Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
06P3847
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: CARMONA DA MOTA
Descritores: DESPACHO DO RELATOR
RECURSO PENAL
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
ERRO NA FORMA DO PROCESSO
Nº do Documento: SJ200702220038475
Data do Acordão: 02/22/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA.
Decisão: CONFIRMADO O DESPACHO DO RELATOR.
Sumário : I - Em sede de recurso, os despachos do relator não são susceptíveis de recurso (nomeadamente de agravo) para o pleno das secções criminais (competente – o que não é o caso – para «julgar os recursos de decisões proferidas em 1.ª instância pelas secções»: art. 11.º, n.º 2, al. b), do CPP).
II – No quadro de eventual «erro na forma de processo», competirá ao tribunal aproximar o incidente, quanto possível, «da forma estabelecida na lei» (art. 199.º, n.º 1, do CPC), e, em tal conformidade, deverá o relator admitir o pretendido (mas inadmissível) «recurso de agravo» como «requerimento» para que «sobre a matéria do despacho recaia um acórdão» (art. 700.º, n.º 3, do CPC). *

* Sumário elaborado pelo Relator.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:



1. SÍNTESE

1.1. Em 24Out06, o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em conferência, rejeitou, ante a sua manifesta improcedência, o recurso, oposto em 26Jul06 pela cidadã AA ao despacho judicial que, em 31Mai06, rejeitara – no âmbito do inquérito 27/2005 do MP/STJ – o seu requerimento de abertura da instrução.

1.2. A coberto de e-mail de «9 de Novembro de 2006 9:59», o advogado nomeado à assistente anunciou remeter a juízo «reclamação do acórdão 3847/06-5». Porém, remeteu expediente relativo ao processo n.º 5601/06 da 5.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa (v. fls. 228 a 234).

1.3. Por isso, determinou-se, por despacho de 16Nov06, o desentranhamento de fls. 228/234 e a sua devolução ao requerente.

1.4. Uma vez, assim, que a reclamação de fls. 235 e ss. (remetida por c/r) - não precedida nem de telecópia nem de válido e-mail – só veio a ser efectivamente remetida a juízo no dia 14Nov06 (1), notificou-se a apresentante, por c/r de 21Nov06, para, até 04Dez06, «pagar multa de montante igual ao dobro da mais elevada prevista no n.º 5, sob pena de se considerar perdido o direito de praticar o acto» (cfr. art.s 107.5 do CPP e 145. 6 do CPC).

1.5. A esta notificação, reagiu a assistente, através de e-mail de 04Dez06 (fls. 243) não acompanhado de qualquer anexo, designadamente o anunciado «pedido de aclaração» (2).

1.6. Assim sendo, e não obstante um pedido de aclaração poder ter sido «enviado por correio electrónico» (art. 150.2.c do CPC), o certo é que o ali anunciado o não foi. Donde que a posterior reclamação de fls. 244 (3) tivesse de haver-se – como se houve - como «entregue na secretaria judicial» na data que dele consta (07Dez06), ou seja, no 3.º dia posterior ao último do prazo [4Dez06] para o pedido de aclaração do despacho de fls. 239 (notificado ao destinatário em 24Nov06, mediante c/r expedida no dia 21).

1.7. Tratando-se, pois, de requerimento manifestamente tardio, a secretaria emitiu, em 14Dez, «guias para pagamento [até 11Jan07] da multa a que se refere o n.º 6.º do art. 145.º do CPC».

1.8. Porém, «a recorrente, apesar de notificada para proceder ao pagamento da multa de fls. 253, não efectuou o mesmo» (informação de fls. 261).

1.9. Por isso, o relator, em 16Jan07 (fls. 261 e verso) declarou perdido, nos termos dos art.s 107.5 do CPP e 145.6 do CPC, o direito que assistia à assistente, na condição de pagar a multa correspondente, de praticar, com dois dias úteis de atraso, o seu acto de reclamação de 14Nov06 (fls. 235 e ss.).


2. O requerimento de 29Jan07

2.1. Notificado deste despacho, a assistente manifestou, em 29 (4), a sua pretensão de «apresentar recurso de agravo» para o «pleno [das secções criminais] do Supremo Tribunal de Justiça» (fls. 266 e ss.).

2.2. No entanto, os despachos do relator não são susceptíveis de recurso (nomeadamente de agravo) para o pleno das secções criminais (competente – o que não é o caso (5) - para «julgar os recursos de decisões proferidas em 1.ª instância pelas secções»: art. 11.2.b do CPP).

2.3. Ora, no quadro de tal «erro na forma de processo», competiria ao tribunal aproximar o incidente, quanto possível, «da forma estabelecida na lei» (art. 199.1 do CPP).
2.4. E, em tal conformidade, o relator admitiu o pretendido (mas inadmissível) «recurso de agravo» como «requerimento» para que «sobre a matéria do despacho recaia um acórdão» (6).

2.5. Termos em que, depois de ouvida a parte contrária» (que, notificada em 01Fev, não se pronunciou), se «submeteu o caso à conferência».


3. BREVÍSSIMA APRECIAÇÃO

3.1. Eis as principais conclusões do requerimento da assistente:

a) Nos prazos legais de resposta, a ora reclamante apresentou o pedido de reclamação, aclaração e rectificação, (...) via e-mail de 9/11/2006.
b) Nos prazos determinados pelo art. 150.º do CPC (14/11/06), remeteu ao tribunal competente os originais;
c) O tribunal confirma que está na posse destes originais desde 14Nov.
d) Contudo, alega troca de conteúdo de e-mails a 9/11/2006 e quer aplicar uma multa de 356,00 euros.
e) Esclarecida a situação a 3 e 15 de Janeiro de 2007 (...);
f) O tribunal é irredutível e, por despacho de 18/1/2007, notificado via fax, quer dar o processo como findo, nunca respondendo às questões levantadas de aclaração e pedido de rectificação e reclamação de 9/11/20006 (...);
g) A ora reclamante, por tudo o exposto, não se pode conformar com tal decisão, que quer pôr, desta forma, termo a este processo, solicita por isso a sua revogação, sendo tais despachos revogados e substituídos por outro que reconheça como valido o e-mail de 9/11/2006 (...)

3.2. O e-mail de «9 de Novembro de 2006 9:59», apesar de anunciar remeter a juízo «reclamação do acórdão 3847/06-5», remeteu antes expediente relativo ao processo n.º 5601/06 da 5.ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa (v. fls. 228 a 234). E, como assim, bem se determinou, por despacho de 16Nov06, o desentranhamento dessas peças e, por não dizerem respeito aos autos, a sua devolução ao requerente.

3.3. Desse modo, a reclamação remetida a coberto da c/r de 14Nov06 - afinal não precedida nem de telecópia nem de válido e-mail – ter-se-ia de considerar (como se considerou) remetida a juízo no 2.º dia útil seguinte ao último do prazo (7).

3.4. Bem fez por isso a secção ao notificar a apresentante, por c/r de 21Nov06, para, até 04Dez06, «pagar multa de montante igual ao dobro da mais elevada prevista no n.º 5, sob pena de se considerar perdido o direito de praticar o acto» (cfr. art.s 107.5 do CPP e 145. 6 do CPC).

3.5. Todavia, a assistente, no último dia do prazo, limitou-se a remeter a juízo um e-mail que, apesar de anunciar um anexo «pedido de aclaração», não se fez acompanhar de qualquer anexo. E, se bem que um pedido de aclaração possa ser «enviado por correio electrónico» (art. 150.2.c do CPC), a verdade é que, no caso, o não foi.

3.6. Daí que a posterior reclamação de fls. 244 tivesse de haver-se – como, correctamente, se houve - como «entregue na secretaria judicial» na data que dele consta (07Dez06), ou seja, no 3.º dia posterior ao último do prazo [4Dez06] para o pedido de aclaração do despacho de fls. 239 (8).

3.7. Tratando-se, portanto, de requerimento tardio, bem andou a secretaria (9) ao emitir, em 14, «guias para pagamento [até 11Jan07] da multa a que se refere o n.º 6.º do art. 145.º do CPC».

3.8. Mas, apesar disso (e da cominação que acompanhou a respectiva notificação: cfr. fls. 252, 254, 257 e 259), a recorrente não pagou entretanto essa multa (cfr. informação de fls. 261).

3.9. Perante tal passividade, teria o relator - como realmente o fez no seu despacho de 16Jan07 (fls. 261 e verso) – de declarar perdido, nos termos dos art.s 107.5 do CPP e 145.6 do CPC, o direito que assistia à assistente, na condição (que não satisfez) de pagar a multa correspondente, de praticar, com atraso, o seu acto de reclamação de 14Nov06 (fls. 235 e ss.).


4. DECISÃO

4.1. Tudo visto, o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em conferência para apreciar o requerimento, de 29Jan07, da assistente AA, decide-se pela integral confirmação do despacho do relator que, em 16Jan07 (fls. 261 e verso), declarou perdido o direito que a ela assistia, na condição (que não satisfez) de pagar a multa correspondente, de praticar, com dois dias úteis de atraso, o seu acto de reclamação de 14Nov06 (fls. 235 e ss.).

4.2. Sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia, a requerente pagará as custas do incidente a que deu causa, com 4 (quatro) UC de taxa de justiça e 1 (uma) UC de procuradoria.


Lisboa, 22 de Fevereiro de 2007

Carmona da Mota
Pereira Madeira
Simas Santos
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(1) Ou seja, no 2.º dia útil seguinte ao último do prazo: 26Out + 3 dias úteis = 31Out + 10 = 10Nov + 2 dias úteis = 14Nov.
(2) Para além da afirmação do seu emissor, nada constava do e-mail (da responsabilidade do servidor) quanto à concomitante remessa de um anexo. Aliás, o próprio secretário de justiça confirmou não ter vindo «anexado qualquer pedido de aclaração».
(3) Aliás, dirigida ao processo n.º 3874/06, e não a este processo n.º 3847/06.
(4) 28, domingo.
(5) E, no caso, não se trata de «decisão proferida pela secção» (mas pelo relator) nem de «decisão proferida em 1.ª instância» (cfr. art. 11.3.a do CPP).
(6) «Quando a parte se considerar prejudicada por qualquer despacho do relator, que não seja de mero expediente, pode requerer que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão» (art. 700.3 do CPC)
(7) 26Out + 3 dias úteis = 31Out + 10 = 10Nov + 2 dias úteis = 14Nov.
(8) Notificado ao destinatário em 24Nov06, mediante c/r expedida no dia 21.
(9) «A secretaria, independentemente de despacho, notificará o interessado para pagar multa (...), sob pena de se considerar perdido o direito de praticar o acto» (art. 145.6 do CPC)