Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1ª. SECÇÃO | ||
Relator: | MARIA JOÃO VAZ TOMÉ | ||
Descritores: | REGULAÇÃO DO EXERCÍCIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS VALOR EXTRAPROCESSUAL DAS PROVAS PERÍCIA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA CRITÉRIOS DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE NULIDADE DE ACÓRDÃO ARGUIÇÃO DE NULIDADES OMISSÃO DE PRONÚNCIA PRINCÍPIO DA IGUALDADE PRINCÍPIO DA IMPARCIALIDADE | ||
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Data do Acordão: | 05/09/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
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Sumário : | I - Decorre do art. 657.º, n.º 1, do CPC, que o relator elabora o projeto de acórdão no prazo de 30 dias a contar, naturalmente, da data da abertura da conclusão, nada impedindo que o referido projeto seja elaborado no próprio dia da abertura da conclusão. Não está em causa a apresentação de um acórdão final, mas antes de um projeto, sujeito à discussão com os adjuntos e, como é evidente, a alterações que podem ocorrer até ao dia do julgamento. II - Quando o relator determina a inscrição em tabela e remete os autos aos adjuntos para os vistos, fá-lo por referência a um mero projeto de acórdão; e se, nessa altura, já haviam sido remetidos ao tribunal da Relação os autos na sua totalidade, o relator dispunha já de todos os elementos necessários à boa decisão da causa. Era, pois, lícito ao relator dispensar os vistos, conforme o art. 657.º, n.º 4, do CPC, que é matéria sujeita à sua livre decisão. III - A circunstância de o tribunal da Relação se pronunciar, quanto ao efeito do recurso, em sentido diferente do pretendido pelo recorrente não determina qualquer omissão de pronúncia. IV - Não pode confundir-se o plano do aproveitamento de provas produzidas num outro processo com a respetiva força probatória. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, I – Relatório 1. AA (divorciado, médico dentista, residente na Rua ...) intentou ação de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais contra BB (divorciada, engenheira, residente na Rua ...), relativamente à filha menor de ambos, CC, nascida a ... de julho de 2017. 2. Designado dia para a conferência de pais, e não tendo sido alcançado acordo entre os progenitores, não foi fixado um regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais, em virtude de a menor se encontrar ainda hospitalizada nos cuidados intensivos, tendo as partes sido remetidas para a audição técnica especializada. 3. Na data agendada para a continuação da conferência de pais, não havendo sido obtido acordo entre os progenitores, foi fixado um regime provisório de regulação do exercício das responsabilidades parentais, nos termos do qual a menor ficou a residir com a mãe, havendo lugar a convívios do pai com “a menor aos sábados na casa da progenitora, contribuindo o progenitor com a quantia de € 200,00 a título de pensão de alimentos, suportando, ainda, metade das despesas médicas e medicamentosas na parte não comparticipada”. 4. Determinou-se a realização da avaliação psicológica a ambos os progenitores e a conclusão da A.T.E., uma vez que nesta apenas foi alcançado consenso sobre a residência da menor com a mãe. 5. Os progenitores foram notificados para alegarem, arrolarem testemunhas e juntarem documentos, tendo também sido solicitada a elaboração de relatórios sociais nos termos do disposto no art. 21.º, n.º l, al. e), do RGPTC (Regime Geral do Processo Tutelar Cível), aprovado pelo art. 1.º da Lei n.º 141/2015, de 8 de setembro. 6. Foram entretanto juntos os relatórios periciais com a avaliação psicológica dos progenitores, tendo, na sequência destes, sido determinada a realização de perícia psiquiátrica a ambos os progenitores. 7. As partes apresentaram alegações e juntaram prova (cf. fls. 121 a 129 e 164 a 177) 8. Foram adicionadas aos autos as informações sociais sobre a situação dos progenitores e da menor (cf. fls. 186 a 203). 9. Foram igualmente anexados aos autos os relatórios periciais com avaliação psiquiátrica dos progenitores (cf. fls. 369-373 e 375-379). 10. Instruída a causa, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, finda a qual, a 26 de março de 2022, foi proferida sentença com o seguinte teor decisório: «Pelo exposto, e nos termos conjugados dos artigos 1905.º, 1906.º e 1907.º, todos do Código Civil e 40.º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, decide-se regular o exercício das responsabilidades parentais relativo à menor CC da seguinte forma: «1-A CC fica a residir com a mãe, a quem incumbirá o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente da mesma. 2-As responsabilidades parentais respeitantes às questões de particular importância para a vida da CC devem ser decididas por ambos os progenitores, em conjunto, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro imediatamente. 3-Nos próximos oito meses, o pai poderá estar com a CC com a supervisão e nos moldes que forem delineados pelo CAFAP. 4-Após, e durante quatro meses, o pai poderá estar com a menor em fins-de-semana alternados, ao Sábado ou Domingo, entre as l0h00 e as 19h00, em sua casa. 5-Decorridos os quatro meses mencionados em 4), o pai poderá ter a menor consigo em fins-de-semana alternados, em sua casa, indo buscá-la à sexta-feira após as actividades lectivas ou, enquanto tal não sucede, às 19H00 na casa da progenitora entregando a menor no domingo na casa da mãe pelas 20H00. 6-O pai poderá ter a filha consigo durante uma semana nas férias do Natal e da Páscoa. 7-Nas férias de Verão da CC, o pai deverá conviver com a menor pelo menos 15 dias, em período a conciliar com a mãe até à altura do ano em que cada um dos progenitores tenha de definir as férias. 8-As datas festivas de Natal, Ano Novo, Carnaval e Páscoa serão repartidas entre os progenitores alternadamente, competindo ao outro progenitor no ano seguinte. 9-No aniversário da CC, cada progenitor tomará com ela uma das refeições principais, no ano seguinte alternam a refeição. 10-A CC passará o dia com cada progenitor aniversariante, bem como o dia do Pai e o dia da Mãe com o progenitor respectivo. 11-Nas férias de verão o pai poderá ter a menor consigo durante quinze dias seguidos, sendo este período dividido em períodos de uma semana, no caso de coincidência entre as férias de ambos os progenitores. 12-0 pai contribuirá, a título de alimentos para a criança, com a quantia mensal de € 200,00 (duzentos euros), entregues à mãe até dia 8 de cada mês, por transferência bancária. 13- A quantia referida em 12) deverá ser actualizada anualmente em função do índice de inflação fixado pelo INE relativo ao ano anterior e com início em Abril de 2023. 14-Ambos os progenitores comparticiparão na proporção de metade as despesas médicas, medicamentosas e de educação da criança, na parte não comparticipada, mediante apresentação ao outro de recibo.” Comunique-se, de imediato, ao CAFAP, por forma a serem delineados os convívios ora fixados. As custas serão a suportar pela requerida. - art. 527Q do Código de Processo Civil. Fixo o valor da acção em €. 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo). Oportunamente cumpra o disposto no art. 78.Q do CRC.» 11. Não conformada, a Requerida BB interpôs recurso da referida sentença - que foi recebido “como de Apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo”, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por despacho do Relator de 30 de junho de 2022, corrigido o seu regime de subida, mandando “que o recurso subisse nos próprios autos (e não por apenso), nos termos do art. 644°, n° 1, do Código de Processo Civil” -, concluindo nos moldes seguintes: “Deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser fixado um regime de responsabilidades parentais que proteja a criançada personalidade borderline e histriónica do Recorrido, assim fazendo V. Exas a costumada Justiça.” 12. O Requerente/Apelado AA não apresentou contra-alegações. 13. Por acórdão de julho de 2022, o Tribunal da Relação de Lisboa, decidiu o seguinte: “Acordam os juízes desta Relação em negar provimento à Apelação, confirmando integralmente a sentença recorrida. Custas da Apelação a cargo da Requerida ora Apelante”. 14. Não conformada, a Requerida BB, à luz do art. 672.º, n.º 1, als. a) e b), do CPC, interpôs recurso de revista excecional, formulando as seguintes Conclusões: “a) Em 26/04/2022, foi interposto recurso de apelação, versando a prolação de nova decisão sobre a matéria de facto e a consequente prolação de nova decisão sobre a matéria de Direito (ref.ª 32380942); b) Em 30/05/2022, o recurso de apelação foi admitido nos termos do artigo 644º, n.º 2, alínea d), CPC, como recurso de despacho de admissão ou rejeição de meios de prova, com subida em separado (ref.ª ...350); c) Em 30/05/2022, o despacho de admissão de recurso foi notificado às partes (ref.ª ...432) d) Em 30/05/2022, antes de decorrido o prazo de reclamação, foi o recurso feito subir, instruído apenas com certidão de peças processuais do Recorrido – no caso a petição inicial e as alegações apresentadas pelo Recorrido nos termos do artigo 39º do RGPTC (ref.ª ...824, ...135, ...137, ...139, ...142, ...144, ...146, ...147); e) Em 02/06/2022, três dias depois da admissão do recurso, e sem que tivesse o processo (fosse físico ou fosse electrónico) foi proferido o seguinte despacho pelo Exmo Sr. Desembargador Relator: “Aos vistos e, de seguida, inscreva-se o processo em tabela”, (ref.ª Citius ...556) f) Em 03/06/2022, é aberta conclusão ao Exmo Desembargador para proferir o despacho que viria a aparecer com data de 02/06/2022, melhor identificado na alínea que antecede. g) Em 06/06/2022 foi deduzida na 1ª Instância reclamação ao abrigo do artigo 643º CPC quanto ao tipo de recurso e modo de subida (ref.ª ...664) h) A qual veio a ser julgada, em 27/06/2022, improcedente por falta de base legal i) Em 06/06/2022, foi o projecto de acordão aos vistos dos Adjuntos (ref.ª ...563 e ref ...567) j) Em 06/06/2022, a Recorrente dirigiu requerimento ao tribunal da Relação invocando o erro no modo de subida, e requerendo «Deve entender-se que o recurso foi interposto da decisão final e não de um “despacho que admitiu ou rejeitou um meio de prova”, considerando-se ainda para efeitos da sua apreciação os documentos identificados nas alegações de recurso com as respectivas referências citius ao abrigo do disposto no artigo 22º da Portaria 280» (Ref.ª ...516) k) Requerimento que viria a merecer o despacho de 30/06/2022, (ref.ª ...516) com o teor seguinte: ““Requerimento da recorrente de 6/6/2022: Visto que o presente recurso tem por objecto a sentença final que regulou definitivamente as responsabilidades parentais relativamente à menor CC (e não qualquer decisão interlocutória – como erroneamente consta do despacho de admissão do recurso, no qual se invoca – a despropósito – a al. d) do n.º 2 do artigo 644º do CPC), tal recurso sobe nos próprios autos (e não por apenso) – art. 644º - 1, al. a) do CPC. Assim, sendo, solicite-se ao tribunal “a quo” o envio do processo principal no qual foi proferida a sentença recorrida. Quando este processo for remetido a esta Relação, deverá o mesmo ser inscrito imediatamente em tabela, com dispensa de vistos, visto que os Exmos Senhores Adjuntos já apuseram o seu visto no presente apenso (indevidamente organizado pelo tribunal “a quo”) e, portanto, já tiveram acesso à sentença recorrida e às alegações e contra-alegações apresentadas pelo Recorrente e pelo Recorrido. Notifique. LX 30/6/2022. DD”. l) Por consulta dos autos, tomou a signatária conhecimento de tal despacho, e apresentou em 07/07/2022 (ref.ª ...493), requerimento onde invocava a nulidade do processado por omissão de notificação à Recorrente das alegações do Recorrido a que o Exmo Desembargador Relator aludia no seu despacho de 30/06/2022; m) Em 08/07/2022, viria a ocorrer a notificação do despacho de 30/06/2022 (ref.ª ...526) n) Em 11/07/2022, (ref.ª citius ...107) é proferido o despacho sobre a nulidade processual, “Requerimento de arguição de nulidade de 07/07/2022: Indeferido, porquanto: a) Deveu-se a um mero lapso de escrita a alusão feita do despacho do relator que mandou inscrever o processo em tabela (logo que recebido nesta relação o processo indevidamente retido pela 1ª Instância) às contra-alegações apresentadas pelo Recorrido; b) Não é imprescindível que os Adjuntos tenham acesso a todas e cada uma das peças processuais constantes dos autos que constituem o processo principal, podendo o relator – se a celeridade no julgamento o impuser – dispensar os vistos, com a concordância dos Adjuntos (art.º 675º-4 do CPC), entendendo-se ser esse o caso dos autos, motivo pelo qual se reitera a determinação no sentido de o processo ser imediatamente inscrito em tabela, logo que recebido nesta Relação, com dispensa de vistos dos Exmos Juizes Adjuntos. Notifique. LX, 11/07/2022. DD” o) Quando o processo – físico ou electrónico – chegou ao Tribunal da Relação foi de imediato inscrito em Tabela; p) Do exposto resulta que a. o acórdão foi elaborado antes mesmo de, no processo – com recurso admitido e subido em separado – ter sido aberta conclusão; b. O acórdão foi elaborado tendo por base apenas articulados do Recorrido, atento que apenas estes instruiram o recurso e apenas estes foram com vista aos Adjuntos; q) Sem terem sido consideradas as peças processuais – da Recorrente e do Recorrido – que impunham decisão diversa; r) Aliás, a seleção e decisão de seleção das peças processuais do Recorrido que acompanharam o recurso assim admitido em separado não foi requerida pelo Recorrido e nem consta do despacho do Tribunal de 1ª Instância, constituindo um mistério processual; s) Igualmente, considerando ainda o modo de subida com que o Recurso foi admitido (em separado) nem sequer foi dada a hipótese à Recorrente de vir a indicar as peças processuais que deveriam instruir o recurso assim admitido; t) Tivesse o Tribunal da Relação apreciado o teor das alegações de recurso e as peças processuais para onde a Recorrente remete no seu recurso e não teria consagrado o que consagrou relativamente à alteração da resposta aos quesitos, conforme especificamente explicitado relativamente a cada um dos factos no corpo das alegações, que aqui se dá por integralmente reproduzido; u) Com efeito, as peças processuais e elementos que a Recorrente indica como sendo susceptíveis de alterar os factos provados não foram consideradas no presente recurso. v) Ora, estas omissões – (1)admissão do recurso em separado, (2) instruído apenas com peças processuais do Recorrido, sem que as correspondentes peças processuais da Recorrente o acompanhassem, (3) omissão de junção das peças processuais referidas nas alegações de apelação, (4) omissão de apreciação do teor das aludidas peças processuais da Recorrente e dos peritos que impõem decisão diversa – por influírem no exame na causa e na decisão a proferir, são geradoras de nulidade da decisão a qual se invoca para os devidos efeitos legais; w) Por outro lado, em 25/11/2021 (ref.ª Citius ...256) foi junto aos autos de regulação das responsabilidades parentais, relatório pericial realizado no processo crime de violência doméstica que corre termos sob o número 488/18.3..., no Tribunal da Relação, agora pendente de recurso. x) Em 25/11/2021 (ref.ª Citius ...256) foi junto aos autos de regulação das responsabilidades parentais, relatório pericial realizado no processo crime de violência doméstica que corre termos sob o número 488/18.3..., no Tribunal da Relação, agora pendente de recurso. y) Relatório cujo teor se dá aqui, para efeitos de apreciação do presente recurso de revista por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, podendo ser consultado na aplicação CITIUS o que se requer ao abrigo do artigo 22º da Portaria 280/2013. z) Deste relatório pericial consta, designadamente, com relevância para os presentes autos que: “6.2. O examinado nega todas as acusações que lhe são feitas e refere que a ex-mulher apenas apresentou queixa de violência doméstica para o prejudicar no processo de regulação das responsabilidades parentais respeitante à filha de ambos, agora com 3 anos. Reconhece uma “depressão muito forte” com início em 2015, em reação à morte da primeira mulher, por doença súbita, ao fim de um casamento de vinte anos; refere um estado de “carência” emocional, devido a essa perda, esperando resolvê-lo com o novo relacionamento, com a mãe da sua filha. O examinado realizou perícia psicológica em 2018 e perícia psiquiátrica em 2019, neste INMLCF, no âmbito do Processo 3534/17.4... de Regulação das Responsabilidades Parentais, pelo Juízo de Família e Menores do ... – Juiz 3. Tendo consultado os autos enviados por este Juízo de Família, para a realização daquelas perícias, extraímos que o examinado foi consultado por psiquiatra dos SAMS-..., em 02-11-2015, o qual observou sintomatologia depressiva de intensidade moderada, em reação à morte da primeira mulher; outro psiquiatra dos SAMS-..., notificado pelo Juízo de Família e Menores a fornecer informação clínica, redigiu informação datada de 04-06-2019, na qual refere que observou o paciente uma única vez, em 2016, confirmando o quadro depressivo, com bom prognóstico, tendo marcado nova consulta a que o examinado faltou. 6.3. Dos mesmos autos do Juízo de Família e Menores, extraímos alegações da queixosa, que anexam SMS enviados pelo examinado entre 22-06-2016 e 18-10-2018 e uma carta manuscrita, sem data. Estas mensagens e escritos do examinado, enviados à progenitora da sua filha, no contexto de rotura ou ameaça de rotura da relação conjugal, ilustram um estado de emocionalidade excessiva, com busca de atenção, e impulsividade ou agir no calor do momento em resposta a estímulos imediatos, num sentimento de urgência e comportamento autolesivo em ambiente de mal-estar emocional. Assim, pode ali ler-se uma ameaça de suicídio, seguida do anúncio de que tal ameaça visava apenas fazer a destinatária pensar que o examinado estava em grande sofrimento; a assunção de agressões cometidas contra a destinatária; a assunção de um mal-estar emocional resultante do desejo, naquela altura frustrado, de ser pai; o reconhecimento de que lhe era difícil suportar a ideia da separação conjugal; o reconhecimento de que era bem tratado pelos pais da esposa e o arrependimento por atitudes negativas passadas. Estas mensagens, no contexto de uma rotura iminente, são fortemente sugestivas de traços disfuncionais de personalidade do chamado grupo B, um conjunto de perturbações de personalidade que têm em comum o comportamento dramático, emotivo e errático, mais concretamente, traços histriónicos de emocionalidade excessiva e busca de atenção (necessidade de buscar a atenção, emoções lábeis e superficiais, emoções dramáticas e exageradas) e traços borderline de instabilidade dos afetos e marcada impulsividade (esforços frenéticos para evitar o abandono, impulsividade autolesiva, comportamento parassuicida ou suicida). Frequentemente, os traços histriónicos envolvem a manipulação e dependência emocionais, exigência de atenção, humor deprimido perante situações frustrantes, busca de gratificação imediata, risco aumentado de gestos e ameaças de suicídio com o objetivo de obter atenção. Os atos de que o examinado está acusado não são, de modo plausível, típicos de uma depressão, que se caracteriza por humor deprimido ou abatido, perda da energia vital, baixa autoestima, sentimentos de desesperança, mas são, com mais verosimilhança, associáveis a estes traços disfuncionais de personalidade. 7. RESPOSTA A QUESITOS “1. Na data dos factos constantes da acusação o arguido sofria de depressão ou de alguma patologia psiquiátrica?; Encontrava-se diagnosticado com uma depressão reativa à morte da primeira mulher, com início em 2015 e que ainda não estaria remitida em 2016. Observamos existência concomitante de traços disfuncionais de personalidade, do tipo histriónico e borderline, ativos pelo menos até final de 2018. 2. Aquela condição do arguido foi diagnosticada e em que data?; A depressão reativa foi diagnosticada em 2015, segundo informação do próprio e como consta da documentação clínica consultada. 3. De que forma essa depressão, ou outra eventual patologia, pode ter determinado, ou não, o arguido à eventual prática dos factos que lhe são imputados na acusação?” Veja-se parágrafo 6.3 da secção “Discussão/Conclusões”. aa) Em 17/02/2022, em audiência de julgamento, o Exmo Perito, Dr. EE, (ref.ª Citius ...268, [Depoimento gravado em sistema H@bilus Media Studio (das 11:24 minutos aos 12:17 minutos)] prestou esclarecimentos sobre este relatório, integralmente transcritos nas alegações de apelação (de 26/04/2022, ref.ª ...942), que aqui se dão por integralmente reproduzidos, para todos os efeitos legais, requerendo-se a sua consulta para efeitos de apreciação do presente recurso nos termos do artigo 22º da Portaria 280/2013, bb)O Sr. Perito, Dr. EE, veio a esclarecer designadamente que: cc) “Ora, estes traços, quando ativos, prejudicam a parentalidade. Fazem diminuir as, as capacidades parentais, a capacidade de dar o melhor. Ou seja, quando ativos estes traços de grande emocionalidade, instabilidade, impulsividade, traduzem-se em menor empatia pela criança, menor paciência, menor tolerância à frustração, comportamentos intrusivos, interações menos satisfatórias, diminuição do autocontrolo em situações de stressantes. No dia a dia, com certeza, todas as pessoas estão sujeitas a situações stressantes. Um pai ou uma mãe também, em relação a uma criança. dd) O padrão borderline é caracterizado por impulsividade e instabilidade, provoca relações instáveis entre pai e filha, relações intensas, mas como aproximação/distanciamento, ou seja, há uma aproximação, depois há um distanciamento, algo atabalhoado. Impulsividade, impressões (impercetível) e incongruentes. Tudo isto é manifesto pela pessoa que tem estes traços. Prejudica a parentalidade. Há menos sintonia, menos capacidade de estar em sintonia com o filho, dificuldade de perceber a perspetiva do menor, em responder às necessidades do menor. ee) Portanto, eu não observei diretamente a relação pai e filho, mas isto é o que se pode deduzir de um conjunto de traços disfuncionais. Sabemos que este conjunto de traços disfuncionais tem estas consequências na parentalidade, tipicamente. ff) Ambas as instâncias acentuam que o S. Perito “reconheceu que a base de estudo que o levou a fazer este diagnóstico sobre a personalidade do ora requerente foi, em grande medida, a leitura dos sms e das mensagens de correio electrónico que o examinado teria enviado à ora Requerida , “documentação essa que o depoente pressupõe ser verdadeira” gg) Ora, as mensagens que o Sr Perito considerou são as que foram objecto de perícia pela PJ no âmbito do processo crime que as extraiu do telemóvel/smartphone da Recorrente e que foram juntas, devidamente certificadas, também aos presentes autos; hh) A PJ atestou que as mensagens eram provenientes dos telemóveis com os números ...862 e ...849 e do endereço de email ... ii) Pese embora a PJ não tenha feito a identificação do titular de tais números e nem da titularidade do endereço de e-mail, o certo é que o tribunal dispunha de elementos que lhe permitiam estabelecer a correspondência entre estes e o Recorrido e se tivesse actuado com zelo e imparcialidade, analisando todas as provas produzidas no processo, como lhe impõem os artigos 5/2 e 607/4 CPC , teria a final realizado que: a. A)- as mensagens analisadas pelo Sr Perito foram retiradas do telemóvel da Recorrente pela Polícia Judiciária como provenientes dos telemóveis ...862 (por ex., fls. 55 da certidão de mensagens) e ...849 (por ex.fls. 88 da certidão de mensagens) e do endereço de email ... (por ex.fls 32 da certidão de mensagens, email de 22/04/2019) – certidão junta aos autos; b. O número de telemóvel ...862 é o contacto indicado pelo Recorrido em requerimento que este dirigiu aos autos em 07/02/2018 referencia Citius ...620 c. -O número de telefone ...849 é o numero indicado pelo Recorrido, como sendo o seu, na audiência de 16/12/2021, conforme consta da respectiva acta, referência Citius ...607 d. -O email ...” é o endereço de email utilizado pelo Recorrido em requerimento que este remeteu aos autos em 26/03/2019, Referência citius...018 jj) O relatório pericial – prova produzida no processo crime, cujo processo oferece maiores garantias ao Recorrido, com exercício do contraditório – deve ser admitido e valorado como prova plena nestes autos, ao abrigo do artigo 421º e 624º do CPC; kk) Desta forma o referido relatório, possuindo valor extraprocessual e fazendo prova plena dos factos dele constantes, deve ser admitido nestes autos e considerado o seu conteúdo ao abrigo das invocadas disposições legais; ll) Constando dos autos de RRP elementos que afastam a dúvida suscitada ao tribunal quanto à origem de tais escritos, haverá que concluir que: a. O Recorrido tem uma personalidade histriónica e bordeline, b. Manifestada designadamente através de grande emocionalidade, instabilidade, impulsividade, menor empatia pela criança, menor paciência, menor tolerância à frustração, comportamentos intrusivos, interações menos satisfatórias, diminuição do autocontrolo em situações de stressantes... c. Que tal personalidade constitui um risco para uma criança, tanto mais quando está demonstrado que a criança padece de um atraso no neurodesenvolvimento decorrente da sua situação de permaturidade, situação que obriga a um maior controlo e paciência, incompatível com as caracteristicas de personalidade do arguido. d. Tanto mais quando, é afirmado pelo perito dr. EE que o o Recorrido não reconhece tal patologia mm) Ora, não temos dúvidas que entregar uma criança com necessidades especiais, ainda que apenas por algumas horas, a alguém cuja personalidade é caracterizada pela falta de paciência, pouca resistência à frustração e impulsividade, etc, coloca em risco a criança. nn) Sendo que os resultados das perícias realizadas psicológicas nos autos que manifestam um entendimento contrário se explicam – conforme o faz o Dr. EE – porquanto nas entrevistas “a pessoa aparece aqui com sustentabilidade social, seleciona a informação,”, vai preparada, sabe o que deve e não deve responder, como não pode comportar-se, não é espontânea, como o será quando estiver com a criança. oo) Assim , deve o relatório pericial e os esclarecimentos prestados pelo perito fazer prova plena nestes autos, nos termos dos artigos 421º e 624º CPC. pp) E, em consequência, ser o processo remetido para o tribunal da Relação para que altere a decisão sobre a matéria de facto, em consonância com tal prova plena; qq)Por último, considerando tudo o aqui exposto neste recurso, quer nas conclusões quer no corpo das alegações, demonstrado à saciedade que tem existido uma parcialidade a favor do Recorrido ao longo de todo o processo. rr) Com efeito, o que é negativo e contrário aos interesses do Recorrido é ignorado na decisão, como o foram: a. os contactos do Recorrido (e-mail e telefone) constantes dos requerimentos que o mesmo remeteu ao processo, b. o teor das acusações crime cujas absolvições foram consideradas como fazendo prova plena, em violação do disposto no artigo 624º CPC, c. A volatilidade dos seus relacionamentos amorosos e a tendência para não aceitar as rejeições – vive em união de facto com uma e continua a enviar mensagens de teor amoroso para a anterior; d. As contradições das declarações prestadas pelo Recorrido nos diversos processos e nas diversas pericias sobre a sujeição a acompanhamentos psicológicos e psiquiátricos; e. O relatório pericial elaborado no âmbito do processo crime; f. Os esclarecimentos prestados pelo Dr. EE nestes autos de RRP g. O teor das mensagens – para cima de um milhar – em que o Recorrido utiliza a CC como meio para que a Recorrente reate o relacionamento com ele, apesar de nessa altura o Recorrido viver em união de facto com outra pessoa, ss) Uma análise – ainda que sumária – do processo demonstra que tudo o que o Recorrido alega no processo é tido como verdade inabalável, enquanto que o que a Recorrente alega é tido como tentativa INJUSTIFICADA de afastar o Recorrido e impedir que este exerça a sua parentalidade. a. aliás, no último processo de incumprimento (autuado a 03/06/2022), o Recorrido mente descaradamente informando o Tribunal que o CAFAP tem contactado insistentemente a Recorrente e que esta tem faltado; b. contactado o CAFAP, este veio desmentir em resposta ao Tribunal, o que o Recorrido havia afirmado. c. E, o que faz o tribunal? Requer que o CAFAP venha mais uma vez esclarecer, e nem sequer notifica o Recorrido para vir juntar provas do que alega contra a Recorrente. tt) Toda esta actuação do Recorrido, a mentira, a vitimização, são características dos seus distúrbios de personalidade – e o tribunal dá-lhe a atenção que o mesmo pretende. uu)E o Tribunal, ao fazê-lo, nem sequer cuida do interesse e do direito da criança a ser protegida. vv) Face ao exposto verifica-se que toda a actuação do Tribunal – seja 1ª Instância, seja na Relação, viola o direito a um julgamento equitativo e imparcial, tal como o impõe o artigo 5º do CPC, o artigo 20º da CRP e o artigo 6º da CEDU. ww) O acórdão, sem prejuízo da apreciação de nulidade que se invoca nos termos do artigo 195º por influir na decisão da causa, infringiu ainda o disposto nos artigo 629º, 644º/1/a), 645º/1/a), 3º/3, 4º, 5º/2/a) e b), 421º, 624º, 607º/4 e 5, todos do CPC, 20º da CRP e 6 da CEDH, , pelo que deve ser revogado, e em consequência xx) Nestes termos e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas que se requer, conforme resulta do exposto, no corpo nas alegações e nas conclusões, deve o recurso ser admitido, quer nos termos do artigo 671º, quer nos termos do artigo 672º CPC yy) Com efeito, zz) No seguimento do entendimento do acórdão do STJ de 13-04-2021 que consagra “assumem relevo social os casos em que estão em causa aspetos fulcrais para a vida em sociedade, incluindo aquelas em que estão em causa interesses de crianças carecidas de proteção.” 13-04-2021 (Revista excepcional n.º 1677/20.6..., Abrantes Geraldes (Relator), Tomé Gomes e Alexandre Reis) aaa) Nos presentes autos, para além de não terem sido tidas em consideração provas que demonstram que o Recorrido representa um risco para a criança, especialmente vulnerável (atraso no neurodesenvolvimento resultante de ser uma bebé prematura), estamos ainda perante violações flagrantes dos deveres de zelo e imparcialidade que impendem sobre os magistrados, também esta uma questão de particular relevância social. bbb) Ademais, o valor extraprocessual das provas e a sua extensão nos termos dos artigos 421º e 624º aos processos tutelares cíveis constitui de igual forma uma matéria de elevada relevância juridica ccc) Sem prejuízo da anterior invocação de nulidade e nem do posterior recurso nos termos do 671º/4CPC ddd) Ordenando-se a remessa do processo para o Tribunal da Relação para que, reapreciando a prova e todos os elementos constantes dos autos e referidos nas alegações, bem como as peças processuais da Recorrente, de igual função àquelas do Recorrido, que intruiram o recurso que subiu e que foram com vista aos Adjuntos, e bem assim o Relatório pericial e os esclarecimentos prestados pelo Dr. EE, julgue com igualdade e imparcialidade, protegendo a criança, e, considerando o risco que o Recorrido representa para a criança, profira nova decisão de facto e de Direito. Termos em que, Deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, com as demais consequências legais e processuais, assim fazendo V. Exas a costumada Justiça”. 15. O Ministério Público respondeu, apresentando as seguintes Conclusões: “1. No âmbito de um processo de jurisdição voluntária só é admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do art 988.º, n.º 2 do CPC. 2. Dispõe o art. 988.º, n.º 2 do CPC que das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência ou oportunidade “não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça”. 3. O acórdão proferido não padece de nenhum dos vícios ou nulidades que lhe são imputados, dado que não violou qualquer disposição legal substantiva ou adjectiva, quer a nível de erro de interpretação, aplicação ou determinação da norma aplicável. 4. Ora, não existe, no acórdão, qualquer violação de lei substantiva - tanto a nível de erro de interpretação, como a nível de aplicação ou determinação da norma aplicável, exigida pelo artigo 674.º, n.º 1 do CPC - ou nulidades previstas nos artigos 615.º e 666.º, ex vi do art. 674.º, n.º 1, al. c), todos do CPC. 5. Não padecendo o acórdão recorrido de qualquer nulidade, tendo sido proferido de acordo com as normas legais vigentes e aplicáveis in casu, não deve, nem pode, o presente recurso ser admitido. 6. Dispõe o artigo 671.º, n.º 3, do CPC, “sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”. 7. Segundo o STJ “As situações de excepção acenadas consistem na “ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova”, como dispõe o n.º 3 do artigo 674.º do principal diploma adjectivo. 8. Assim, o STJ só pode conhecer do juízo de prova fixado pela Relação quando tenha sido dado como provado um facto sem que tivesse sido produzida a prova que a lei declare indispensável para a demonstração da sua existência ou se tiverem sido violadas as normas reguladoras da força probatória de alguns meios de prova.” 9. O que não é manifestamente o caso, uma vez que a apreciação que se fez do depoimento da testemunha além de se mostrar fundamentada é a que melhor integra as regras aplicáveis, em termos de regime prova, pelo que inexiste qualquer nulidade, nomeadamente a que a recorrente lhe imputa. 10. No caso concreto não foi violada qualquer disposição legal, sendo que apreciação que se fez do depoimento da testemunha se mostra juridicamente fundamentada e comprovada com os inúmeros relatórios periciais posteriores efetuados ao pai, do depoimento das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento e que a decisão de facto e fundamentação espelham, pelo que, no caso presente, temos por verificada a dupla conforme. 11. Como tal, não se verificarem os pressupostos de admissibilidade do recurso de revisão excecional, porquanto a recorrente limita-se a discordar do acórdão para justificar a necessidade de “melhor aplicação do direito”, repetindo continuamente ao longo das alegações, os mesmos argumentos que anteriormente já havia alegado na apelação, a propósito dos vários pontos que enuncia, e que, na sua perspetiva, impunha uma decisão diversa. Tal como não explica, qual a relevância jurídica das questões analisadas no recurso, nem o motivo pelo qual tal apreciação será necessária para a melhor aplicação do direito. 12. Não corresponde à verdade o articulado relativamente às peças processuais que a recorrente alude não ter este tribunal tido acesso, dado como é conhecimento de todos os operadores judiciários, que para o efeito bastava à Exma. Senhora Mandatária da recorrente carregar no processo, no item consultar todas as peças, para constatar que este se mostra na íntegra no referido sistema citius, ao qual o tribunal acedeu para proferir o acórdão. 13. Tal como, também, não se verifica na decisão qualquer violação do princípio da igualdade ou imparcialidade e isto, porque como é evidente, este tribunal acedeu a todos os elementos constantes dos autos, como decorre enumeração da tramitação do processo e da análise que fez dos elementos factuais e peças processuais ali constantes, no acórdão. 14. O Tribunal apreciou, em sede de recurso, todas as circunstâncias e meios de prova tendo concluído no mesmo sentido da sentença da 1.ª instância, pelo que não padece o mesmo de nenhum vício ou nulidade. 15. Pelo que ao manter o regime de exercício das responsabilidades parentais, que havia sido fixado nos termos previstos nos art.s 40.º, do RGPTC,1905.º a1908.º, 1985, n.º 1, 1918.º, 1878.º e 2004.º do Código Civil, 36.º,n.º 5 e n.º 6 da CRP e 9.º, n.º 3 da Convenção dos Direitos da Criança, fez a correta aplicação das normas ao caso concreto. Face ao exposto, não deverá ser admitido o recurso interposto pela Recorrente BB, por não se verificarem os da alínea a) e b) do n.º 2 do art.672.º do CPC, mantendo-se na íntegra o decidido no douto acórdão recorrido, com o que farão, V. Excelências, aliás como sempre, JUSTIÇA!” 16. Porquanto a Requerida BB, notificada do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 14 de julho de 2022 que negou provimento à apelação por si interposta da sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, confirmando integralmente essa sentença, reclamou para a conferência com base nos arts. 616.°, n.º 2, al. b), e 195.º, n.º 1, do CPC, e com fundamento em pretensa nulidade do referido acórdão e violação dos arts. 3.°, 4.º, 5.°, do CPC, 20.° da CRP e 6.° da CHDH, aquele Tribunal, em conferência, por acórdão, decidiu o seguinte: “1) Indeferir a reclamação para a conferência deduzida pela Reclamante BB contra o Acórdão proferido por esta Relação em 14.07.2022, sob invocação do disposto nos artigos 616°, n.° 2, al. b) e 195°, n.° 1, do CPC; 2) Condenar a Apelante ora Reclamante nas custas do incidente”. 17. O recurso foi admitido pelo Senhor Desembargador-Relator, que também remeteu ao Supremo Tribunal de Justiça o apenso criado pelo Tribunal de 1.ª Instância aquando da subida ao Tribunal da Relação de Lisboa do recurso de apelação. 18. A Relatora remeteu os autos à Formação do Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do art. 672.º, n.º 3, do CPC, em ordem ao apuramento dos pressupostos referidos no n.º 1 do mesmo preceito. 19. A 1 de março de 2023, a Formação admitiu o recurso de revista excecional interposto pela Requerida BB. 20. Notificado do acórdão da Formação, o Requerente/Recorrido AA veio informar o Supremo Tribunal de Justiça de que “há muito que foi absolvido do indicado processo crime”, de que “foi absolvido em 1ª Instância no dia 1 de Julho de 2021”, de que “essa decisão veio a ser confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa por Acórdão de 18 de julho de 2022”, de que “estando a decisão transitada em julgado com baixa em definitivo para o Tribunal de 1ª Instância desde o dia 10 de Agosto de 2022”, e de que “com a absolvição do aqui Recorrido, ficou claro que as acusações de que foi alvo por parte da mãe da sua filha foram completamente infundadas e caluniosas e apenas tiveram o único propósito de tentar influenciar os presentes autos de Regulação das Responsabilidades Parentais”. 21. A Requerida/Recorrente BB respondeu, referindo o seguinte: “BB, recorrente nos autos à margem referenciados, notificada para o requerimento do Recorrido vem, em resposta, oferecer a V. Exas o seguinte: “1. No aludido processo crime, a ofendida não se constituiu assistente, por ter confiado que o Tribunal tomaria em consideração todas as provas recolhidas em série de inquérito, designadamente o relatório pericial elaborado pela Polícia Judiciária; 2. Por essa razão, foi impedida de fazer instâncias em sede de julgamento e, designadamente, analisar em audiência todos os registos de mensagens e emails que o Recorrido remeteu à Recorrente, por não aceitar o fim do relacionamento; 3. Registos que foram analisados pelo perito do IML, Dr. EE, que, para efeitos de determinação da sanção naquele processo crime, avaliou o Recorrido e lhe diagnosticou personalidade borderline e histriónica, patologias que constituem riscos para o exercício das responsabilidades parentais, conforme consta destes autos; 4. Entre essas mensagens constam designadamente: i. Sms 1316 – dia 12/12/2016 às 15:43: “... peço desculpa por tudo o que tenho feito e dito ao longo destes meses! ...” (página 149 do anexo de transcrições da PJ) ii. Sms n.º 1192, de 10/01/2017 às 15:12: "acabei de dizer ao meu pai que tenho sido o causador de todas as situações contigo! Eu nunca lhe tinha dito que te tinha agredido por várias vezes" (página 140 do anexo de transcrições da PJ). iii. SMS 1149 – dia 08/02/2017 às 16:40: “Amor perdoa-me! Enervei-me e perdi a cabeça...” (pagina 137 do anexo de transcrições da PJ) iv. Sms 854 de 06/04/2017 às 09.29: “... Mas como fui estúpido e burro não te tratei bem nem te respeitei como esposa! Aquilo que te fiz não tem perdão! Mas agora que estás grávida eu não posso estar ao pé de ti devido a esse acto irracional imperdoável. ...” v. Sms 766- dia 06/04/2017 (dia antes do divórcio) às 17:21: “(…) Estou profundamente arrependido com o mal que te causei! Peço perdão mais uma vez e peço que não me odeies a vida inteira! Acho que eu deveria ser espancado pelo mal que te causei. Imperdoável” (página112 do anexo de transcrições da PJ) 5. Dos autos de RRP constam, por terem sido indicados pelo Recorrido como sendo seus, dois números de telemóvel, de onde a Polícia Judiciária atesta que foram remetidas as mensagens para a Recorrente – porém, como referido, tal prova não foi analisada em julgamento crime e, por essa razão, não foi considerada; 6. O facto de o Recorrido ter sido absolvido do crime não anula que ele tenha praticado os factos, apenas evidencia que a recorrente, neste caso concreto, viu-se impedida de produzir prova; 7. O facto de o Recorrido ter sido absolvido, nas circunstâncias supra descritas, não anula o facto de, conforme análise do perito do IML, o Recorrido constituir um risco para uma criança, risco acrescido em virtude desta padecer de atraso no neurodesenvolvimento”. II – Questões a decidir Sem embargo das questões de que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio, é pelas conclusões com que o Recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou a anulação da decisão recorrida: art. 639.°, n.º 1, do CPC) que se determina o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem. Estão, assim, em causa, as seguintes questões: - de saber se o acórdão recorrido padece ou não de nulidade por omissão de ato suscetível de influir na decisão da causa; - de determinar o valor extraprocessual das provas; - de saber se se verifica ou não violação dos princípios da igualdade e da imparcialidade. III – Fundamentação A. De Facto Foram considerados como provados os seguintes factos: “1- Requerente e requerida foram casados entre si, entre 2016 e meados de 2017, tendo a requerida engravidado da menor CC numa altura em que as partes já se encontravam separadas. 2- A relação dos progenitores antes do nascimento da filha foi pautada por desentendimentos constantes. 3- CC, nasceu no dia ....07.2017, tendo sido registada como filha de BB, sem a menção de paternidade. 4- A CC nasceu de ... semanas e um dia, com 582 gr, com o diagnóstico de ... e necessidade de oxigénio suplementar, 5- ... tendo permanecido internada na Unidade de Neonatologia do Hospital ... desde a data do seu nascimento até ao dia 19.01.2018. 6- A requerida não informou o requerente acerca do nascimento da filha de ambos. 7- O requerente tomou conhecimento do nascimento da filha junto da Conservatória do Registo Civil ..., no início do mês de Outubro de 2017. 8- Tendo perfilhado a CC. 9- No período compreendido entre o início do mês de outubro de 2017 e a data em que a CC teve alta clínica, o requerente visitou regularmente a filha na Unidade de Neonatologia do Hospital .... 10- Na data da alta clínica a menor teve indicação de manter oxigénio no domicílio, 11- ... e necessitou de acompanhamento médico regular e de realizar um conjunto de terapias e terapêuticas. 12- A CC foi acompanhada pela Equipa de Intervenção Precoce ... desde o mês de Abril de 2018 e, pelo menos, até Dezembro de 2020. 13- Em sede de conferência de pais que teve lugar no dia 26.02.2018 foi estabelecido o seguinte regime provisório: "1) A menor CC ficará a residir provisoriamente com a progenitora, sendo as responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, exercidas por ambos os progenitores. - art" 1906°, n°l do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei n° 61/2008 de 31/10.- 2) O pai poderá estar com afilha todos os Sábados, entre as 15:00 horas e as 16:00 horas visitando-a em casa da progenitora sempre acompanhado pelo seu progenitor (avô paterno da menor).-Tal não sendo possível, no decurso dessa semana, o progenitor, através da sua Mandatária, avisará com 24 horas de antecedência, a Mandatária da progenitora de tal facto, indicando a pessoa que o acompanhará.- Este regime terá início no próximo Sábado (3-3-2018).-3) O pai contribuirá com o montante de € 200,00 (duzentos euros) mensais a título de alimentos, por transferência bancária, até ao dia 8 de cada mês, para conta titulada pela progenitora, iniciando-se o pagamento desta prestação no próximo mês de Março.- 4) O pai custeará, ainda, metade das despesas médicas e medicamentosas, consultas, terapêuticas, leite e alimentação de carácter especial, na parte não comparticipada, mediante apresentação de documentos comprovativos os quais serão remetidos pela Mandatária da progenitora à Mandatária do progenitor devendo ser paga a respectiva comparticipação no prazo de 10 dias após a sua recepção.- 5) A mãe deverá avisar o progenitor por e-mail, com a antecedência mínima de 3 dias, da data e hora das consultas médicas da menor, indicando a hora e o estabelecimento de saúde onde as mesmas se realizarão.'" 14- Nos autos de Processo Tutelar Comum que constituem o Apenso A, foi proferida decisão a 20.06.2018 nos seguintes termos: "Em face de todo o exposto, julgo procedente a presente acção e determino que se acrescente ao nome da menor os apelidos " R... " e "M...", passando a menor, actualmente registada como sendo CC a chamar-se "CC". 15- No ano de 2018 a requerida apresentou queixa contra o requerente pela prática de um crime de violência doméstica que deu origem ao Processo Comum Singular com o n° 488/18.3...e correu termos no Juízo Local Criminal do ... - J2. 16- O requerente visitou a menor CC todos os sábados entre 03.03.2018 e 20.03.2020 nos termos constantes do regime provisório mencionado em 13). 17- Durante o período mencionado em 16), as visitas foram sempre realizadas na cozinha estando instalada nesta divisão uma câmara de vigilância para controle dos movimentos do requerente em relação à menor. 18- As visitas do progenitor à filha foram suspensas a partir de Abril de 2020 por decisão comum dos progenitores, em virtude da situação pandémica por COVID 19 e por a CC, em virtude de se encontrar abrangida pelo dever especial de protecção, em virtude de ser portadora de doença respiratória crónica para efeitos de aplicação de medidas de distanciamento social, prevenção, contenção e mitigação e tratamento, de forma a evitar o contágio na sequência da pandemia por propagação de infecção epidemiológica por SARS-COV2 e da doença covid l9 (conforme alteração introduzida pelo Tribunal da Relação de Lisboa). 19- Tendo a 15.06.2020 proposto ao requerente que a partir dessa data visse a filha do lado de fora do muro da casa, sendo a menor trazida ao páteo ou à janela. 20- Por despacho proferido a 21.09.2020 foi determinada a alteração à redação da cláusula 2a do regime provisório mencionado em 13) nos seguintes termos: "O pai poderá estar com afilha todos os sábados, entre as 15 Horas e as 16 horas num espaço público da cidade do ..., preferencialmente, no Parque da Cidade. Tais visitas terão início no próximo sábado dia 26.09.2020." 21- A progenitora não fez comparecer a menor para os convívios com o pai nos termos fixados no regime provisório mencionado em 20). 22- Em 29.12.2020 a CC apresentava um nível de desenvolvimento adequado para a sua faixa etária em todas as áreas do desenvolvimento, com excepção das áreas "Fala e Linguagem" e "Cognitiva". 23- Com data de 11.01.2021, a progenitora solicitou à médica de família da menor, Dra. FF, que exerce funções no Centro de Saúde ..., que fizesse constar na declaração médica referente à CC que a mesma deveria permanecer no respectivo domicílio e não deveria contactar com outras crianças ou terceiros adultos. 24- O solicitado pela progenitora e mencionado em 23) não foi atendido pela médica em causa em virtude da mesma ter entendido que tal pedido ultrapassava as suas competências. 25- Das conclusões da perícia psicológica constantes do relatório junto a fls. 219 a 227 referente ao progenitor considera-se: "Não se observou a presença e sintomatologia, traços ou características de personalidade que possam ser considerados restritivos ou impeditivos para que consiga exercer toda as competências e as responsabilidades associadas à sua função parental deforma segura, autónoma, previsível e responsável..." 26- Das conclusões da perícia psicológica constantes do relatório junto a fls. 231 a 237 referente à progenitora considera-se: "Não se observou a presença e sintomatologia, traços ou características de personalidade que possam ser considerados restritivos ou impeditivos para que consiga exercer toda as competências e as responsabilidades associadas à sua função parental de forma segura, autónoma, previsível e responsável..." 27- Das conclusões da perícia psiquiátrica constante do relatório junto a fls. 369 a 373 referente ao progenitor considera-se "O examinado sofreu um episódio depressivo reativo no contexto de luto, em 2015 tendo sido tratado com psicofármacos em consulta de psiquiatria durante cerca de um ano, com remissão total do referido episódio; Só por si, a existência de antecedentes psiquiátricos não interfere com a capacidade do exercício das responsabilidades parentais ou retira quaisquer capacidades aos indivíduos que os apresentam; No caso em apreço, tal consistiu num episódio auto-limitado e contextualizada num situação de luto, o que o torna compreensível e com bom prognóstico, como se verificou; Não revela alterações psicopatológicas ao Exame do estado Mental actual; Não revela alterações ao Exame Pericial Psicológico específico e detalhado, realizado em 2018 no INMLCF.” 28- Das conclusões da perícia psiquiátrica constante do relatório junto a fls. 375 a 379 referente à progenitora considera-se " 1. A examinanda não tem história de doença ou perturbação mental; 2. Ainda que tivesse, só por si, a existência de antecedentes psiquiátricos não interfere com a capacidade do exercício das responsabilidades parentais ou retira quaisquer capacidades aos indivíduos que os apresentam; 3. Não revela alterações psicopatológicas major ao Exame do estado Mental actual, exceto marcada reatividade ansiosa, irritabilidade e reatividade emocional aquando do relato das vivências;" 29- O requerente é médico dentista por conta própria, tendo referido ter como rendimento mensal em 2018 a quantia de € 618,27, desconhecendo-se os rendimentos pelo mesmo concretamente auferidos na presente data. 30- A requerida é engenheira exercendo funções por conta de outrem, tendo referido auferir em 2018 subsídio no montante mensal no montante de € 857,80, desconhecendo-se os rendimentos pela mesma concretamente auferidos na presente data. 31- No âmbito do processo comum singular n°488/18.3... foi a 01.07.2021 32- Da perícia psicológica constante do relatório junto com a Ref 30952256 realizada ao aqui requerente no âmbito do processo comum singular n°488/18.3... considerou-se: "Ao requerente foi diagnosticada uma depressão reactiva à morte da primeira mulher, em início de 2015, e que não estaria remitida em 2016. O requerente apresenta traços disfuncionais de personalidade do tipo histriónico e borderline, activos pelos menos até final de 2018. 33- A requerida envia ao requerente através do telefone fotos da menor e vídeos da mesma”. Foram considerados como não provados os seguintes factos: “O tribunal a quo considerou não se ter provado qualquer outra factualidade com interesse para a decisão da causa, designadamente, que a casa onde o requerente vive não tenha condições de habitabilidade”. B. De Direito Tipo e objeto de recurso 1. No âmbito da presente ação de regulação do exercício das responsabilidades parentais proposta por AA contra BB, progenitores de CC, atualmente com 5 anos de idade, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “1- A CC fica a residir com a mãe, a quem incumbirá o exercício das responsabilidades parentais relativas aos actos da vida corrente da mesma. 2- As responsabilidades parentais respeitantes às questões de particular importância para a vida da CC devem ser decididas por ambos os progenitores, em conjunto, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro imediatamente. 3- Nos próximos oito meses, o pai poderá estar com a CC com a supervisão e nos moldes que forem delineados pelo CAFAP. 4- Após, e durante quatro meses, o pai poderá estar com a menor em fins-de-semana alternados, ao Sábado ou Domingo, entre as 10h00 e as 19h00, em sua casa. 5- Decorridos os quatro meses mencionados em 4), o pai poderá ter a menor consigo em fins-de-semana alternados, em sua casa, indo buscá-la à sexta-feira após as actividades lectivas ou, enquanto tal não sucede, às 19H00 na casa da progenitora entregando a menor no domingo na casa da mãe pelas 20H00. 6- O pai poderá ter a filha consigo durante uma semana nas férias do Natal e da Páscoa. 7- Nas férias de Verão da CC, o pai deverá conviver com a menor pelo menos 15 dias, em período a conciliar com a mãe até à altura do ano em que cada um dos progenitores tenha de definir as férias. 8- As datas festivas de Natal, Ano Novo, Carnaval e Páscoa serão repartidas entre os progenitores alternadamente, competindo ao outro progenitor no ano seguinte. 9- No aniversário da CC, cada progenitor tomará com ela uma das refeições principais, no ano seguinte alternam a refeição. 10- A CC passará o dia com cada progenitor aniversariante, bem como o dia do Pai e o dia da Mãe com o progenitor respectivo. 11- Nas férias de verão o pai poderá ter a menor consigo durante quinze dias seguidos, sendo este período dividido em períodos de uma semana, no caso de coincidência entre as férias de ambos os progenitores. 12- O pai contribuirá, a título de alimentos para a criança, com a quantia mensal de € 200,00 (duzentos euros), entregues à mãe até dia 8 de cada mês, por transferência bancária. 13- A quantia referida em 12) deverá ser actualizada anualmente em função do índice de inflação fixado pelo INE relativo ao ano anterior e com início em Abril de 2023. 14- Ambos os progenitores comparticiparão na proporção de metade as despesas médicas, medicamentosas e de educação da criança, na parte não comparticipada, mediante apresentação ao outro de recibo.” 2. Não conformada, a progenitora BB interpôs recurso de apelação. 3. A 30 de maio de 2022, foi organizado apenso de recurso de apelação que integrou a petição inicial, as alegações apresentadas pela progenitora (contestação), a sentença, as alegações de recurso de apelação e o despacho de admissão de recurso de apelação. 4. A 3 de junho de 2022, foi aberta conclusão com a seguinte informação “ao Ex.mo Juiz Relator Desembargador DD, deixando consignada a remessa por e-mail ao Sr. Desembargador, do histórico electrónico dos autos, bem como da decisão e alegações de recurso, em formato “Word””, tendo sido proferido o seguinte despacho “aos vistos e, de seguida, inscreva-se o processo em tabela”. 5. A 6 de junho de 2022, a Requerida/Recorrente apresentou requerimento, concluindo o seguinte: “termos em que, deve entender-se que o recurso foi interposto da decisão final e não de um “despacho que admitiu ou rejeitou um meio de prova”, considerando-se ainda para efeitos da sua apreciação os documentos identificados nas alegações de recurso com as respectivas referências citius ao abrigo do disposto no artigo 22.º da Portaria 280/2013.”. 6. A 27 de junho de 2022, foi aberta conclusão com a seguinte informação: “ao Ex.mo Juiz Relator Desembargador DD, com informação a Vª Exª de que não se inscreveu o processo em tabela conforme ordenado no despacho de 3/6/2022, face ao requerimento que antecede”, tendo sido proferido o seguinte despacho: “visto que o presente recurso tem por objecto a sentença final que regulou definitivamente as responsabilidades parentais relativamente à menor CC (e não qualquer decisão interlocutória – como erroneamente consta do despacho de admissão do recurso, no qual se invoca – a despropósito – a al. d) do n.º 2 do artigo 644.º do CPC), tal recurso sobre nos próprios autos (e não por apenso) – art- 644.º, n.º 1, al. a), do CPC. Assim sendo, solicite-se ao Tribunal “a quo” o envio do processo principal no qual foi proferida a sentença recorrida. Quando o processo for remetido a esta Relação, deverá o mesmo ser inscrito imediatamente em tabela, com dispensa de vistos, visto que os Ex.mos Adjuntos já apuseram o seu visto no presente apenso (indevidamente organizado pelo tribunal “aquo”) e, portanto, já tiveram acesso à sentença recorrida e às alegações e contra-alegações apresentadas pelo recorrente e pelo recorrido”. 7. A Requerida/Recorrente apresentou, então, requerimento, concluindo o seguinte: “termos em que, se invoca a nulidade processual de omissão de notificação das contra-alegações do recorrido, acto susceptível de influir na decisão da causa e requer-se a anulação de todo o processado subsequente ao acto omitido, ordenando a realizado do acto omitido.” 8. A 11 de julho de 2022, foi proferido despacho com o seguinte teor: “Requerimento de arguição de nulidade de 07/07/2022: Indeferido, porquanto: a) Deveu-se a um mero lapso de escrita a alusão feita do despacho do relator que mandou inscrever o processo em tabela (logo que recebido nesta relação o processo indevidamente retido pela 1ª Instância) às contra-alegações apresentadas pelo Recorrido; b) Não é imprescindível que os Adjuntos tenham acesso a todas e cada uma das peças processuais constantes dos autos que constituem o processo principal, podendo o relator – se a celeridade no julgamento o impuser – dispensar os vistos, com a concordância dos Adjuntos (art.º 675º-4 do CPC), entendendo-se ser esse o caso dos autos, motivo pelo qual se reitera a determinação no sentido de o processo ser imediatamente inscrito em tabela, logo que recebido nesta Relação, com dispensa de vistos dos Exmos Juizes Adjuntos. Notifique. LX, 11/07/2022. DD”. 9. A 14 de julho de 2022, foi proferido o acórdão recorrido. 10. Não resignada, a Requerida BB interpôs recurso de revista. (In)admissibilidade do recurso A admissibilidade do presente recurso já foi apreciada nos autos, nada havendo a acrescentar a este propósito. Nulidade ou não do acórdão recorrido por omissão de ato suscetível de influir na decisão da causa 1. Da leitura conjugada das alegações de recurso de revista com as respetivas conclusões resulta que a Requerida/Recorrente coloca, essencialmente, duas questões ao Supremo Tribunal de Justiça: saber se a admissão do recurso com subida em separado e com junção de apenas algumas peças processuais e decisões “que aproveitam apenas ao recorrido” e se a inscrição em tabela remetida aos Adjuntos em data anterior à abertura da conclusão (3 de junho de 2022) importam a verificação de uma nulidade processual por omissões e irregularidades passíveis de influir no exame da causa. 2. Pode, todavia, dizer-se desde já que parece não assistir qualquer razão à Requerida/Recorrente, não se vendo que tenha sido praticada irregularidade ou omitida qualquer formalidade suscetíveis de influir no exame da causa. 3. De acordo com o art. 657.º do CPC: “1 - Decididas as questões que devam ser apreciadas antes do julgamento do objeto do recurso, se não se verificar o caso previsto no artigo anterior, o relator elabora o projeto de acórdão no prazo de 30 dias. 2 - Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação. 3 - Se o volume das peças processuais relevantes tornar excessivamente morosa a extração de cópias, o processo vai com vista aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias a cada um. 4 - Quando a natureza das questões a decidir ou a necessidade de celeridade no julgamento do recurso o aconselhem, pode o relator, com a concordância dos adjuntos, dispensar os vistos.”. 4. Decorre do disposto no art. 657.º, n.º 1, do CPC, que o Relator elabora o projeto de acórdão no prazo de trinta dias a contar, naturalmente, da data da abertura da conclusão, nada impedindo que o referido projeto seja elaborado no próprio dia da abertura da conclusão. De facto, a lei processual civil pátria estabelece um prazo indicativo para a elaboração de acórdão, não estando vedada a hipótese de o projeto de acórdão ser elaborado em data subsequente ou em data coincidente com a da abertura da conclusão. 5. Com efeito, “quem dirige o processo é o relator, e não a secretaria, devendo esta esperar pela indicação daquele para inscrever o processo em tabela. Ainda que o respeito pelos prazos deva ser preocupação do relator, a especial complexidade do caso e a necessidade de preservar o correto julgamento é que devem comandar a tramitação procedimental. Noutra perspetiva, nada obriga a que a inscrição do processo em tabela para julgamento tenha de aguardar tal prazo, podendo o relator promovê-la logo que disponha do projeto de acórdão.”1. 6. Não está em causa a apresentação de um acórdão final, mas antes de um projeto, sujeito à discussão com os Adjuntos e, evidentemente, a alterações que podem ocorrer até ao dia do julgamento. 7. Por conseguinte: - de um lado, quando a 3 de junho de 2022 – e não em data anterior, ao contrário do que invoca a Requerida/Recorrente -, o Relator determinou a inscrição em tabela e remeteu os autos aos Adjuntos para os vistos, fê-lo por referência a um projeto de acórdão e não por referência a um texto final e imodificável; - de outro lado, o processo não foi inscrito em tabela tal como ordenado, mas apenas o foi depois da remessa dos autos na sua totalidade, conforme ordenado por despacho de 27 de junho de 2022. Assim, ainda que o recurso tenha sido erroneamente autuado por apenso, a verdade é que tal decisão foi revertida por decisão do Tribunal da Relação de Lisboa e o processo foi remetido, na sua globalidade, ao Tribunal de recurso. 8. Deste modo, afigura-se claro que, no momento da inscrição em tabela, o Relator dispunha já de todos os elementos necessários à boa decisão da causa. 9. Era pois lícito ao Relator dispensar os vistos, estando tal possibilidade prevista no art. 657.º, n.º 4, do CPC. Não está em causa a desnecessidade de apreciação dos documentos constantes dos autos principais, mas antes e apenas uma decisão relativa à necessidade de remeter o processo aos vistos. 10. A possibilidade de dispensa de vistos é matéria sujeita a decisão do Relator, com fundamento na natureza das questões a decidir ou na necessidade de celeridade, não estando dependente da ponderação da necessidade ou desnecessidade de apreciar a documentação constante dos autos. I.e.: a dispensa dos vistos não dispensa, naturalmente, o cumprimento do dever de pronúncia sobre todas as questões suscitadas em sede de recurso de apelação, no qual se integra o dever de pronúncia sobre os meios de prova invocados pela Apelante em sede de impugnação da matéria de facto. 11. Saliente-se, por fim, que, como é sobejamente sabido, o verdadeiro desiderato de qualquer processo judicial consiste na proferição de uma decisão de mérito, perante a qual as normas procedimentais se assumem como instrumentais e acessórias. 12. Assim, “(…) malgrado a descrição dos passos que continua a ser feita no art. 657.°, não vemos obstáculos intransponíveis a que o relator adote a tramitação que se revele mais eficaz e célere em face das circunstâncias do caso concreto. Afinal, o objetivo fundamental de toda a tramitação é o de permitir que os demais juízes cooperem na atividade decisória, sendo relativamente secundário o modo como tomam conhecimento dos dados tendentes a satisfazer tal objetivo. Assim, atenta a função instrumental da tramitação processual e pondo o acento tónico no efetivo conhecimento do objeto do recurso, não está afastada a possibilidade de continuar a verificar-se o sistema de vistos no próprio processo, o que, em certos casos, pode ser mais profícuo e mais eficiente do que a obediência estrita ao que a lei determina. A norma do n.º 3 é indiciadora da necessidade de ser o relator a ponderar qual o método de trabalho capaz de conduzir a melhores resultados e que promova uma efetiva colegialidade.”2. 13. Deste modo, ainda que se concluísse pela verificação de um desvio à tramitação legal dos recursos prevista nas normas legais aplicáveis – que, reitere-se, não se verifica -, ainda assim tal afastamento se mostraria justificado à luz da natureza acessória e instrumental das regras procedimentais respeitantes ao conhecimento do objeto do recurso. 14. Pode, pois, afirmar-se que saber se o Relator considerou, na elaboração do projeto de acórdão, que acabou por ser votado, a documentação invocada pela Requerida/Recorrente em sede de recurso de apelação é matéria que respeita à eventual verificação de vícios do acórdão ou, no limite, à eventual verificação de erro de julgamento, não estando em causa qualquer nulidade processual. 15. Importa apreciar a eventual nulidade do acórdão recorrido por omissão de pronúncia, já que parece resultar da alegação da Requerida/Recorrente que, em sua opinião, o Tribunal da Relação de Lisboa não se pronunciou sobre os elementos de prova invocados em sede de recurso de apelação. 16. Esta alegação convoca a aplicabilidade do disposto no art. 615.º, n.º 1, al. d), 1.ª parte, do CPC, aplicável ex vi do art. 666.º, n.º 1, do mesmo corpo de normas, segundo o qual “é nula a sentença quando: (…) d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. 17. Essa nulidade prende-se, essencialmente, com o comando normativo contido no art. 608.º, n.º 2, do CPC, que estabelece que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.”. 18. Sobre a matéria dos deveres de pronúncia do Tribunal da Relação, o Supremo Tribunal de Justiça tem entendido pacificamente que “em face da impugnação da decisão de facto configurada pelo recorrente, a Relação deve proceder à análise crítica dos concretos meios de prova indicados como fundamento de impugnação”3 e que o «“o conceito de “questão”, deve ser aferido em função direta do pedido e da causa de pedir aduzidos pelas partes ou da matéria de exceção capaz de conduzir à inconcludência/improcedência da pretensão para a qual se visa obter tutela judicial, dele sendo excluídos os argumentos ou motivos de fundamentação jurídica esgrimidos/aduzidos pelas partes.”»4. 19. No caso sub judice, resulta da análise do acórdão recorrido que o Tribunal da Relação de Lisboa se pronunciou, especificadamente, sobre a pretendida atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso, sendo claro que a circunstância de ter decidido em sentido contrário ao pretendido pela Requerida/Recorrente não impõe a conclusão de que omitiu a pronúncia requerida. 20. Saber se decidiu bem ou mal é matéria que se situa no domínio do erro de julgamento e não no plano de uma eventual nulidade por omissão de pronúncia. 21. No que concerne à impugnação da matéria de facto dada como provada, a conclusão não pode deixar de ser a mesma. Com efeito, do cotejo do teor da impugnação da matéria de facto com aquele do acórdão recorrido resulta evidente que o Tribunal da Relação de Lisboa se pronunciou sobre os elementos invocados pela Requerida/Recorrente em sede de recurso de apelação, tendo, de resto, julgado parcialmente procedente a sua pretensão. 22. À semelhança do que foi mencionado supra, saber se o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu bem ou mal é matéria que se situa já no domínio do erro de julgamento, não sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, por estarem em causa provas sujeitas ao princípio da livre apreciação do julgador. 23. Improcedem, assim, as conclusões da Requerida/Recorrente por BB. Do valor extraprocessual das provas 1. A Requerida/Recorrente invoca que o Tribunal recorrido devia ter considerado a perícia realizada ao Requerente/Recorrido, progenitor, na qualidade de arguido no âmbito do processo-crime n.º 488/18.3... Entende que que a sua utilização nos presentes autos faz prova plena quanto ao afirmado, a esse respeito, no referido processo-crime. 2. Em sua opinião, a ponderação pelas Instâncias do relatório pericial elaborado em sede de processo-crime conduziria inelutavelmente a que as conclusões aí alcançadas pelo perito a propósito da personalidade do Requerente/Recorrido fossem consideradas como plenamente provadas. 3. Afigura-se claro que não assiste qualquer razão à Requerida/Recorrente. 4. Conforme o art. 421.º do CPC: “1 - Os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 355.º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova. 2 - O disposto no número anterior não tem aplicação quando o primeiro processo tiver sido anulado, na parte relativa à produção da prova que se pretende invocar.”. 5. No caso em apreço a Requerida/Recorrente confunde o plano do aproveitamento de provas produzidas num outro processo com a respetiva força probatória. 6. De facto, o Tribunal da Relação de Lisboa não afirmou, em momento algum, que não podia considerar o relatório elaborado em processo-crime, que, de resto, determinou que fosse dado como provado o teor da perícia (facto provado sob o n.º 32). O que o Tribunal recorrido afirmou foi antes que o teor da perícia realizada em sede de processo-crime, uma vez confrontado com os demais elementos de prova produzidos nos presentes autos, nomeadamente com a perícia psiquiátrica, não era suficiente para ser considerada como prova inequívoca de que as capacidades parentais do progenitor se mostravam comprometidas e diminuídas. 7. E podia fazê-lo. 8. Na verdade, estão em causa duas perícias realizadas em processos de diferente naturezas, mas que, no essencial, têm lugar mediante o recurso às mesmas técnicas e conhecimentos científicos e à luz das leges artis aplicáveis ao caso. 9. Assim, de um lado, a mera circunstância de a perícia psiquiátrica realizada no âmbito do processo-crime ter concluído no sentido pretendido pela Requerida/Recorrente não significa que tal meio de prova valha mais do que a perícia psiquiátrica realizada nos autos e, de outro lado, uma vez importada prova pericial constituída no âmbito de processo de natureza distinta para o processo civil, aquela não pode deixar de valer como prova pericial que é, com a força probatória que lhe é reconhecida em processo civil. 10. Efetivamente, “quanto ao valor probatório a prova emprestada será tratada como a demais prova do segundo processo, não sendo nem valorizada, nem desvalorizada. Assim, tanto a prova testemunhal como pericial estão sujeitas na causa cível ao princípio da apreciação da prova segundo a livre convicção do juiz do art. 655.º o que não muda com o processo ter sido penal”5. – 11. Sendo assim, impõe-se levar em devida linha de conta o art. 389.º do CC, de acordo com o qual “a força probatória das respostas dos peritos é fixada livremente pelo tribunal”. 12. Estamos, pois, no domínio do princípio da livre apreciação da prova. 13. Deste modo, “a força probatória das perícias, incluindo das perícias médico-legais, é apreciada livremente pelo tribunal — daí que o Supremo Tribunal de Justiça não possa pronunciar-se sobre os resultados da livre apreciação da prova pericial.” 6 14. In casu, afigura-se claro que a Requerida/Recorrente não se conforma com a valoração levada a cabo pelas Instâncias da prova produzida nos autos e da prova pericial efetuada em processo-crime. Contudo, como resulta da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça mencionada supra, este Tribunal não pode interferir na apreciação que as Instâncias fizeram da prova pericial produzida, já que esta se encontra sujeita ao princípio da livre apreciação do julgador. 15. Refira-se, por último, que a mera discordância da Requerida/Recorrente com o sentido decisório adotado pelas Instâncias não significa a violação de qualquer princípio ou norma processual. 16. Improcedem, assim, as conclusões da Requerida/Recorrente. Violação ou não dos princípios da igualdade e imparcialidade 1. A Recorrente alega ainda a violação dos princípios da igualdade e da imparcialidade por i) o recurso ter sido remetido ao Tribunal da Relação de Lisboa apenas com algumas peças processuais e ii) por terem sido indeferidos os sucessivos requerimentos de prova por si apresentados. 2. No que respeita ao conhecimento do objeto do recurso apenas com base em determinadas peças ou no processo na sua totalidade, remete-se para o que foi mencionado supra. De facto, o mero inconformismo da Requerida/Recorrente com o sentido decisório propugnado pelas Instâncias não determina a conclusão de que o princípio da igualdade e da imparcialidade foram violados. Não se identifica qualquer vício suscetível de afetar o acórdão recorrido e que importe a sua revogação. 3. “(…) o conteúdo jurídico-constitucional do princípio da igualdade tem vindo progressivamente a alargar-se, de acordo com a síntese dialéctica dos “momentos” liberais, democráticos e sociais. O seu âmbito de protecção abrange na ordem constitucional portuguesa as seguintes dimensões: a) proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento, para situações manifestamente desiguais; b) proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre cidadãos baseadas em categorias meramente subjectivas ou em razão dessas categorias ( cfr. nº 2, onde se faz expressa menção de categorias subjectivas que historicamente fundamentaram discriminações); c) obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação, pelos poderes públicos, de desigualdades fácticas de natureza social, económica e cultural ( cfr. , por ex., arts. 9º/d e f, 58º-2/b e 74º-1).”7. 4. O acórdão recorrido não violou o princípio da igualdade, pois o Tribunal recorrido não agiu com arbítrio e não discriminou qualquer das partes. Além disso, ambas as partes tiveram a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontram em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. 5. Não se verifica a inobservância do princípio da imparcialidade, porquanto o julgador atuou com isenção, não tomando partido por qualquer das partes, não favorecendo uma em detrimento da outra. Foi respeitado o direito de ambas as partes a um processo equitativo. 6. Impõe-se, por isso, concluir pela inexistência de qualquer violação do princípio da igualdade e da imparcialidade e, ainda, pela inexistência de qualquer erro na aplicação das normas jurídicas aplicáveis. 7. No que toca ao indeferimento de meios de prova solicitados pela Requerida/Recorrente, nomeadamente a realização de inspeção judicial à casa do Requerente/Recorrido, importa apenas recordar que ao Supremo Tribunal de Justiça compete apreciar as decisões proferidas pelo Tribunal recorrido. 8. De facto, “os recursos apenas visam a reapreciação das decisões objeto dos mesmos e, concomitantemente, a reapreciação das questões que, tendo sido oportunamente suscitadas, ali foram objeto de apreciação, que não a apreciação de questões novas – a menos que se trate de questões que sejam de conhecimento oficioso.”8. 9. No caso dos autos, a matéria relativa à rejeição de meios de prova não é de conhecimento oficioso, sendo claro que o Tribunal da Relação de Lisboa não se pronunciou sobre tal questão por tal matéria não ter sido suscitada em sede de recurso de apelação. 10. Por isso, trata-se de questão nova que, enquanto tal, se encontra subtraída aos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça. 11. Perante a improcedência das questões suscitadas pela Requerida/Recorrente, parece não haver motivos para modificar a decisão adotada pelas Instâncias sobre a regulação do exercício das responsabilidades parentais da menor CC. 12. Na verdade, “nos processos de jurisdição voluntária só é admissível recurso para o Supremo quando as resoluções proferidas, excedendo critérios de mera conveniência ou oportunidade, emirjam de critérios de estrita legalidade, nestes se baseando exclusivamente, não bastando, consequentemente que o acórdão impugnado tenha interpretado normas jurídicas.”9. 13. Assim, “no âmbito de um processo de jurisdição voluntária, a intervenção do STJ pressupõe, atenta a sua especial incumbência de controlar a aplicação da lei processual ou substantiva, que se determine se a decisão recorrida assentou em critérios de conveniência e de oportunidade ou se, diferentemente, a mesma corresponde a um processo de interpretação e aplicação da lei.”10. 14. No caso sub judice, as Instâncias socorreram-se de critérios de oportunidade e conveniência para estabelecer a regulação do exercício das responsabilidades parentais da menor, em decisão não sindicável pelo Supremo Tribunal de Justiça, não se mostrando violadas, conforme referido supra, quaisquer normas jurídicas aplicáveis. 15. Por último, recorde-se que qualquer decisão nesta matéria como que está sujeita à cláusula rebus sic stantibus. IV – Decisão Nos moldes expostos, acorda-se em julgar improcedente o recurso interposto por BB, confirmando-se o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. Custas pela Recorrente. Lisboa, 9 de Maio de 2023
Maria João Vaz Tomé (Relatora) António Magalhães Jorge Dias _____________________________________________
1. Cf. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2022, pp. 320 e ss.↩︎ 2. Cf. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2022, p. 322.↩︎ 3. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de outubro de 2022 (António Magalhães), proc. n.º 6431/13.9TBOER.L1.S1- disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/38f33c44b0c8358280256879006bc013?CreateDocument.↩︎ 4. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de outubro de 2022 (Isaías Pádua), proc. n.º 602/15.0T8ALHL1-A.S1.↩︎ 5. Cf. Rui Pinto, “Valor Extraprocessual da Prova Penal na Demanda Cível. Algumas linhas gerais de solução”, in Colectânea de Estudos de Processo Civil, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, pp. 98 e ss.↩︎ 6. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de setembro de 2022 (Nuno Pinto de Oliveira), proc. n.º proc. n.º 786/20.6T8PVZ.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e86a50324642217d802588bf00481f22?OpenDocument. Vide, inter alia, no mesmo sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 31 de março de 2022 (Rijo Ferreira), proc. n.º 812/06.1TBAMT.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0bcb9f5ede9038fa8025881600564a22?OpenDocument; de 15 de fevereiro de 2018 (Fátima Gomes), proc. n.º 4084/07.2TBVFX.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/437b6cd872a3f41d8025823d0051ac7f?OpenDocument; de 27 de fevereiro de 2018 (Helder Roque), proc. n.º 594/13.0TBBNV.E1.S1.↩︎ 7. Cf. J.J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I , Coimbra, Coimbra Editora, 2014, p. 339.↩︎ 8. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de janeiro de 2019 (Acácio das Neves), proc. n.º 26688/15.0T8LSB.L1.S2. Vide, inter alia, no mesmo sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de acórdãos do STJ de 28 de fevereiro de 2023 (António Magalhães), proc. n.º 320/18.8T8TND.C1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1dff2792e3b0bc9e80258978003a02e2?OpenDocument; de 19 de janeiro de 2023 (Fátima Gomes), proc. n.º 682/18.7T8PVZ.P1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/74675d7cce16eeb48025894000598049?OpenDocument; e de 15 de dezembro de 2022 (Maria da Graça Trigo), proc. n.º 125/20.6T8TND.C1-A.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/56ad739b266e41b58025891a00346f2a?OpenDocument.↩︎ 9. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de julho de 2017 (José Raínho), proc. n.º 996/16.0T8BCL-D.G1-A.S1. Vide, inter alia, Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de fevereiro de 2020 (Fátima Gomes), proc. n.º 29241/16.7T8LSB-A.L1.S1; de 7 de novembro de 2019 (Paula Sá Fernandes), proc. n.º 1971/12.0TBCSC.L2.S1; de 3 de outubro de 2019 (Rosa Ribeiro Coelho), proc. n.º 784/18.0T8FAF-B.G1.S1; e de 27 de junho de 2019 (Maria Olinda Garcia), proc. n.º 8003/15.4T8GMR-B.G1.S1.↩︎ 10. Cf. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de junho de 2019 (Maria dos Prazeres Beleza), proc. n.º 2215/12.0TMLSB-B.L1.S1 – disponível para consulta in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/38f33c44b0c8358280256879006bc013?CreateDocument..↩︎ |