Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | JORGE DIAS | ||
| Descritores: | REVISTA EXCECIONAL ÂMBITO DO RECURSO CONVOLAÇÃO CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS LEILÃO ARGUIÇÃO DE NULIDADES NULIDADE DE ACÓRDÃO OMISSÃO DE PRONÚNCIA EXCESSO DE PRONÚNCIA | ||
| Data do Acordão: | 06/20/2023 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO | ||
| Sumário : | I - O recurso em revista excecional, apesar de ser recurso ordinário, não abrange todas as questões que tenham sido suscitadas no recurso, mas apenas aquelas consideradas, pela Formação, com relevância jurídica ou relevância social (para além dos casos em que seja verificada contradição), conforme als. a), b) e c), do n.º 1 do art. 672.º do CPC. II - Ao tribunal incumbe proceder à qualificação jurídica que julgue adequada, nos termos do art. 5.º, n.º 3, do CPC, dentro da fronteira da factualidade alegada e provada e nos limites do efeito prático-jurídico pretendido. III - A convolação operada, de contrato de prestação de serviços de leilão, para contrato de prestação de serviços não extravasa o perímetro objetivo e subjetivo da pretensão deduzida pela autora, em função do qual se afere também o exercício do contraditório por parte do réu. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Capital Leiloeira, Lda., com sede na Praça..., apresentou requerimento de injunção contra AA, residente na Rua ..., solicitando que este fosse notificado no sentido de lhe pagar a quantia global de €34.883,75, sendo €33.050,00 a título de capital, €1.180,75, a título de juros de mora vencidos, €500,00 a título de outras quantias, e €153,00 a título de taxa de justiça paga. Prosseguindo o processo seus termos, foi proferido acórdão neste STJ, julgando-se o recurso improcedente e confirmando-se o acórdão da Relação. Do acórdão deste Tribunal vem o recorrente requerer/alegar: a)- Omissão de pronúncia: - O acórdão reclamado restringiu o objeto da revista já que o acórdão da Formação “apenas se pronunciou sobre a admissibilidade da revista excepcional, não restringindo (não o fez nem o podia fazer, antes mandando que “se pronuncie sobre as questões suscitadas”) o objecto do recurso”. - “A Formação, aliás, pronuncia-se sobre o requerimento de recurso, e não sobre as alegações ou sobre as conclusões recursivas”. - “Admitido o recurso, ele deve ser apreciado como uma revista ordinária, na sua plenitude”. - “Em consequência, mostra-se indevidamente preterido o conhecimento das questões recursivas invocadas nas e balizadas pelas conclusões I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X, XI, XII, XIII, XIV, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXI, XXII, XXIII, XIV, XXV, XXVI, XXVII, XXVIII, XXIX, XXX, XXXI, XXXIII, XXXIV, XXXV, XXXVI, XXXVII, XL, XLIV, XLV, XLVI, XLVII, XLVIII, XLIX, L, LI, LII, LIII, LIV, LV, LVI, LVII, LVIII e LIV i), iv), v), vi), vii) e viii)”. - “daquelas conclusões consta efectivamente – inter alia – a adequada impugnação recursiva da fundamentação quanto à decisão da matéria de facto”. b)- Excesso de pronúncia: - O acórdão ora em referência concluiu tratar-se o contrato entre A. e R. a que alude o ponto 6º dos factos provados em 1ª instância de um comum contrato de prestação de serviços, para concluir não lhe serem aplicáveis as disposições do Decreto-Lei nº 24/2014 e do Decreto-Lei nº 155/2015. Um comum contrato de prestação de serviços que não de prestação de serviços de leiloeira, concluiu-se”. - “Ora, não só a matéria de facto apurada (mesmo independentemente da impugnação das decisões sobre a mesma) não autorizava esse Tribunal a retirar tal conclusão, como também (e sobretudo) as regras processuais lho vedam”. - “No petitório dos presentes autos, a A. invocou [com sublinhado nosso]: “1- A Requerente dedica-se à prestação de serviços de atividade leiloeira”. “3 - No exercício da sua atividade, a Requerente prestou serviços ao Requerido…”. Portanto, tal como a própria A. livremente enformou, esta afirmou ter prestado serviços de actividade leiloeira. Ao longo de toda a réplica, a A. manteve aquela qualificação jurídica, pontificando a conclusão que formula em 20º daquele articulado: “Fica demonstrado que a relação creditícia estabelecida entre Autor e Reu provém de um contrato de prestação de serviços de leilão, com os encargos a suportar pelo adquirente dos bens, no caso, o Réu, tratando-se, por isso, de um contrato válido e eficaz, pelo que improcede a excepção de nulidade contratual” [sublinhado nosso]”. - “a inovadora qualificação jurídica diversa da do objecto do litígio a que esse Supremo Tribunal procedeu é processualmente desconforme, pois que viola ostensivamente os princípios do artigo 5º do CPC, do “ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal” – não valendo aqui a previsão do nº 3, quer por se tratar, não de alegações, mas sim de questão estrutural da acção – a da sua idealizada e estabilizada relação jurídica – quer por haver uma indagação contrária aos fundamentos livremente invocados pela A. – que foram, como é óbvio, todos determinantes das acções defensivas do recorrente”. - “A comutação da qualificação jurídica5 está vedada ao Tribunal (qualquer que seja a instância) por via do princípio do dispositivo (artigos 3º e 5º do CPC), dando agora o STJ uma resolução do litígio que não lhe foi pedida pela A.”. E conclui: “Devem as nulidades invocadas supra procederem, revogando-se o acórdão em mérito, consequentemente se procedendo ao conhecimento devido e balizado de todas as questões recursivas”. * O recorrente argui a nulidade do acórdão. Vejamos: a)- Por omissão de pronúncia: - Sobre a alegação de que foi interposto recurso da matéria de facto já este Tribunal se pronunciou, primeiro em despacho do relator e depois em acórdão, por ter havido reclamação para a Conferência. Veja-se o acórdão de 11-10-2022, no qual nos pronunciamos sobre a questão da matéria de facto: “O despacho do relator supratranscrito entendeu que não vinha alegado recurso da matéria de facto. Não se descortinaram pontos da matéria de facto que o recorrente alegasse terem sido mal julgados, por falta de prova, por decididos contra a prova produzida, ou por uso ou não uso de presunções. Assim se continua a entender face ao requerimento ora apresentado. Não foi cumprido o ónus a cargo do recorrente, quando se impugna matéria de facto, ónus referido no art. 640º, do CPC (por isso se utilizou a expressão “parece querer”). E o eventual erro (do Tribunal recorrido) na apreciação das provas tem de se reportar à fixação dos factos materiais, factos que devem ser concretizados para o Tribunal de recurso averiguar da existência ou não, desse erro e, averiguar se houve ofensa de disposição expressa de lei que exigia certa espécie de prova para a existência do facto ou se havia lei que fixava força provatória de determinado meio de prova. O que não foi concretizado pelo recorrente e, por isso, se entendeu inexistir recurso sobre a matéria de facto”. E na reclamação sob análise também não indica onde e porque forma impugnava a matéria de facto. - Relativamente ao recurso na vertente da matéria de direito e tendo sido entendido que se verificava dupla conforme e a admissibilidade da revista excecional, respeitante a questões que a Formação venha a considerar relevantes, competia a essa Formação prevista no nº 3 do art. 672º, do CPC, pela mesma foi decidido: “Como tem sido entendimento desta Formação, relevância jurídica ocorre "em face de questões que obtenham na Jurisprudência ou na Doutrina respostas divergentes, quando o tema encerre novidade, ou que emanem de legislação que suscite problemas de interpretação, nos casos em que o intérprete e aplicador se defronte com lacunas legais, e/ou, de igual modo, com o elevado grau de dificuldade das operações exegéticas envolvidas, em todo o caso, em todas as situações em que uma intervenção do Supremo Tribunal de Justiça possa contribuir para a segurança e certeza do direito", revelando-se o pressuposto da relevância social "em razões suscetíveis de distinguir a conjeturada particular relevância social - de elevado interesse geral, que não se estribe no simples interesse particular - que terá também de ser explicitada pelo impugnante através de argumentação consistente e convincente, para além de concretizada, objetivada e reportada ao caso em apreço, sendo que, na densificação desse conceito indeterminado deverá, pondo em causa a eficácia do direito e minando a sua credibilidade, de modo a motivar a atenção de relevantes camadas da população e a extravasar, notoriamente, os meros interesses particulares das partes ou o inerente objeto do processo." - acórdão de 23-06-2022, proc. n.° 573/15.3...). A matéria atinente à nulidade por falta de forma do contrato de prestação de serviço de leilão, muito embora não se trate de matéria complexa, assume ainda assim algum ineditismo, não tendo sido localizada qualquer decisão deste Supremo Tribunal sobre a matéria. Está em causa a extensão da exigência de forma prevista no artigo 15.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 155/2015, de 10 de agosto, ao contrato celebrado com terceiro quando este assuma a obrigação de pagar a remuneração convencionada entre a vendedora e a leiloeira. Está matéria mostra-se ainda correlacionada com questões atinentes à invocada violação de direito probatório material e ainda ao regime de arguição e conhecimento da nulidade por falta de forma. Atento o ineditismo desta matéria, justifica-se que o Supremo Tribunal de Justiça se pronuncie sobre as questões suscitadas, pelo que o recurso deve ser admitido, ficando prejudicada a apreciação da invocada contradição de acórdãos”. Tem de ser tido em conta a exceção julgada relevante pela Formação e que, apesar da dupla conforme, determine a admissão da revista, sendo a matéria julgada excecionalmente relevante pela Formação que determina e sobre a qual incidirá a apreciação do recurso de revista assim admitido. O recurso em revista excecional, apesar de ser recurso ordinário, não abrange “na sua plenitude” (como entende o reclamante) todas as questões que tenham sido suscitadas no recurso, abrange apenas aquelas consideradas, pela Formação, com relevância jurídica ou relevância social (para além dos casos em que seja verificada contradição), conforme als. a), b) e c), do nº 1 do art. 672º, do CPC. Veja-se neste sentido Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª ed., pág. 391, onde refere: “Verificada alguma circunstância de que a lei faz depender a revista excecional, a referida formação de juízes deve delimitar o seu objeto. Efetivamente, se forem diversas as questões suscitadas no acórdão da Relação ou diversas as pretensões que tiverem sido apreciadas, a revista excecional não tem que abarcar necessariamente todos esses aspetos, mas apenas aqueles que reúnam as características referidas em cada uma das alíneas do nº 1 do art. 672º que se considerem aplicáveis ao caso”. Assim e conforme acórdão da Formação, em causa “A matéria atinente à nulidade por falta de forma do contrato de prestação de serviço de leilão, muito embora não se trate de matéria complexa, assume ainda assim algum ineditismo, não tendo sido localizada qualquer decisão deste Supremo Tribunal sobre a matéria”. E foi esta a questão admitida a título de revista excecional e mais nenhuma outra. E esta questão foi tida em conta e analisada no acórdão reclamado, embora a descontento do recorrente e ora reclamante. E doutras mais questões, não admitidas pela Formação, não tinham que ser objeto de apreciação por este Tribunal. Como salienta o Ac. deste STJ de 29-09-2020, no Proc. nº 1237/14.0TBSXL-B.L1.S2, “A intervenção da Formação a que alude o nº3 do artigo 672º do CPCivil é acessória, pontual e específica, apenas para a aferição dos pressupostos aludidos nas alíneas a), b) e c) do nº1 daquele mesmo normativo, não efectuando qualquer juízo ainda que meramente indiciário sobre o fundo da causa, ficando a sua intervenção processual assim limitada, cfr a propósito Rui Pinto, Código de processo Civil, 449. (…) a Formação não proferiu, nem pode proferir, nenhum juízo de valor sobre o fundo da questão, pronunciando-se antes sobre a possibilidade de tal juízo poder vir a ser feito, começando e acabando aí a sua específica competência, nos termos do artigo 672º do CPCivil; quer a Relatora, quer o Colectivo, foram chamados a pronunciar-se, subsequentemente sobre o mérito do recurso, admitido que foi este, em termos excepcionais, nos precisos termos consignados pelo Acórdão da Formação, e por força do disposto no artigo 652º do CPCivil, aplicável ex vi do artigo 679º do mesmo diploma.” Pelo que não se verifica a nulidade por omissão de pronúncia. * b)- Excesso de pronúncia: A questão essencial da reclamação, respeitante a esta nulidade arguida, é a de saber se o tribunal está vinculado à qualificação jurídica indicada pelas partes ou, se pode/deve convolar a qualificação jurídica à factualidade apurada. É certo que no acórdão reclamado se concluiu que o contrato entre A. e R. a que alude o ponto 6º dos factos provados em 1ª instância era um contrato de prestação de serviços e que não lhe eram aplicáveis as disposições do Decreto-Lei nº 24/2014 e do Decreto-Lei nº 155/2015. Era um contrato de prestação de serviços e não um contrato de prestação de serviços de leilão. Também é certo que as partes, nomeadamente a A. se reportavam a que os serviços prestados o foram no âmbito de atividade leiloeira. Alega o reclamante que se verifica uma “inovadora qualificação jurídica diversa da do objecto do litígio” e que este Supremo Tribunal procedeu processualmente em desconformidade, violando ostensivamente os princípios do artigo 5º do CPC, do “ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal”. Alega o reclamante que a comutação da qualificação jurídica está vedada ao Tribunal (qualquer que seja a instância) por via do princípio do dispositivo (artigos 3º e 5º do CPC), dando agora o STJ uma resolução do litígio que não lhe foi pedida pela A.. No acórdão reclamado, de fls. 18 a 21 se justifica a posição adotada, nomeadamente ao referir-se que “Conforme consta da matéria de facto provada, factos 4, 5 e 6, das diligências de promoção de venda dos prédios, levadas a cabo pela autora, o réu manifestou interesse em apresentar uma proposta de compra, o que fez, mas, pelo facto de as vendedoras donas dos prédios serem do relacionamento pessoal do réu, este passou a negociar diretamente com elas, nomeadamente quanto ao preço e forma de pagamento. Ficando acordado entre a autora e réu que a remuneração devida pelos serviços prestados pela autora, incluindo o pagamento dos honorários devidos ao Solicitador pelos serviços a prestar por este, designadamente, nas buscas junto dos serviços da Autoridade Tributária, dos serviços de registo predial e tribunais quanto à existência de quaisquer ónus ou encargos sobre os prédios, e ainda os serviços prestados com cancelamento de registos de ónus existentes, e registo a favor do novo proprietário, seria no montante de € 35.000,00, acrescido de IVA e a cargo do réu”. Consta desses factos: “4. No decurso das diligências de promoção de venda dos prédios, o réu manifestou interesse em apresentar uma proposta de compra, o que fez. 5. Pelo facto de as vendedoras serem do relacionamento pessoal do réu, este passou a negociar diretamente com aquelas, na pessoa do seu representante, Dr. BB, Ilustre Advogado com escritório em ..., o preço de compra e venda e forma de pagamento. 6. Não obstante, ficou acordado entre a autora e réu que a remuneração devida pelos serviços prestados por aquela seria de € 35.000,00, acrescidos de IVA, nela ficando incluídos não só os serviços próprios da autora, mas também o pagamento dos honorários devidos ao Solicitador pelos serviços a prestar por este, designadamente, nas buscas junto dos serviços da Autoridade Tributária, dos serviços de registo predial e tribunais quanto à existência de quaisquer ónus ou encargos sobre os prédios, e ainda os serviços prestados com cancelamento de registos de ónus existentes, e registo a favor do novo proprietário, o aqui réu. 7. Concluídos que foram os serviços prestados, a autora emitiu a fatura nº 2019/25, de 22/05/2019, no valor de € 43.050,00, com IVA incluído, e remeteu-a ao réu, que a recebeu em data não concretamente apurada, mas anterior a 14 de junho de 2019.” Esta matéria de facto resulta do alegado pela autora na réplica, nos arts. 12 a 18. “12º- No exercício dessa actividade, a Autora, em 02 de Outubro de 2018, outorgou um contrato de prestação de serviços de leilão com as proprietárias dos prédios que integram um conjunto conhecido por “Quinta ...”, sito no lugar do ..., freguesia de ..., inscrito na matriz sob o artº 1257º e 1285º, descrito na CRP com o n.º ...41; e o prédio urbano destinado a habitação inscrito no 441º e descrito na CRP na ficha com o n.º ...78, também sito no mesmo lugar e freguesia. V. Doc. N.º 1, 2 e 3. 13º- Tendo desenvolvido diversas acções de promoção de leilão. V. Doc n.º 4, 5, 6, 7, 8 e 9. 14º- Tendo ficado acordado entre Autora e as Clientes proprietárias que a remuneração da leiloeira pelos serviços prestados seria suportada pelo adquirente, como, de resto, é prática nesta actividade. 15º- Em consequência das diligências de promoção de venda destes prédios, o Reu manifestou interesse em apresentar uma proposta de compra, o que fez nas instalações da Autora. 16º- Pelo facto de as vendedoras serem do relacionamento pessoal do Réu, este passou a negociar directamente com aquelas na pessoa do seu representante, Dr. BB, Ilustre Advogado com escritório em ..., o preço de compra e venda e forma de pagamento. No entanto, 17º- Ficou acordado entre Autora, vendedoras e Réu que a remuneração à Autora pelos seus serviços seria de 35.000,00€, acrescido de IVA, neles ficando incluídos não só os serviços próprios da Autora, mas também o pagamento dos honorários ao Solicitador pelos serviços por este a prestar nas buscas junto dos serviços da Autoridade Tributária, dos Serviços de Registo Predial e Tribunais quanto à existência de qualquer ônus ou encargos sobre estes prédios e ainda os serviços prestados com cancelamento de registos de ônus existentes e registo a favor do novo proprietário, o Reu. 18º- O Reu concordou com este pagamento, tendo feito um pagamento parcial de 10.000,00€”. E consta do despacho exarado na ata de audiência prévia de 10-07-2020, no qual se refere: “Seja como for, contrariamente ao sustentado pelo réu, afigura-se que a autora, no requerimento de injunção, cumpriu minimamente aquele ónus de alegação da causa de pedir, fazendo uma exposição sucinta dos factos em que alicerça a sua pretensão, tal como explicita no artigo 8º da réplica. Não pode, como tal, dizer-se que a petição inicial é completamente omissa quanto à alegação da causa de pedir. Poderia dizer-se, sim, que no requerimento de injunção a autora não especificou de forma suficiente quais os concretos serviços que teria prestado ao réu e que dariam corpo à ali referida «coadjuvação da venda do imóvel denominado “Quinta ...”». Essa insuficiência na exposição da matéria de facto não seria, como se disse já, o bastante para considerar a petição inicial inepta, por falta de causa de pedir. Poderia e deveria ser suprida, a convite do tribunal, nos termos do já citado artigo 590º, nºs 2, al. b) e 4) do Código de Processo Civil. E, diga-se, o tribunal por certo faria esse convite, caso a autora não tivesse já carreado para o processo os factos que concretizam a mencionada «coadjuvação», o que fez nos artigos 12º a 20º da réplica – actividade processual que, na óptica do tribunal, pode ser aproveitada, por economia processual, visto que o réu teve já oportunidade de exercer o contraditório sobre esses novos factos, o que fez no articulado que ofereceu com data de 10-03-2020 (cfr. fls. 48 e segs.). Nestes termos e pelos fundamentos expostos, decide-se julgar improcedente a excepção dilatória de nulidade de todo o processo invocada pelo réu”. O entendimento sufragado por este Tribunal, trata-se de uma mera convolação jurídica da pretensão formulada pela A., e que se mostra lícito operar nos termos do artigo 5º, nº 3, do CPC, “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito”. Trata-se de pretensão deduzida pelo A., que não se encontra fora do perímetro da vinculação temática do tribunal, nos termos decorrentes dos artigos 5º, n.º 1, 260º, 609º e 611º do CPC. A convolação operada, de contrato de prestação de serviços de leilão, para contrato de prestação de serviços não extravasa o perímetro objetivo e subjetivo da pretensão deduzida pela autora, em função do qual se afere também o exercício do contraditório por parte do réu. O réu sempre alegou, nomeadamente na resposta à réplica da autora, que esta não prestou quaisquer serviços, “16) Sucede que, a A. nada vendeu e não “coadjuvou” o que quer que seja, 17) pretendendo -isso sim- locupletar-se e in casu à custa do Réu”. Mas provou-se que, como consta da matéria de facto provada que houve serviços prestados e foi acordado um preço, como contrapartida desses mesmos serviços, nomeadamente no ponto 6. Ao Tribunal incumbe proceder à qualificação jurídica que julgue adequada, nos termos do artigo 5º, n.º 3, do CPC, dentro da fronteira da factualidade alegada e provada e nos limites do efeito prático-jurídico pretendido. Conforme acórdão do STJ de 09-07-2014, no Proc. nº 236/10, “o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, sendo certo, no entanto, que só pode servir-se dos factos articulados pelas partes (art. 5º, nº 3, do NCPC (2013))”. A decisão do acórdão reclamado encontra-se circunscrita ao âmbito da pretensão formulada pela autora e não ofende o princípio do dispositivo. * A pretensão do requerente tem, assim, que improceder. Não tendo fundamento o requerimento de arguição de nulidades do acórdão proferido deve, o mesmo, ser indeferido. * Sumário elaborado nos termos do art. 663 nº 7 do CPC: I- O recurso em revista excecional, apesar de ser recurso ordinário, não abrange todas as questões que tenham sido suscitadas no recurso, mas apenas aquelas consideradas, pela Formação, com relevância jurídica ou relevância social (para além dos casos em que seja verificada contradição), conforme als. a), b) e c), do nº 1 do art. 672º, do CPC. II- Ao Tribunal incumbe proceder à qualificação jurídica que julgue adequada, nos termos do artigo 5º, n.º 3, do CPC, dentro da fronteira da factualidade alegada e provada e nos limites do efeito prático-jurídico pretendido. III- A convolação operada, de contrato de prestação de serviços de leilão, para contrato de prestação de serviços não extravasa o perímetro objetivo e subjetivo da pretensão deduzida pela autora, em função do qual se afere também o exercício do contraditório por parte do réu. Decisão: Em face do exposto, acorda-se em indeferir o requerimento de arguição de nulidades do acórdão desta Secção de 28-02-2023. Custas pelo autor/reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) Ucs. Lisboa, 20-06-2023
Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro Relator Jorge Arcanjo – Juiz Conselheiro 1º adjunto Manuel Aguiar Pereira– Juiz Conselheiro 2º adjunto |