Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | ANTÓNIO AUGUSTO MANSO | ||
| Descritores: | RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO ACÓRDÃO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA ARGUIÇÃO NULIDADE OMISSÃO DE PRONÚNCIA REGISTO CRIMINAL INCONSTITUCIONALIDADE MEDIDA CONCRETA DA PENA PENA PARCELAR PENA ÚNICA INDEFERIMENTO | ||
| Data do Acordão: | 11/12/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
| Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
| Sumário : | I - Não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos (art.º 432º, 1, b) e art.º 400º, 1, f), do Código de Processo Penal), pena que tanto é a parcelar aplicada aos crimes individualmente considerados, como a pena única conjunta. II - A inadmissibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão proferido, em recurso, pelo tribunal da Relação, nos termos referidos, diz, ainda, respeito a todas as questões processuais ou substanciais que digam respeito a essa decisão. III - Aqui se incluem os vícios da decisão indicados no artigo 410.º do CPP, respetivas nulidades (artigo 379.º e 425.º, n.º 4) e aspetos relacionadas com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, onde se incluem as questões relacionadas com a apreciação da prova – nomeadamente, de questões de proibições ou invalidade de prova –, com a determinação da pena correspondente ao tipo de ilícito realizado pela prática desses factos ou de penas parcelares em caso de concurso de medida não superior a 5 ou 8 anos de prisão, consoante os casos das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, incluindo nesta determinação questões de inconstitucionalidade suscitadas neste âmbito. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Acordam, em conferência, na 3ª secção do Supremo Tribunal de Justiça, 1. Relatório 1.1. Pelo tribunal coletivo do Juízo Central Criminal de Lisboa–J12, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, onde é arguido (além de outros) AA, todos melhor identificados nos autos, a 19.12.2024, foi proferido acórdão que decidiu, além do mais, nos seguintes termos: (…) a. condenar o arguido AA, pela prática, em coautoria material, na forma tentada e em concurso efetivo de 2 (dois) crimes de homicídio, previstos e puníveis pelos artigos 22, 23, 73, 131, todos do Código Penal e artigo 86, n.º 3, da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, na pena de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de prisão, de cada um dos crimes; b. condenar o arguido AA, pela prática, em coautoria material, na forma tentada e em concurso efetivo de 1 (um) crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 86, n.º 1, alínea c) e n.º 2, da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, com referência às alíneas q), az) e ae), do n.º 1, do artigo 2º e alínea a) e alínea l), do n.º 1 e alínea c), do n.º 5, do artigo 3.º, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão; c. condenar o arguido AA, em cúmulo jurídico, na pena única de 10 (dez) anos de prisão. 1.2. Inconformado com o decidido, interpôs recurso o arguido (como o coarguido), para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão de 22.04.2025, decidiu, no que aqui interessa: (…) B-Julgar improcedente o recurso interposto pelos arguidos AA (e coarguido) e (…) do acórdão condenatório, confirmando a decisão recorrida. (…) 1.3. Mais uma vez, inconformados recorreram, os arguidos, para o Supremo Tribunal de Justiça, que por acórdão de 15 de Outubro de 2025, decidiu, -rejeitar parcialmente o recurso, quanto à “escolha” da pena parcelar pela prática do crime de detenção de arma proibida (multa/prisão), quanto ao arguido BB, e, quanto à medida concreta das penas parcelares, “no que concerne ao crime de homicídio agravado na forma tentada, quanto a ambos os arguidos recorrentes”, nos termos sobreditos. -no mais, negar provimento ao recurso dos arguidos AA (e coarguido), confirmando, antes, o acórdão recorrido, condenando em custas os recorrentes. 1.4. Inconformado, vem, agora, o arguido AA “arguir a nulidade do mesmo ao abrigo dos artigos 379º nº 1 al. c) e nº 2, e 425º nº 4 do CPP e art.º 72º nº 2 da LTC pelos fundamentos seguintes: 1. O aliás, douto acórdão recorrido, condenou o ora recorrente na pena de 6 anos e oito meses de prisão para cada um dos dois crimes de tentativa de homicídio na forma tentada e na pena de 2 anos de 6 meses de prisão para o crime de detenção de arma proibida e, em cúmulo jurídico, na pena única de 10 anos de prisão. 2. Tal decisão assentou entre outras considerações no conteúdo dos seus antecedentes criminais (cfr. facto 22 do douto Acórdão.), “22. Do certificado do registo criminal do arguido AA consta: a) a condenação, datada de 31 de maio de 2001, pela prática, em 21 de setembro de 1998, de 1(um) crime de roubo qualificado, previsto e punido nos termos do disposto nos artigos 210, n.ºs 1 e 2, alínea b) e 204, n.º 2, alínea f), ambos do Código Penal, na pena única de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução, mediante regime de prova.”. b) a condenação, datada de 11 de junho de 2003, transitada em julgado em 26 de junho de 2003, pela prática, em 26 de julho de 2000, de 1 (um) crime de roubo, previsto e punido pelo artigo 210, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão. Por realização de cúmulo jurídico entre esta pena e a anterior, veio a ser condenado numa pena única de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão. c) a condenação, datada de 11 de fevereiro de 2013, transitada em julgado em 24 de outubro de 2013, pela prática, em 29 de outubro de 2010, de 1 (um) crime de tráfico de quantidades diminutas e de menor gravidade, na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses, suspensa na sua execução por igual período, mediante regime de prova. Por despacho judicial datado e 21 de setembro de 2016, a pena de prisão suspensa na sua execução foi declarada extinta, nos termos do disposto no artigo 57, do Código Penal.” (sublinhado nosso). 3. Assim, pronunciou-se para a atribuição da medida concreta da pena no douto Acórdão “C. o comportamento anterior e posterior dos arguidos, sendo que o arguido AA tem registo de antecedentes criminais e consequentemente predisposição para a violação de normas jurídico- penais;” 4. Se atentarmos à matéria assente constante do acórdão recorrido que reproduz o seu registo criminal facilmente se constata que ele abarca condenações de 2001, 2003 e 2013. 5. Além disso, nenhuma decisão aplicou pena principal ou medida de segurança ao arguido, ora recorrente superior a 5 anos de prisão. 6. Das condenações anteriores, a última ocorreu 11.02.2013, extinta em 21.09.2016. 7. Assim desde essa última data até 19.12.2024, passaram mais de 5 anos sobre a extinção da pena ou medida de segurança, mais concretamente, 8 anos e cerca de 3 meses, sem que “entretanto” tenha ocorrido nova condenação. 8. Donde, nos termos do artigo 11, nº 1 al. a) e 3 da Lei nº 37/2015 de 05 de maio, deveria ter sido cancelada automaticamente, e de forma irrevogável, todas as condenações ainda constantes no registo criminal. 9. Logo nos termos do artigo 379º nº 1 al. c) do C.P.P. o tribunal deixou de se pronunciar sobre questões que, oficiosamente, que por imperativo legal, nos termos do artigo 410º, nº1 e 3 do CPP deveria ter tomado conhecimento, mesmo que noa suscitado pelo recorrente. 10. Na verdade, o Tribunal recorrido, valorou prova de que não podia conhecer pois estava proibido por lei de o fazer. 11. Ora, o aproveitamento judicial de informação, que por inoperância do sistema, se mantenha no certificado de registo criminal é ilegal, e viola ainda o princípio constitucional da igualdade, pois permite distinguir um arguido de um outro que, nas mesmas condições, tenha esse certificado devidamente “limpo”, o que se verifica in casu. 12. Donde na esteira do Professor Figueiredo Dias (em Direito Penal Português, pág. 612), as informações do Registo Criminal das pessoas funciona como um autêntico meio de prova, resultando daqui não só que os preceitos reguladores do registo se tenham de considerar, neste domínio, normas de processo penal, mas também que todos os casos obrigatórios de cancelamento dos cadastros para fins judiciais passem a constituir verdadeiras proibições de prova – nosso sublinhado -. 13. Como refere ainda P. Pinto de Albuquerque em anotação à norma do art.º 126º do CPP, a validade da prova é uma questão jurídica essencial que deve ser apreciada e decidida pelo juiz e o silêncio sobre esta questão constitui o vício de omissão de pronúncia nos termos do disposto no art.º 379º nº 1 c) primeira parte, do CPP. 14. No mesmo sentido, escreve João Conde Correia que as proibições de (…) valoração de prova podem ser conhecidas oficiosamente, seja em primeira instância, seja em sede de recurso; que o juiz deve agir ex oficio e que as proibições de prova são muitas vezes denominadas nulidades (art. 126º nºs 1 e 3) e estas nulidades não podem considerar-se sanadas (art. 449º nº 1 e)); o juiz sempre teria de conhecer estes casos. 15. Dito isto e o estabelecido no nº 2 do art. 379º do CPP, já que o Acórdão foi fundada em provas nulas é, também ela, nula, haverá que retirar da matéria de facto provada a menção às anteriores condenações do arguido descritas nos factos provados, designadamente o facto 22, e, a jusante, quanto à medida da pena foi valorada na medida em que "C. o comportamento anterior e posterior dos arguidos, sendo que o arguido AA tem registo de antecedentes criminais e consequentemente predisposição para a violação de normas jurídico-penais;”, pelo que deve reformular-se as operações de determinação da pena a aplicar ao arguido. 16. Ao considerar fatores determinantes na opção pela medida da pena, os antecedentes criminais do Arguido, com base no Certificado de Registo Criminal do Arguido, violou não só o artigo 11.º da Lei n.º 37/2005 de 5 de Maio, como também o Princípio da Igualdade consagrado na CRP no artigo 13º. 17. Estas decisões que aplicaram estas penas já deviam estar canceladas, cessando a sua vigência no Registo Criminal. 18. Não tendo sido canceladas por manifesta inoperância dos Serviços de Registo Central. 19. Violação manifesta do Princípio da Igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP. 20. Pois devia o Arguido ser tratado pelo Tribunal a quo como qualquer outro Arguido, isto é, como o Arguido relativamente ao qual se procedeu ao cancelamento das decisões inscritas no Registo Criminal, nos termos do artigo 11º da Lei n.º 37/2005 de 5 de Maio e não ter sido objeto de novas condenações. 21. Não o fazendo o Tribunal a quo violou não só a referida Lei como o Princípio da Igualdade. 22. E nem se diga que, o facto de não se ter suscitado esta questão nas alegações de recurso, obstaculiza a que este Mais Alto Tribunal dela não devesse conhecer, e já não possa conhecer por entender que se encontra esgotado o seu poder jurisdicional, nos termos do artigo 613º, nº1 CPC ex vi artigo 4º do CPP, posto que, nos termos do mesmo artigo nº2 do CPC e dos artigos seguintes maxime artigo 615º, nº1, al. d) do CPC ex vi artigo 125º e 126º, nº1 a 3 do CPP ex vi a contrario do artigo 449º, nº1, al. e) do CPP, conforme supra se alegou, sempre seria de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da sentença a referida nulidade sob pena de se interpretar normativamente as mesmas normas de forma inconstitucional por violação do artigo, pelo menos, 13º da nossa Lei Fundamental, ainda para mais considerando que o coarguido nestes autos pelo facto de não ter antecedentes criminais, teve uma pena inferior ao ora recorrente. 23. Pelo exposto, ressalvado sempre o devido respeito, o Douto Acórdão Recorrido, deve ser declarado nulo e substituído por outro que não tenha em conta o registo criminal, e daí aplicar em consonância a medida concreta da pena, expurgado da nulidade acima aludida, reformulando-se o mesmo, que face à evidência do caso não nos repugna que possa ser por esta Alta Instância, mesmo que possa pôr em causa o direito ao recurso, nos termos do artigo 32º, nº1 da CRP. 24. Violou por isso, o aliás douto acórdão recorrido, os artigos 11, nº 1 al. a) e 3 da Lei nº 37/2015 de 05 de maio, 125º, 126º, 369º nº 1 do CPP, pelo que deve ser considerado nulo nos termos do artigo 379º nº 1 al.c) ex vi artigo 425º, nº4 do CPP. Pelo exposto incorreu assim o douto acórdão recorrido em omissão de pronuncia sobre as questões de conhecimento oficioso e também de normais constitucionais (1º, 13º, 18º e 32º nº 1 da CRP), incorrendo o mesmo na nulidade prevista no artigo 379º nº 1 al. c) ex vi 425º nº 4 do CPP e artº 72 nº 2 da LTC, que se requer a V. Exas seja a mesma conhecida oficiosamente e sanada.” 1.5. Neste Tribunal, notificado o Exmo. Procurador Geral Adjunto para pronuncia sobre todo o alegado pelo arguido requerente, fê-lo nos termos seguintes: “O arguido AA, que viu a sua condenação na pena de 6 anos e oito meses de prisão para cada um dos dois crimes de tentativa de homicídio na forma tentada e na pena de 2 anos de 6 meses de prisão para o crime de detenção de arma proibida e, em cúmulo jurídico, na pena única de 10 anos de prisão, confirmada por acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça do passado dia 15.10.2025, vem arguir a nulidade deste, invocando nesse sentido o disposto nos artºs. ao abrigo dos artigos 379º nº 1 al. c) e nº 2, e 425º nº 4 do CPP e artº 72º nº 2 da LTC por omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso e também de normas constitucionais. Fundamenta o seu pedido no facto de o acórdão ter tido em conta, para a escolha da pena (e diferenciando-a da aplicada ao coarguido), o Certificado de Registo Criminal junto aos autos, CRC que indevidamente continha condenações anteriores que do mesmo já não deveriam constar, por força do disposto no artº 11º, nºs. 1 al. a) e 3 da Lei nº 37/2015 de 05 de maio. Assim – e embora admita que não levantou tal questão nos recursos – entende que este STJ tinha a obrigação de a conhecer e que, não o tendo efetuado, se verifica a invocada nulidade. O Ministério Público não acompanha este entendimento. Na verdade, embora assista razão ao arguido/recorrente quando refere não se ter verificado, pelos serviços competentes, o atempado cumprimento do disposto no artº 11º, nºs. 1 al. a) e 3 da Lei nº 37/2015 de 05 de maio1(1 - As decisões inscritas cessam a sua vigência no registo criminal nos seguintes prazos: a) Decisões que tenham aplicado pena de prisão ou medida de segurança, com ressalva dos prazos de cancelamento previstos na Lei n.º 113/2009, de 17 de setembro, com respeito aos crimes previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal, decorridos 5, 7 ou 10 anos sobre a extinção da pena ou medida de segurança, se a sua duração tiver sido inferior a 5 anos, entre 5 e 8 anos ou superior a 8 anos, respetivamente, e desde que, entretanto, não tenha ocorrido nova condenação por crime de qualquer natureza; […] 3 - Tratando-se de decisões que tenham aplicado pena de prisão suspensa na sua execução os prazos previstos na alínea e) do n.º 1 contam-se, uma vez ocorrida a respetiva extinção, do termo do período da suspensão.), o certo é que essa matéria já não podia ser apreciada em sede do acórdão deste STJ, sendo ainda que este em nada utilizou tais antecedentes criminais na sua decisão. E, consequentemente, inexiste a invocada nulidade por omissão de pronúncia. Na verdade: -Os antecedentes criminais do arguido foram, efetivamente, utilizados para graduar as penas parcelares em sede das decisões de 1ª e de 2ª instâncias: . No acórdão de 19.12.2024, no Juízo Central Criminal de Lisboa – Juiz 12 – ficou referido, em sede de elementos atendidos em desfavor do arguido, aquando da apreciação das penas a aplicar-lhe, os seus antecedentes criminais (ponto C. a fls. 56); . No acórdão de 24.02.2025. do Tribunal da Relação de Lisboa, as penas parcelares aplicadas a este arguido foram mantidas, sendo igualmente referenciados os seus antecedentes criminais. -Mas, aquando da escolha da pena única, resultante do cúmulo jurídico, não foram os antecedentes referenciados e, como tal, tomados em consideração (aliás, nem existiu recurso da decisão de 1ª instância quanto ao cúmulo). Sucede que acerca das penas parcelares formou-se dupla conforme, tal como entendido no acórdão deste STJ ora colocado em crise. Esta dupla conforme implica que a questão já não possa ser agora invocada: a irrecorribilidade da condenação deste arguido pela prática dos crimes gera a impossibilidade de se apreciarem todas as matérias com estes relacionadas, tal como referido no acórdão deste STJ proferido em 07.12.2022, no processo 406/21.1JAPDL.L1.S1 (Relator – Orlando Gonçalves): «Tem sido enfatizado na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que estando este, “por razões de competência, impedido de conhecer do recurso interposto de uma decisão, estará também impedido de conhecer de todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão, tais como os vícios da decisão indicados no artigo 410.º do CPP, respetivas nulidades (artigo 379.º e 425.º, n.º 4) e aspetos relacionadas com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, aqui se incluindo as questões relacionadas com a apreciação da prova – nomeadamente, de respeito pela regra da livre apreciação (artigo 127.º do CPP) e do princípio in dubio pro reo ou de questões de proibições ou invalidade de prova –, com a qualificação jurídica dos factos e com a determinação da pena correspondente ao tipo de ilícito realizado pela prática desses factos ou de penas parcelares em caso de concurso de medida não superior a 5 ou 8 anos de prisão, consoante os casos das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, incluindo nesta determinação a aplicação do regime de atenuação especial da pena previsto no artigo 72.º do Código Penal, bem como questões de inconstitucionalidade suscitadas neste âmbito (cfr., por exemplo, os acórdãos de 11.4.2012, no Proc. 3989/07.5TDLSB.L1.S1, de 25.6.2015, no Proc. 814/12.9JACBR.S1, de 3.6.2015, no Proc. 293/09.8PALGS.E3.S1, e de 6.10.2016, no Proc. 535/13.5JACBR.C1.S1, bem como, quanto à atenuação especial da pena, os acórdãos de 5.12.2012, no Proc. 1213/09.SPBOER.S1, e de 23.6.2016, no Proc. 162/11.1JAGRD.C1.S1)» [acórdão do STJ de 14.03.2018, processo 22/08.3JALRA.E1.S1, LOPES DA MOTA (relator), alojado em www.dgsi.pt , tal como sucederá com os demais acórdãos citados neste parecer sem menção expressa a outra fonte].” Ou seja, quanto às condenações do arguido, ora requerente, pela prática dos crimes de homicídio tentado e de detenção de arma proibida, não pode a invocada nulidade ser já apreciada. Resta, então, a pena aplicada em cúmulo (única questão que, aliás, foi apreciada no acórdão deste STJ de 15.10.2025), em que se terá de verificar se existiu indevida valoração dos antecedentes criminais do arguido. Isso não sucedeu: em parte alguma da decisão quanto a este aspeto se referenciam sequer, muito menos se valoram, os antecedentes criminais do arguido. Assim, não tem fundamento o alegado no pedido de declaração de nulidade e subsequente pedido de redução da pena aplicada. -Daqui que seja parecer do Ministério Público que não se verifica a nulidade invocada pelo requerente/arguido AA.” 1.6. Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, decidiu-se nos termos que seguem. 2. Apreciação 2.1.Vem o arguido AA, inconformado com o acórdão deste Supremo Tribunal de 15.10.2025, proferido no processo supra referenciado, que negando provimento ao recurso interposto do acórdão da Relação, confirmou as condenações do arguido em 6 anos e 8 meses de prisão para cada um dos dois crimes de homicídio na forma tentada e de 2 dois anos e 6 meses para o crime de detenção de arma proibida e em cúmulo jurídico na pena de 10 anos de prisão, arguir a nulidade deste acórdão por omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso e de normas constitucionais, nos termos do disposto nos artigos 379º, n.º 1, alínea c) e n.º 2 e 425º, n.º 4, ambos do CPP e artigo 72º da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82, de 15 de Novembro. Em síntese assenta o seu inconformismo no facto de o acórdão agora em crise, ter considerado para a escolha e medida da pena o Certificado de Registo Criminal – CRC -, junto ao processo, do qual constam condenações anteriores que já não deveriam constar, atento o disposto no art.º 11º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, da Lei 37/2015, de 05 de Maio. Admitindo que não levantou antes esta questão, fá-lo agora nesta sede, por entender que o Supremo Tribunal de Justiça tinha obrigação de conhecer desta questão, e que, não o tendo feito, constitui a nulidade arguida. 2.2.O acórdão agora em crise, no que aqui interessa, rejeitou parcialmente o recurso quanto (…) à medida concreta das penas parcelares, no que concerne aos crimes de homicídio agravado na forma tentada e detenção de arma proibida, quanto a ambos os arguidos recorrentes. Por considerar inadmissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do segmento do acórdão da Relação que confirmou as condenações em que foram condenados os arguidos pelo acórdão da 1ª instância. Aí se pode ler que da conjugação das disposições legais citadas – art.º 432º, 1, b), art.º 400º, 1, e) e f), art.º 434º e art.º 432º, 1, a) e c), todos do CPP -, não é admissível recurso de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos. Pena que tanto é a parcelar aplicada aos crimes individualmente considerados, como a pena única conjunta. Proferidas duas decisões no mesmo sentido verifica-se uma situação do que se designa como dupla conforme quanto a esta condenação, sendo irrecorrível tal decisão. Situações que não suscitam dúvidas quanto à irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça (António Gama, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Almedina, Coimbra, vol. V, p. 71.) A irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão proferido em recurso pelo tribunal da Relação, nos termos referidos, diz, ainda, respeito a todas as questões processuais ou substanciais que digam respeito a essa decisão (António Gama, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Almedina, Coimbra, vol. V, p. 75, e ac. do STJ de 31.01.2024, proferido no processo n.º 2861/22.3JAPRT.P1.S1). Como referido na douta promoção do Exmo. Procurador Geral Adjunto, que se cita, “esta dupla conforme implica que a questão já não possa ser agora invocada: a irrecorribilidade da condenação deste arguido pela prática dos crimes gera a impossibilidade de se apreciarem todas as matérias com estes relacionadas, tal como referido no acórdão deste STJ proferido em 07.12.2022, no processo 406/21.1JAPDL.L1.S1 (Relator – Orlando Gonçalves): «Tem sido enfatizado na jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que estando este, “por razões de competência, impedido de conhecer do recurso interposto de uma decisão, estará também impedido de conhecer de todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão, tais como os vícios da decisão indicados no artigo 410.º do CPP, respetivas nulidades (artigo 379.º e 425.º, n.º 4) e aspetos relacionadas com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, aqui se incluindo as questões relacionadas com a apreciação da prova – nomeadamente, de respeito pela regra da livre apreciação (artigo 127.º do CPP) e do princípio in dubio pro reo ou de questões de proibições ou invalidade de prova –, com a qualificação jurídica dos factos e com a determinação da pena correspondente ao tipo de ilícito realizado pela prática desses factos ou de penas parcelares em caso de concurso de medida não superior a 5 ou 8 anos de prisão, consoante os casos das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, incluindo nesta determinação a aplicação do regime de atenuação especial da pena previsto no artigo 72.º do Código Penal, bem como questões de inconstitucionalidade suscitadas neste âmbito (cfr., por exemplo, os acórdãos de 11.4.2012, no Proc. 3989/07.5TDLSB.L1.S1, de 25.6.2015, no Proc. 814/12.9JACBR.S1, de 3.6.2015, no Proc. 293/09.8PALGS.E3.S1, e de 6.10.2016, no Proc. 535/13.5JACBR.C1.S1, bem como, quanto à atenuação especial da pena, os acórdãos de 5.12.2012, no Proc. 1213/09.SPBOER.S1, e de 23.6.2016, no Proc. 162/11.1JAGRD.C1.S1)» [acórdão do STJ de 14.03.2018, processo 22/08.3JALRA.E1.S1, Lopes da Mota (relator), alojado em www.dgsi.pt , tal como sucederá com os demais acórdãos citados neste parecer sem menção expressa a outra fonte].” Em consequência, quanto às condenações sofridas pelo arguido/requerente pela prática dos crimes de homicídio na forma tentada e de detenção de arma proibida, não pode a arguida nulidade ser conhecida. Existem duas decisões condenatórias conformes, que afastam a recorribilidade da decisão e de todas as questões que lhe digam respeito, com ela relacionadas. Assim, a única questão que o acórdão agora em crise apreciou e decidiu, foi a da pena única conjunta aplicada em cúmulo, dependente das penas parcelares. E, também, neste os antecedentes criminais do arguido requerente não foram considerados nem valorados. Com efeito, percorrido todo o acórdão em momento algum são sequer referenciados e muito menos valorados. Como já não haviam sido considerados no acórdão do Tribunal da Relação, como faz notar o Sr. Procurador Geral Adjunto, dizendo que “aquando da escolha da pena única, resultante do cúmulo jurídico, não foram os antecedentes referenciados e, como tal, tomados em consideração (aliás, nem existiu recurso da decisão de 1ª instância quanto ao cúmulo).” Não tem, pois, fundamento o requerido pedido de declaração de nulidade e ulterior pedido de redução da pena aplicada. Não se verifica, pois, a nulidade arguida. 2.3. Por fim, como referido já, o arguido requerente fundamenta o seu pedido no facto de o acórdão ter tido em conta, para a escolha da pena o Certificado de Registo Criminal junto que continha condenações anteriores que do mesmo já não deveriam constar, diferenciando-a da aplicada ao coarguido. Ora, diferentemente do que defendo o arguido requerente, na diferenciação de penas entre o arguido requerente e o coarguido pesou, sobretudo, o facto de ser aquele que estava em litígio com os ofendidos em consequência da “relação” cessada e ter iniciado a contenda. Como se lê no acórdão da Relação citando o da 1ª instância, “não pode deixar de considerar-se que a iniciativa dos disparos partiu do arguido AA a cuja execução aderiu o arguido BB”. 2.4. E, ainda, que a maior responsabilidade e culpa do arguido requerente é claramente assumida por este, no processo. Com efeito no recurso da decisão da 1ª instância para o Tribunal da Relação, e do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça, é pedida sempre condenação em penas superiores: (i)de 5 anos e 8 meses pela prática do crime de homicídio na forma tentada para o arguido/requerente e de 4 anos e 8 meses para o coarguido, e, (ii)em cúmulo, no recurso para o STJ, é pedida a pena única conjunta de 8 anos e 8 meses para o arguido requerente e de 6 anos e 8 meses para o coarguido. Com um intervalo de 2 dois anos de prisão, a mais, para o arguido/requerente. A final, acabou condenado em 10 anos de prisão e o coarguido em 8 anos e 6 meses de prisão, uma diferença inferior àquela, não se verificando qualquer injustiça relativa. Em suma, não podendo ser apreciada e decidida a invocada nulidade quanto às condenações do arguido requerente, pela prática dos crimes de homicídio tentado e de detenção de arma proibida, e não sendo considerados nem valorados os antecedentes criminais do arguido/requerente, na determinação da pena única conjunta, não se verifica a arguida nulidade do acórdão em crise, por omissão de pronúncia ao abrigo dos artigos 379º nº 1 al. c) e nº 2, e 425º nº 4 do CPP e art.º 72º nº 2 da LTC. Falece, assim, o pedido do requerente que, em consequência vai indeferido. 3 – Decisão. Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça, 3ª secção, em: - indeferir a arguição de nulidade do acórdão deste supremo tribunal de 15.10.2025; -Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça devida em 3 UC`s, (artigo 513.º, n.ºs 1 e 3, do CPP, e artigo 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa). * Supremo Tribunal de Justiça, 12 de Novembro de 2025 António Augusto Manso (Relator) José Luis Lopes da Mota (Adjunto) Antero Luis (Adjunto) |