuação em bando (art. 204.º, n.º 2, al. g), do CP), pelo facto de se imputar ao peticionante a qualidade, partilhada com os demais arguidos, de membro do bando, exige a participação do agente na prática de atos de execução do crime de furto. Sendo um fator de agravação do crime, é necessário que o agente pratique o furto como membro de bando, com a colaboração de, pelo menos, outro membro, o que, por essa razão, o expõe à pena de 2 a 8 anos de prisão. VI - Não vindo imputada ao requerente a prática de atos de execução dos crimes de furto de veículos, que foram praticados por outros membros do bando, não ocorre o motivo de elevação do prazo máximo de prisão preventiva, de 8 para 10 meses, nos termos da al. b) do n.º 2 do art. 215.º do CPP. VII - Pelo que, estando excedido o prazo máximo de 8 meses, verifica-se o fundamento de ilegalidade da prisão a que se refere a al. c) do n.º 2 do art. 222.º do CPP. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. AA, arguido com identificação nos autos em epígrafe, acusado da prática de crimes de furto qualificado, alegando encontrar-se atualmente em prisão ilegal, por considerar ultrapassado o prazo máximo de prisão preventiva em que se encontra, apresenta petição de habeas corpus, subscrita por advogado, nos termos e com os seguintes fundamentos: «1.º O ora peticionante encontra-se preso preventivamente no Estabelecimento Prisional ..., à ordem dos presentes autos, desde o dia 5 de Julho de 2022. 2.º Está o mesmo acusado da prática de: 1 crime de furto qualificado, p. e. p. pelo art. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º al. d), todos do Código Penal; 2 crimes de furto qualificado p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 als. b) e h) e n.º 2 al. g) ambos do Código Penal; 4 crimes de furto qualificado p. e. p. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. a), e) e g) por referência ao art. 202.º als. b) e d), todos do Código Penal; 1 crime de furto qualificado p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 als. a) e h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º als. a) e d), todos do Código Penal; 2 crimes de furto qualificado na forma tentada p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º al. d) e 22.º e 23.º, todos do Código Penal; 1 crime de furto qualificado, na forma tentada p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º als. b) e d) e 22.º e 23.º, todos do Código Penal; 1 crime de receptação p. e p. pelo art. 231.º n.º 1 do Código Penal; 1 contra-ordenação p. e p. pelo art. 97.º n.º 1 da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro. 3.º No referido processo foi aberta instrução, não havendo ainda decisão sobre a mesma. 4.º Estipula o artigo 215.º do Código de Processo Penal os prazos máximos da prisão preventiva, prevendo no seu n.º 1 os prazos gerais, e nos números seguintes as condições para agravação dos mesmos. 5.º No presente caso, está o arguido acusado dos crimes supra mencionados, não se verificando qualquer agravante do artigo 215.º do Código de Processo Penal. Vejamos, 6.º No tocante ao n.º 2 do mesmo artigo, não se verifica in casu qualquer crime de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada ou crime punível com pena de prisão superior a 8 anos. Também não se verifica preenchida qualquer alínea do mesmo disposto, não estando elencado nenhum dos crimes em questão. 7.º Já quanto ao n.º 3, não foi decretada especial complexidade ao processo. 8.º Ora, analisando as condições supra, verifica-se que o prazo máximo de prisão preventiva para o arguido AA cifra-se 8 meses. Deste modo, tendo sido o arguido detido no pretérito dia 5 de Julho de 2022, perfez os 8 meses no dia 5 de Março de 2023. Assim sendo, dúvidas não restam que, se encontra ilegalmente preso por excesso de prisão preventiva. 10.º De acordo com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º do Código de Processo Penal, nas situações em que é expirado o prazo máximo de prisão preventiva e ainda assim o arguido permanece privado na sua liberdade, é a petição de Habeas Corpus o meio adequado e idóneo para solucionar tal violação dos Direitos Fundamentais. 11.º A este propósito, em caso semelhante, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, Proc. n.º 256/16.7PAPVZ-B.S1, de 25-05-2017 : I - Estando os requerentes pronunciados por crimes de furto qualificado e crimes de falsificação ou contrafacção de documentos ou uso de documento contrafeito dos arts. 256.º, n.º 1, als. e) e f) e 255.º, al. a) do C. Penal, estes últimos punidos com pena de prisão até 3 anos ou multa, não pode ser ponderada a alteração dessa qualificação a não ser no decurso da audiência de julgamento com sujeição às formalidades dos arts. 358.º e 359.º CPP pois assim o exige o princípio da vinculação temática ou da identidade do processo como uma das garantias de defesa. ( ) Por conseguinte, só uma outra falsificação de documento que não a prevista no nº 1 do art 256.º pode ser tida como incluída no elenco da al. d) do n.º 2 do art. 215.º. Dito de outra maneira: aquele crime de falsificação previsto e punido com pena de prisão até 3 anos, ou seja o do n.º 1 do art. 256.º C. Penal que por si não permite a medida de coacção de prisão preventiva não pode logicamente suportar ou justificar o alongamento do prazo de prisão preventiva de 1 ano e 2 meses de prisão previsto no citado art. 215.º, n.º 1, al. c) apenas possível devido à imputação de outros crimes para 1 ano e 6 meses de prisão nas condições estipuladas no n.º 2, al. d) do citado artigo não obstante ali se fazer referência ao crime de falsificação. Donde a conclusão de que estando os requerentes em prisão preventiva desde 2016.03.18 está excedido o prazo máximo de prisão preventiva de 1 ano e 2 meses que ao caso é aplicável por virtude somente de os arguidos estarem pronunciados por crimes de furto qualificado, de harmonia com a citada al. d) do art. 202º. ( ) Em face do que se decide julgar procedentes os pedidos de habeas corpus determinando a imediata libertação dos requerentes. Sem tributação. Passe mandados de libertação. Dê conhecimento urgente ao processo à ordem do qual os requerentes estavam em prisão preventiva.» Finaliza pedindo que seja declarada a ilegalidade da prisão e ordenada a sua libertação imediata. 2. O Mmo. Juiz de instrução prestou a informação a que se refere o artigo 223.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (CPP), sobre as condições em que foi efectuada e se mantém a prisão, dela fazendo constar o seguinte (transcrição): «“(…) - o arguido AA foi detido em 5 de Julho de 2022, por suspeitas da prática de crimes de furto qualificado e de receptação; - em 7 de Julho de 2022, em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido detido, foi-lhe aplicada a medida coactiva de prisão preventiva (fls. 4855/5029, em especial fls. 4858, 5014, 5015 e 5027); - por despacho judicial de 4 de Outubro de 2022 procedeu-se ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva que foi aplicada, entre outros, ao referido arguido, tendo sido decidido manter a referida medida de coacção de prisão preventiva (fls. 6026/6027); - foi deduzida acusação pelo M. Público em 4 de Novembro de 2022, na qual foi imputada ao arguido AA a prática de 1 crime de furto qualificado, p. e. p. pelo art. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º al. d), todos do Código Penal; 2 crimes de furto qualificado p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 als. b) e h) e n.º 2 al. g) ambos do Código Penal; 4 crimes de furto qualificado p. e. p. 203.º, 204.º nº 1 al. h) e n.º2 als. a), e) e g) por referência ao art. 202.º als. b) e d), todos do Código Penal; 1 crime de furto qualificado p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 als. a) e h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º als. a) e d), todos do Código Penal; 2 crimes de furto qualificado na forma tentada p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º al. d) e 22.º e 23.º, todos do Código Penal; 1 crime de furto qualificado, na forma tentada p. e. p. art. 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art. 202.º als. b) e d) e 22.º e 23.º, todos do Código Penal; 1 crime de receptação p. e p. pelo art. 231.º n.º 1 do Código Penal; 1 contra-ordenação p. e p. pelo art. 97.º n.º 1 da Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro (fls. 6791/6928, em especial fls. 6889 e v.º); - nessa acusação é expressamente referido que os arguidos aí actuaram “…em concurso real, autoria e co-autoria material…” (fl.s 6885 v.º); - mais se refere nessa acusação que no decurso da sua actividade delituosa foram objecto de furto as viaturas com as matrículas ..-XZ-.. (fl.s 6804 v.º, pontos 28. e 29.), ..-LF-.. (fl.s 6808, pontos 62. e 63.) e ..-..-FI (fl.s 6836 e v.º, pontos 362. e 363.); - ainda se verteu nessa acusação que “11. Desde data não concretamente apurada mas pelo menos desde Novembro de 2019, que todos os arguidos supra identificados, formularam o propósito de se apropriarem dos bens, designadamente ouro, quantias monetárias, produtos têxteis, de latão e demais objectos que conseguissem, contra a vontade dos seus legítimos donos. 12. Na prossecução desse desígnio todos os arguidos se, organizaram, entre si e com outros sujeitos, para, em conjunto, se introduzirem em estabelecimentos comerciais, armazéns e fábricas, bem como se apoderarem de cargas acondicionadas em camiões e reboques de transportes de mercadorias, estacionados em parques industriais ou outros locais, apropriando-se de objetos de valor, facilmente transportáveis e transacionáveis, daí retirando e fazendo seus, os objectos que viessem a encontrar.” (fl.s 6800 v.º); - por despacho judicial de 8 de Novembro de 2012 procedeu-se ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva que foi aplicada, entre outros, ao referido arguido, tendo sido decidido manter a referida medida de coacção de prisão preventiva (fl.s 6953/6954); - por despacho judicial de 6 de Fevereiro de 2023 procedeu-se ao reexame dos pressupostos da prisão preventiva que foi aplicada, entre outros, ao referido arguido, tendo sido decidido manter a referida medida de coacção de prisão preventiva (fl.s 7965/7966); - entretanto, dois dos arguidos acusados requereram a abertura da instrução (fl.s 7655/7666 e 7749/7757), fase em que nesse momento se encontram os autos principais. Por tudo o que vem de referir-se, e nos termos do art.º 223.º, n.º 1 do C. Pr. Penal, não se recorta que tenha sido excedido o prazo de duração máxima de prisão preventiva a que o requerente AA se acha sujeito, sendo certo que, por imperativo legal, foi dado cumprimento, nos momentos oportunos, ao disposto no art.º 213.º do mesmo código, tendo sido o arguido sempre mantido nessa situação coactiva. Com efeito, considerando que a acusação imputa a todos os arguidos a comissão, entre outros, de crimes de furto qualificado, sob a forma de co-autoria, e que no decurso dessa actividade criminosa foram furtados três veículos automóveis, segue-se que, nos termos do art.º 215.º, n.º 2, al. b) do C. Pr. Penal, o prazo máximo de duração da prisão preventiva é de dez meses.» 3. O processo encontra-se instruído com certidão de fls. 4855/5029, 6026/6027, 6791/6928, 6800 v.º, 6804 v.º, 6808, 6836 e v.º, 6885 v.º, 6953/6954, 7655/7666 e 7749/7757. Nomeadamente, certidão do interrogatório e do subsequente despacho de indiciação e de aplicação da prisão preventiva, do despacho de manutenção da prisão preventiva em 04/10/2022, da acusação de 04/11/2022, do despacho de 08/11/2022 que, em novo reexame, mantém a prisão preventiva e dos requerimentos de abertura da instrução, um entrado em 13/12/2022 e outro em data não indicada. 4. Convocada a secção criminal e notificados o Ministério Público e o defensor, realizou-se audiência, em conformidade com o disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 223.º do CPP. Após o que a secção reuniu para deliberar (artigo 223.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPP), fazendo-o nos termos que se seguem. II. Fundamentação 5. O artigo 31.º, n.º 1, da Constituição consagra o direito à providência de habeas corpus como direito fundamental contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegais. O habeas corpus constitui uma providência expedita e urgente de garantia do direito à liberdade consagrado nos artigos 27.º e 28.º da Constituição, em caso de detenção ou prisão «contrários aos princípios da constitucionalidade e da legalidade das medidas restritivas da liberdade», «em que não haja outro meio legal de fazer cessar a ofensa ao direito à liberdade», sendo, por isso, uma garantia privilegiada deste direito, por motivos penais ou outros (assim, Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, p. 508, e Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2005, p. 303, 343-344). O artigo 27.º da Constituição, que se inspira diretamente no artigo 5.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH) e no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (artigo 9.º), que vinculam Portugal ao sistema internacional de proteção dos direitos humanos, garante o direito à liberdade física, à liberdade de movimentos, isto é, o direito de não ser detido, aprisionado ou de qualquer modo fisicamente confinado a um determinado espaço ou impedido de se movimentar (assim, por todos, o acórdão de 29.12.2021, Proc. 487/19.8PALSB-A.S1, em www.dgsi.pt). Nos termos do artigo 27.º, todos têm direito à liberdade e ninguém pode ser privado dela, total ou parcialmente, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena ou de aplicação judicial de medida de segurança privativas da liberdade (n.ºs 1 e 2), excetuando-se a privação da liberdade, no tempo e nas condições que a lei determinar, nos casos previstos no n.º 2 do mesmo preceito constitucional, em que se inclui a prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos [n.º 3, al. b)]. Como se tem afirmado, a prisão é ilegal quando ocorra fora dos casos previstos neste preceito constitucional, de aplicação direta (por todos, o acórdão de 2.2.2022, Proc. n.º 13/18.6S1LSB-G, em www.dgsi.pt). De acordo com o disposto no artigo 28.º, a detenção é submetida, no prazo máximo de 48 horas, a apreciação judicial, para restituição à liberdade ou imposição de medida de coação, em que se inclui a prisão preventiva, a qual tem natureza excecional e está sujeita aos prazos previstos na lei. A prisão preventiva só pode ser aplicada por um juiz, que, em despacho fundamentado, verifica a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida, que a justificam (artigos 193.º, 194.º, n.ºs 1 e 5, e 202.º do CPP). 6. A prisão preventiva, enquanto medida de coacção de ultima ratio, está sujeita aos prazos de duração máxima previstos no artigo 215.º do CPP. Nos termos do n.º 1 deste preceito, a prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação [al. a)] ou de oito meses sem que, havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória [al. b)]. Estabelecendo o n.º 2 do mesmo preceito que estes prazos são elevados para seis meses e dez meses, respetivamente, em casos, entre outros, de furto de veículos [al. b)]. Quando o procedimento se revelar de excecional complexidade, por qualquer dos crimes indicados no n.º 2, aqueles prazos são elevados para um ano e uma ano e quatro meses, devendo a complexidade ser declarada por despacho fundamentado do juiz, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, ouvido o arguido e o assistente (n.ºs 3 e 4 do mesmo artigo 215.º). 7. As decisões relativas à aplicação e reexame dos pressupostos da prisão preventiva – reexame tem lugar no prazo máximo de três meses, a contar da data da sua aplicação ou do último reexame, e quando no processo for proferido despacho de acusação [artigo 213.º, n.º 1, al. a) e b), do CPP] –, podem ser impugnadas por via de recurso ordinário, nos termos gerais (artigos 219.º, n.º 1, e 399.º e segs. do CPP), sem prejuízo de recurso à providência de habeas corpus contra abuso de poder por virtude de prisão ilegal (artigos 31.º da Constituição e 222.º a 224.º do CPP), com os fundamentos enumerados no n.º 2 do artigo 222.º do CPP. Dispõe o artigo 222.º do CPP que: “1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus. 2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de: a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente; b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.” 8. Em jurisprudência constante, tem este Supremo Tribunal de Justiça reiteradamente afirmado que a providência de habeas corpus corresponde a uma medida extraordinária ou excecional de urgência – no sentido de acrescer a outras formas processualmente previstas de reagir contra a prisão ou detenção ilegais – perante ofensas graves à liberdade, com abuso de poder, ou seja, sem lei ou contra a lei que admita a privação da liberdade, referidas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP (assim e quanto ao que se segue, por todos, de entre os mais recentes, o acórdão de 10.01.2023, Proc. n.º 631/19.5PBVLG-MC.S1, em www.dgsi.pt). A providência de habeas corpus não constitui um recurso de uma decisão judicial, um meio de reação tendo por objeto a validade ou o mérito de atos do processo através dos quais é ordenada ou mantida ou que fundamentem a privação da liberdade do arguido ou um «sucedâneo» dos recursos admissíveis, que são os meios adequados de impugnação das decisões judiciais (artigos 399.º e segs. do CPP). A diversidade do âmbito de proteção do habeas corpus e do recurso ordinário configuram diferentes níveis de garantia do direito à liberdade, em que aquela providência permite preencher um espaço de proteção imediata perante a inadmissibilidade legal da prisão. 9. Os motivos de «ilegalidade da prisão», como fundamento da providência de habeas corpus, têm de reconduzir-se, necessariamente, à previsão das alíneas do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, de enumeração taxativa. Como se tem afirmado em jurisprudência uniforme e reiterada (acórdão de 10.01.2023 cit.), o Supremo Tribunal de Justiça apenas tem de verificar (a) se a prisão, em que o peticionante actualmente se encontra, resulta de uma decisão judicial exequível, proferida por autoridade judiciária competente, (b) se a privação da liberdade se encontra motivada por facto que a admite e (c) se estão respeitados os respectivos limites de tempo fixados na lei ou em decisão judicial (assim, de entre os mais recentes, por todos, os acórdãos de 16.11.2022, Proc. 4853/14.7TDPRT-A.S1, de 06.09.2022, Proc. 2930/04.1GFSNT-A.S1, de 9.3.2022, proc. 816/13.8PBCLD-A.S1, e de 29.12.2021, proc. 487/19.8PALSB-A.S1, em www.dgsi.pt). 10. O habeas corpus pressupõe a atualidade da ilegalidade da prisão, reportada ao momento em que a petição é apreciada, como também tem sido repetidamente sublinhado (assim, os acórdãos anteriormente citados bem como, de entre outros, os acórdãos de 21.11.2012, proc. n.º 22/12.9GBETZ-0.S1, 09.02.2011, proc. n.º 25/10.8MAVRS-B.S1, de 11.02.2015, proc. n.º 18/15.9YFLSB.S1, e de 17.03.2016, proc. n.º 289/16.3JABRG-A.S1, em www.dgsi.pt). 11. Da petição, da informação a que se refere o artigo 223.º, n.º 1, do CPP e dos documentos juntos, resulta esclarecido, em síntese, que: - O arguido foi detido em 05/07/2022, tendo sido sujeito a primeiro interrogatório judicial em 07/07/2022. - Foi detido e apresentado ao juiz de instrução, a requerimento do Ministério Público, com base em fortes suspeitas de prática, em coautoria, de factualidade integrante da prática de sete crimes de furto qualificado e de três crimes de furto qualificado sob forma tentada. - A final, o juiz de instrução considerou fortemente indiciados os factos imputados no requerimento do Ministério Público e que estes integravam a previsão de um crime de furto qualificado p. e p. nos artigos 203.º, 204.º, n.º 1, al. h) e 2, als e) e g); dois crimes de furto qualificado p. e p. nos artigos 203.º, 204.º, n.º 1, al. b) e h) e 2, als g); quatro crimes de furto qualificado p, e p. nos artigos 203.º, 204.º, nº 1, al. h) e 2 als e) e g); e três crimes de furto qualificado, sob forma tentada p. e p. nos artigos 203.º, 204.º, nºs 1, als h) e 2, als e) e g), e 22.º e 23.º do Código Penal. E, julgando verificados os respetivos pressupostos, nomeadamente de perigo de continuação da atividade criminosa e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas, nos termos do artigo 202.º do CPP, aplicou a medida de coação de prisão preventiva. - Em 04/10/2022 foi proferido despacho judicial de manutenção da prisão preventiva, ao abrigo do artigo 213.º do CPP. - Por despacho do Ministério Público de 04/11/2022, foi o arguido acusado da prática dos seguintes crimes: 1 crime de furto qualificado, p. e. p. pelo art.º 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art.º 202.º al. d), todos do Código Penal; 2 crimes de furto qualificado p. e. p. art.º 203.º, 204.º n.º 1 als. b) e h) e n.º 2 al. g) ambos do Código Penal; 4 crimes de furto qualificado p. e. p. 203.º, 204.º nº 1 al. h) e n.º 2 als. a), e) e g) por referência ao art.º 202.º als. b) e d), todos do Código Penal; 1 crime de furto qualificado p. e. p. art.º 203.º, 204.º n.º 1 als. a) e h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art.º 202.º als. a) e d), todos do Código Penal; 2 crimes de furto qualificado na forma tentada p. e. p. art.º 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art.º 202.º al. d) e 22.º e 23.º, todos do Código Penal; 1 crime de furto qualificado, na forma tentada p. e. p. art.º 203.º, 204.º n.º 1 al. h) e n.º 2 als. e) e g) por referência ao art.º 202.º als. b) e d) e 22.º e 23.º, todos do Código Penal; 1 crime de receptação p. e p. pelo art.º 231.º n.º 1 do Código Penal (fls. 6791/6928, em especial fls. 6889 e v.º) ; - Em reexame, foi a prisão mantida posteriormente por despachos de 08/11/2022 e de 06/02/2023. - Foi requerida a abertura da instrução por um arguido em 13/12/2022 e, por outro em data não informada no processo, estando agora o processo em fase de instrução. 12. O peticionante pretende que se julgue ilegal a manutenção da prisão preventiva, ao abrigo da alínea c), do nº 2, do artigo 222.º do CPP, porque, alega, já decorreu o prazo de oito meses de privação da liberdade, por virtude da detenção, no dia 05/07/2022, e da aplicação da prisão preventiva, em 07/07/2022. Sustenta que, nesta fase processual, tendo sido requerida instrução, o prazo máximo de duração da prisão preventiva é de oito meses, sem que tenha sido proferida decisão instrutória, em aplicação da al. b), do nº 1, do artigo 215.º, por, diz, inexistir qualquer dos fundamentos legais de elevação do prazo previstos no n.º 2 do artigo 215.º – casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada ou crime punível com pena de prisão superior a 8 anos ou de preenchimento de qualquer das alíneas deste n.º 2 – e, além disso, não ocorrer ter sido declarada a especial complexidade do processo (n.º 3 do mesmo preceito). 13. A informação prestada pelo Mmo. Juiz de instrução indica o furto de veículos como motivo de elevação do prazo de duração máxima da prisão preventiva, como estabelece o artigo 215º, nº 2, al. b), do CPP. Diz, como se viu, em conclusão: “considerando que a acusação imputa a todos os arguidos a comissão, entre outros, de crimes de furto qualificado, sob a forma de co-autoria, e que no decurso dessa actividade criminosa foram furtados três veículos automóveis, segue-se que, nos termos do art.º 215.º, n.º 2, al. b) do C. Pr. Penal, o prazo máximo de duração da prisão preventiva é de dez meses. Dispõe o artigo 215.º do CPP, na parte que agora releva: «1 - A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido: a) (…) b) Oito meses sem que, havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória; (…) 2 - Os prazos referidos no número anterior são elevados, respectivamente, para seis meses, dez meses, um ano e seis meses e dois anos, em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos, ou por crime: a) (…) b) De furto de veículos ou de falsificação de documentos a eles respeitantes ou de elementos identificadores de veículos; (…)» 14. Da acusação do Ministério Público, que define o objeto do processo, extrai-se que: (a) O arguido encontra-se acusado pela prática de onze crimes de furto qualificado por várias alíneas do n.º 2 do artigo 204.º do Código Penal, nomeadamente pela alíneas a) (valor consideravelmente elevado), e) (penetrando em habitação, ainda que móvel, estabelecimento comercial ou industrial ou outro espaço fechado, por arrombamento, escalamento ou chaves falsas) e g) (como membro de bando destinado à prática reiterada de crimes contra o património, com a colaboração de pelo menos outro membro do bando), sendo oito na forma consumada que corresponde a pena de prisão de dois a oito anos (pp. 197 e 198 da acusação a fls. 6889-6889v.º dos autos). (b) Estes tipos de crime são preenchidos pela factualidade descrita nos seguintes pontos da acusação: 1) Ponto XI (artigos 98 a 109, pp. 41-43, a fls. 6811-6812) – furto de catalisadores de oito viaturas automóveis, nas instalações da sociedade “M...”, em ..., ..., com a comparticipação dos arguidos BB, CC, DD e EE, “em comunhão de esforços” e “na execução de um plano previamente delineado”; 2) Ponto XVI (artigos 154 a 163, pp. 52-53, a fls. 6816v.º-6817) – furto, do interior de um semirreboque, em ..., de “diversos objetos provenientes de compras e vendas efetuadas on line”, com a comparticipação dos arguidos EE, FF e GG, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 3) Ponto XVIII (artigos 179 a 187, pp. 56-58, a fls. 6818v.º-6819v.º) – furto, do interior de um semirreboque, no ..., de “caixas de botas Whichester Boot” com a comparticipação dos arguidos EE, FF e HH, em “comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 4) Ponto XXXI (artigos 288 a 297, pp. 77-79, a fls. 6829-6830) – furto, no armazém da sociedade “Ma...”, em ..., de “diversos artigos têxteis, fechados e embalados” com a comparticipação dos arguidos II, JJ, KK, BB, LL, MM e NN, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 5) Ponto XXXVII (artigos 330 a 337, pp. 85-87, a fls. 6833-6834) – furto, no armazém da sociedade “E...”, em ..., ..., de “diversas caixas de roupa de diversas marcas, novas e embaladas”, com a comparticipação dos arguidos JJ, KK, OO, BB, II e NN, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 6) Ponto XL (artigos 352 a 359, pp. 89-91, a fls. 6835-6836) – furto, no armazém da sociedade “A..., Lda”, em ..., de “diversas caixas contendo colchas, cobertores, lençóis e outros artigos de têxtil lar, novos e devidamente embalados”, com a comparticipação dos arguidos II, EE, FF, NN, OO, JJ, KK, BB e PP, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 7) Ponto XLIII (artigos 378 a 384, pp. 94-95, a fls. 6837v.º-6838) – furto, no armazém da sociedade “P...”, em ..., de “diversas caixas contendo colchas, cobertores, lençóis e outros artigos de têxtil lar, novos e devidamente embalados”, com a comparticipação dos arguidos II, EE, FF, NN, OO, JJ, KK, BB e PP, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 8) Ponto XXXIV (artigos 311 a 317, pp. 82-83, a fls. 6831v.º-6832) – furto, no armazém da sociedade “Sa...”, em ..., de “diverso material de ferragem”, com a comparticipação dos arguidos JJ, KK e BB, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”; 9) Ponto XLVIII (artigos 418 a 421, pp. 101-102, a fls. 6841v.º-6841v.º) – tentativa de furto, no armazém da sociedade “N...”, em ..., com a comparticipação dos arguidos JJ, KK e BB, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”, nada tendo os arguidos levado consigo; 10) Ponto L (artigos 432 a 437, pp. 104-105, a fls. 6842v.º-6843) – tentativa de furto, nas instalações da sociedade “H..., em ..., com a comparticipação dos arguidos II, JJ, KK, EE, FF e BB, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”, não tendo os arguidos levado qualquer objeto; 11) Ponto XXXVI (artigos 323 a 329, pp. 84-85, a fls. 6831v.º-6832) – tentativa de furto, nas instalações da empresa “G...”, em ..., com a comparticipação dos arguidos II e OO, “em comunhão de esforços” e na “execução de um plano previamente delineado”, não tendo levado consigo qualquer objeto; (c) Os factos que dizem respeito aos crimes de furto dos veículos automóveis são os que constam: 1) Do ponto I da acusação (artigos 26-29, pp. 28 e 190, a fls. 6804v.º e 6884v.º) – furto do veículo Renault Master, com a matrícula ..-XZ-... Crime imputado, em autoria, ao arguido II, “acompanhado por terceiras pessoas cuja identidade não foi possível apurar”; 2) Do ponto V da acusação (artigos 60-68, pp. 34-35 e 195, a fls. 6805-6805v.º e 6888) – furto do veículo Mercedes Sprinter, com a matrícula ..-LF-... Crime imputado, em autoria, ao arguido QQ, “acompanhado outros indivíduos cuja identidade não foi possível apurar”; 3) Do ponto XLI da acusação (artigos 360-362, pp. 91, 199, 200, 201, 205 e 207, a fls. 6836 e 6885-6894) – furto do veículo Mitsubishi, com a matrícula ..-..-FI. Crime imputado, em coautoria, aos arguidos BB, DD, RR, LL, SS e TT. 15. Do exposto, resulta, em síntese, que ao arguido e peticionante AA não é imputado qualquer facto de comparticipação, a qualquer título, como autor, instigador ou cúmplice, tal como definidos pelos artigos 26.º e 27.º do Código Penal, na execução dos crimes de furto dos veículos automóveis. A sua participação (ou comparticipação), como autor (ou coautor), apenas teve lugar, conjuntamente com os arguidos anteriormente identificados, nos furtos referidos nos mencionados pontos XI, XVI, XVIII, XXXI, XXXVII, XL, XLIII, XXXIV, XLVIII, L e XXXVI da acusação, nenhum deles dizendo respeito a furto de veículo. Assim sendo, não pode afirmar-se que acusação imputa a todos os arguidos a comissão de crimes de furto qualificado, sob a forma de coautoria, e que no decurso dessa atividade criminosa, imputada a todos e aos mesmos arguidos, foram furtados três veículos automóveis. A acusação não imputa aos arguidos a prática dos mesmos factos, constitutivos dos mesmos crimes, nem imputa a todos os arguidos o furto dos três veículos automóveis. 16. Apesar de mencionar que os arguidos “formularam o propósito de se apropriarem dos bens”, que, “na prossecução desse desígnio todos os arguidos se organizaram entre si e com outros sujeitos para, em conjunto, se apoderarem” dos bens e objetos furtados, fazendo-se deslocar em veículos destinados a essas atividades, “estabelecendo contactos telefónicos para combinarem” alvos e locais, acordando formas de reconhecimento, deslocação e execução, e que os factos descritos foram levados a efeito “na prossecução do desígnio formulado por todos os arguidos” (artigos 11 a 25 da acusação), a acusação não imputa ao peticionante qualquer crime de furto de veículo. Para além disso, a agravação resultante de atuação em bando (artigo 204.º, n.º 2, al. g), do Código Penal), pelo facto de se imputar ao peticionante a qualidade, partilhada com os demais arguidos, de membro do bando, exige sempre a comparticipação do agente do crime de furto na sua execução, isto é, a participação na prática de atos de execução do crime. Sendo um fator de agravação do crime, é necessário que o agente pratique o furto como membro de bando, com a colaboração de, pelo menos, outro membro, o que, por essa razão, expõe o agente à pena de 2 a 8 anos de prisão (cfr., por todos, o acórdão de 12-09-2007, Proc. 07P2605, www.dgsi.pt). 17. Em conformidade com o que vem de se expor deve, pois, concluir-se que, conforme consta da acusação, a situação de prisão preventiva em que o arguido atualmente se encontra não resulta de processo por crime de furto de veículos, que, nos termos da al. b) do n.º 2 do artigo 215.º do CPP, constitui motivo de elevação do respetivo prazo de duração de oito para dez meses, findos os quais, não tendo sido proferida decisão instrutória, a prisão preventiva se extingue. Estando o peticionante acusado da prática de crimes puníveis com penas de prisão não superiores a oito anos, a prisão preventiva extingue-se decorridos oito meses sem que tenha sido proferida decisão instrutória, nos termos da al. b) do n.º 1 do artigo 215.º do CPP. Pelo que, tendo a prisão preventiva sido aplicada por decisão de 7 de julho de 2022, se extinguiu em 7 de março de 2023. Assim se verificando o fundamento de ilegalidade da prisão, a que se refere a al. c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, por esta se manter atualmente para além do prazo fixado na lei. Decisão 18. Pelo exposto, deliberando nos termos dos n.ºs 3 e 4, alínea d), do artigo 223.º do CPP, decide-se declarar ilegal a prisão e, consequentemente, ordenar a imediata libertação do peticionante AA. Passe mandados de libertação. Comunique de imediato ao proc. 631/19.5PBVLG. Sem custas.
Supremo Tribunal de Justiça, 22 de março de 2023. José Luís Lopes da Mota (relator) Paulo Ferreira da Cunha Maria Teresa Féria de Almeida Nuno António Gonçalves |