Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | NUNO GONÇALVES | ||
Descritores: | DECISÃO SINGULAR | ||
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Data da Decisão Sumária: | 03/21/2025 | ||
Votação: | - - | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECLAMAÇÃO - ARTIGO 405.º DO CPP | ||
Decisão: | INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO | ||
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Sumário : | I. É jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça que se inclui na dupla conforme do artigo 400.º n.º 1 al.ª f) do CPP, a confirmação da condenação in mellius. II. O Tribunal Constitucional tem julgado, invariavelmente, constitucionalmente conforme a interpretação da irrecorribilidade de acórdãos da Relação proferidos em recurso que “tenham aplicado pena de prisão não superior a 8 anos e inferior à que foi aplicada pelo tribunal de primeira instância, alterando uma parte da matéria de facto essencial á subsunção no tipo penal em causa”. | ||
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Decisão Texto Integral: |
Reclamação - artigo 405.º do CPP (n.º 52/2025) I - Relatório: O arguido AA foi condenado em 1.ª instância pela prática dos seguintes crimes: ----- - um crime de abuso sexual p. e p. pelo artigo 171.º, n.º 1, do CP, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão; - sete crimes de abuso sexual p. e p. pelo artigo 171.º, n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão por cada um dos crimes; - cinco crimes de abuso sexual de crianças p, e p, pelo artigo 171.º, n o 3, alínea b), do CP, na pena de 8 meses de prisão por cada; - um crime de pornografia de menores p. e p. pelos artigos 176.º, n.º 1, alínea b) e 177.º, n o 8 do CP, na pena de 2 anos de prisão. Em cúmulo jurídico destas penas parcelares foi condenado na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão. Foi ainda condenado nas penas acessórias previstas nos artigos 69.º - B, n.º 2 e 69.º- C, n.º 2, do C. Penal, pelo prazo de 7 anos e 6 meses em relação a cada um dos sobreditos crimes cometidos. Não se conformando, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 8 de janeiro de 2025, concedeu parcial provimento ao recurso e, alterando os pontos 18, 19 e 28 da matéria de facto provada, condenou o arguido pela prática de: - um crime de abuso sexual de criança, p. e p. pelo artigo 171.º, n.º 1, do CP, na pena de 2 anos de prisão; - sete crimes de abuso sexual p. e p. pelo artigo 171.º, n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de 4 anos de prisão por cada; - um crime de abuso sexual de crianças p. e p, pelo art 171.º, n o 3, alínea b), do CP, na pena de 6 meses de prisão; - um crime de pornografia de menores, p. e p. pelo artigo 176.º, n.º 1, alínea b), agravado pelo disposto no artigo 177.º, n.º 8, ambos do Código Penal, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão. Absolvendo-o dos restantes crimes por que vinha condenado. E, reformulado o cúmulo jurídico, condenou o arguido na pena única em 7 anos de prisão, a que acrescerão as penas acessórias fixadas pelo Tribunal a quo. Inconformado, interpôs o arguido AA, recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Recurso que não foi admitido por despacho de 19 de fevereiro de 2025, com fundamento nos artigos 432.º, n.º 1, alínea b) 433.º e 400.º n.º 1, alínea f), do CPP, tendo em conta que foi aplicada pena não superior a 8 anos de prisão e inferior à aplicada em 1.ª instância, referindo que a jurisprudência do STJ, vem considerando que é confirmatório da decisão da 1.ª instância o acórdão da Relação que, “in mellius”, mantém a condenação mas reduz a pena, e que também a jurisprudência do TC assim se tem pronunciado. O recorrente apresentou reclamação do despacho que não admitiu o recurso, nos termos do artigo 405.º do CPP, extraindo dela as seguintes conclusões: “2. (…) o Acórdão proferido em 2a Instância começou por efectuar uma "correcção do erro de escrita constante de fls. 13 do acórdão". 3. Seguidamente, (…) procedeu à alteração da redação dos factos provados n.ºs 18, 19 e 28. 4. Ainda, (…) com base num entendimento jurídico, e não apenas com a subsunção dos factos ao direito entendeu que o arguido tinha cometido um crime de abuso sexual de crianças previsto e punível pelo art. 171.º , n o 3 al. b) do Código Penal, ao invés de cinco crimes conforme tinha sido condenado na I a Instância, por se verificar, em suma, concurso aparente. 5. No que respeita ao crime de pornografia de menores, diz o douto Acórdão (…) recorrido: "Assim, ainda que por fundamentos diferentes, deve manter-se a condenação do arguido pelo crime de pornografia infantil." 6. No que respeita a medida da pena, o douto Acórdão recorrido, (…) entendeu fazer "alguns ajustes: alterando em consequência as diversas penas concretas aplicadas. 7. Assim, o douto Acórdão (…) alterou a matéria de facto provada, alterou a fundamentação jurídica quanto a dois tipos legais de crimes diferentes pelos quais o arguido foi condenado, e alterou a fundamentação quanto à medida de cada uma das penas. 8. De maneira que, em caso algum, poderá ser considerado confirmatório do Acórdão proferido em I a Instância, já que não confirma nem a matéria de facto provada, nem a fundamentação jurídica em diversos pontos do mesmo! 9. Portanto, dúvidas não há que em causa está um acórdão que de maneira alguma confirma a decisão de I a Instância, pelas razões supra apontadas. 10. Em face do exposto, o douto despacho proferido viola ou dá errada interpretação ao disposto nos artigos 11.º, 399.º, 400.º a contrario, e 432.º todos do CPP, sendo consequentemente nulo, nulidade essa que expressamente se invoca para os devidos efeitos legais, devendo consequentemente o recurso apresentado a fls. ser admitido, nos termos e com as consequências legais.” * Cumpre decidir: * II - Fundamentação: 1. No que é relevante para o conhecimento da reclamação, o arguido foi condenado em 1.ª instância na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão, pela prática dos crimes acima referidos. Em recurso, o Tribunal da Relação no respeitante aos 5 crimes de abuso sexual de crianças p, e p, pelo artigo 171.º, n.º 3, alínea b), do CP, pelos quais o arguido havia sido condenado, considerou que a conduta do arguido é absorvida por um só tipo de crime, entendendo que quatro dessas situações já estavam a ser punidas, nos termos do artigo 171.º, n.º 2, do CP, por via da regra da consumpção, condenando-o por 1 crime de abuso sexual de crianças p, e p, pelo artigo 171.º, n.º 3, alínea b), do CP. E também reduziu as penas parcelares aplicadas a cada um dos outros crimes pelos quais foi condenado. Reduzindo ainda a pena única aplicada que fixou em 7 anos de prisão. 2. O critério de admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça reporta-se à pena concretamente aplicada, ou seja, a pena em que o arguido foi condenado na decisão recorrida. A recorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões penais está prevista, específica e autonomamente, no artigo 432.º do CPP, dispondo a alínea b) do n.º 1 que se recorre “de decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas Relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º”. O artigo 400.º, n.º 1, alínea f), determina a irrecorribilidade de “acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a oito anos”. A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça é uniforme no sentido de que há dupla conforme também quando haja confirmação da condenação in mellius. Também assim o Tribunal Constitucional que, no Acórdão n.º 232/2018 decidiu “não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 400º n.º 1 alínea f), e 432º, n.º 1 alínea b), do Código de Processo Penal interpretados no sentido da irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça das decisões dos tribunais da relação que, sendo proferidos em recurso, tenham aplicado pena de prisão não superior a 8 anos e inferior à que foi aplicada pelo tribunal de primeira instância, alterando uma parte da matéria de facto essencial á subsunção no tipo penal em causa”. O que se verifica no caso presente, visto que o acórdão em causa absolveu o arguido de alguns crimes e reduziu as penas parcelares aplicadas a cada um dos crimes pelos quais foi condenado e também a pena única que fixou em 7 anos de prisão, sendo, pois, favorável ao arguido. Pelo que o recurso ordinário em 2.º grau, para o Supremo Tribunal de Justiça, não é admissível (artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP). 3. O reclamante invoca a nulidade do despacho ora reclamado. Porém não há que conhecer autonomamente desta questão. Uma vez que no âmbito da reclamação prevista no artigo 405.º, n.º 1, do CPP, os poderes de cognição do Presidente do tribunal ad quem cingem-se à confirmação ou revogação da decisão sobre a não admissibilidade ou a retenção indevida do recurso. A reclamação destina-se somente a reagir contra tal decisão ou a retenção de recurso interposto de decisão judicial. Quaisquer outras questões, incluindo a regularidade e a fundamentação da decisão que não admitiu o recurso, estão à margem da finalidade e do âmbito da reclamação. A decisão judicial que não admitiu ou reteve o recurso não admite recurso. A única via de reação é a reclamação. A confirmação da não admissão do recurso fecha definitivamente a via do recurso ordinário. * III - Decisão: 4. Pelo exposto, indefere-se a reclamação deduzida pelo arguido AA. Custas pelo reclamante fixando-se a taxa de justiça em 3 UCs. Notifique-se. * Lisboa, 21 de março de 2025 O Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça Nuno Gonçalves |