Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | VASQUES DINIS | ||
Descritores: | PROCESSO DISCIPLINAR NULIDADE COMPETÊNCIA DISCIPLINAR REESTRUTURAÇÃO DE EMPRESA DIREITOS DE DEFESA DO ARGUIDO CADUCIDADE DA ACÇÃO DISCIPLINAR SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO LEI INTERPRETATIVA PRESCRIÇÃO DA INFRACÇÃO | ||
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Nº do Documento: | SJ200606080037314 | ||
Data do Acordão: | 06/08/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
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Sumário : | I - O Supremo Tribunal de Justiça não pode conhecer de nulidades do acórdão da Relação, quando não tenham sido arguidas, expressa e separadamente, no requerimento de interposição do recurso, como impõe o n.º 1 do artigo 77.º do Código de Processo do Trabalho.
II - A competência para a instauração de processo disciplinar, atribuída ao Conselho de Administração pelo artigo 34.º, n.º 3, com referência aos artigos 10.º, n.º 5 e 6.º, n.º 1, alínea h), do Regulamento Disciplinar, aprovado pela Portaria n.º 348/87, de 28 de Abril - aplicável, por força dos n.os 1 e 2 da Cláusula 20.ª do Acordo de Empresa, celebrado em 17 de Maio de 1996, entre os Correios de Portugal, S.A. e o Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações de Portugal e outros, aos trabalhadores admitidos antes de 17 de Maio de 1992 - pode ser delegada, em face do disposto nos artigo 14.º, n.º 1, alínea g) e n.º 2, dos Estatutos dos Correios e Telecomunicações de Portugal, S.A., aprovados pelo Decreto-Lei n.º 87/92, de 14 de Maio. III - Não contraria o disposto naquele Regulamento a atribuição da referida competência, por Deliberação do Conselho de Administração, no âmbito da reestruturação dos Órgãos Centrais de Apoio do Conselho de Administração, à Direcção de Inspecção do Conselho de Administração, órgão no qual desempenhava funções o Inspector Superior, a quem, nos termos do n.º 4 do artigo 34.º do citado Regulamento, competia, igualmente, instaurar o procedimento disciplinar. IV - O prazo de caducidade, de 60 dias, referido no artigo 31.º, n.º 1, do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho (LCT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969, não começa a correr se a instauração do inquérito prévio ocorre no próprio dia em que o órgão com competência disciplinar teve conhecimento dos factos a averiguar, uma vez que, nos termos do artigo 10.º, n.os 11 e 12, do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo (LCCT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, aquele prazo suspende-se, não apenas, com a comunicação da nota de culpa ao trabalhador, mas também com a instauração de processo de inquérito prévio, desde que, mostrando-se necessário para fundamentar a nota de culpa, seja conduzido de forma diligente, não mediando mais de 30 dias entre a suspeita de existência de comportamentos irregulares e o início do inquérito, nem entre a sua conclusão e a notificação da nota de culpa. V - Justifica-se a realização de inquérito prévio, quando o apuramento concreto dos comportamentos irregulares denunciados - traduzidos na falta de cobrança, regular, periódica e frequente, de serviços prestados, ao longo de mais de um ano - envolve o exame minucioso de vasta documentação, com vista, designadamente, à determinação dos valores em falta, relativos a cada um dos serviços prestados, indispensável à formulação da nota de culpa. VI - Não se indicia falta de diligência na condução do inquérito, se entre a audição do arguido, em tal inquérito, e a produção de prova testemunhal, decorreram cerca de três meses e meio, período necessário à análise de documentação relativa à entrada no circuito dos CTT, para expedição, tratamento e distribuição, de 726 328 objectos, entre Agosto de 1999 e Outubro de 2000. VII - Em processo disciplinar laboral, dominado pelo princípio do inquisitório, não configura violação das garantias de defesa a falta de notificação do arguido e do seu mandatário para as diligências de inquirição de testemunhas oferecidas na resposta à nota de culpa, por isso que tal falta não determina a nulidade do processo, a que se refere a alínea b) do n.º 3 do artigo 12.º da LCCT, nem contraria o disposto nos artigos 20.º, n.º 2, 32.º e 208.º, todos da Constituição da República, e no artigo 54.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março. VIII - O prazo de 30 dias previsto no n.º 8 do artigo 10.º da LCCT não é um prazo peremptório que implique, se não observado, a caducidade da acção disciplinar, sendo apenas relevante para efeitos de apreciação da justa causa de despedimento. IX - Não tem natureza de lei interpretativa a disposição do artigo 415.º, n.º 1, do Código do Trabalho, na parte em que estabelece, como consequência da inobservância do prazo para proferir a decisão final no processo disciplinar, a caducidade do direito de aplicar a sanção. X - O prazo de prescrição da infracção, a que se refere o n.º 3 do artigo 27.º da LCCT, começa a correr, em caso de infracção de execução continuada ou permanente, a partir da prática do último acto que a integra, mas interrompe-se com a instauração do procedimento disciplinar, a que equivale a instauração de inquérito prévio, quando este se mostre necessário à elaboração da nota de culpa. XI - A interrupção da prescrição tem como consequência a inutilização do prazo decorrido até à prática do acto interruptivo, não começando a correr novo prazo, enquanto vigorar a suspensão operada pela instauração do procedimento disciplinar. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
I 1. "AA" intentou, no Tribunal do Trabalho de Almada, contra "Empresa-A.", acção pedindo: Alegou, em síntese, que: - Foi funcionária da Ré, entre 12 de Abril de 1982 e 25 de Junho de 2002, data em que foi despedida após instauração de processo disciplinar com tal fim; Frustrada, na audiência preliminar, a conciliação das partes, a Ré contestou, a pugnar pela improcedência da acção, para o que, em resumo, alegou que: - Não decorreu o invocado prazo de prescrição; Na primeira instância, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo a Ré sido condenada a reintegrar a Autora ao seu serviço, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, bem como a pagar-lhe a quantia global de € 7.709,84 (sete mil setecentos e nove euros e oitenta e quatro cêntimos), correspondente a Esc.: 1.545.684$00 (um milhão quinhentos e quarenta e cinco milhares seiscentos e oitenta e quatro escudos) referente às retribuições entretanto vencidas e não pagas, acrescidas de juros de mora, contados à taxa legal, desde o dia em que as retribuições eram devidas, até integral pagamento, e tendo sido absolvida do demais peticionado. Inconformada, a Ré apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, concedendo provimento ao recurso, a absolveu do pedido. Desta decisão vem interposto, pela Autora, o presente recurso de revista, cuja alegação termina com as conclusões assim redigidas: 1. O douto Acórdão recorrido enferma de nulidade por excesso de pronúncia, na medida em que o Tribunal da Relação baseou o sua decisão em documentos cuja junção aos autos não era admissível e que deveriam ter sido desentranhados. 2. Enferma, ainda, de nulidade por omissão de pronúncia, por não se ter pronunciado sobre questões que devia conhecer e que se prendiam com o facto de terem decorrido mais de 30 dias entre a data da realização da última diligência probatória e a data da notificação à trabalhadora da decisão final do processo disciplinar e com o direito aos proporcionais devidos pela cessação do contrato de trabalho. 3. O douto Acórdão recorrido assenta em documentos juntos aos autos apenas com as alegações de recurso. 4. O art. 706.º do CPC, dispõe que "As partes podem juntar documentos às alegações, nos casos excepcionais a que se refere o art. 524.º CPC ou no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância". 5. Nos termos do art. 524.º do CPC "Depois do encerramento da discussão só são admitidos nos casos de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento". 6. É entendimento jurisprudencial e doutrinário unânimes que é à entidade patronal que incumbe o ónus da prova dos factos integradores da justa causa do despedimento imposto ao trabalhador e a existência e regularidade do processo. 7. A apelante não alegou nem provou, em 1ª instância, que o processo disciplinar instaurado o tenha sido a mando de quem tinha competência para o efeito. 8. Depois do encerramento da discussão em 1ª instância só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento. 9. A apelante não alegou sequer que essa apresentação não tinha sido possível até aquele momento, não sendo de conceber tal possibilidade por se tratarem de documentos da sua autoria, datados de 1987 e 1993, 10. A apresentação desses documentos com as alegações foi extemporânea, pelo que o Tribunal da Relação devia ter mandado desentranhar os mesmos. 11. O processo disciplinar padece de nulidade por não ter sido instaurado por pessoa/entidade com competência para o efeito. 12. As normas provenientes da contratação colectiva de trabalho, como é o caso do Regulamento Disciplinar dos CTT, não podem ser ultrapassadas ou contrariadas por regulamentos ou despachos internos, (art. 7.º do D.L. n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro). 13. É entendimento doutrinário e jurisprudência dominante que o direito do contraditório não se esgota com a audição do arguido. 14. Levando em conta a gravidade das acusações feitas, deveria ter sido possibilitado ao mandatário da A. assegurar-se da regularidade da inquirição, assim como, da veracidade da redução a escrito da mesma, até porque esta inquirição é levada a cabo pela própria entidade patronal, para a qual laboram, também, as testemunhas arroladas. 15. A falta de notificação do arguido e do seu mandatário para a diligência de inquirição das testemunhas arroladas na defesa constitui causa de nulidade do processo disciplinar, por violar o princípio do contraditório. 16. Ainda que assim não se entendesse sempre teria de ser considerada a prescrição da infracção disciplinar e caducidade do processo, nos termos dos arts. 27.º, n.º 3 e 31.º, n.º 1 da LCT. 17. O processo disciplinar esteve, por culpa da R., parado por períodos superiores a 60 dias o que por si só implicaria também a caducidade do processo disciplinar. 18. A decisão do processo disciplinar foi proferida fora do prazo estabelecido no art. 10.º, n.º 8 do DL n.º 64-A/89, de 27/02, facto que, atendendo em especial à redacção do art. 415.º do CT não pode deixar de inquinar o processo disciplinar. 19. Verificando-se a ruptura do vínculo contratual e independentemente da existência ou inexistência de justa causa de despedimento, sempre a A, teria direito a receber os respectivos proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal. 20. O Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, assenta numa errada e distorcida aplicação do direito aos factos e fundamenta-se em factos que não estão demonstrados nos autos, violando o disposto no art. 712.º do CPC e fazendo uma interpretação errónea do art. 706.º do CPC, art. 7.º do D.L. 519- -C1/79, de 29 de Dezembro e dos arts. 20.º, 32.º e 208.º todos da CRP, o art. 10.º do D.L. 874/76, de 28 de Dezembro e o art. 10.º, n.º 8 do DL 64-A/89 de 27-02. Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o douto Acórdão da Relação de Lisboa e confirmando a decisão da 1.ª instância, como é de inteira JUSTIÇA! A Ré contra-alegou para sustentar a manutenção do julgado. Neste Supremo Tribunal, a Exma. Magistrada do Ministério Público emitiu douto parecer, no sentido de ser negada a revista, parecer que não mereceu resposta de qualquer das partes. 2. Nas conclusões da alegação, que delimitam o objecto do recurso, suscita a Autora as seguintes questões: 1.ª - Nulidade do acórdão recorrido; 2.ª - Nulidade do processo disciplinar; 3.ª - Caducidade do processo disciplinar; 4.ª - Prescrição da infracção disciplinar. Corridos os vistos, cumpre decidir. II 1. Quanto à primeira das questões enunciadas, diz a recorrente - nas conclusões 1. a 10. da sua alegação - que o acórdão enferma de nulidade, por violação do disposto no artigo 668.º n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, porque, por um lado, conheceu de questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) - assentando a decisão em documentos apresentados extemporaneamente, que deveriam ter sido mandados desentranhar -, e, por outro lado, não conheceu de questões que estava obrigada a apreciar (omissão de pronúncia) - não tendo apreciado a questão da caducidade do procedimento disciplinar, consequência do decurso de mais de 30 dias entre a data da realização da última diligência probatória e a data da notificação, à Autora, da decisão final, nem o alegado direito da Autora a receber da Ré proporcionais de férias, subsídios de férias e de Natal, em virtude da cessação do contrato. Cumpre observar que, nos termos do artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, as nulidades da sentença devem arguidas, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso. De harmonia com a jurisprudência estabilizada e pacífica deste Supremo, tal disposição é aplicável ao recurso de revista, pelo, que não sendo cumprida a imposição daquele preceito - cuja finalidade é permitir ao tribunal recorrido, antes de o recurso subir, pronunciar-se sobre as invocadas irregularidades do acórdão e, eventualmente, supri-las -, não pode tomar-se conhecimento de nulidades imputadas, na alegação do recurso, ao acórdão da relação (1). É esse o caso dos autos, em que, examinado o requerimento de interposição da revista (fls. 1354), se constata que a Autora não faz nele qualquer referência às alegadas nulidades, pelo que delas não poderá conhecer-se, já que só na alegação de recurso elas foram arguidas. 2. O acórdão impugnado declarou, nos termos que se transcrevem, provados os seguintes factos: 1. A A foi admitida ao serviço da R, para laborar sob as suas ordens, direcção e fiscalização, em 12 de Abril de 1982. 2. Ultimamente possuía a categoria profissional de chefe de estação. 3. Laborando na estação de Correios de S. João de Brito. 4. E auferindo mensalmente a quantia de € 1.363,21, acrescida de € 126,30 a título de diuturnidades e de € 158,76 relativos a subsídio de refeição. 5. Após a sua admissão na R, a A fez o devido estágio em estação dos CTT. 6. Em 11 de Setembro 1982 terminou o estágio com boa classificação, o que lhe permitiu a escolha de estação. 7. Em 1984 é colocada na Estação do Areeiro, em Lisboa. 8. O trabalho desenvolvido nos anos de 1984 a 1987 é reconhecido com a entrega, pela entidade patronal, da Medalha de Ouro das Colecções Philae. 9. Em 1987 são-lhe entregues os Serviços de Exactoria - Contabilidade da Estação - apesar de ser a funcionária mais nova. 10. Em 1989 é-lhe entregue a chefia da Estação, em substituição da titular, que se verificou durante 6 meses. 11. Em 1990 é convidada para chefiar uma estação, tendo a sua chefe da altura recomendado, superiormente, o cancelamento do convite por ser necessária a continuação dos seus serviços ali. 12. Nesse ano é-lhe atribuído um prémio por bons serviços prestados. 13. Em 1991 muda para a letra H e mais uma vez é premiada a sua boa prestação de serviços. 14. Em 1992 é elogiado e premiado o seu serviço por missiva expressa. 15. Nesse mesmo ano é convidada pela Direcção dos CTT para chefiar uma estação e preparar uma equipa para esse efeito, tendo-lhe sido concedido em 1 de Setembro de 1992 um prémio por bons serviços. 16. Em Outubro de 1992 frequentou um Curso de Chefia com 1.500 alunos, tendo obtido o 4.° lugar e a letra C/Comercial. 17. É de imediato colocada a chefiar a Estação da EC de S. João de Brito, em Lisboa. 18. Em 1993 são-lhe concedidos 2 prémios, um dos quais o prémio de produtividade da Estação. 19. Em 1994, é-lhe concedido um novo prémio e mudança para a letra I. 20. Posteriormente é-lhe atribuída a letra K. 21. Mercê do seu trabalho e da sua equipa, a Estação passou de nível 0 para o nível 5. 22. A A foi sempre uma trabalhadora eficiente, assídua, disciplinada, honesta e zelosa no seu serviço. 23. Durante 19 anos e até ao presente nunca foi passível da mais leve sanção por parte das suas chefias, nem de uma mera censura ou advertência. 24. Às relações disciplinares da Ré e dos seus trabalhadores admitidos antes de 19 de Maio de 1992 aplica-se o Regulamento Disciplinar aprovado pela Portaria n.º 348/87, de 28 de Abril, ao abrigo do disposto no artigo 26.º do Estatuto anexo ao Decreto-Lei n.º 49 368 e cláusula 20 do Acordo de Empresa publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 21, de 8 de Junho de 1996 (revisão do AE). 25. Por carta datada de 28 de Janeiro de 2002, que a A recebeu no dia 30 de Janeiro, a R comunicou à A a intenção de proceder ao seu despedimento com justa causa disciplinar, tendo enviado a respectiva nota de culpa, que se mostra junta de fls. 14 a 17 e cujo teor damos aqui por integralmente reproduzido. 26. Na mencionada nota de culpa a A é acusada de favorecimento ilegítimo de um cliente, causando prejuízos sérios à empresa no período compreendido entre Agosto de 1999 e 23 de Outubro de 2000. 27. A A apresentou a sua defesa por escrito, em 13 de Fevereiro do mesmo ano, conforme requerimento junto de fs. 18 a 23, dando-se aqui por inteiramente reproduzido o respectivo teor. 28. Por decisão datada de 20 de Junho de 2002, à A foi aplicada a pena de despedimento. 29. Os senhores BB, CC e DD, pertencentes à Direcção de Auditoria da Ré, remeteram, no dia 10 de Agosto de 2001, à Direcção de Auditoria a participação de ocorrência, a qual está junta de fs. 25 a 28 e cujo teor se dá aqui por totalmente transcrito, acompanhado dos documentos que estão juntos de fs. 83 a 214. 30. A Direcção de Auditoria, no próprio dia 10, remete tal participação de ocorrência à Direcção de Inspecção. 31. A Direcção de Inspecção dos CTT, órgão com competência disciplinar na empresa ora Ré, no mesmo dia 10, nomeia a Dr.ª EE e a Eng.ª FF instrutoras do processo disciplinar contra a ora A. 32. Em 03 de Setembro de 2001, no âmbito do processo disciplinar, é ouvida a arguida, ora A. 33. A A foi suspensa preventivamente em 4 de Setembro de 2001. 34. Então, face ao contexto da documentação existente e das declarações da arguida, é realizado um trabalho de análise e confronto de documentos, nomeadamente elementos contabilísticos da Estação de Correios no período de Agosto de 1999 a Outubro de 2000, que integra toda a documentação que se encontra junta de fls. 301 a 1115. 35. De 7 de Dezembro de 2001 a 21 de Dezembro de 2001 são ouvidos trabalhadores dos CTT, junto registo disciplinar e biográfico da arguida e, em 28 de Janeiro de 2002, é formulada acusação contra a arguida. 36. Nem a A, nem o seu mandatário, foram notificados da inquirição por parte da R das testemunhas arroladas em sua defesa. 37. Em cumprimento do estatuído no artigo 45.° do Regulamento Disciplinar dos CTT, anexo à Portaria n.º 348/87, de 28 de Abril, foi enviada, no dia 17 de Abril de 2002, cópia do processo disciplinar à Comissão de Trabalhadores, para a mesma emitir parecer fundamentado. 38. Em 24 de Abril de 2002, a Comissão de Trabalhadores informou os CTT que decidia não emitir parecer. 39. Em 26 de Abril de 2002, foi ordenada a remessa do processo disciplinar ao Conselho Disciplinar, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do artigo 46.º do supra referido Regulamento Disciplinar. 40. Processo que, por despacho do presidente do Conselho Disciplinar, foi disponibilizado aos restantes membros daquele Conselho e para consulta da A e respectivo advogado constituído. 41. Conselho Disciplinar que, em 27 de Maio de 2002, por unanimidade «emitiu o parecer de ao arguido», ora A, «ser aplicada a pena de despedimento». 42. A A foi notificada da decisão proferida no processo disciplinar em que era arguida no dia 2 de Julho de 2002. 43. No período compreendido entre Agosto de 1999 e 23 de Outubro de 2000, no exercício das suas funções de Chefe da Estação de S. João de Brito, em Lisboa, aproveitando-se das particulares funções de chefia, a Autora permitiu que o cliente Empresa-B - usando como remetente várias denominações, nomeadamente Prima Dona, Golden Bust, C.I.Dep. Divulgação, Phitonature, Inst. Pierre Laurent, Xinax Carta, Kosmética Directo e D.A.C. Decor Arte e Colecção - expedisse correspondências Direct Mail (DM) em regime de avença ocasional sem efectuar o correspondente pagamento. 44. A A dava instruções aos coadjuvantes que aceitavam as correspondências deste cliente - sem a apresentação da Guia de Avença descritiva das quantidades entregues e sem o respectivo pagamento - para procederem à pesagem dos contentores vazios e cheios e ainda à pesagem de um exemplar-tipo, anotarem estes valores num papel que entregavam à A. 45. O cliente Empresa-B na Estação de Correios de S. João de Brito fazia entregas de grandes quantidades de correspondência, por vezes duas e três vezes por dia. 46. A A não cobrava o respectivo preço nem foi escriturado qualquer movimento correspondente, de preço, de quantidade ou de entregas. 47. O Modelo A é o modelo contabilístico da escrita diária da estação de correios e que, no código 230 reflecte os valores da cobrança ocasional, no código 310 as avenças Direct Mail e no código 311 as avenças correio contacto. 48. Modelos A que são numerados sequencialmente durante o ano, como se vê no canto superior direito de todos os modelos A do período de Agosto de 1999 a finais de Outubro de 2000. 49. No período entre Agosto de 1999 e Outubro de 2000 foram verificados todos os valores lançados nos referidos modelos - códigos referidos - confrontando-os com todos os documentos. 50. Não há vestígios das efectivas grandes quantidades de correspondências que o cliente Empresa-B entregava na estação. 51. A A nunca cobrou do cliente as importâncias devidas pela expedição dos objectos, não tendo preenchido qualquer documento ou elemento contabilístico que reflectisse as expedições do cliente da Ré. 52. Em Agosto de 1999, com o remetente Phytonature, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, 10.445 objectos com o peso unitário de 13 gramas a que corresponde uma taxa unitária de Esc.: 37$00, o que representa um valor total de Esc.: 386.465$00. 53. Em Agosto de 1999, com o remetente Kosmética Directo, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em três entregas, respectivamente 1.784, 36.100, 45.000 objectos com o peso unitário respectivamente de 54, 50 e 50 gramas, a que corresponde uma taxa unitária respectivamente de Esc. 48$00, Esc. 46$$00 e Esc. 46$00, o que representa um valor total de Esc. 3.816.232$00. 54. Ainda em Agosto de 1999, com o remetente Xinax Carta, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, 37.084 objectos com o peso unitário de 22 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 42$00, o que representa um valor total de Esc. 1.557.528$00. 55. Em Novembro de 1999, com o remetente Golden Bust, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em 5 entregas, respectivamente 15.200, 13.950, 14.100, 11.550 e 13.100 objectos, com o peso unitário de 20 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 38$00, o que representa um valor total de Esc. 2.580.200$00. 56. Nos dias 11 e 28 de Fevereiro de 2000, com o remetente Golden Bust, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em duas entregas, 19.995 e 19.995, objectos com o peso unitário de 20 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 38$00, o que representa um valor total de Esc. 1.519.620$00. 57. Ainda em Novembro de 1999, com o remetente D.A:C., a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em 6 entregas, respectivamente 15.810, 15.095, 14.476, 3.429, 9.905 e 4.237 objectos, com o peso unitário de 21 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 43$00, o que representa um valor total de Esc. 2.706.936$00. 58. Em Dezembro de 1999, com o remetente Institut Pierre Laurent, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em três entregas, respectivamente 883, 10.000 e 10.000 objectos, com o peso unitário de 34 gramas, a que corresponde uma taxa unitária respectivamente de Esc. 125$00, Esc. 44$00 e Esc. 44$00, o que representa um valor total de Esc. 990.375$00. 59. Nos dias 7 e 22 de Janeiro de 2000, com o remetente Institut Pierre Laurent, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em duas entregas, respectivamente 10.000 e 10.242 objectos, com o peso unitário de 34 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 45$00, o que representa um valor total de Esc. 910.890$00. 60. Nos dias 10, 12, 13, 14, 17 e 17 de Julho de 2000, com o remetente Institut Pierre Laurent, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em seis entregas, respectivamente 11.802, 10.923, 10.540, 11.526, 10.710 e 5.678 objectos, com o peso unitário de 34 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 45$00 o que representa um valor total de Esc. 2.753.055$00. 61. Nos dias 22, 23, 24, 25, 28, 29, 31 e 31 de Agosto de 2000, com o remetente Institut Pierre Laurent, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em 9 entregas, respectivamente 14.535, 9.226, 9.226, 9.065, 9.742, 8.226, 8.065, 13.226 e 3.516 objectos, com o peso unitário de 31 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 45$00, o que representa um valor total de Esc. 3.817.215$00. 62. Nos dias 2, 8, 10, 11 de Agosto de 2000, com o remetente Dermabust, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em quatro entregas, respectivamente 11.615, 10.038, 16.307 e 4.423 objectos, com o peso unitário de 26 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 43$00, o que representa um valor total de Esc. 1.822.469$00. 63. Nos dias 19, 20, 21, 25, 26 e 27 de Setembro de 2000, com o remetente C.B.L., a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em seis entregas, respectivamente 6.523, 7.456, 7.206, 9.521, 7.530 e 4.603 objectos com o peso unitário respectivamente de 67, 68, 68, 48, 48, 68 e 68 gramas, a que corresponde uma taxa unitária respectivamente de Esc. 51$00, Esc. 51$00, Esc. 51$00, Esc. 47$00, Esc. 48$00, Esc. 68$00 e Esc. 68$00, o que representa um valor total de Esc. 2.146.705$00. 64. Em 3 de Outubro de 2000, com o remetente C.B.L., a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em quatro entregas, respectivamente 7.368, 7.147, 6.588 e 5.632 objectos, com o peso unitário de 68 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 51$00, o que representa um valor total de Esc. 1.363.485$00. 65. Em 22 de Setembro de 2000, com o remetente Prima Dona, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, 9.313 objectos com o peso unitário de 48 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 47$00, o que representa um valor total de Esc. 437.711$00. 66. Em 4 de Outubro de 2000, com o remetente C.I. Dep. Divulgação, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, 3.767 objectos, com o peso unitário de 30 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 43$00, o que representa um valor total de Esc. 161.981$00. 67. Em 19 de Outubro de 2000, com o remetente C.I. Dep. Divulgação, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em quatro entregas, respectivamente 12.900, 12.333, 11.900, 1.565 objectos, com o peso unitário de 30 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 43$00, o que representa um valor total de Esc. 1.664.014$00. 68. Em 20 de Outubro de 2000, com o remetente C.I. Dep. Divulgação, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em oito entregas, respectivamente 9.733, 9.933, 9.765, 10.500, 7.600, 9.533, 10.700 e 10.000 objectos, com o peso unitário de 30 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 43$00, o que representa um valor total de Esc. 3.343.852$00. 69. Em 23 de Outubro de 2000, com o remetente C.I. Dep. Divulgação, a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em duas entregas, respectivamente 10.233 e 10.667 objectos, com o peso unitário de 30 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 43$00, o que representa um valor total de Esc. 898.700$00. 70. Com o remetente C.B.L., a A permitiu que entrassem no circuito dos CTT para expedição, tratamento e distribuição, em quatro entregas, respectivamente 10.000, 10.935, 10.161 e 5.387 objectos, com o peso unitário de 31 gramas, a que corresponde uma taxa unitária de Esc. 45$00, o que representa um valor total de Esc. 1.641.735$00. 71. Com esta actuação a A beneficiou o cliente Empresa-B em Esc. 34.350.568$00 (Trinta e quatro milhões, trezentos e cinquenta mil quinhentos e sessenta e oito escudos), valor correspondente à totalidade das taxas dos objectos que entraram na rede da R e que foram entregues aos respectivos destinatários. 72. Com o comportamento da A, a Ré teve um prejuízo correspondente a Esc. 34.350.568$00, valor dos portes dos referido objectos, correspondências de DM. 73. Todos os objectos referidos, correspondências de Direct Mail, deram entrada na Estação de Correios de S. João de Brito, em Lisboa e, por indicação da A, os coadjuvantes pesavam os contentores vazios, os contentores cheios da correspondência e cada um dos exemplares-tipo de cada uma das entregas. 74. Valores que anotavam em notas manuscritas pelos mesmos e que estes entregavam à A. 75. Os coadjuvantes da A assim procederam no período entre Agosto de 1999 e Outubro de 2000. 76. A Autora apesar de proceder ao cômputo dos valores a pagar pelo cliente relativamente a cada uma das entregas, nunca cobrou do cliente os respectivos valores. 77. O cliente Empresa-B era apenas um dos vários clientes de avença ocasional, entre outros, tais como Credicontrato, Sar Publicidade, APG, Pakard, Tyssen, Óptica Areeiro. 78. Os CTT disponibilizam aos seus clientes, entre outras, a designada Avença Global por Valor que, em traços gerais, representa a formalização por escrito de contrato após despacho superior que é proferido após análise de risco do cliente, e que, sendo aceite, vai possibilitar a prestação de serviços a crédito. 79. A designada «cobrança ocasional» é caracterizada pelo pagamento imediato dos serviços, isto é, contra a aceitação pelos CTT da respectiva correspondência a expedir. 80. A A. conhecia bem as regras de funcionamento da cobrança ocasional, como de todos os restantes serviços, regras que cumpria relativamente a todos os clientes de avença ocasional e que ignorou por completo relativamente ao cliente Empresa-B. 81. Relativamente aos clientes de cobrança ocasional, os valores dos objectos eram cobrados e os respectivos valores dados como cobrados no código 230, os valores de avença DM no código 310 e os valores de avenças de correio contacto no código 311, todos do Modelo A. 82. O que a A não fez, como se verificou repetidamente e em relação a todas as entregas do cliente Empresa-B referidas, já que a A não cobrou o respectivo valor e consequentemente não ficou reflectido no Modelo A. 83. A avença ocasional tem como suporte a guia de aceitação preenchida pelo cliente onde se indica a data e a quantidade a expedir, procedendo-se ao cálculo das respectivas importâncias e conferência das respectivas quantidades. 84. Ora, os coadjuvantes da A faziam, por indicação desta, o cálculo das respectivas importâncias e o controle de quantidades mas a A não exigia a guia de aceitação e não procedia à cobrança dos respectivos valores, permitindo a entrada na rede dos CTT de um grande volume de correspondência sem o pagamento do respectivo preço. 85. Os coadjuvantes da A aceitavam a correspondência do cliente Empresa-B de acordo com as instruções dadas pela A. 86. Na Estação de Correios de S. João de Brito nunca o cliente Empresa-B teve qualquer contrato de avença global por valor. 87. Aliás, a própria A, em 1998, propôs à Direcção Comercial de Lisboa, para o cliente Empresa-B, o regime da Avença Global por Valor, o que foi indeferido não tendo, por isso, sido autorizado a prestação de serviços a crédito àquele cliente. 88. O que foi comunicado à A, tal como lhe foi comunicado que tal decisão resultava do não cumprimento pelo cliente de contrato anterior na estação de correios de Arroios, na qual mantinha débitos muito elevados. 89. Situação que levou a que o cliente Empresa-B pudesse apenas expedir correspondências a pronto pagamento. 90. No ano de 2000, ao cliente Empresa-B apenas foi recebida a quantia de Esc. 87.410$00, no dia 20 de Outubro. Não havendo fundamento para censurar a decisão do tribunal recorrido, no que diz respeito à matéria de facto, já porque tal decisão não vem impugnada, já porque não ocorre qualquer das situações que autorizam o Supremo a alterá-la ou a determinar a sua ampliação (2), é com base no quadro factual supra definido que hão-de ser resolvidas as questões relativas à nulidade e caducidade do processo disciplinar e à prescrição da infracção. 3. Para sustentar a nulidade do processo disciplinar, argumenta a Autora que, por um lado, ele não foi mandado instaurar por pessoa ou entidade com competência para o efeito e, por outro lado, foi, por violação do princípio do contraditório, preterido o direito de defesa, uma vez que nem ela nem o seu mandatário foram notificados para a diligência de inquirição das testemunhas arroladas pela defesa. É incontroverso que ao caso é aplicável o Regulamento Disciplinar aprovado pela Portaria n.º 348/87, de 28 de Abril, em face do disposto nos n.os 1 e 2 da Cláusula 20.ª do Acordo de Empresa celebrado, em 17 de Maio de 1996, entre os Empresa-A. e o SNTCT - Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª Série, n.º 21, de 8 de Junho de 1996. (3) Aquele Regulamento atribui competência, para instaurar ou mandar instaurar processos disciplinares por infracções puníveis com sanção de despedimento, ao Conselho de Administração e ao Inspector Superior (4). Convém ter presente que tal diploma foi editado, ao abrigo do disposto no artigo 26.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 49 368, de 10 de Novembro de 1969, que criou a empresa pública Correios e Telecomunicações de Portugal (CTT), com vista a regulamentar o exercício do poder disciplinar sobre os respectivos trabalhadores. Antes da publicação da referida Portaria n.º 348/87, foram reestruturados os Órgão Centrais de Apoio do Conselho de Administração, entre os quais a Direcção de Inspecção do Conselho de Administração (DINCA), nesta integrando os Serviços de Inspecção dos CTT, conforme Ordem de Serviço de 12 de Fevereiro de 198 (5), tendo, em 11 de Junho de 1987, sido nomeado o Inspector Superior dos CTT, para exercer funções na DINCA (fls. 1257). À DINCA foi, na deliberação do Conselho de Administração que procedeu à reorganização dos serviços, atribuída competência exclusiva para a instrução de processos respeitantes a infracções indiciariamente puníveis com a pena de despedimento [ponto 2.3., a) da Ordem de Serviço]. A mesma deliberação estabelece que os inquéritos e processos disciplinares podem ser realizados por determinação do Conselho de Administração ou dos seus membros, ou por solicitação dos Directores-Gerais, Directores de Coordenação, Directores dos Órgão e Serviços Centrais de Apoio, entre outros [ponto 2.4., alíneas a) e b), da Ordem de Serviço]. O Decreto-Lei n.º 87/92, de 14 de Maio, transformou os CTT em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e aprovou os respectivos Estatutos, nos quais se atribui ao Conselho de Administração competência para "[estabelecer a organização técnico-administrativa da sociedade e as normas de funcionamento interno", e se prevê que "[o] conselho de administração poderá delegar nalgum ou alguns dos seus membros ou em comissões especiais alguma ou alguma das suas competências" (6). Após a criação, por cisão simples, da Telecom Portugal, S.A., operada pelo Decreto-Lei n.º 277/92, de 15 de Dezembro, ocorreu nova reestruturação orgânica dos CTT, na sequência da qual, as competências, em matéria disciplinar, foram atribuídas à Direcção de Inspecção (INSP), conforme Ordem de Serviço n.º 53/93, de 28 de Dezembro de 1993 (7), destacando-se a de "analisar todas as participações remetidas à INSP e propor, em tempo oportuno, a sua distribuição às áreas de Investigação ou Instrução Central ou Local" [ponto 3.2., alínea a), da Ordem de Serviço]. Resulta do exposto que as competências do Inspector Superior, face à primeira remodelação da orgânica da empresa, não podiam deixar de ser exercidas no âmbito da Direcção de Inspecção do Conselho de Administração (DINCA), o que significa que a competência para mandar instaurar o procedimento disciplinar, conferida pelo Regulamento ao titular do cargo de Inspector Superior, se comunicou ao Órgão Central de Apoio ao Conselho de Administração - que passou a integrar - e, pois, ao respectivo Director, como responsável máximo de tal órgão. Como, bem, se observa no douto acórdão recorrido, "nada obsta a que as empresas possam reestruturar os seus serviços e alterar as respectivas denominações", o que, no caso foi operado ao abrigo de disposições legais de nível hierárquico superior ao do instrumento de regulamentação colectiva que integrou as normas do citado Regulamento Disciplinar, sem que se possa afirmar que a referida atribuição de competências colida com o nele definido - ultrapassando-o ou contrariando-o -, de modo a restringir as garantias dos trabalhadores. Conclui-se, pois, que o processo disciplinar foi mandado instaurar por quem tinha competência para tal, não se mostrando violado o disposto no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 519-C/1, de 29 de Dezembro. 3.2. Segundo a recorrente, a falta de notificação do mandatário constituído, em processo disciplinar laboral, pelo trabalhador arguido, para a realização das diligências probatórias, configura violação dos mais elementares direitos de defesa, tornando o processo nulo, nos termos do artigo 12.º, n.º 3, do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo (LCCT) (8) , invocando o disposto nos artigos 20.º, n.º 2, 32.º e 208.º, todos da Constituição da República, e no artigo 54.º do Estatuto da Ordem dos Advogados(9) . O n.º 2 do artigo 20.º da Constituição dispõe que "[todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade"; o artigo 208.º do mesmo diploma prescreve que "[a] lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial à administração da justiça" e o n.º 1 do artigo 54.º do Estatuto da Ordem dos Advogados dispõe que "[o] mandato judicial, a representação e a assistência por advogado são sempre admissíveis e não podem ser impedidos perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada, nomeadamente para a defesa de direitos, patrocínio de relações jurídicas controvertidas, composição de interesses ou em processos de mera averiguação, ainda que administrativa, oficiosa ou de qualquer outra natureza"; e, nos termos do artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, "em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e defesa". Face a estas disposições, não se duvida de que o arguido, em processo disciplinar laboral, tem a faculdade de ser assistido e fazer representar-se por advogado, para fazer valer os direitos de audiência e de defesa, os quais hão-de ser garantidos por formalidades minimamente indispensáveis ao exercício do contraditório. O modo de exercício, pessoalmente ou através de mandatário, daqueles direitos está regulado no artigo 10.º da LCCT, que, além de conferir ao arguido prazo para consultar o processo, responder por escrito à nota de culpa e oferecer provas (n.º 4), obriga a entidade empregadora a realizar as diligências de prova requeridas na resposta à nota de culpa (n.º 5). A tal se reduz o exercício do contraditório (10), o que bem se compreende num processo dominado pelo princípio do inquisitório, em que a funções acusatória, instrutória e decisória estão atribuídas à mesma entidade, que, sendo titular do poder disciplinar, é, também, interessada no resultado do processo. Isto explica que a garantia dos direitos de audiência e de defesa, em processo disciplinar laboral - cuja estrutura inquisitória não colide com qualquer norma ou princípio constitucional -, não contemple a faculdade de intervenção ou presença do arguido ou do seu mandatário no acto de produção de prova testemunhal, do que resulta a inexigibilidade da notificação para uma tal diligência. E, assim, da falta dessa notificação não decorre a nulidade do processo cominada no artigo 12.º, n.º 3, alínea b), da LCCT, referida à inobservância dos direitos de audiência e de defesa reconhecidos nos n.os 4 e 5 do artigo 10.º do mesmo diploma (11), nem a violação do disposto nos artigos 20.º, n.º 2, 32.º e 208.º, da Constituição da República, e no artigo 54.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 84/84, de 16 de Março. 4. A terceira questão, suscitada no recurso, é a de saber se ocorreu a caducidade do procedimento disciplinar. Dispõe o n.º 1 do artigo 31.º do Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho (LCT) (12) que "[o] procedimento disciplinar deve iniciar-se nos sessenta dias subsequentes àquele em que a entidade patronal, ou o superior hierárquico com competência disciplinar, teve conhecimento da infracção". O referido prazo de 60 dias suspende-se, quer com a comunicação da nota de culpa (artigo 10.º, n.º 11, da LCCT), quer com a instauração de processo prévio de inquérito, "desde que, mostrando-se necessário para fundamentar a nota de culpa, seja iniciado e conduzido de forma diligente, não mediando mais de 30 dias entre a suspeita de existência de comportamentos irregulares e o início de inquérito, nem entre a sua conclusão e a notificação da nota de culpa" (artigo 10.º, n.º 12, da LCCT). Alega a recorrente que "o processo esteve parado 93 dias", entre 4 de Setembro de 2001 e 7 de Dezembro de 2001, e que "processo disciplinar esteve, por culpa da R., parado por períodos superiores a 60 dias". Essa alegação não tem suporte factual, pois que, da matéria de facto provada resulta que: - No próprio dia 10 de Agosto de 2001, em que o órgão com competência disciplinar teve conhecimento da eventual existência de irregularidades cometidas pela Autora, foram nomeadas duas instrutoras para o processo disciplinar (pontos 29, 30 e 31 da decisão sobre a matéria de facto); Como, bem, se observa no douto acórdão recorrido, face ao número de documentos a analisar, não pode deixar de considerar-se necessária a realização do inquérito, por indispensável à formulação da nota de culpa, mostrando-se, assim, preenchido um dos requisitos consignados no n.º 12 do artigo 10.º da LCCT. E não é de considerar excessivo o período de tempo decorrido entre a audição da arguida e as últimas diligências probatórias realizadas no inquérito (cerca de três meses e meio), devido à necessidade de apurar, através de minucioso exame de vasta documentação - relativa à entrada no circuito dos CTT, para expedição, tratamento e distribuição, de 726 328 objectos, entre Agosto de 1999 e Outubro de 2000 -, comportamentos desenvolvidos, regular, periódica e frequentemente, ao longo de mais de um ano. Daí que, no caso, não possa afirmar-se falta de diligência na condução do inquérito ou demora, para além do razoável, na sua conclusão. Porque o procedimento disciplinar foi iniciado, com a nomeação das instrutoras no dia em que houve conhecimento das suspeitas de comportamentos irregulares, o prazo de caducidade nem sequer começou a correr. Não consta do veredicto sobre a matéria de facto a data exacta em que ficou concluído o inquérito (13) , que, aliás, a Autora não alegou, como lhe impunha o n.º 1 do artigo 342.º do Código Civil, para efeito do disposto no último segmento do n.º 12 do artigo 10.º da LCCT, supra citado, não tendo, também, invocado, na alegação da revista, como fundamento da extinção do procedimento, a inobservância do prazo ali consignado. Ora, sem a alegação e prova de factos com virtualidade para tornar inoperante a suspensão do prazo de caducidade, não pode dar-se por verificada essa modalidade de extinção da acção disciplinar, com fundamento no disposto no artigo 31.º, n.º 1, da LCT. Defende a Autora que o facto de ter sido excedido o prazo consignado no n.º 8 do artigo 10.º da LCCT não pode, atenta a redacção do artigo 415.º do Código do Trabalho, deixar de inquinar o processo disciplinar, determinando a caducidade do procedimento. Segundo aquele preceito da LCCT, a entidade empregadora dispõe de 30 dias - contados do termo do prazo para a comissão de trabalhadores juntar ao processo o seu parecer - para proferir a decisão final, nada dizendo a lei sobre as consequências do incumprimento do prazo de 30 dias. É pacífica a jurisprudência deste Supremo no sentido de que aquele prazo de 30 dias não tem natureza peremptória - ou seja não é um prazo de caducidade -, mas meramente ordenatória ou aceleratória - com vista a incentivar a celeridade processual -, pelo que a sua inobservância apenas pode relevar para apreciação da justa causa de despedimento, na medida em que possa indiciar - ou até criar uma presunção juris tantum - que, na perspectiva do empregador, a infracção não assume gravidade para tornar imediata e praticamente impossível a manutenção do vínculo laboral (14) . O Código do Trabalho, no artigo 415.º, n.º 1 (15), veio conferir ao prazo para proferir a decisão natureza peremptória, ao estabelecer para a sua inobservância a caducidade do direito de aplicar a sanção. Terá essa disposição natureza de lei interpretativa? Para que uma lei assuma a natureza de lei interpretativa, "[é] necessário que o legislador a qualifique expressamente como tal ou que, pelo menos, essa intenção resulte em termos suficientemente inequívocos; e isto porque nem toda a decisão legal de uma controvérsia gizada em torno do significado de certo preceito legal se deve tomar como interpretação autêntica. Publica-se uma lei que suscita dúvidas; formam- -se em torno delas duas ou mais correntes; o legislador intervém em ordem a pôr termo à incerteza gerada. Isto não quer dizer necessariamente que estejamos perante uma lei interpretativa; bem pode acontecer que o legislador tenha pretendido afastar as dúvidas para o futuro, não o movendo a intenção de considerar a nova lei como o conteúdo ou a expressão da antiga. Tal intenção só existirá se se tiver querido realmente explicar a lei anterior e impor como obrigatória essa explicação" (16) . É função da lei interpretativa fixar uma das interpretações possíveis da lei anterior, com que os interessados podiam e deviam contar, sem violar expectativas seguras e legitimamente fundadas, por isso que se a lei nova consagra uma solução contrária à corrente jurisprudencial constante e pacífica, entretanto formada, na vigência da lei antiga, não pode aquela considerar-se lei interpretativa (17) . Ora, não resulta do Código do Trabalho, inequivocamente, a intenção de desfazer as dúvidas sobre o sentido do preceito a que sucedeu o n.º 1 do artigo 415.º, no que diz respeito à natureza - peremptória ou meramente ordenatória - do prazo em causa. Acresce que, havendo corrente jurisprudencial uniforme, no sentido de que da inobservância do referido prazo, na vigência da lei antiga, não resultava a caducidade do procedimento disciplinar, tem de considerar-se o preceito do Código do Trabalho, na parte relativa à caducidade, uma disposição inovadora, a qual não tem aplicação ao caso que nos ocupa, em face do disposto nos artigos 3.º, n.º 1, e 8.º, n.º 1, da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou aquele Código. Do que vem de ser exposto, conclui-se que o facto de a decisão final ter sido proferida 57 dias após a Comissão de Trabalhadores ter comunicado que não emitia parecer (pontos 28 e 38 da decisão sobre a matéria de facto) - em desrespeito pelo estatuído no n.º 8 do artigo 10.º da LCCT - não tem como consequência a caducidade do procedimento disciplinar. 5. A última questão suscitada no recurso refere-se à prescrição da infracção disciplinar. Dispõe o artigo 27.º, n.º 3, da LCT, que "[a] infracção disciplinar prescreve ao fim de um ano a contar do momento em que foi praticada (...)". Como se decidiu no Acórdão deste Supremo Tribunal de 16 de Fevereiro de 2002 (Processo n.º 1316/01 - 4.ª Secção) (18) , o prazo de prescrição começa a correr, em caso de infracção de carácter continuado, após findar o último acto que a integra, mas interrompe-se com a instauração do procedimento disciplinar, a que equivale a instauração do inquérito preliminar, quando este se mostre necessário à elaboração da nota de culpa. A interrupção da prescrição tem como consequência a inutilização do prazo decorrido até à prática do acto interruptivo, até à decisão final (19), não começando a correr novo prazo, enquanto vigorar a suspensão operada pela instauração do procedimento. Ora, como, bem, se explica no douto acórdão recorrido, "no caso dos autos, verifica-se que os factos provados integram uma infracção continuada ou permanente, uma vez que a actuação da Autora, violadora dos seus deveres profissionais, se prolongou no tempo entre Agosto de 1999 a Outubro de 2000", pelo que, "o prazo de prescrição relativamente a essa infracção de carácter permanente ou continuado só se inicia a partir do último acto, ou seja, com o termo dessa actuação, o que ocorreu em 23 de Outubro de 2000, pelo que até ao início do procedimento disciplinar, em 10.08.2001, não decorreu o referido prazo de prescrição" e, "mesmo que, por hipótese, se entendesse tratar-se de infracções individualizadas, ainda assim não estariam prescritas, pelo menos, as infracções referidas nos n.os 61 a 70, por entre a sua prática e o início do procedimento disciplinar não haver decorrido mais de um ano". Correcta, pois, se mostra, também, neste particular, a decisão impugnada. 6. Uma breve referência se impõe à pretensão, referida na conclusão 19 da alegação da revista, relativa ao alegado direito da Autora a receber os proporcionais de retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal, decorrentes da cessação do contrato. Tal pretensão não foi objecto de apreciação no acórdão impugnado e, como acima se viu, a recorrente arguiu a nulidade do acórdão, além do mais, por não se ter pronunciado sobre esse pretenso direito. Tendo-se decidido não conhecer da nulidade, por ter sido arguida extemporaneamente, não pode agora apreciar-se tal pretensão, visto que o recurso se destina, apenas, a reapreciar questões decididas pelo tribunal recorrido. III Em face do exposto, decide-se negar a revista. Custas a cargo da Autora, consignando-se que, por beneficiar de apoio judiciário, está dispensada de as pagar até que se verifique o condicionalismo previsto no artigo 54.º, n.os 1 e 2, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, em vigor à data da concessão do benefício. Lisboa, 8 de Junho de 2006 Vasques Diniz Pinto Hespanhol Fernandes Cadilha --------------------------------- (1) Entre outros, os Acórdãos de 10 de Maio de 2001, subscrito pelos Exmos. Conselheiros Mário Torres (Relator), Manuel Pereira e José António Mesquita, e de 14 de Março de 2006, subscrito pelos Exmos. Conselheiros Fernandes Cadilha, Mário Pereira e Maria Laura Leonardo, ambos disponíveis, em texto integral, em www.dgsi.pt, Documentos n.os SJ200105100018124 e SJ200603140040284. (2) Artigos 722.º, n.º 2, in fine, e 729.º, n.os 2 e 3, do Código de Processo Civil. |