Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | RAÚL BORGES | ||
Descritores: | OBSTRUÇÃO AO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO FUNDAMENTOS | ||
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Nº do Documento: | SJ200806250013183 | ||
Data do Acordão: | 06/25/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | OUTROS | ||
Decisão: | INDEFERIDO O PEDIDO DE DESAFORAMENTO | ||
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Sumário : | I - O pedido de desaforamento ou remoção de competência (arts. 37.º e 38.º do CPP) é logo acompanhado dos elementos relevantes para a decisão. Não o sendo, como se verifica no caso dos autos, em que não foi sequer junta certidão do estado do processo, falece desde logo, e em concreto, o pressuposto primeiro de o processo se encontrar na fase posterior à designação de dia para julgamento. II - Por outro lado, as alegações do requerente não integram os fundamentos de qualquer das situações previstas nas alíneas do art. 37.º do CPP, correspondendo tão-somente a uma visão e interpretação próprias de conexões de pessoas servindo em diferentes órgãos e serviços da administração da justiça e da administração autárquica, baseadas apenas na circunstância de se verificar coincidência entre nomes e/ou apelidos dessas pessoas – nomes e apelidos, como sejam “Almeida”, “Costa” e “Mariano”, que são comuns a milhares de portugueses –, as quais, em conjugação de esforços, estariam na disposição de lhe complicar a vida. III - Como se refere no acórdão do STJ de 26-01-2005 (Proc. n.º 4325/04 - 3.ª), o art. 37.º do CPP contém referências estritas e inteiramente ligadas a motivos ambientais e extraprocessuais, sérios e graves, que condicionem ou impeçam o exercício da jurisdição – questões de ordem pública ou de intolerável pressão externa que não permitam o exercício sereno da jurisdição, que nada têm a ver com o quadro de interligações pessoais e de imputações vagas e difusas que o arguido apresenta. IV - Se o requerente considera estar perante uma situação em que está em causa a imparcialidade do juiz, do magistrado do MP ou de funcionários, pretendendo contestá-la, a via correcta será a de requerer a recusa nos termos do art. 43.º do CPP, não devendo escolher a via do desaforamento, pois as causas de remoção de competência fixadas nas diversas alíneas do art. 37.º do CPP são taxativas, nelas não cabendo a parcialidade do juiz. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n.º 1318/08 - 3ª (Pedido de desaforamento) AA, arguido no processo 360/05.7TASXL, veio ao abrigo do artigo 37º do CPP, em requerimento por si elaborado e subscrito, requerer a atribuição de competência a outro Tribunal, com repetição total do julgamento à excepção da audição às testemunhas abonatórias, considerando-se o seu depoimento gravado. Após expor uma série de referências e conexões entre magistrados, oficiais e escrivães do Tribunal do Seixal, o Presidente da Câmara e vereadores do Município do Seixal e o Comandante da GNR de Paio Pires (para quem a mesma família remete diligências astuciosas contra si), a partir do facto de essas pessoas terem um nome, sobrenome ou apelido comum, refere-se a uma acta de debate instrutório do processo 509/00, como documento falsificado, alude à insolvência do Centro de Invenção do Seixal, determinada por violação de correspondência sua por parte da Câmara Municipal do Seixal, invocando ter sido vítima de ameaças e de simulação de doença por envenenamento, a que escapou por duas vezes por estar preparado, porque alertado. E depois de assim expor, remata: “Pelo exposto, não há exercício da jurisdição quer por condições idóneas externas quer internas ao próprio tribunal e relacionadas com uma subversão do Estado de Direito, em suma porque em todos os seus sectores do tribunal há pessoas da mesma família dos denunciantes e por isso nenhuma regra essencial do CPP é cumprida à excepção das que são de interesse da acusação e das que são falsamente interpretadas, pessoas aquelas que também controlam as esquadras de polícia através de afinidade congénita ou corrupção institucional”. “Para além disso, os advogados se reúnem todos os anos com o principal assistente ou interessado nestes processos e nas instalações deste”. “Os defensores em nada assistem, fingem assistir, e alguns têm medo de ser perseguidos e ameaçados” Finalmente, conclui: “Há uma subversão do Estado de Direito no Seixal, território com leis próprias, criadas e distribuídas para cada caso (fora das leis nacionais). Nenhum dos processos teve o julgamento adequado e imparcial”. Juntou documentos dando a saber ter feito pedido idêntico no âmbito de outros dois processos, indicando o nº do processo neste STJ. Por despacho de fls. 23 foi ordenada a junção de cópia do requerimento inicial do processo pendente neste STJ. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta em parecer de fls. 30 a 32, considera que não poderá /deverá ser apreciado o requerimento apresentado pelo próprio arguido livremente, porque nos termos do nº 1 do artigo 98º do CPP só poderá ser requerido no(s) próprio(s) processo(s) para poder ser decidido nas secções criminais do STJ. Colhidos os vistos, o processo foi à conferência, cumprindo apreciar e decidir. Definindo os pressupostos e efeito do desaforamento ou remoção de competência, estabelece o artigo 37º do CPP: Quando, em qualquer estado do processo posterior ao despacho que designar dia para a audiência, em virtude de graves situações locais idóneas a perturbar o desenvolvimento do processo: a) O exercício da jurisdição pelo tribunal competente se revelar impedido ou gravemente dificultado; b) For de recear daquele exercício grave perigo para a segurança ou a tranquilidade públicas, ou c) A liberdade de determinação dos participantes no processo se encontrar gravemente comprometida; a competência é atribuída a outro tribunal da mesma espécie e hierarquia onde a obstrução previsivelmente se não verifique e que se encontre o mais próximo possível do obstruído. Apreciando. Os fundamentos invocados não são de todo integradores de qualquer das situações previstas nas alíneas supra citadas; o exercício da jurisdição pelo tribunal não se revela impedido ou gravemente dificultado, não está latente qualquer grave perigo para a segurança ou tranquilidade públicas, como não se descortina grave comprometimento da liberdade de determinação dos participantes no processo. As alegações do requerente correspondem a uma visão sua e interpretação própria de conexões de pessoas servindo em diferentes órgãos e serviços da administração da justiça e da administração autárquica, baseadas apenas na circunstância de se verificar coincidência entre nomes e/ou apelidos e essas pessoas unidas pelo facto de comungarem de nomes e apelidos que, singular ou combinados, estão presentes na composição do nome em milhares de portugueses, como os apontados “Almeida”, “Costa”, “Mariano”, em conjunção e conjugação de esforços estariam na disposição de complicar a vida ao requerente. Como se refere no acórdão do STJ, de 26-01-2005, processo 4325/04-3ª, o artigo 37º do CPP contém referências estritas e inteiramente ligadas a motivos ambientais e extraprocessuais, sérios e graves, que condicionem ou impeçam o exercício da jurisdição - questões de ordem pública ou de intolerável pressão externa que não permita o exercício sereno da jurisdição. Ora, a narrativa do requerente traça os contornos de um quadro de interligações pessoais, que nada tem a ver com integração ou sequer aproximação aos pressupostos da lei, reportando-se a imputações vagas e difusas. Por outro lado, se o requerente considera estar-se perante uma situação em que está em causa a imparcialidade do juiz, magistrado do MP ou de funcionários, pretendendo contestá-la, a via correcta será a de requerer a recusa nos termos do artigo 43º do CPP, não devendo escolher a via do desaforamento, pois que as causas de remoção de competência fixadas nas diversas alíneas do artigo 37º do CPP são taxativas, nelas não cabendo a imparcialidade do juiz, como expendeu o acórdão de 04-06-98, in CJSTJ 1998, tomo 2, 210. O pedido é, assim, manifestamente improcedente. Pelo exposto, acordam neste Supremo Tribunal de Justiça em indeferir o pedido de desaforamento formulado pelo cidadão AA, por manifestamente improcedente. Custas pelo requerente, com taxa de justiça de 3 UC. Consigna-se que foi observado o disposto no artigo 94º, nº 2 do CPP. Lisboa, 25 de Junho de 2008 Raúl Borges (Relator) Fernanado Fróis |