Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4.ª SECÇÃO | ||
Relator: | JÚLIO GOMES | ||
Descritores: | DESPEDIMENTO EXTINÇÃO DO POSTO DE TRABALHO | ||
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Data do Acordão: | 03/30/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO. | ||
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Sumário : |
I- A decisão de externalização de um serviço, cujas funções não foram distribuídas pelo remanescente da estrutura produtiva, constitui uma modificação estrutural que, nos termos da lei, pode servir de fundamento a um despedimento por extinção do posto de trabalho. II- A referida decisão de externalização pode assentar na insatisfação do empregador com a qualidade ou quantidade do serviço prestado na secção ou departamento que encerra, mas sem que tal se traduza na imputação de culpa aos trabalhadores visados pelo despedimento, e, portanto, sem que se verifique qualquer violação do artigo 368.º n.º 1 alínea a) do CT. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 9989/19.5T8 PRT.P1.S1 Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça,
1. Relatório.
AA, apresentou formulário para instauração de ação especial de impugnação judicial da licitude e regularidade do despedimento contra Montepio Crédito, Instituição Financeira de Crédito, SA, opondo-se ao despedimento de que foi alvo. O Empregador apresentou articulado de motivação do despedimento, no qual alegou os factos que estiveram na base de tal decisão, tendentes a demonstrar a extinção do posto de trabalho do Autor, decorrente da externalização do serviço de arquivo a que o mesmo estava afeto. O trabalhador contestou e deduziu reconvenção. A Ré respondeu. Realizado o julgamento foi proferida sentença que decidiu ser ilícito o despedimento.
O empregador recorreu. O trabalhador contra-alegou e interpôs recurso subordinado. O Tribunal da Relação proferiu Acórdão, revogando a sentença objeto de recurso, absolvendo a Ré do pedido formulado pelo trabalhador, tendo igualmente considerado improcedente o recurso subordinado interposto por este último.
Inconformado, o Autor interpôs recurso de revista com as seguintes Conclusões:
1. O presente recurso vem interposto do Acórdão de fls. proferido pelo Venerando Tribunal da Relação ... que julgou procedente o recurso do ora Recorrido, e em consequência decidiu julgar lícito o despedimento por extinção do posto de trabalho promovido por este. 2. Considera o Recorrido que o Acórdão está ferido de nulidade; ainda ao decidir como decidiu incorreu em erro de julgamento; e por fim viola ainda os arts. 368/1/al. a) e 384/al. a) do Código do Trabalho (CT). 3. O presente recurso pretende que o Tribunal ad quem veja apreciada as seguintes questões, uma vez que considera que ocorreu violação da lei adjetiva e substantiva no Acórdão em crise: a). Nulidade do Acórdão por decisão-surpresa; b) Nulidade do Acórdão por oposição entre os fundamentos e a decisão - c) Erro de julgamento (error in judicando) por aplicação errada do direito decorrente da errada interpretação dos factos; d) Violação dos art. 368/1/al. a) e 384/al. a) do Código do Trabalho (CT). 4. De fls. 45 a 48 do Acórdão em crise, considerou o referido aresto pela nulidade da sentença, por alegadamente os fundamentos desta se encontrarem em oposição com a decisão. 5. Considerou-se então pela existência de contradição entre os fundamentos da sentença e a decisão, nos termos mais bem descritos e transcritos nas alegações, para cujo conteúdo expressamente se remete. 6. Considera o Recorrente que ocorreu decisão-surpresa em virtude de ser declarada nula a sentença sem ter sido este notificado para se pronunciar, em clara violação do princípio do contraditório e do art. 665/3 do CPC. Isto porque, 7. O Tribunal a quo conhece da alegada nulidade nos termos alegados no requerimento de recurso do Recorrido, contudo decide ir mais longe do que o alegado, fundamentando a sua decisão não só com base nos argumentos aduzido pelo Recorrido, mas também aduzindo novos fundamentos que, no entender do mesmo, são razão para a declaração de nulidade – veja-se, a fls. 47 do Acórdão, que o Tribunal acrescenta que “é igualmente ponderado não estar demonstrada a necessidade imperiosa da Ré proceder à digitalização dos seus documentos”. 8. Este fundamento não foi apontado no requerimento de recurso do Recorrido, pelo que o Recorrente não teve possibilidade de, quanto ao mesmo, e à concatenação entre este os restantes fundamentos, se pronunciar, atentos ainda os factos provados 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 83 e 84, pelo que constitui a declaração da nulidade da sentença uma verdadeira decisão-surpresa, razão pela qual deverá ser declarado nulo o Acórdão com os devidos efeitos legais. 9. Os fundamentos do Acórdão em crise encontram-se em manifesta oposição com a decisão, uma vez que deflui do mesmo que o Recorrente agiu em violação dos deveres laborais passíveis de constituírem ilícitos disciplinares, o que de forma lógica teria de conduzir à decisão de nulidade do despedimento por extinção do posto de trabalho, por violação do art. 368/1/al. a) do Código do Trabalho. 10. Ou seja, o Recorrente foi despedido devido a atos culposos cuja responsabilidade repousa sobre si, bem como sobre o Banco. 11. Dos factos provados 33, 38, 43, 51, 54 a 61, 63, 64, 72/al. e) e f) decorre que Recorrido e Recorrente, em diversos momentos da execução do contrato de trabalho, agiram de forma culposa – e os ditos factos provados são levados à colação a fls. 56 a 58 do Acórdão em crise, pelo que consideramos que não estamos perante uma alegação de contradição entre os factos provados e a decisão, mas sim uma contradição e desvio de um raciocínio lógico, na medida em que os ditos factos servem de fundamentação, mas conduzem a uma decisão contrária à lógica, que seria a da declaração de nulidade do despedimento. 12. O Acórdão em crise encontra-se fundamentado, no trecho que nas alegações se deixa transcrito e para o qual expressamente se remete, que resulta provado que existiu uma conduta omissiva (ou seja, uma conduta culposa, ainda que negligente) do Recorrido, e ainda provado que o Banco apontou diversos ilícitos disciplinares ao trabalhador para fundamentar a sua decisão. 13. Os Mmo. Juízes Desembargadores remetem expressamente para a matéria factual provada para fundamentar a decisão de considerar que o despedimento do Recorrente foi lícito, como resulta do texto do Acórdão que supra se transcreveu. 14. Resulta dos factos provados 33, 38, 43, 51, 54 a 61, 63, 64, 72/al. e) e f), bem como da decisão de despedimento junta aos autos com o formulário de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, que o Recorrido imputa ao Recorrente atos passíveis de censura disciplinar, culposos e que convolam a decisão de despedimento em ilícita (vd. art. 384/al. a) do CT). 15. Não se compreende que, ainda que se encontrem nos autos, como demonstrado, fortemente indiciadas atitudes culposas do empregador e do trabalhador, as quais são expressamente assumidas pelo Recorrente, a decisão em crise considere de forma liminar que “não importa ter a Ré imputado ao Trabalhador uma conduta culposa” e declare lícito o despedimento do trabalhador. 16. Não pode deixar de ser manifesta e notória a importância do facto de o empregador ter imputado ao trabalhador factos culposos da sua autoria para fundamentar a decisão do despedimento por via da externalização, já que não se atribuindo importância, como acontece, admite-se expressamente que não importa para o Tribunal o cumprimento do direito substantivo – o que não é admissível. 17. Se assim entende o Tribunal a quo, estamos perante uma violação do direito de acesso à justiça (art. 2 do CPC e 20 da CRP) - as decisões judiciais visam dar resposta às pretensões das partes, subsumindo os factos ao direito, e proferindo decisões que, de forma clara, sejam passíveis de ser entendidas pelos seus destinatários, que são as partes. 18. O Tribunal, ao ignorar sem apresentar qualquer motivo ou fundamento para desconsiderar a confissão do Recorrente relativamente ao facto de ter este considerados factos culposos do trabalhador para a tomada de decisão de despedimento, demite-se das suas funções de garantir uma decisão que seja percetível pelos seus destinatários. 19. Os seus destinatários terão de entender o encadeamento lógico que levou à decisão - e não, simplesmente e sem mais, bastar-se a afirmação de que não tem interesse o facto do Banco ter confessado algo que, por respeito ao direito substantivo, levaria à partida à declaração da ilicitude do despedimento. 20. Não existe qualquer fio condutor lógico que possa ter como decisão a montante aquilo que a jusante se fundamentou em sentido contrário. 21. O Tribunal a quo, ao fundamentar a sua decisão com base no acervo probatório citado, bem como concluindo pela existência de factos culposos praticados pelo Recorrente (“não importa ter a Ré imputado ao Trabalhador uma conduta culposa”), teriam de forma lógica que concluir pela ilicitude do despedimento em cumprimento dos art. 368/1/al. a) e 384/al. a) do CT, ao contrário do que sucede - o que fere de nulidade a decisão em crise. 22. Ademais, o Tribunal não só considera (vd. fls. 47 do Acórdão) que concorda com a sentença na medida em que na mesma se refere que não cabe ao Tribunal substituir-se à empresa para se decidir como se resolve, em termos de gestão, um determinado aumento de serviço, acrescentando ainda os Venerandos Desembargadores que “é igualmente ponderado não estar demonstrada a necessidade imperiosa da Ré proceder à digitalização dos seus documentos. Não tinha que assim suceder por tal necessidade ser outrossim uma avaliação a ser efetuada em termos de gestão empresarial, não incumbindo ao Tribunal conferir a mesma”. 23. Não se compreende como é considerado na fundamentação que não cabe ao Tribunal substituir-se à empresa na tomada de decisões de gestão empresarial, quando em sentido diametralmente oposto considera que “Tratou-se, assim, em nosso entender, de um ato de gestão perfeitamente justificado por motivos estruturais, suscetíveis de fundar que essa reestruturação se apresenta como vantajosa da organização, por os gasto económicos subjacentes à externalização do arquivo serem inferiores aos valores gastos com obras necessárias, espaço e trabalhadores afetos, para além da segurança dos documentos e eficácia do serviço”, 24. Ou bem que o Tribunal não se pode substituir à empresa na tomada de decisões de gestão empresarial, ou se bem que considera poder avaliar a bondade dos atos de gestão da empresa e daí extrair conclusões quanto à (i)licitude do despedimento – ocorrendo, também nessa medida, uma ambiguidade gritante e que fere de nulidade o Acórdão em crise, revelando-se o mesmo de contraditório e, por maioria de razão, ininteligível, devendo por isso ser declarado nulo. Caso assim não se entenda, 25. Considera o Recorrente que existe manifesto erro de julgamento, uma vez que o Acórdão em crise procedeu a uma aplicação errada do direito decorrente de errada interpretação dos factos. 26. Os fundamentos do Acórdão em crise encontram-se em manifesta oposição com a decisão, uma vez que deflui do mesmo que o Recorrente agiu em violação dos deveres laborais passíveis de constituírem ilícitos disciplinares, o que de forma lógica deveria conduzir à decisão de nulidade do despedimento por extinção do posto de trabalho, por violação do art. 368/1/al. a) do Código do Trabalho, ou seja, o Recorrido ter sido despedido devido a atos culposos cuja responsabilidade repousa sobre si, bem como sobre o Banco. 27. A este propósito já se deixaram as considerações pertinentes nas conclusões 11 a 24, para as quais expressamente se remete e aqui se deixam transcritas, por economia processual, para os devidos efeitos legais. 28. Sendo que, caso este Tribunal não considere a alegada nulidade (o que não se aceita, mas se acautela por dever de patrocínio), sempre deverão as citadas conclusões serem observadas tendo por referencial o erro de julgamento apontado – como aliás decorre das alegações, para cujo conteúdo expressamente se remete. 29. E assim sendo, em consequência, ser declarado erro de julgamento e revogado o Acórdão em crise, declarando-se ilícito o despedimento do Recorrente. Por fim, 30. Considera ainda o Recorrente que aplicou o Tribunal a quo erradamente o art. 368/1/al. a) do CT, ao considerar que “não importa ter a Ré imputado uma conduta culposa ao Trabalhador” e daí não ter extraído a consequência natural que seria a de considerar ilícito o despedimento do Recorrente nos termos do art. 384/al. a) do CT. 31. Como decorre da decisão de despedimento junta aos autos com o formulário de impugnação do despedimento (art. 98-C e 98-D do Decreto-Lei 295/2009, de 13/10), datado de 05/06/2019, bem como dos factos provados 33, 38, 43, 51, 54 a 61, 63, 64, 72/al. e) e f), o Recorrido imputa ao Recorrente factos culposos, passíveis de censura disciplinar. 32. Em concreto é imputado ao Recorrente um incumprimento constante e recorrente das instruções do Banco relativamente à prestação do seu serviço -, e que são o verdadeiro motivo para a extinção do vínculo laboral, optando, contudo, por extinguir o posto de trabalho ao invés de puni-lo disciplinarmente. 33. Resulta claro da decisão de despedimento que a extinção do posto de trabalho não foi mais do que uma forma de, a coberto de uma alegada decisão de gestão empresarial para otimização dos custos do Banco, despedirem o trabalhador pelo facto do mesmo não cumprir com brio e zelo as instruções superiormente emanadas. 34. Ou seja, numa clara distorção dos deveres laborais do mesmo para com o Recorrido, passíveis de atuação disciplinar deste, surgindo nesta medida a extinção do posto de trabalho como uma verdadeira fraude à lei pela declarada intenção de fazer cessar o contrato de trabalho quando não existiam motivos suficientemente fortes nos ilícitos laborais enunciados que tornassem insustentável a manutenção do vínculo. 35. Como decorre dos autos, tendo o Recorrido plena consciência de que não tinha elementos factuais suficientemente fortes para aplicar ao Recorrente uma decisão de despedimento com justa causa, optou por efabular uma alegada desnecessidade do posto de trabalho deste para desse modo tentar cobrir de legalidade a quebra do vínculo contratual – o que nunca poderá merecer a concordância do Recorrente e, cremos, deste Supremo Tribunal de Justiça. 36. Assim, deverá ser revogado o Acórdão recorrido, considerando-se ilícito o despedimento do Recorrente por violação do art. 368/1/al. a), nos termos do art. 384/al. a) do CT, e em consequência ser ordenada a reintegração do mesmo no Recorrido. E rematava pedindo a revogação do Acórdão recorrido e declarado ilícito o despedimento do Autor. O Réu contra-alegou. O Ministério Público, em cumprimento do disposto no n.º 3 do artigo 87.º do CPT, emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso.
2. Fundamentação
De Facto
Foi a seguinte a matéria de facto dada como provada nas instâncias:
1. O Réu é uma instituição de crédito e exerce a atividade bancária.
2. Participou nas negociações e outorgou o ACT para o Grupo Montepio, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 8, de 28/02/2017, págs. 516 e ss., instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte.
3. O Autor encontra-se filiado no Sindicato dos Bancários ... (SB...), onde figura como o sócio n.º ....
4. O Montepio Crédito, S.A. desenvolve a sua atividade social na área de concessão de crédito especializado, nomeadamente relacionado com o mercado automóvel (65%), de equipamento (27%) e de bens de consumo duradouro (8%).
5. O trabalhador AA presta serviço ao Montepio Crédito, tendo-lhe esta instituição atribuído a categoria profissional de ....
6. O Autor foi integrado no Departamento de ... no ano de 2007.
7. Em 2010 o Autor assumiu a posição que pertencia à colega BB, desempenhando as seguintes funções: a. Receção e organização administrativa de documentação original do negócio da empresa, nomeadamente de contratos e livranças dos clientes; b. Gestão documental de todos os pedidos dos departamentos da empresa; c. Planeamento e coordenação com a empresa externa (EAD) na execução de tarefas na plataforma de arquivo digital da empresa; d. Acompanhamento de empresas externas (P.…, etc.) e internas (CEMG) no que respeita à segurança e condições das instalações, efetuando relatórios periódicos; e. Elaboração de estudos e relatórios sobre o serviço do departamento; f. Gestão do espaço físico, equipamentos e material do departamento.
8. Desde 2011 até 2016 o Autor foi o único trabalhador do Arquivo do Montepio Crédito.
9. Na sequência da reestruturação organizativa e externalização do departamento do Arquivo, local onde o Autor exercia as suas funções, iniciou-se o procedimento para extinção de posto de trabalho.
10. No dia 30 de novembro de 2018 e na sequência da referida externalização, foi entregue ao Autor, em mão, uma carta a comunicar-lhe a dispensa do cumprimento de dever de assiduidade, sem perda de retribuição, ao abrigo do disposto na al. i) do nº 2 do art. 249º do C.T. (cfr. doc. 1 e doc. 1.A juntos com o articulado motivador, que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais).
11. No dia 04 de dezembro de 2018, foi rececionada uma carta remetida pelo Sindicato dos Bancários ... a informar a sua oposição ao despedimento por extinção do posto de trabalho e a solicitar uma reunião (cfr. doc. 2 junto com o articulado motivador, que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
12. No mesmo dia 04 de dezembro foi rececionada outra carta remetida pelo trabalhador AA a informar a sua oposição expressa à dispensa do dever de assiduidade assim como ao despedimento por extinção do posto de trabalho, por entender não se encontrarem reunidas condições legais e empresariais para o efeito (cfr.doc. 3 junto com o articulado motivador, que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
13. No dia 12 de dezembro de 2018, por carta registada com aviso de receção, foi remetida ao trabalhador a comunicação da necessidade do Empregador de proceder à extinção do seu posto de trabalho, com a consequente cessação do respetivo contrato de trabalho, pelos motivos indicados no documento anexo a essa comunicação, onde se identificaram os motivos invocados para tal extinção e demais elementos necessários para dar cumprimento ao disposto no n.º 1 do art.º 369.º do CT (cfr. docs. 4 e 5 juntos com o articulado motivador que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais).
14. Na referida comunicação o Trabalhador foi informado que se encontravam preenchidos os requisitos previstos nos arts. 367.º, 368.º e seguintes do CT, bem como de que dispunha do prazo de 10 dias úteis para, querendo, se pronunciar sobre os motivos invocados pelo Empregador, conforme dispõe o art.º 370.º do CT.
15. A comunicação foi recebida pelo Trabalhador em 17 de dezembro de 2019.
16. No dia 27 de dezembro de 2018, foi recebido o parecer fundamentado proferido pelo Sindicato dos Bancários ... (cfr. doc. 6 junto com o articulado motivador que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
17. No dia 28 de dezembro de 2018, o Empregador rececionou o parecer fundamentado apresentado pelo Autor nos termos do disposto no n.º 1 do art. 370º do CT. (cfr. doc. n.º 7 junto com o articulado motivador, que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
18. Em 28 de Janeiro de 2019 o Réu proferiu decisão por escrito, nos termos do disposto no nº 2 do art. 371º do CT, dirigida ao Trabalhador, mediante carta registada com aviso de receção, no mesmo dia 28 de janeiro de 2019 (cfr. doc. 8 e 9 juntos com o articulado motivador, que se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais).
19. Nesta comunicação o Trabalhador foi informado de que o Empregador tinha proferido decisão de despedimento por extinção de posto de trabalho, pelos motivos indicados no documento anexo à comunicação.
20. Tal comunicação foi enviada ao Trabalhador com a antecedência mínima de 75 dias, relativamente à data da cessação do contrato – ...6 de abril de 2019 – nos termos do disposto na al. c) do nº 3 do art. 371º do CT.
21. Com a indicação de que o Empregador colocava à disposição do Trabalhador, até à data da cessação do contrato, a compensação legal no montante de €11.830,08 (onze mil oitocentos e trinta euros e oito cêntimos), bem como todos os créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato até ao dia 26 de abril de 2019.
22. O Trabalhador foi informado de que continuaria dispensado do dever de assiduidade e da prestação efetiva de trabalho, sendo os dias de 20 de março de 2019 a 26 de abril de 2019, de gozo de férias, determinados nos termos do n.º 5 do art. 241º do CT.
23. No mesmo dia 28 de janeiro igual comunicação foi remetida à Autoridade para as Condições do Trabalho, nos termos do disposto no art. 371º, n.º 3 do CT (cfr. doc. 10 junto com o articulado motivador, que se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).
24. Ao Autor não foi paga a retribuição resultante das horas de formação profissional não ministrada (cf. doc. 1 junto com a com a contestação).
25. Nos últimos 3 anos foram ministradas ao trabalhador, em 2017, 32 horas de formação em gestão de conflitos.
26. Ficaram em falta 50 horas de formação, a cujo pagamento o Réu procedeu, assim que alertado para esta situação (cfr. doc. 2 junto com a resposta do Réu).
27. O Autor procedeu à devolução do valor de € 11.830,08.
28. A digitalização, organização, conservação e disponibilização de imagens de todos os processos físicos onde constam todos os documentos dos clientes, bem como as caraterísticas, negociações e produtos associados que se encontrem relacionados com os contratos de crédito e ainda os contratos efetuados entre o cliente e o MC já se encontram externalizados desde o primeiro semestre de 2010.
29. Em junho 2017 externalizou-se também a custódia temporária de documentos que não façam parte da pasta de documentos originais a preservar, que são triados e destruídos pelo prestador de serviço no final de 3 meses.
30. Para o arquivo/conservadoria são enviados para custódia própria apenas os documentos originais de preservação obrigatória.
31. Em 2010 foi entregue a digitalização à empresa EAD, sendo que a organização e conservação dos documentos passou a ser feita pela conservadoria do Finibanco, mais especificamente pela trabalhadora CC.
32. Por falta de conhecimento dos documentos por parte desta trabalhadora, e aumento considerável do serviço foi solicitado pelo Diretor deste departamento que o Autor fosse cedido ao Finibanco por tempo indeterminado, o que foi aceite pelo seu Diretor e Administração do Montepio Crédito.
33. O serviço foi acumulado durante o período que esteve entregue ao Finibanco, sendo que o Autor fazia serviço para a Finicrédito e para Finibanco, que era gerido pela CC.
34. A situação piorou quando já estava o Autor sozinho no arquivo (em 2013) e não havia ninguém que o substituísse nas férias, piorando ainda mais por ter estado de baixa médica aproximadamente 3 meses devido acidente.
35. Na altura em que se externalizou essa parte de arquivo (digitalização) foi opção do Montepio Crédito, devido a razões que se prendiam com o mau momento do mercado de trabalho, com a existência de condições físicas (local para arquivo) que se tinham criado há alguns anos e porque se projetou ser necessário apenas um trabalhador para desempenhar o serviço, manter o arquivo físico dos originais dos contratos e das livranças outorgados com os clientes e garantes.
36. A preocupação expressa pelo AA de que o arquivo não possuía espaço suficiente, originou que o arquivo transitasse de uma sala relativamente pequena para duas salas, numa das quais (a maior) se fez um investimento na dotação de um sistema antifogo. 37. A transição para este espaço ocorreu no início de 2013. 38. Os dois novos espaços tinham cofres antifogo que limitavam o espaço de arquivo, sendo que em 18/11/2013, o AA alertou e propôs à direção que esses cofres fossem retirados e substituídos por prateleiras pelo facto de darem muito mais espaço de arquivo.
39. Este espaço para além dos cofres tinha, também, estantes com prateleiras.
40. Em junho de 2014 foram retirados cofres e, em julho de 2014, colocadas 10 novas estantes com prateleiras, tendo sido reorganizado o espaço conciliando-o com as estantes que já existiam.
41. Também em julho de 2014, o AA solicitou à direção autorização para
42. Essa autorização foi dada.
43. Pelo menos desde dezembro de 2014, ainda antes da entrada do Autor no departamento os contratos já se acumulavam no chão e em cima das mesas, numa sala sem as medidas de autoproteção recomendadas.
44. Já tinha sido transmitido ao diretor do departamento do Arquivo, em pelo menos 18de novembro de 2013, que o espaço destinado ao Arquivo era limitado, e que era necessário proceder a alterações (substituir cofres por prateleiras, etc.), bem como as condições de trabalho inapropriadas, (cheiros de fossa, humidades, circulação de ar, etc.).
45. Porque a partir de meados de 2015 o número de contratos físicos aumentou, em 29/01/2016, na reformulação de alguns serviços, o arquivo ficou dotado com mais um trabalhador, DD, com a categoria de administrativo.
46 (Por lapso não consta da enumeração dos factos provados, passando-se diretamente do 45 para o 47).
47. Em julho de 2016 foram retirados os cofres que existiam na sala anexa à do arquivo para serem colocadas estantes com prateleiras e para se ganhar espaço de arquivo.
48. Entretanto, os contratos que se encontravam nos cofres retirados foram colocados numa antiga sala de formação que passou a ser utilizada para organizar o serviço.
49. Em setembro de 2016 foram colocadas as estantes com prateleiras na sala anexa e foi intenção da direção colocar uma outra fiada de estantes na sala principal de arquivo.
50. Para recuperar espaço em 2016 foi efetuado um expurgo de contratos, tarefa que já não era efetuada desde 2010.
51. Caso tivesse sido feito o expurgo dos contratos que já se encontravam terminados e se esse trabalho fosse sistemático, conseguir-se-ia libertar mais espaço no arquivo.
52. Até à chegada do DD nunca houve condições para fazer qualquer expurgo dos contratos.
53. O primeiro expurgo de contratos foi feito em novembro de 2016.
54. O trabalho de expurgo estava a ser feito a ritmo muito lento o que originava que houvesse muito espaço ocupado com contratos que já não necessitavam de ali estar e que poderiam ir para arquivo morto.
55. Em dezembro de 2016, a direção chamou os dois trabalhadores e solicitou-lhes um compromisso de prazo para a execução das tarefas de expurgo e inventário do arquivo.
56. Esse compromisso nunca foi obtido por parte dos 2 trabalhadores.
57. Numa reunião posterior com a direção novamente o assunto foi abordado, referindo-lhes que o Conselho de Administração tinha dado o prazo de 6 meses para a organização do arquivo, prazo esse que já há muito tinha sido ultrapassado e que seria necessário que eles assumissem um compromisso para colocar o trabalho em dia.
58. Mais uma vez tal compromisso não foi obtido.
59. A listagem de expurgo de contratos, emitida em 2016, demorou cerca de 2 anos até se encontrar concluída.
60. Como não era feito o atempado expurgo dos contratos já terminados, o espaço tornou-se cada vez mais escasso e em agosto de 2018 o AA enviou um email à direção referindo que o espaço se iria esgotar em poucas semanas.
61. A partir desse email foi tomada a decisão de se externalizar o serviço, o que veio a ocorrer em novembro.
62. As funções que estão adstritas ao serviço de arquivo são: • Manter em ordem e atualizados os arquivos da Sociedade respeitantes a contratos celebrados; • Responder às solicitações dos colaboradores relativas à necessidade de consulta ou emissão de cópia de documentos arquivados bem como à necessidade de obtenção de documentos originais; • Efetuar o arquivo das requisições que formalizam a entrega, às entidades requisitantes, dos documentos constantes dos pedidos formulados; • Aplicar e cumprir a regulamentação interna em vigor emanada do Conselho de Administração e das Direções, no âmbito das suas competências; • Observar e cumprir todas as normas de conduta profissional expressas no “Código de Conduta e Normas Deontológicas”.
63. Em 2 anos e meio foram feitos outros serviços solicitados pelo diretor como: I) manter o serviço diário em dia; II) retirar terminados 2016; III) retirar 1500 contratos para a NGCI (2017); IV) retirar 1700 contratos para NGCI (2018); V) retirar terminados 2018.
64. Só recentemente, passados cerca de 2 anos e meio, o trabalho relacionado com a organização do arquivo ficou concluído quanto à reorganização dos contratos existentes que estavam arrumados por lote e aos novos contratos e livranças.
65. Com a entrada em vigor do DL 133/2009 cada processo de originais cresceu em volume de documentos/páginas cerca de 10 vezes, considerando também o aumento de atividade com o aumento de número de contratos que se verificou a partir de meados de 2015, e ainda a falta de expurgo dos contratos terminados, fatores que originaram que o espaço destinado ao arquivo tenha deixado de ser suficiente, obrigando a que se realizassem obras de adaptação e aumento do espaço físico.
66. As obras de adaptação ascendiam a € 23.150,00 (vinte e três mil cento e cinquenta euros) relativas a trabalhos de construção civil e instalação de alarmes e sistemas de extinção de incendio (vide Anexo 1, junto com o articulado motivador, aqui dado por reproduzido).
67. No final de novembro de 2018, já existia um conjunto de documentos originais que se encontram arquivados em local de risco, por não terem as condições de segurança necessárias.
68. Como alternativa à execução das obras, foi feita uma consulta ao mercado para que esse serviço fosse externalizado para uma entidade especializada que trabalhasse com diversas Instituições de Crédito e Financeiras.
69. Uma grande parte dos concorrentes do Réu já externaliza este tipo de arquivo.
70. A melhor proposta que foi apresentada ao Montepio Crédito tem um custo anual de € 6.492,00 (seis mil, quatrocentos e noventa e dois euros) implicando a realização de um contrato pelo prazo de 3 anos pelo que o valor global desse contrato nesses 3 anos ascenderá a € 19.476,00 (dezanove mil, quatrocentos e setenta e seis euros) (cfr. Anexo 1 junto com o articulado motivador do despedimento).
71. Esta opção, para além não implicar qualquer investimento em obras de adaptação, cujo montante é superior ao valor do contrato a 3 anos a outorgar para a externalização do serviço, implica que possam ser libertados os dois trabalhadores existentes naquele serviço, cujo custo anual ascende a € 49.435,83 (quarenta e nove mil, quatrocentos e trinta e cinco euros e oitenta e três cêntimos) – cálculos de setembro de 2018.
72. A externalização dos serviços de arquivo dos documentos originais possibilita: a) Uma economia de custos anuais correspondente aos salários e encargos dos 2 trabalhadores deste serviço, ou seja €49.435,83 (quarenta e nove mil, quatrocentos e trinta e cinco euros e oitenta e três cêntimos); b) Uma economia relacionada com o investimento que seria necessário fazer de 23.150,00 (vinte e três mil, cento e cinquenta euros), a que acresceriam ainda as manutenções e o valor da renda do espaço ocupado; c) A garantia de que os originais dos contratos e livranças são guardados em ótimas condições de segurança, contra intrusão, fogo e água; d) A organização feita por profissionais com formação específica ao serviço de empresa tecnologicamente apetrechada para a gestão do arquivo, incluindo em termos de organização e métodos, que proporcionem a obtenção atempada e adequada de serviços de qualidade, bem como a certeza de que esses originais estão corretamente arquivados; e) Um maior controlo, evitando que desapareçam documentos originais (como já ocorreu antes da externalização) e constituam um custo adicional por não se conseguir concretizar a ação judicial; f) A disponibilização atempada sempre que estes originais sejam solicitados para efeitos de interposição de ações judiciais.
73. O trabalhador AA possui o 9.º ano de escolaridade.
74. Durante os mais recentes anos teve formação fornecida pelo R. (curso de Excel e curso de liderança), com os respetivos diplomas e outras formações ao abrigo do Banco de Portugal.
75. As avaliações foram sempre positivas, conforme o regulamento de avaliação da Empresa, sendo que na avaliação de 2014 foi avaliado com funções de administrativo em 4,9 (Bom), numa escala de 1 a 7.
76. O Autor está inscrito num curso QUALIFICA para finalizar o 12.º ano nos próximos meses.
77. O Autor deu formação do serviço executado ao colega EE, em 2011 e ao colega DD, em 2016.
78. O trabalhador AA, assim como o DD, procediam à elaboração de um relatório semanal sobre o trabalho efetuado, relatório esse remetido ao Diretor Administrativo e Financeiro, que assim controlava o trabalho efetuado.
79. Os poucos trabalhadores que têm saído do Montepio Crédito (exceto quando tal sucede para as áreas comerciais ou de elevada complexidade técnica) não são substituídos por outros.
80. No Arquivo/Conservadoria existiam apenas os dois postos de trabalho dos trabalhadores AA e DD.
81. Não vigoram no Montepio Crédito quaisquer contratos a termo para as tarefas correspondentes às dos referidos postos de trabalho de Administrativo e Continuo. 81-A. Desde o ano de 2009 que a Ré não admite trabalhadores para as funções administrativas (aditado pelo Tribunal da Relação).
81-B. Inexiste na Ré posto de trabalho disponível que possua conteúdo funcional idêntico ao do Trabalhador ou compatível com a respetiva categoria profissional (aditado pelo Tribunal da Relação).
82. Eliminado pelo Tribunal da Relação.
83. Existe um departamento de arquivo na Caixa Económica Montepio Geral (...).
84. O Réu utiliza instalações de arquivo em ... (mais concretamente na Rua ..., ..., ... ...), onde se encontram arquivados milhares de contratos e documentos, instalações que continuam a ser utilizadas como tal após o despedimento do Autor.
85. Essas instalações de ... são utilizadas para arquivo de documentos pelo Montepio Crédito, pelo Banco Montepio e pelo Montepio Valor, sendo todos os seus trabalhadores da Caixa Económica Montepio Geral.
86. O Grupo Montepio tem ainda a gestão da «Atmosfera M», espaço de excelência para defender “uma Responsabilidade Social ativa e um futuro sustentado”, não trabalhando nenhum funcionário do Réu neste espaço.
87. Após 02.04.2009 foram admitidos ao Banco outros trabalhadores, cuja relação laboral, entretanto cessou: a) FF, em substituição de uma baixa de gravidez; b) GG, em substituição de uma baixa de gravidez; (alterado pelo Tribunal da Relação)
88. Em abril de 2019, foi contratada uma funcionária de nome HH, vinculada a uma empresa externa de nome I..., que já tinha sido trabalhadora da Ré, para exercer funções do departamento de frota (alterado pelo Tribunal da Relação).
89. Foi contratada uma trabalhadora, de nome II, para o departamento de registos de propostas.
90. Foi criado um novo departamento com o nome de ..., onde colocaram uma trabalhadora, JJ, que já era trabalhadora do Réu.
91. No dia 24 do passado mês de agosto, foi contratada, “a recibos verdes”, uma trabalhadora de nome KK para proceder a um “tratamento de multas”.
92. “O capital social do Montepio Crédito é composto por 30 milhões de ações (…), sendo detido integralmente pelo Montepio Holding, SGPS, S.A., que é detido integralmente pela Caixa Económica Montepio Geral (…) que, por sua vez, é detida pela Associação Mutualista Montepio Geral” (cfr. Relatório e Contas do Montepio Crédito S.A., fls. 43 a 50).
93. O Montepio Crédito é uma estrutura organizativa detida pela Montepio Holding, SGPS, S.A., tal como o Montepio Investimento, S.A.; a Montepio Valor – Sociedade Gestora de Fundos de Investimento, S.A.; a Montepio Gestão de Activos - SGFI, S.A.; a Caixa Económica Montepio Geral, S.A. e a Montepio Geral – Associação Mutualista.
94. O Autor auferia, a título de retribuição base efetiva: i) € 874,50 de remuneração base; ii) € 125,19 a título de diuturnidades; iii) € 152,60 a título de subsídio de almoço isento; iv) € 30,80 a título de subsídio de almoço passivo; v) € 60,72 a título de subsídio escolar (pago trimestralmente).
95. O Autor, com a situação criada, sente profundo desânimo, tristeza, desgosto, indignação, angústia, humilhação, medo e perda de autoestima.
De Direito
Sendo certo que as Conclusões do recurso, com a ressalva das questões de conhecimento oficioso, delimitam o objeto do mesmo, a questão fulcral no presente recurso é a da licitude ou ilicitude do despedimento por extinção do posto de trabalho do Autor e ora Recorrente. Sublinhe-se, desde já, que não se discute a existência do requisito respeitante ao número de trabalhadores abrangidos para que possa (e deva) ter lugar um despedimento por extinção de posto(s) de trabalho (artigo 368.º, n.º 1, alínea d) do CT), em vez de um despedimento coletivo, nem o critério de seleção do(s) trabalhador(es) abrangido(s) porquanto apenas trabalhavam dois trabalhadores no departamento do arquivo/conservadoria que foi encerrado e resulta do Acórdão recorrido que os dois postos de trabalho aí existentes foram extintos. A extinção do(s) posto(s) de trabalho deve fundar-se, de acordo, com o disposto no artigo 367.º, n.º 1, em “motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, relativos à empresa”, entendendo-se como tais os motivos referidos no artigo 359.º n.º 2, por força da remissão do artigo 367.º n.º 2. A extinção dos postos de trabalho resulta da externalização de um serviço, a qual corresponde a uma modificação estrutural (artigo 359.º, n.º 2, alínea b), do CT) enquanto reorganização da atividade produtiva. As razões económicas resultam, com clareza, dos factos 68 a 72 (mormente deste último em que estão sintetizadas) traduzindo-se, designadamente, em uma poupança em custos salariais e em despesas em obras de readaptação do espaço dedicado ao arquivo, mas também em um serviço de melhor qualidade. Sublinhe-se, também, que dos factos provados não resulta qualquer indício de que as funções em causa não tenham sido efetivamente externalizadas e que tenham sido redistribuídas pela estrutura organizativa do empregador (recorde-se que o grupo não é o empregador no direito português e não está demonstrada a existência de qualquer situação de pluralidade de empregadores). O Recorrente esgrime, no entanto, o argumento de que o despedimento por extinção do posto de trabalho seria ilícito, por violação do disposto no artigo 368.º, n.º 1, alínea a). Defende, com efeito, que o presente despedimento por extinção do posto de trabalho seria uma autêntica fraude à lei, já que o empregador imputaria ao Autor uma conduta pouco diligente e em desobediência a ordens e instruções recebidas, pelo que o despedimento por extinção do posto de trabalho procuraria “contornar” as dificuldades probatórias inerentes a um despedimento disciplinar fundado nesses motivos (vide Conclusões 32 a 35). Em primeiro lugar, importa destacar que dos autos não resulta demonstrada a existência de qualquer conduta culposa do Autor. O facto de os trabalhadores afetos ao departamento do arquivo não terem conseguido realizar no prazo de seis meses, como seria desejo da Direção, a tarefa de expurgo dos contratos, nem terem assumido qualquer compromisso nesse sentido (factos 51 a 58) não representa necessariamente um facto culposo, já que faltam dados para avaliar o volume de trabalho em causa e a razoabilidade da exigência do empregador. Decorre dos factos provados, outrossim, uma insatisfação com a qualidade do serviço prestado – o ritmo muito lento do expurgo (facto 54) e o desaparecimento já verificado de originais (facto 72, e) – que pode ter contribuído para a decisão de externalização. A este respeito PEDRO FURTADO MARTINS dá o seguinte exemplo: “Imagine-se que certo empregador decidiu encerrar a secção de marketing e publicidade que integrava dois postos de trabalho, por ter concluído que lhe era mais vantajoso entregar esse serviço a uma empresa especializada, que dispunha de profissionais mais experientes e habilitados, sendo que para essa decisão contribuiu também a circunstância de os trabalhadores da secção em causa não conseguirem desempenhar as tarefas que lhe estavam cometidas de forma tão empenhada, competente e rentável como o fazem os profissionais da empresa a quem o empregador passou a contratar a prestação de serviços de marketing e publicidade”[1]. Em suma, a decisão de externalização pode até ter assentado, ao menos em parte, em uma certa insatisfação do empregador com a prestação dos trabalhadores que integravam o departamento de arquivo, sem que tal implique que se trata de uma sanção disciplinar, mais ou menos camuflada. Há, pois, que concluir que o Tribunal da Relação não cometeu qualquer erro de julgamento ao decidir pela licitude do despedimento por extinção de postos de trabalho, não tendo sido violado o disposto no artigo 368.º, n.º 1, alínea a) do CT. Sublinhe-se, ainda, que de acordo com o facto 81-B, “inexiste na Ré posto de trabalho disponível que possua conteúdo funcional idêntico ao do Trabalhador ou compatível com a respetiva categoria profissional”. Apreciemos, agora, as nulidades invocadas pelo Recorrente. Afirma, em primeiro lugar, a existência de uma decisão surpresa quando o Tribunal da Relação se pronunciou pela nulidade da sentença por existir uma contradição entre, por um lado, a sentença afirmar que “a decisão de externalização do serviço de arquivo tomada pelo Réu, situa-se na área do risco e gestão empresarial”, para seguidamente questionar se em vez da externalização o empregador não poderia ter contratado mais trabalhadores para a realização do serviço de arquivo, questionando igualmente a necessidade de digitalização dos documentos. Ora não só esta questão já tinha sido decidida, ainda que em sentido oposto, pelo Juiz de 1.ª instância no seu despacho de admissão do recurso, como resultava das alegações do empregador, não se colocando, pois, a questão da violação do contraditório. E tratando-se, no fundo, de um afloramento da questão do motivo do despedimento por extinção do posto de trabalho e do seu controlo o Tribunal da Relação decidiu, e bem, que “ambas as partes já se pronunciaram nos autos, nomeadamente, em sede de articulados, mostrando-se, pois, assegurado que não se tratará de decisão surpresa, entendendo que nos autos se mostram reunidos os elementos necessários para o efeito” (p. 48 do Acórdão). Acresce que, como se pode ler nas contra-alegações, foi a própria sentença a referir que “o Réu não alega que tenha sido obrigado ou que fosse uma necessidade imperiosa da empresa proceder à digitalização dos seus documentos”. O Recorrente invoca uma outra nulidade, que consistiria em uma ininteligibilidade da decisão ou em uma contradição entre os fundamentos e a decisão (Conclusões 11 a 24). No Acórdão recorrido pode ler-se efetivamente que “deixamos já referido e justificado que não importa ter a Ré imputado ao Trabalhador uma conduta culposa” (p. 57 do Acórdão). A frase não deve, contudo, ser descontextualizada e importa, na sua interpretação, ter em conta o que seguidamente se escreve: “Note-se que ficou provado que em 2016, na reformulação de alguns serviços e perante o aumento dos contratos físicos, o arquivo foi dotado de mais um trabalhador, passando a existir nele dois postos de trabalho, tendo a Ré procurado, junto de ambos os trabalhadores, um compromisso de prazo para a execução das tarefas de expurgo e inventário do arquivo. Perante aquela motivação não pode outrossim concluir-se, sem mais, por uma conduta culposa do Trabalhador, não obstante ter ficado assente que o expurgo de contratos se encontrava a ser efetuado de forma lenta e não ter sido obtido o referido compromisso por parte também do Trabalhador, desde logo por as razões para tal lentidão não terem ficado explicitadas. Note-se que ficou provado que pelo menos desde dezembro de 2014, ainda antes da entrada do Autor no departamento, os contratos já se acumulavam no chão e em cima das mesas, a partir de 2015, o número de contratos físicos aumentou e que até à chegada do Trabalhador DD, nunca houve condições para fazer qualquer expurgo dos contratos. E ainda que ficou provada o que entendemos como uma postura diligente do Trabalhador ao ter expressado a preocupação de que o arquivo não possuía espaço suficiente - o que originou que o arquivo transitasse de uma sala relativamente pequena para duas salas -, alertado e proposto à direção que os cofres antifogo desses dois novos espaços fossem retirados e substituídos por prateleiras – o que veio a suceder em Junho de 2014 e posteriormente colocadas novas estantes e prateleiras -, solicitou à direção autorização para reocupar a sala, onde, inicialmente estava o arquivo, para colocar um conjunto de caixas que eram necessárias para se efetuar o serviço – autorização que foi dada”. Assim, o que resulta da motivação é que não importa, no sentido de que não releva, no caso concreto, qualquer conduta culposa imputada pelo empregador ao trabalhador, pela simples razão de que nunca lhe foi imputada tal conduta. Não existe, pois, qualquer obscuridade ou deficiência na fundamentação, nem, tão-pouco, qualquer contradição entre a fundamentação e a decisão, pelo que a sentença não padece, também neste aspeto, de qualquer vício que determine a sua nulidade.
3. Decisão: Acorda-se em negar a revista. Custas pelo Recorrente
Lisboa, 30 de março de 2022
Júlio Manuel Vieira Gomes (Relator) Joaquim António Chambel Mourisco Maria Paula Sá Fernandes
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