Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | JORGE GONÇALVES | ||
| Descritores: | RECURSO DE DECISÃO CONTRA JURISPRUDÊNCIA FIXADA PRESSUPOSTOS ASSISTENTE LEGITIMIDADE PARA RECORRER REJEIÇÃO | ||
| Data do Acordão: | 10/09/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (PENAL) | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
| Sumário : |
I – Constitui pressuposto material do recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada que a decisão recorrida viole essa jurisprudência, exigindo-se uma rejeição expressa e frontal da mesma. II – O acórdão do Tribunal da Relação que figura como acórdão recorrido convoca e aplica a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça – interpretando-a bem ou mal, não releva para o caso -, pelo que, manifestamente, não se pode concluir ter sido proferido contra a dita jurisprudência fixada. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO 1. Por requerimento de 27 de maio de 2025, o Ministério Público no Tribunal da Relação de Coimbra interpôs recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 446.º, do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de CPP), por considerar que o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 9 de abril de 2025, proferido nos autos de recurso penal n.º 5/23.3PCLRA.C1, foi proferido contra o assento n.º 8/1999 do Supremo Tribunal de Justiça, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 185, de 10 de agosto de 1999. Formulou as conclusões que se transcrevem: «1. Pelo assento 8/99/AUJ, de 10/08, foi fixada a seguinte jurisprudência, que mantém actualidade: “O assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir.” 2. O assistente/recorrente, ao pedir a condenação das arguidas numa pena de prisão, ainda que suspensa na execução, sem adiantar condições específicas para a suspensão, ou o agravamento das penas de mula e da taxa diária, não invoca qualquer interesse específico e próprio, distinto da finalidade de defesa social que a medida das penas visa prosseguir e proteger e que ao Ministério Público compete, alegando, apenas, que a espécie e a medida das penas aplicadas são desadequadas e desproporcionais à grande censurabilidade dos factos, afirmando o seu receio da prática de novos crimes em razão da sua avançada idade e da circunstância de ser proprietário do imóvel que aquelas ocupam, sendo obrigado a contactar com elas. 3. O Ministério Público na primeira instância não recorreu da sentença condenatória e, na resposta a recurso do assistente, considerou que as penas aplicadas às arguidas, coautoras de um crime de ofensa à integridade física simples, eram adequadas e proporcionais. 4. Em parecer, na segunda instância, o Ministério Público arguiu a ilegitimidade do assistente para recorrer da medida das penas, desacompanhado do Ministério Público. 5. A decisão/acórdão, embora fundamentada no que respeita a citações jurisprudenciais e doutrinárias, não justifica, nomeadamente com argumentos relevantes, novos, ainda não ponderados, a não aplicação da jurisprudência fixada e baseia-se, tão-somente, na convicção de que a pena aplicada na primeira instância não foi a melhor solução legal, sendo que não conseguiu demonstrar um concreto e próprio interesse em agir por parte do assistente. 6. Reconhecer a legitimidade de um assistente para recorrer num caso como o presente é reconhecer a legitimidade de todos os assistentes para recorrerem das medidas das penas aplicadas, porquanto nenhuma diferença de fundamentos se encontra relativamente a todos os demais recursos onde a ilegitimidade tem sido frequentemente reconhecida e declarada. 7. Não pode remediar-se qualquer eventual injustiça na decisão da primeira instância pela via do agravamento da pena, quando o Ministério Público, entendendo-a adequada e proporcional, dela não interpôs recurso. 8. No caso: - os fundamentos abordados na decisão já foram considerados no próprio AUJ de que este tribunal se afastou, decidindo em sentido contrário; - o tribunal não apresentou qualquer argumento relevante, novo, ainda não ponderado, nem indicou, com evidência, qualquer percepção de alteração notória no sentido de se mostrar ultrapassada a ponderação feita pelo Supremo Tribunal de Justiça nesse assento/AUJ; - o tribunal não conseguiu demonstrar um concreto e próprio interesse em agir por parte do assistente; - a discordância do assistente relativamente às penas aplicadas às arguidas não deriva de causa que tenha afectado o seu interesse concreto e próprio, oriundo duma posição equidistante que vise a salvaguarda de valores jurídicos e em razão da qual se possa considerar vencido; - o assistente não invocou qualquer interesse próprio e concreto em agir na alteração da medida concreta da pena, para além das necessidades de prevenção a nível a nível geral e do receio do cometimento de novos crimes, cuja defesa é tarefa do Ministério Público, que expressamente a considerou justa; - à falta de invocação de qualquer interesse específico de uma pena mais elevada, distinto das finalidades públicas da aplicação da pena, não pode o tribunal concluir que existe interesse relevante do assistente em agir, por forma a integrar o pressuposto de admissibilidade do recurso nesta parte, tanto mais que que a decisão proferida não foi contra ele; - a decisão, ao não aplicar a jurisprudência fixada, proferindo decisão contrária a ela, baseia-se tão-somente na convicção de que a pena aplicada na primeira instância não foi a melhor solução legal. 9. Para que ao assistente fosse reconhecida a legitimidade para recorrer da medida das penas, desacompanhado do Ministério Público, teria ele de demonstrar um interesse próprio e relevante, por exemplo, que a decisão judicial afectou, directamente e de forma significativa, os seus direitos ou interesses pessoais, o que aqui não aconteceu, e o tribunal não convenceu, com fundamentação bastante, nova e nos termos exigidos e acima enunciados, da verificação de pressupostos de não aplicação da jurisprudência fixada pelo assento, não conseguindo demonstrar o tal concreto e próprio interesse em agir por parte do assistente. 10. Por falta de legitimidade do assistente para recorrer da medida das penas aplicadas às arguidas, o recurso deveria ter sido rejeitado, nessa parte, com fundamento na jurisprudência fixada pelo assento/AUJ 8/99, de 10/08. 11. Ao decidir contra a jurisprudência fixada, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra violou o decidido nesse assento/AUJ e o disposto no artigo 445º, nº 3, do código de processo penal.» 2. O assistente, AA, respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência, concluindo (transcrição das conclusões): «A. Contrariamente ao que vem alegar o Ministério Público, o douto Acórdão agora recorrido não vai contra a jurisprudência fixada pelo Assento n.º 8/99, de 10 de outubro. B. É manifesto que, em sede de recurso, o Recorrido invocou e demonstrou um interesse concreto e próprio na alteração da espécie e da medida de pena. C. O interesse próprio do Recorrido está suficientemente alegado e demonstrado nos artigos 22.º a 26.º das alegações de recurso e nos pontos IX e X das conclusões. D. Concretamente, nessa sede, alega o Recorrido que a pena de multa não é suficiente para desencorajar as Arguidas de voltarem a praticar atos de natureza semelhante, designadamente, em retaliação contra o Recorrido, que, como proprietário do imóvel que as Arguidas ocupam, continua obrigado a contactar com as mesmas. E. E, ainda, que a espécie de pena aplicada às Arguidas, de baixa intensidade repressiva, causa claro prejuízo ao Recorrido, na medida em que coloca em causa a sua própria segurança, bem como, viola ainda as suas expectativas e interesses legítimos dado que o Recorrido sempre pugnou para que as Arguidas fossem condenadas e punidas exemplarmente pelos factos contra si praticados, de forma a garantir que estas não voltem a repeti-los. F. Tais fundamentos são, igualmente, extensíveis ao pedido de alteração da medida da pena aplicada. G. Assim entendeu, também, o Tribunal da Relação de Coimbra, no douto Acórdão agora recorrido, que concluiu que “… o assistente, ao recorrer da espécie e medida da pena, não estará apenas a pretender a realização de um “interesse próprio de vingança pessoal”, mas antes, a contribuir, tal como nas anteriores fases do processo, como colaborador do MP, na declaração do direito do caso concreto, possibilitando que um tribunal superior possa sindicar a decisão proferida, e como tal, a contribuir na finalidade pública que preside ao processo penal.” H. Entendimento que vem sendo perfilhado pela maioria da jurisprudência nacional (cfr. Acórdãos do STJ de 03/02/2021 e 25/10/2018, do TRE de 10/09/2019 e do TRP de 21/02/2018, in www.dgsi.pt) I. Assim, bem andou o Tribunal da Relação de Coimbra ao decidir que o Recorrido tem legitimidade para recorrer da medida das penas aplicadas às arguidas, desacompanhado do Ministério Público, por ter demonstrado um concreto e próprio interesse em agir. J. O douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra decide em conformidade com a jurisprudência fixada pelo Assento n.º 8/99, enquadrando o presente caso na exceção à regra da falta de legitimidade do assistente para recorrer da medida da pena, quando desacompanhado do Ministério Público, fixada nesse mesmo Assento. K. Por conseguinte, deve improceder, na sua totalidade, o presente recurso, mantendo-se inalterada o douto Acórdão recorrido, que não merece qualquer reparo.» 3. Neste Supremo Tribunal de Justiça (doravante STJ), o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no sentido da rejeição do recurso, dizendo, além do mais: «(…) afigura-se, assim, evidente, sem quebra do respeito por diferente opinião, que o acórdão recorrido não questionou a validade da jurisprudência firmada no assento n.º 8/1999. Para que tal se verificasse necessário seria que tivesse afastado expressamente a respetiva doutrina e decidido que o assistente tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, ainda que não tenha nem demonstre um concreto e próprio interesse em agir. Não foi isso, manifestamente, o que aconteceu. Bem ou mal, o acórdão recorrido entendeu – e fundamentou de forma clara essa conclusão – que, neste caso, o assistente tinha um interesse próprio e concreto para agir / recorrer quanto à matéria da medida e espécie da pena, tal como exigido pelo assento n.º 8/1999. Donde que, não se identificando a imprescindível oposição, muito menos expressa, entre o acórdão recorrido e o assento n.º 8/1999, o recurso deva ser rejeitado, nos termos do artigo 441.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, por falência de um dos pressupostos substanciais.» 4. Facultado o contraditório, o mesmo não foi exercido. 5. Realizado exame preliminar e colhidos os vistos, cumpre decidir em conferência. II – FUNDAMENTAÇÃO 1. Estabelece o artigo 446.º, do CPP, com a epígrafe “Recurso de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça”: «1 - É admissível recurso direto para o Supremo Tribunal de Justiça de qualquer decisão proferida contra jurisprudência por ele fixada, a interpor no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão recorrida, sendo correspondentemente aplicáveis as disposições do presente capítulo. 2 - O recurso pode ser interposto pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis e é obrigatório para o Ministério Público. 3 - O Supremo Tribunal de Justiça pode limitar-se a aplicar a jurisprudência fixada, apenas devendo proceder ao seu reexame se entender que está ultrapassada.» O recorrente fundamenta o presente recurso [extraordinário] de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal na alegada circunstância de o acórdão recorrido – decisão do TRP, de 09.04.2025 – ter sido proferido contra o assento n.º 8/1999, do Supremo Tribunal de Justiça, publicado no Diário da República, I Série - A, n.º 185, de 10 de agosto de 1999. Constituem pressupostos do referido recurso extraordinário: a) Sob o ponto de vista formal: - a interposição no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado de «qualquer» decisão, ou seja, de decisão proferida por tribunal colegial ou por tribunal singular, por tribunal superior ou por tribunal de 1.ª instância (artigo 446.º, n.º 1, do CPP); - o arguido, o assistente, as partes civis e o Ministério Público têm legitimidade para a interposição do recurso (artigo 446.º, n.º 2, do CPP); - com exceção do Ministério Público, para quem o recurso é obrigatório, o arguido, o assistente e as partes civis devem ainda demonstrar interesse em agir/recorrer (artigos 446.º, n.º 2, 448.º e 401.º, n.º 2, do CPP); - o recorrente deve identificar «o acórdão» – um só acórdão, portanto – de fixação de jurisprudência contrariado pela decisão recorrida e o local da sua publicação (artigos 446.º, n.º 1, parte final, e 438.º, n.º 2, do CPP). b) Sob o ponto de vista substancial: - deve identificar-se uma oposição entre a decisão recorrida e a jurisprudência fixada quanto à mesma questão de direito e perante idêntica situação de facto (artigos 446.º, n.º 1, parte final, e 437.º, n.º 1, do CPP); - não pode ter ocorrido modificação legislativa que interfira, direta ou indiretamente, na resolução da questão de direito controvertida durante o intervalo da prolação do acórdão de fixação de jurisprudência e do acórdão recorrido (artigos 446.º, n.º 1, parte final, e 437.º, n.º 3, do CPP). 2. Não existem dúvidas quanto à verificação dos pressupostos formais, porquanto o Ministério Público tem (sempre) legitimidade, interpôs o recurso nos 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido e identificou o assento/acórdão de fixação de jurisprudência que aquele, supostamente, contrariou. 3. No que toca aos requisitos substanciais, o recorrente alega, como já se disse, que o acórdão recorrido foi proferido contra a jurisprudência do assento n.º 8/1999, do Supremo Tribunal de Justiça. O referido assento resolveu a contradição de julgados entre os acórdãos da Relação do Porto, de 10 de fevereiro de 1993, e da Relação de Évora, de 23 de abril de 1996, questionando-se a legitimidade do assistente, desacompanhado do Ministério Público, para recorrer por discordância em relação à espécie ou à medida da pena aplicada. Respondendo à questão, o Supremo Tribunal de Justiça firmou a seguinte jurisprudência obrigatória: «O assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir.» O assistente não fica impedido de recorrer, desacompanhado do Ministério Público, no que concerne à espécie e medida concreta da pena, apenas se lhe impondo a obrigação, o ónus, de demonstrar um concreto e próprio interesse em agir, de que têm sido fornecidos pela doutrina e jurisprudência diversos exemplos. Consignou-se a propósito no assento que: «(…) este interesse em agir do assistente "tem de ser concreto e do próprio, pelo que é insuficiente se o Tribunal, concluindo que se não está face a um mero desejo de vindicta privada, nada mais encontrar; como insuficiente é para por aquele se concluir se o MP, nas suas alegações escritas, emitir parecer no sentido de o Tribunal a quo ter usado de uma benevolência que se não justifica na determinação da medida concreta da pena (…), se o assistente não demonstrar um real e verdadeiro interesse, um seu pedido de agravação da pena (em termos de espécie ou de medida) tem um cunho, ou, pelo menos, aparenta tê-lo, de regresso à vindicta privada, o que de há muito felizmente desapareceu das nossas leis – ainda quando elas admitem a ação direta ou a legítima defesa nunca se as quis como e enquanto sinal de vindicta, mas enquanto ação de justiça dentro de um apertado e rigoroso condicionalismo que concretamente se previu e o qual o agente não deve voluntariamente provocar. Nestes casos, aparece com uma nitidez, bem demarcada, a ideia – exata – de que o domínio da ação penal cabe ao MP.» Resulta do acórdão recorrido que, por sentença de 17 de outubro de 2024, as arguidas BB e CC foram condenadas, cada uma, pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 130 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, bem como a pagar ao assistente e demandante, AA, a quantia de 1.500,00€ a título de danos não patrimoniais, acrescida dos juros moratórios, à taxa legal em vigor, contados a partir do trânsito em julgado da condenação. A condenação assentou na seguinte factualidade: «1. No dia 4 de Janeiro de 2023, cerca das 12h35 horas, na Rua 1 em Leiria, as arguidas, por motivos não inteiramente apurados (mas relacionados com o contrato de comodato existente entre o assistente e a arguida BB), em comunhão de esforços e intentos dirigiram-se ao assistente AA, na altura com 90 anos de idade, tendo uma das arguidas desferido um golpe, com um objecto não concretamente apurado, no membro superior esquerdo daquele, tendo o assistente caído no chão. 2. Já com o assistente caído no chão, as duas arguidas desferiram-lhe pontapés no corpo. 3. Como consequência directa e necessária da actuação das arguidas resultaram para o assistente, para além de dores e sofrimento físico, as seguintes lesões: - Face: equimose arroxeada, na região malar direita, medindo 4x2cm; - Ráquis: mobilidades da coluna vertebral mantidas dentro dos parâmetros da normalidade, com referência a dor nos últimos graus e à palpação das apófises espinhosas lombares. - Membro superior esquerdo: escoriação crosta sanguínea, no cotovelo, medindo, 1 cm de diâmetro, com edema subjacente. Mobilidades mantidas dentro dos parâmetros da normalidade, com referência a dor nos últimos graus; - Membro inferior direito: edema do joelho direito, quente ao toque. Mobilidades mantidas dentro dos parâmetros da normalidade, com referência a dor nos últimos graus; - Membro inferior esquerdo: ponteado equimótico arroxeada-avermelhado na face anterior do joelho, ocupando uma área de 5x4cm, no seio da qual apresenta 2 escoriações sanguíneas, a maior na sua extremidade supero-medial, medindo 3 cm de diâmetro; ligeiro edema do joelho, quente ao toque. Mobilidades mantidas, dentro dos parâmetros da normalidade, com referência a dor nos últimos graus lesões. 4. As lesões atrás referidas determinarão, em condições normais, um período de doença fixável em 10 dias, com afetação da capacidade de trabalho geral (10 dias); 5. As arguidas, com a conduta descrita, agiram em comunhão de esforços e intentos, com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde do assistente, o que representaram e quiseram. 6. Actuaram as arguidas de forma livre, voluntária e conscientemente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal. Mais se provou (Do pedido de indemnização civil): 7. Em virtude da conduta das arguidas o assistente sentiu vergonha. 8. Em virtude da conduta das arguidas o assistente ficou com medo. Mais se provou (Da situação económica das arguidas): 9. Não são conhecidos quaisquer bens móveis ou imóveis à arguida BB. 10. Não são conhecidos rendimentos mensais à arguida BB. 11. Não são conhecidos quaisquer bens móveis ou imóveis à arguida CC. 12. Não são conhecidos rendimentos mensais à arguida CC. 13. Do Certificado de Registo Criminal da arguida BB "nada consta" averbado. 14. Do Certificado de Registo Criminal da arguida CC "nada consta" averbado» O assistente/demandante civil, AA, recorreu da sentença, insurgindo-se, além do mais, contra a escolha e determinação da medida concreta da pena. Nas suas conclusões (transcrição da parte relevante): «I. O Tribunal a quo incorreu em manifesto erro na apreciação do Direito, quanto à escolha e determinação da medida concreta da pena. II. Apesar de não terem antecedentes criminais, as Arguidas demonstraram um manifesto desprezo pelo processo e por este Tribunal, não se tendo dignado a comparecer na diligência de julgamento ou na leitura de sentença. III. As Arguidas não demonstraram, ao longo do processo, qualquer arrependimento pela sua actuação. IV. Também os factos praticados pelas Arguidas se revelam particularmente censuráveis, desde logo porque o Recorrente tinha, à data dos factos, 90 anos de idade. V. As Arguidas eram duas e agrediram o Recorrente em simultâneo, atacando-o com um objecto (ferro ou pau) e, ainda, desferindo-lhe pontapés quando o este se encontrava, indefeso, no chão. VI. Claramente, a actuação das Arguidas poderia ter tido consequências muito mais gravosas para o Recorrente, face à sua avançada idade. VII. Por outro lado, não são conhecidos rendimentos mensais às Arguidas, nem a propriedade de quaisquer bens móveis ou imóveis, o que demonstra que não estão minimamente inseridas na sociedade, nem têm uma vida pessoal e profissional estável. VIII. Todas estas circunstâncias demonstram que a pena de multa não é suficiente para satisfazer as exigências de tutela dos bens jurídicos em causa, concretamente, a integridade física das pessoas, nem para satisfazer a necessidade de socialização das Arguidas. IX. A pena de multa não é suficiente para desencorajar as Arguidas de voltar a praticar actos de natureza semelhante, designadamente, em retaliação contra o próprio Recorrente, que, como proprietário do imóvel que as Arguidas ocupam, continua obrigado a contactar com as mesmas. X. A espécie de pena aplicada às Arguidas, de baixa intensidade repressiva, causa claro prejuízo ao Recorrente, na medida em que coloca em causa a sua própria segurança, bem como, viola ainda as suas expectativas e interesses legítimos dado que o Recorrente sempre pugnou para que as Arguidas fossem condenadas e punidas exemplarmente pelos factos contra si praticados, de forma a garantir que estas não voltem a repeti-los. XI. Acresce que, conforme resulta dos factos provados, não são conhecidos às Arguidas rendimentos mensais ou quaisquer bens móveis ou imóveis, pelo existe uma forte probabilidade de as Arguidas não cumprirem a pena que lhes foi aplicada. XII. Assim, deve a douta sentença recorrida ser revogada, por erro na apreciação e aplicação do Direito, concretamente, do disposto no art. 70.º do Código Penal, sendo substituída por acórdão que aplique a medida de pena de prisão às Arguidas, ainda que suspensa na sua execução. XIII. Caso não se entenda o supra alegado – o que não se admite – e com o devido respeito, entende-se que o Tribunal a quo também fez uma incorrecta ponderação dos factos, para efeitos de fixação do quantitativo diário das penas de multa. XIV. O Tribunal a quo ignorou as várias agravantes do comportamento das Arguidas, mormente, a provecta idade do Recorrente à data dos factos, com todos os riscos daí decorrentes face aos factos em análise, e o desprezo que manifestaram pelo processo. XV. A culpa das Arguidas e o grau de ilicitude são graves. XVI. Assim, entende-se que a pena a aplicar às Arguidas nunca deveria ser inferior a 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa. XVII. Na determinação do quantitativo diário da multa, ainda que esteja provado que não são conhecidos rendimentos mensais às Arguidas, não quer dizer que os mesmos inexistam, o que não se provou. XVIII. A fixação do quantum diário da pena de multa pelo mínimo legal deve estar reservado para situações de manifesta pobreza, pois só nesse caso a aplicação de um valor superior a esse mínimo pode constituir uma privação total do sustento do arguido. (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 04/05/2016, in www.dgsi.pt) XIX. No caso em apreço, não está provado que as Arguidas vivam numa situação de pobreza, nem se provou, sequer, que atravessem quaisquer dificuldades económicas ou de sustento. XX. A multa a aplicar às Arguidas tem de lhes impor um sacrifício, sob pena de não constituir uma verdadeira punição e não cumprir as finalidades do processo penal. (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 03/11/2015, in www.dgsi.pt) XXI. A verdadeira punição pelos crimes em que as Arguidas foram condenadas apenas se poderá verificar caso se fixe o quantitativo diário das penas de multa num valor de, no mínimo, €50,00 (cinquenta euros). XXII. Por conseguinte, deve a douta sentença recorrida ser revogada, por incorrecta apreciação e aplicação do Direito, concretamente, do art. 47.º, n.º 2, do Código Penal, sendo substituída por Acórdão que aplique a cada uma das Arguidas a pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa e fixe o respectivo quantitativo diário em €50,00 (cinquenta euros). XXIII. Relativamente ao pedido de indemnização civil, tendo-se concluído pela ressarcibilidade dos danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente, a fixação da respectiva indemnização deve ser feita de modo equitativo, tendo em consideração o grau de culpabilidade das Arguidas, a sua situação económica e financeira e outras circunstâncias relevantes para o caso concreto. XXIV. O comportamento das Arguidas é censurável, na medida em que agiram com dolo directo, representando os factos e querendo praticá-los. XXV. O grau de ilicitude da conduta das Arguidas é elevado, considerando a idade do Recorrente e a falta de arrependimento das Arguidas. XXVI. Não ficou demonstrado que as Arguidas atravessem quaisquer dificuldades financeiras, não obstante se ter provado que não lhes são conhecidos rendimentos mensais. XXVII. Face circunstâncias do caso concreto e aos danos sofridos pelo Recorrente, a atribuição de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de €1.500,00, ainda por cima a pagar solidariamente entre ambas as Arguidas, parece ter um cariz meramente simbólico. XXVIII. Considerando os danos que se visa ressarcir, a indemnização por danos não patrimoniais deve ser fixada num valor significativo, de acordo com critérios de equidade, que não deve ser inferior a €10.000,00 (dez mil euros), a pagar solidariamente pelas Arguidas. XXIX. Face ao exposto, deve a sentença recorrida ser revogada por erro na apreciação e aplicação do Direito, concretamente, dos arts. 494.º e 496.º, n.º 3, do Código Civil, sendo substituída por Acórdão que condene as Arguidas, solidariamente, no pagamento ao Recorrente de indemnização por danos não patrimoniais no montante de €10.000,00 (dez mil euros). Nestes termos e nos melhores de Direito, que os Venerandos Juízes Desembargadores doutamente suprirão, deve a sentença ora recorrida ser revogada, e, consequentemente, substituída por Acórdão que: a. Condene as arguidas BB e CC em pena de prisão, ainda que suspensa na sua execução Subsidiariamente, b. Condene as arguidas BB e CC, cada uma, em pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, com o quantitativo diário em €50,00 (cinquenta euros); Em qualquer dos casos, c. Condene as demandadas BB e CC, solidariamente, no pagamento ao demandante AA do montante de €10.000,00 (dez mil euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.» O Ministério Público não recorreu da sentença. No Tribunal da Relação de Coimbra, a Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta sustentou que o assistente carecia de legitimidade para recorrer quanto à medida da pena. Apreciando esta questão, o Tribunal da Relação de Coimbra, depois de recordar o teor do assento n.º 8/1999 e a respetiva fundamentação essencial, depois de cotejar e de interpretar o mesmo assento à luz do que emana dos acórdãos de fixação de jurisprudência n.ºs 5/2011 ["em processo por crime público ou semipúblico, o assistente que não deduziu acusação autónoma nem aderiu à acusação pública pode recorrer da decisão de não pronúncia, em instrução requerida pelo arguido, e da sentença absolutória, mesmo não havendo recurso do Ministério Público"] e 2/2020 [“O assistente, ainda que desacompanhado do Ministério Público, pode recorrer para que a suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado fique condicionada ao pagamento, dentro de certo prazo, da indemnização que lhe foi arbitrada”], e depois de passar em revista os diversos entendimentos da jurisprudência e da doutrina acerca do alcance da exigência estabelecida no assento para reconhecer legitimidade ao assistente para recorrer da medida da pena desacompanhado do Ministério Público, concluiu que, nas circunstâncias concretas do caso, estavam reunidos os pressupostos dessa legitimidade. Lê-se no acórdão recorrido (excluem-se da transcrição as notas de rodapé): «Sobre o direito ao recurso do assistente o STJ já por duas vezes foi chamado a fixar jurisprudência. A primeira, através do acórdão de fixação de jurisprudência (AFJ) (então assento) n.º 8/99 (Ac. de 30.10.1997, DR, I-A, de 10.08.1999), no sentido de que "[o] assistente não tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, salvo quando demonstrar um concreto e próprio interesse em agir". A segunda, mediante o AFJ n.º 5/2011, (Ac. de 09.02.2011, DR, 1.ª, de 11.03.2011), em como "[e]m processo por crime público ou semipúblico, o assistente que não deduziu acusação autónoma nem aderiu à acusação pública pode recorrer da decisão de não pronúncia em instrução requerida pelo arguido, e da sentença absolutória, mesmo não havendo recurso do Ministério Público". Ambos os arestos, tratando obviamente de situações diferentes, assinalaram os poderes autónomos do assistente, entre os quais o de recorrer, em especial o segundo, que fez ainda eco daquela posição doutrinária, de que qualquer interesse do assistente tem de estar subordinado ao interesse público da realização da justiça penal. A legitimidade, enquanto pressuposto processual para recorrer, não é problema diferente da legitimidade para a constituição de assistente, isto é, o recorrente só pode recorrer de decisões na medida da sua legitimidade, ou seja, pelos crimes em que se tenha constituído assistente. É a qualidade adjectiva que do ponto de vista previamente definido pela lei e, portanto avaliada a priori, justifica que alguém possa mormente impugnar, perante tribunal superior, decisão que a afecte e que obviamente tenha relação com o objecto do processo. Já o interesse em agir, igualmente verdadeiro pressuposto processual e também designado de interesse processual, conceito oriundo da processualística civil, consiste na necessidade de recorrer à via judiciária com vista a reagir contra uma decisão que comporte uma desvantagem para o recorrente e que só por esse meio possa ser acautelada. (…) Na jurisprudência, a questão de saber quando é que o assistente tem interesse em agir em matéria relativa à fixação da espécie e medida da pena, ou seja, quando é que está em causa a tutela de um interesse próprio, não tem tido uma posição unívoca, do que se se dá conta na decisão sumária proferida a 28-01-2019, no Processo: 1654/15.9PBFUN-B.L, em sede de reclamação para o presidente da Relação de Lisboa (Relator: GUILHERMINA FREITAS - VICE-PRESIDENTE), disponível em www.dgsi.pt. A posição dominante é a mais restritiva, quer ao nível do STJ (vejam-se, a título de exemplo, os acórdãos proferidos nos Proc. 1740/10.1JAPRT.P1.S1, 400/12.3JAAVR.S1 e 1960/14.0PAALM.L1.S1, todos eles disponíveis in www.dgsi.pt), quer das Relações (vejam-se, a título de exemplo, os acórdãos proferidos nos Proc. 178/06.0PTCSC.L1-9, da RL, 187/11.7PDVNG.P1, da RP, 669/16.4JABRG.G1, da RG, 1429/12.7TAFAR.E1, da RE e 310/13.7GBPMS.C1, da RC, e a decisão sumária da RC de 01-03-2024 Processo: 104/20.3T9TND.C1 igualmente disponíveis in www.dgsi.pt). Mas tem vindo a afirmar-se outra tese, mais ampla, na jurisprudência do STJ (de que são exemplo o Ac. do STJ de 22/1/2015, proferido no âmbito do Proc. 520/13.7PHLSB.L1.S1, de 03-02-2021, Processo: 4038/18.3 JAPRT.P1.S1, de 06-05-2021, Processo: 214/19.0 JDLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt) e na das Relações (de que são exemplo o Ac. da RE de 21/3/2017, proferido no âmbito do Proc. 519/09.8TASTB.E1 e de 10-09-2019, Processo: 46/17.0JAPTM.E1 e a decisão sumária proferida 28-11-2006 pela RE, Processo: 2693/06-1 e da RP de 06-12-2023, Processo: 640/21.4GAPRD.P1 todos disponíveis in www.dgsi.pt). Escreveu-se no Ac. STJ de 03-02-2021, acima referido: “Jurisprudência e doutrina mais recentes manifestam-se contra a visão tradicional que restringe o estatuto de sujeito processual do assistente, circunscrevendo os seus poderes processuais à de mero colaborador da atividade do Ministério Público, a quem, no fim de contas, tinha de subordinar a sua atuação. Nessa conceção, a relevância do papel do assistente “na promoção de uma aplicação correta do direito” resume-se ao controlo da atuação do Ministério Público. Sustenta que “sendo o Ministério Público o único titular do direito de acção penal — nos crimes públicos —, a posição processual do assistente tem natureza ancilar, não podendo ver‑se nela uma posição de titularidade plena de um direito fundamental (afirmação diferente se terá de fazer quanto ao arguido e quanto às partes civis). E mesmo tratando‑se de crimes dependentes de acusação particular, a natureza pública do processo não põe irremediavelmente em crise esta concepção da figura do assistente” – Apud acórdão n.º 254/98 do Tribunal Constitucional. Na jurisprudência, aos AUJ citados, acrescenta-se o entendimento largamente maioritário no sentido de que o assistente pode recorrer mesmo que do provimento do recurso advenha alteração da espécie e medida da pena sempre que ao longo do processo tenha pugnado ativamente por uma determinada solução jurídico-criminal que a decisão final não consagrou.” (…) Revertendo para o caso concreto, temos por certo que o interesse que o assistente visa assegurar, no recurso interposto (…) é um interesse próprio, sendo o recurso interposto “a via de alcançar tutela judicial efetiva para as pretensões apresentadas e pelas quais pugnou ativamente na sua intervenção processual.” De facto, o recorrente constituiu-se assistente no processo, ainda em fase de inquérito, deduziu acusação particular, aderindo à acusação do M.P. e indicando prova para além daquela que o M.P. tinha indicado, assim demonstrando claramente o seu interesse na condenação e punição das arguidas. Deduziu ainda pedido de indemnização civil contra as arguidas. Interveio, através de mandatário, aquando da audiência de discussão e julgamento e em alegações oralmente proferidas, peticionou a condenação numa “pena exemplar”. Proferida sentença, recorreu, explicando que tem medo das arguidas, que é proprietário do prédio que as arguidas ocupam e que, por isso, é obrigado a contactar com elas e que entende que a pena de multa não é suficiente para desencorajar as arguidas de praticar factos de natureza semelhantes, nomeadamente de retaliação contra o recorrente, colocando em causa a sua segurança e também as suas expectativas em face da Justiça, sempre tendo pugnado para que fossem punidas exemplarmente e por forma a garantir que não se volta a repetir. Segundo se julga, sendo a decisão recorrível, assistia-lhe o direito de recorrer para obter tutela judicial efetiva para as concretas pretensões por que ativamente foi pugnando no decurso do processo, de obtenção de uma pena que alcance as finalidades estabelecidas no art. 40.º do Código Penal, designadamente a de proteção do bem jurídico de que é titular, o que no seu entendimento, não é logrado com a pena em que as arguidas foram condenadas O concreto interesse em agir não está, advoga-se, ligado apenas a um interesse de carácter patrimonial ou a eventuais consequências que a decisão final pudesse acarretar noutros processos ou ramos do direito. E o assistente, ao recorrer da espécie e medida da pena, não estará apenas a pretender a realização de um “interesse próprio de vingança pessoal”, mas antes, a contribuir, tal como nas anteriores fases do processo, como colaborador do MP, na declaração do direito do caso concreto, possibilitando que um tribunal superior possa sindicar a decisão proferida, e como tal, a contribuir na finalidade pública que preside ao processo penal. Em razão do exposto, entende-se que o recorrente tem legitimidade e interesse em agir.» Face à fundamentação apresentada, temos de concluir que o acórdão recorrido não decidiu contra jurisprudência fixada. Como já se assinalou, constitui pressuposto material do recurso extraordinário em apreço que a decisão recorrida tenha sido proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, ou seja, que a decisão recorrida viole essa jurisprudência. Deveremos “deveremos estar na presença de uma decisão que de forma expressa se opõe frontalmente à jurisprudência fixada. (…) a opção da lei foi clara. Para os casos de desconhecimento, leitura incorreta, ou erro de julgamento, de direito ou errada ou má interpretação do AFJ reservou o recurso ordinário. (…) Exige-se divergência assumida, uma contestação, uma rejeição expressa da jurisprudência fixada, mencionar e contrariar expressamente o AFJ, negar a sua validade” (Tiago Caiado Milheiro, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo V, maio de 2024, comentário § 26, páginas 492-493). In casu, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra que figura como acórdão recorrido convoca e aplica a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça – interpretando-a bem ou mal, não releva para o caso -, pelo que, manifestamente, não se pode concluir ter sido proferido contra a dita jurisprudência fixada. Para que se pudesse extrair tal conclusão seria necessário que o acórdão recorrido tivesse afastado, de forma frontal e expressa, a doutrina estabelecida pelo “assento” e decidido que o assistente tem legitimidade para recorrer, desacompanhado do Ministério Público, relativamente à espécie e medida da pena aplicada, ainda que não tenha nem demonstre um concreto e próprio interesse em agir. Como bem refere o Ministério Público no seu parecer, não foi isso, manifestamente, o que aconteceu: o acórdão recorrido entendeu - e fundamentou de forma clara essa conclusão – que, no caso em apreço, o assistente tinha um interesse próprio e concreto para agir / recorrer quanto à matéria da medida e espécie da pena, tal como exigido pelo assento n.º 8/99. Assim, sem necessidade de outras considerações, não se identificando a imprescindível oposição entre o acórdão recorrido e o dito assento, se conclui pela rejeição do recurso, porquanto não se verifica «decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo tribunal de Justiça», pressuposto material imprescindível para viabilizar o recurso extraordinário pretendido pelo recorrente. * III - DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar o presente recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada. Sem custas. Supremo Tribunal de Justiça, 9 de outubro de 2025 (certifica-se que o acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos seus signatários, nos termos do artigo 94.º, n.ºs 2 e 3 do CPP) Jorge Gonçalves (Relator) Ana Paramés (1.ª Adjunta) José Piedade (2.º Adjunto) |