Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
878/02.3TASTB.S1
Nº Convencional: 5ª SECÇÃO
Relator: SOUTO DE MOURA
Descritores: OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA GRAVE
OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA QUALIFICADA
AGRAVAÇÃO PELO RESULTADO
MORTE
NEGLIGÊNCIA
RECUSA DE ASSISTÊNCIA MÉDICA
CAUSALIDADE ADEQUADA
NEXO DE CAUSALIDADE
REGRAS DA EXPERIÊNCIA COMUM
Data do Acordão: 10/13/2011
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Sumário : I - Nos termos do art. 144.º, al. d), do CP, a agravação do crime de ofensa à integridade física pode derivar do facto de a ofensa provocar perigo para a vida da vítima.

II - Tendo-se dado por provado que o arguido representou como possível resultado da sua conduta atingir órgãos vitais da vítima, colocando em perigo a respectiva vida, mas sem se conformar com esse resultado, não deve ter lugar a agravação do art. 144.º, al. d), do CP.

III - Na verdade, o dolo de perigo exigido por esta alínea não se compadece com a mera negligência consciente, em relação ao resultado «pôr a vida em perigo», o que resulta do modo como o tipo legal está estruturado e do art. 13.º do CP, nos termos do qual a punição a título de negligência depende da sua específica previsão no tipo legal.

IV - Decorre da factualidade provada, que o arguido desferiu com muita força vários pontapés no abdómen e nas pernas do ofendido, e com este «já prostrado no solo – rogando que lhe abrissem a porta – e incapaz de reagir, (…) continuou a desferir-lhe, com a mesma força, pontapés no abdómen e nas pernas», o que torna o comportamento do arguido especialmente censurável, por evidenciar acto de crueldade, susceptível de o fazer incorrer na agravação da al. a) do n.º 1 do art. 145.º do CP.

V - Ficou provado que o ofendido «recusou, poucos minutos após entrar na sua casa, ser assistido por uma equipa do INEM que entretanto fora chamada ao local e ali compareceu», sendo certo que perante a atitude do ofendido aquela equipa se foi embora.

VI - A conduta do arguido deve ser agravada pelo resultado morte, nos termos do art. 147.º, n.º 1, do CP, já que, pese embora a causalidade adequada entre a acção do agente e o resultado morte ter que se estender a todo o processo causal, a recusa do ofendido não surge no caso com virtualidade para interromper esse nexo causal.

VII -É que, nada nos autos inculca que a vítima tivesse recusado ser assistida por motivos suicidários ou masoquistas, tudo apontando para que o tivesse feito, segundo as regras da experiência da vida, porque não se apercebeu da gravidade da situação, e portanto não teve plena consciência do risco que sofria.

VIII - No caso, a possível interrupção do nexo causal exigiria uma conduta gravemente inadequada da vítima, que ocorreria, por exemplo, caso ela estivesse consciente do risco que sofria, mas não se compadece, ao invés, com uma atitude do ofendido que se pode considerar aceitável, que se não apresentou, no condicionalismo, como totalmente inesperada e insólita.
Decisão Texto Integral:

AA, nascido a … em Moura, onde teve residência na R. …, nº …, divorciado, trabalhador da construção civil, foi julgado a 18/4/2007 conjuntamente com outro co-arguido, em processo comum, e no tribunal colectivo da Vara Mista de Setúbal, tendo sido absolvido da prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 132º nº1, 144º alínea d), 145º nº1 alínea b) e 146º nº 1 e 2, com referência ao art. 132º nº 2 alínea d), todos do C P.

Interposto recurso pelo Mº Pº, veio o S T J a considerar, por acórdão de 10/1/2008, entre o mais, que aquela decisão enfermava do vício do artº 410º nº 2 al. a) do C P P, “insuficiência para a decisão para a matéria de facto provada”, e reenviou o processo à primeira instância, para apuramento de um conjunto de aspectos da matéria de facto que enumerou, devendo proceder-se a julgamento nos termos do art. 426º-A do C P P.

Por acórdão de 11/3/2011 da Vara de Competência Mista de Setúbal, na sequência do novo julgamento que teve lugar, o arguido AA foi condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punido pelas disposições conjugadas dos arts. 132º nº 1, 144º alínea d), 145º nº 1 alínea b), com referência ao art. 132º nº 2 alínea d), todos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão.

Recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa da medida da pena, pretendendo que a mesma se fixasse em três anos de prisão suspensa na sua execução, tendo sido porém entendido que o tribunal competente para conhecer do presente recurso era o S T J, pelo que os autos foram remetidos a este Supremo Tribunal.

A  -  FACTUALIDADE APURADA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA

Foram aos seguintes, os factos apurados no primeiro julgamento, que teve lugar na Vara Mista de Setúbal:

“1) A hora não concretamente apurada, na noite de 17 para 18 de Maio de 2002, os arguidos AA e BB encontravam-se no Snack-Bar “A....”, sito na Rua …, em Setúbal;

2) Nesse estabelecimento, para além de outros clientes, encontravam-se CC acompanhado de outro indivíduo de nacionalidade brasileira;

3) A dada altura, por razões não apuradas, verificou-se uma contenda, com agressões físicas entre vários dos clientes que se encontravam naquele estabelecimento;

4) Nessa sequência o arguido AA colocou as mãos no peito de CC e empurrou-o;

5) Entretanto, CC saiu do bar e dirigiu-se à sua residência, que dista poucos metros do local, sita na Rua …;

6) No momento em que foram separados, CC encontrava-se no chão, de joelhos, agarrado à cintura do arguido AA, com as costas encostadas a uma viatura automóvel estacionada a poucos metros da porta da sua residência;

7) CC deslocou-se de seguida para a sua residência, sita na Rua …, cerca das 00H52 do dia 18 de Maio de 2002;

8) CC foi encontrado já cadáver, na sua residência, na manhã do dia 19 de Maio de 2002, apresentando o seu corpo as seguintes lesões: equimose de cor roxa ocupando a pálpebra superior do olho esquerdo; ferida contusa situada no supracílio esquerdo medindo 4 cm; duas escoriações situadas na face anterior do joelho esquerdo medindo, cada uma delas com 1 cm; laceração do mesentério, infiltração hemorrágica do mesentério; hemoperitoneu que originou hemorragia interna com derramamento de 3000 cc de sangue para a cavidade peritoneal;

peritonite; edema cerebral acentuado;

9) O arguido AA agiu livre, voluntária e conscientemente, com o propósito de, com as actuações descritas, molestar fisicamente CC;

10) Sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei;

Mais se provou relativamente à personalidade e condições sociais/pessoais dos arguidos:

11) Arguido AA

a) Em 29.05.2003 foi condenado na pena de oitenta dias de multa à taxa diária de três euros, no âmbito do proc.° n° 134/02.7PTSTB-2° Juízo Criminal do Tribunal da Comarca de Setúbal, pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, praticados em 28.02.2002;

b) Em 14.06.2005 foi condenado na pena de 9 meses de prisão, suspensa por dois anos, no âmbito do proc.° n° 1516/03 .2TASTB-Vara de Competência Mista do Tribunal da Comarca de Setúbal, pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art. 143° do Código Penal, praticado em 31.10.2003;

c) Completou o 5° ano de escolaridade, tendo tirado um curso de formação profissional em construção civil no C.E.F.P de Évora;

d) Trabalha na construção civil, como carpinteiro de cofragens, auferindo mensalmente cerca de € 650;

e) Vive com a mulher e a filha de ambos, de 2 anos, em casa arrendada.

12) Arguido BB (…)

O S T J procedeu ao reenvio dos autos para novo julgamento para que se apurasse os seguintes pontos da matéria de facto:

“ 1. Se entre as 00h52m do dia 18 de Maio de 2002 (altura em que entrou na sua residência) e até ser encontrado cadáver, a vítima saiu de casa ou foi visitado por alguém;

2. Se as lesões encontradas na vítima podem ter sido causadas por agressões ocorridas pouco antes das 00h52m do dia 18 de Maio de 2002, ou se tais lesões foram provocadas necessariamente por acção necessariamente mais próxima da hora da morte, ou se podem ter sido causadas por acidente doméstico sem interferência de outrem;

3. Se entre as agressões do arguido AA à vítima (referidas no ponto 6 dos factos provados) e as leões descritas no ponto 9 há uma relação de causa e efeito;

4. Se o arguido AA representou como possível que em resultado da conduta descrita no ponto 6 poderia atingir órgãos vitais e, desse modo, colocar em perigo a vida de CC, e que actuou sem se conformar com esse resultado;

5. Na hipótese de os pontos 3. e 4. não serem provados, se entre as agressões da contenda que envolveu vários clientes do estabelecimento (facto nº 3) e as leões descritas no facto nº 9. há uma relação de causa e efeito;

6. E, da mesma forma referida em 5., se o arguido AA, ao participar na contenda referida nos factos com os números 4 a 6, representou que dela poderia resultar perigo para a vida ou integridade física substancial de qualquer um dos participantes e quis essa perigosidade, ou ter-se pelo menos conformado com ela”.

Em resultado da repetição parcial do julgamento restrito a estas matérias,  resultou provado que:

“13) Após o descrito em 5), o arguido AA encaminhou-se na direcção de CC, logrando alcançá-lo já no exterior do estabelecimento, tendo-o agarrado e lhe desferido, com muita força, vários pontapés no abdómen e nas pernas;

14) Com CC já prostrado no solo – rogando que lhe abrissem a porta – e incapaz de reagir, o arguido AA continuou a desferiu-lhe, com a mesma força, pontapés no abdómen e nas pernas;

15) As lesões abdominais referidas em 8) resultaram das agressões perpetradas pelo arguido AA, no exterior do estabelecimento, a CC;

16) Representando o arguido AA como possível resultado das suas condutas que poderia atingir órgãos vitais e, desse modo, colocar em perigo a vida de CC, como sucedeu, actuou, no entanto, sem se conformar com esse resultado;

17) O arguido AA agiu livre, voluntária e conscientemente, com o propósito de provocar ferimentos nas apontadas zonas do corpo de CC, objectivo que logrou alcançar;

18) CC recusou, poucos minutos após entrar na sua casa, ser assistido por uma equipa do INEM que entretanto fora chamada ao local e ali compareceu;

19) As lesões abdominais referidas em 8) foram causa directa e necessária da morte de CC, ocorrida no dia 18 ou 19 de Maio de 2002;

20) O arguido AA foi condenado, por sentença de 22-04-2005 no âmbito do processo nº 301/04.9PBSTB, pela prática de um crime de tráfico de quantidades diminutas e de menor gravidade, praticado 22-03-2004, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos; por sentença de 13-02-2009, no âmbito do processo nº 214/07.2TAMRA, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, praticado Maio de 2008, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos.

*

2.2 - FACTOS NÃO PROVADOS

1. A hora não concretamente apurada, mas situada entre as 23 horas e 30 minutos do dia 7 de Maio de 2002 e a 1 hora e 30 minutos do dia 18 de Maio de 2002, DD acompanhou o arguido AA, seu ex-companheiro, quando este se deslocou ao Snack-Bar “A....”, sito na Rua …;

2. O arguido AA calçava, então, botas de biqueira de aço;

3. Já no interior do estabelecimento, o arguido AA e DD começaram a dançar ao som da música que tocava;

4. A dada altura, EE dirigiu-se ao arguido AA e perguntou-lhe se podia dançar com DD, ao que este respondeu negativamente;

5. Após ter observado tal situação, o arguido BB aproximou-se de EE, indagando-lhe se não tinha vergonha de ter convidado a mulher de outrem para dançar, seguida de empurrões mútuos;

6. Nessa altura, o arguido AA interveio, agarrando os cabelos de EE;

7. Seguidamente, arremessou-lhe um banco de metal que ali se encontrava, atingindo-o nas costas e projectando-o, desse modo, na direcção de uma máquina de tabaco, onde o mesmo acabou por embater, caindo no solo;

8. Continuando o arguido AA a desferir pontapés e socos no corpo de EE;

9. Ao mesmo tempo que proferia as seguintes expressões dirigidas ao EE: “Em mato-te, filho da puta. Não te metes com o meu amigo black”

10. Por sua vez, ao verificar que CC se aproximava em auxílio do EE, o arguido BB pegou numa garrafa e vidro que ali se encontrava e, com tal objecto, vibrou um golpe na face de CC, atingindo-o na pálpebra superior do olho esquerdo;

11. O arguido BB colocou as mãos no peito do CC e empurrou-o, fazendo-o cair no solo;

12. Logo de seguida, e de súbito, o arguido BB desferiu um pontapé no abdómen e vários outros nas pernas de CC;

13. Seguidamente, o arguido pegou na cabeça de CC e embateu-a, várias vezes, na ombreira (em pedra) da porta, não obstante os insistentes apelos dos populares que acorreram ao local e que, aos gritos, pediam ao arguido que parasse;

14. O arguido AA — que se havia libertado de EE –, tenha agarrado CC pelo pescoço e provocado o desequilíbrio deste com consequente embate da cabeça num degrau em pedra ali existente;

15. O arguido AA só não prosseguiu a sua conduta porque, entretanto, foi agarrado por alguns dos aludidos populares;

16. Não obstante, o arguido virou-se, ainda, para os presentes e disse: “Pronto. Não bato em mais ninguém”, após o que regressou ao interior do estabelecimento, onde bebeu uma cerveja e se gabou do comportamento que acabara de adoptar;

17. O arguido AA foi praticante de artes marciais e prestou serviço militar nos Comandos;

18. O arguido BB prestou serviço militar em Angola, igualmente nos Comandos;

19. Ambos os arguidos receberam, assim, formação específica na luta corpo a corpo, conhecendo as tácticas para dominar um qualquer oponente, nomeadamente aplicando golpes – que podem revelar-se letais – em zonas particularmente vulneráveis do corpo humano;

20. O arguido BB quis molestar fisicamente CC, bem como lhe provocar ferimentos nas apontadas zonas do corpo, objectivos que logrou alcançar;

No seguimento do decidido pelo Supremo Tribunal de Justiça, e em resultado da repetição do julgamento (restrito às matérias definidas por aquele Superior Tribunal) mais resultou não provado que:

21. Entre as 00h52m do dia 18 de Maio de 2002 (altura em que entrou na sua residência) e até ser encontrado cadáver, tenha a vítima saído de casa ou sido visitada por alguém para além de uma equipa do INEM referida em 18) dos factos provados;

22. As lesões referidas em 8) – com excepção das abdominais – tenham sido provocadas pelos arguidos”.

B  -  RECURSO

As conclusões da motivação de recurso do recorrente foram:

“1- Pretende o aqui recorrente ver reapreciada a medida concreta da pena imposta pelo Tribunal recorrido, por exagerada e desproporcional, devendo a mesma ser suspensa na sua execução.

2- Perante a repetição parcial do julgamento não foram dadas como provadas todas as matérias definidas pelo Supremo Tribunal de Justiça. Sendo certo que os depoimentos das testemunhas inquiridas, nomeadamente a perita médica, são inconclusivos e meras suposições.

3- Tendo o Tribunal recorrido entendido não poder ser imputado ao aqui recorrente a agravação pelo resultado. Condenando o aqui recorrente pelo crime de ofensas à integridade física qualificado.

4   - Encontrando-se assim violados os princípios da necessidade proporcionalidade, adequação e subsidariedade, princípios esses, orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável.

5- E nesta conformidade deve ser o ora recorrente condenado em pena não institucional, situada no limite mínimo, atenta a moldura penal, o seja, três anos, suspensa na sua execução, por igual período, por realizar eficazmente o carácter preventivo e socialização do aqui recorrente, em conformidade com o art. 50° do CP.

6- A conferência da validade formal com a da lógica interna da decisão não é suficiente para sustentar o Douto Acórdão, em que lhe falta este apontado elemento decisivo, contribuindo para erro de fundamentação.

7- O tribunal recorrido retirou deduções, suposições, conclusões, mas em processo penal temos que nos ater aos factos ilícitos cometidos pelo aqui arguido.”

O Mº Pº respondeu concluindo:

“1 – Recorre-se para o STJ de acórdãos finais proferidos pelo tribunal colectivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame de matéria de direito (art.º 423º, nº 1, al. c), do CPP).

2 – O presente recurso deve ser julgado pelo STJ, por ser o competente para dele conhecer, pois versa exclusivamente matéria de direito e ao arguido foi aplicada a pena única de 6 anos de prisão.

3 – Na apreciação da prova, salvo quando a lei dispuser diferentemente, o julgador poderá apelar às regras da experiência e à sua livre convicção.

4 – O tribunal recorrido indicou e procedeu ao exame crítico das provas que serviram para formar a sua convicção, aduziu as razões de ciência das testemunhas e bem assim, os elementos com base nos quais considerou relevantes os seus depoimentos, não resultando da fundamentação da decisão que a prova tenha sido apreciada de forma arbitrária e muito menos que assente em conclusões, deduções ou meras suposições.

5 – Tem sido entendimento jurisprudencial que no recurso de revista pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devam considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como a forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência, ou a desproporção da quantificação efectuada (neste sentido vejam-se, entre outros, Acs. do STJ de 23-09-2010 – Proc. 1687/04.0GDLLE.E1.S1, 3ª Secção, relator PIRES DA GRAÇA e de 15-09-2010 – Proc. 148/08.3ECLSB.S1, 3ª Secção, relator RAUL BORGES).

6 – Com a alteração ao Código Penal introduzida pelo DL 48/95, de 15.03, entrada em vigor em 01-10-95, a pena passou a servir finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial, assumindo a culpa um papel meramente limitador da pena, pois em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (vd. art.º 40º do CP).

7 – Estabeleceram-se como princípios orientadores que devem presidir à determinação da pena aplicável à violação de um bem jurídico fundamental os princípios da necessidade, da proporcionalidade e da adequação.

8 – A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo, em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se, quanto possível, as necessidades da prevenção especial positiva ou de socialização.

9 – Nesta dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e critérios do art.º 71º do CP devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores), como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente.

10 – Quando o julgador aplicar pena de prisão em medida não superior a 5 anos suspende a execução da pena se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (art.º 50º do CPP).

11 – Tendo em consideração no caso concreto:

- que o crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 143º, nº 1, 144º, al. d), 145º, nº 1, al. b) e nº 2 e 132º, nº 2, al. d), do CP na redacção introduzida pela Lei 59/2007, de 4.09 (aplicável no caso por ser o regime concretamente mais favorável ao agente), é punível com pena de prisão de 3 a 12 anos;

- o dolo do arguido, que reveste a modalidade de dolo directo, de intensidade elevada;

- o elevado grau de ilicitude dos factos, atendendo designadamente ao modo como o arguido actuou e à elevada gravidade das consequências resultantes da sua acção;

- a personalidade do arguido revelada na forma como actuou e consequentemente, no menosprezo pelo bem jurídico tutelado;

- o comportamento anterior e posterior à data dos factos:

a) antecedentes criminais: em 29.05.2003 o arguido foi condenado na pena de 80 dias de multa à taxa diária de € 3, pela prática em 28.02.2002 de um crime de condução sem habilitação legal; em 14.06.2005 foi condenado na pena de 9 meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, pela prática em 31.10.2003 de um crime de ofensa à integridade física simples; por sentença de 22-04-2005, foi condenado pela prática em 22-03-2004 de um crime de tráfico de quantidades diminutas e de menor gravidade, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos; por sentença de 13-02-2009, foi condenado pela prática em Maio de 2008 de um crime de tráfico de estupefacientes, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos;

b) ausência de reparação ou ressarcimento, de qualquer natureza, das lesões causadas;

- a idade do arguido, 30 anos na data da prática dos factos;

- que o arguido completou o 5º ano de escolaridade, tendo tirado um curso de formação profissional em construção civil no CEFP de Évora;

- que trabalha na construção civil como carpinteiro de cofragens, auferindo mensalmente cerca de € 650;

- que vive com a mulher e a filha de ambos, menor de idade;

- que as necessidades de prevenção geral positiva ou de integração (na afirmação, reforço e reposição da validade das normas violadas) são muito elevadas, considerando a natureza do bem jurídico tutelado no tipo legal em causa, a importância do crime em questão para a ordem jurídica violada e a extensão da lesão causada pela conduta do agente aferida pela elevada gravidade dos factos e das suas consequências para a vítima (as exigências de prevenção geral são muito elevadas numa sociedade em que se assiste a um constante aumento da criminalidade, que conduz necessariamente a um incremento da insegurança que se verifica actualmente, e pelo elevado alarme social que este tipo de actuações criminosas suscita na comunidade, reclamando e justificando resposta punitiva firme);

- que procedem fortes exigências a nível da prevenção especial, com vista, desde logo, à dissuasão da reincidência, pois, além de já registar um antecedente criminal por factos da mesma natureza e de o seu passado criminal ser evidenciador de que tem mantido um comportamento não conforme com o direito, não houve da parte do arguido, em audiência, qualquer assumpção de responsabilidade e demonstração de arrependimento, revelando desse modo ausência ou diminuta capacidade auto-crítica; 

- o efeito previsível da pena no comportamento futuro do arguido;

- a forte intensidade da culpa do arguido,

entende-se como justa, adequada e proporcional a pena concreta aplicada de 6 anos de prisão, insusceptível de ser suspensa na sua execução.

12 – Na determinação da pena concreta foram considerados os factores relevantes e foi feita uma correcta aplicação dos princípios gerais da determinação da medida da pena (cf. art.ºs 40º e 71º do CP), mostrando-se a pena concreta aplicada justa, adequada e proporcional.

13 – É assim de manter a pena concreta aplicada, não se justificando uma intervenção correctiva do tribunal superior, já que a mesma é adequada, pois não afronta os princípios da necessidade, proibição do excesso ou proporcionalidade das penas – art.º 18º, nº 2, da CRP –, nem as regras da experiência comum, antes é equilibrada e proporcional à defesa do ordenamento jurídico, e não ultrapassa a medida da culpa do recorrente.”

No S T J o Mº Pº emitiu parecer em que disse, entre o mais:

“(…) Descendo a esta luz ao caso dos autos, e tendo em conta a factualidade dada como provada, vejamos então quais são os factores relevantes, da ilicitude e da culpa, a ponderar:

Para a gravidade da ilicitude há que atender (i)ao tipo e modalidade de ofensa escolhida pelo arguido [pontapés], (ii)à zona do corpo escolhida e atingida [no abdómen, que contém órgãos vitais, e nas pernas], (iii)à situação em que a vítima se encontrava [prostrado no solo e demonstrando manifesta debilidade, fragilidade e incapacidade de reacção], e por último quer (iv)à quantidade e intensidade das ofensas [um número indeterminado de pontapés, desferidos com muita força], quer (v)à elevadíssima gravidade das consequências da acção [a morte da vítima].

Por sua vez, a culpa do arguido, uma vez que se trata de uma culpa concreta, ou seja a culpa pelo facto de ter agido como agiu, reflecte a gravidade da ilicitude, que é intensa, posto que só ligeiramente atenuada pelo facto de as agressões terem sido produzidas em ambiente consabidamente propício à violência e, no caso concreto, na sequência de uma situação de conflito mais ou menos alargado, com vários focos de tensão.

Por outro lado, e nesta parte ao contrário do que parece decorrer da fundamentação da decisão, não tinha o arguido, à data da prática do facto, quaisquer antecedentes criminais, se bem que posteriormente tenha vindo a ser condenado por diversos crimes e numa pirâmide de gravidade crescente [(i)condução sem habilitação legal, (ii)ofensa à integridade física simples, (iii)tráfico de menor gravidade e (iv)tráfico de estupefacientes], o que justifica, com o decidido, a imposição de uma pena que acautele suficientemente as finalidades de prevenção especial.

Por fim o tempo entretanto decorrido [cerca de 9 anos], se bem que não acompanhado de todo, como vimos, de bom comportamento por parte do arguido, não poderá ser completamente descurado.

Tudo ponderado, e tendo em conta a moldura abstracta da pena correspondente ao crime cometido - prisão de 3 a 12 anos8 -, afigura-se-nos que a medida concreta da pena não poderia deixar de ser graduada entre os 5 e os 6 anos de prisão, medida essa sempre incompatível, ainda que porventura venha a entender-se ser de reduzir para os 5 anos, com a impetrada, mas injustificável, substituição pela suspensão da execução, nos termos do art. 50.9, n.0- 1 do CP. Por inquestionáveis exigências quer de prevenção geral - decorrentes da necessidade de contenção da violência, particularmente nocturna, sentida pela sociedade portuguesa -; quer de prevenção especial - após a prática dos factos, e em crescendo de gravidade, o arguido já cometeu e foi condenado por quatro vezes, uma das quais também por crime contra a integridade física - não cremos que a aplicação de uma pena substitutiva da prisão possa ainda realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”

Teve lugar a declaração de impedimento dos Exmºs Conselheiros que haviam subscrito o acórdão do S T J de 10/1/2008, pelo que foram apresentados ao actual relator.

Colhidos os vistos os autos foram presentes a conferência.

C  -  APRECIAÇÃO

1.  O recorrente é muito claro ao determinar como objecto do seu recurso a medida da pena que pretende ver reduzida e suspensa na sua execução (conclusão 1ª, e depois 4ª e 5ª). Acrescenta também uma crítica à maneira como o acórdão recorrido chegou à factualidade que considerou provada, sem com isso pretender, porém, recorrer de facto.

Aliás, e como é sabido, o S T J só conhece de direito, sem prejuízo do disposto nos nºs 2 e 3 do art. 410º do C P P. Ora, se não está vedado a esta instância detectar, oficiosamente, vícios da matéria de facto que impeçam uma subsunção jurídica fundada, o que é certo é que tais vícios não se verificam, obviamente tanto quanto possam resultar da decisão recorrida.

Para além de se não ver qualquer contradição na fundamentação da decisão, ou entre esta e a decisão, e de não estarmos perante qualquer erro notório na apreciação da prova, a matéria de facto que foi dada por provada é suficiente para a decisão, ao contrário do que o recorrente parece inculcar na conclusão 6ª da sua motivação, ao falar de “erro de fundamentação”.  Por isso diremos o seguinte:

A suficiência dos factos para a decisão resulta, sem qualquer dúvida, da prova produzida no segundo julgamento da 1ª instância e dos factos que a partir dela se deram por provados. Conforme se pode ver de fls. 905 a 910 dos autos, o acórdão recorrido partiu da factualidade já fixada pelo S T J (como tal referida nos pontos 1 a 13 dos factos provados e 1 a 20 dos não provados) que aceitou a convicção formada pelos subscritores do 1º acórdão da Vara Mista de Setúbal. Consta de fls. 575 e ss. dos autos, e para lá se remeteu.

Depois, o acórdão recorrido revela que se deu cumprimento do decidido pelo S T J em matéria de complementação da prova.

Na verdade, “foi ouvida – conforme expressamente determinado – a perita médica e a maioria das testemunhas já anteriormente inquiridas (uma vez que para se averiguar a existência de uma eventual relação de causa e efeito entre as agressões do arguido AA e as lesões sofridas pela vítima, se entendeu essencial concretizar as agressões perpetradas), bem como algumas que o nunca tinham sido.

A matéria agora adicionalmente assente em resultado da repetição – parcial – do julgamento resultou, fundamentalmente, da conjugação das declarações prestadas pela perita médica – Dr.ª FF – e precisamente das testemunhas nunca antes inquiridas GG e DD.”

Retira-se da explanação ponderosa feita no acórdão recorrido que o mesmo formou a sua convicção, essencialmente, a partir das declarações da referida perita médica Dr.ª FF, nos termos das quais terá havido uma ligação sequencial entre as lesões abdominais sofridas pela vítima (provocadas por um objecto contundente como por exemplo um pé), hemorragias internas sobrevindas e a morte.

Teve ainda em apreço os testemunhos de GG e DD, que assistiram às agressões perpetradas pelo arguido, que classificaram de violentas. “E, em virtude de tal “violência”, nenhuma surpresa demonstraram pelo trágico desfecho. Na realidade, dificilmente poderiam os seus relatos ser mais esclarecedores e convincentes relativamente à violência das agressões do arguido AA desferidas no abdómen de CC” (fls. 907).

Tudo ponderado, o acórdão recorrido logrou dar resposta cabal a todas as questões para as quais o S T J  tinha requisitado uma resposta: às questões das al.s a), b), c) e d) postas pelo Supremo, foram dadas as respostas dos pontos 21(dos factos não provados adicionais), 15, 19 e 16 (dos factos provados adicionais), respectivamente.  

Considera-se definitivamente fixada a matéria de facto.

2.  Em matéria de qualificação, o arguido fora acusado do crime de ofensa à integridade física qualificada, agravada pelo resultado, previsto e punido pelos artigos 143º nº 1, 144º alínea d), 145º nº 1 alínea b) e 146º nº 1 e 2 – com referência ao art. 132º nº 2 alínea d) – todos do Código Penal. Tratou-se da qualificação do seu comportamento à luz da lei então vigente, o Código Penal resultante da revisão do DL n.º 48/95, de 15 de Março. Como bem referiu o Mº Pº na sua resposta, o actual regime, introduzido pela Lei n. 59/2007, de 4 de Setembro, é mais favorável ao arguido, pelo que é só este que se deverá ter em conta.

Vejamos então como é que o acórdão recorrido o fez.

2. 1. De acordo com o art. 143º nº 1 do C P , “quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa”. Disse-se no acórdão recorrido:

Ora, resultou assente que “o arguido AA encaminhou-se na direcção de CC, logrando alcançá-lo já no exterior do estabelecimento, tendo-o agarrado e lhe desferido, com muita força, vários pontapés no abdómen e nas pernas” (…) e que, “Com CC já prostrado no solo – rogando que lhe abrissem a porta – e incapaz de reagir, o arguido AA continuou a desferiu-lhe, com força, pontapés no abdómen e nas pernas”.

Resulta, pois, manifesto ter o arguido praticado o crime de ofensa à integridade física.”

Concordamos evidentemente com esta posição.

2. 2.  Nos termos do art.144º e al. d) do C P, a agravação do crime de ofensa à integridade física pode derivar de a ofensa provocar perigo para a vida da vítima. A este propósito discorreu a decisão de que se recorre:

Entendeu a acusação que os factos praticados pelo arguido AA provocaram perigo para a vida de CC. Não podemos deixar de concordar – as lesões comprovadamente causadas pelas agressões do arguido AA despoletaram um processo hemorrágico que acabou por ceifar a vida de CC. Dir-se-á – antecipando uma discussão necessária a propósito da agravação pelo resultado, que teremos adiante – que CC só morreu porque não aceitou tratamento. Esse ponto de vista está inquinado, porquanto não estamos (por enquanto) a discutir se CC morreu por culpa sua ou por culpa do arguido AA; estamos tão simplesmente a dizer que as lesões provocadas pelas agressões perpetradas pelo arguido AA a CC eram susceptíveis de provocar – como provocaram, efectivamente – a morte. Com efeito, tivesse CC aceitado tratamento e, eventualmente, recuperado, não deixaria de operar a agravação resultante da alínea d) do art. 144º - as lesões teriam, da mesma forma, provocado perigo para a sua vida!”

A qualificação em questão tem que decorrer da matéria de facto dada por provada, e, para tanto, ter-se-á em conta o facto provado 16: “Representando o arguido AA como possível resultado das suas condutas que poderia atingir órgãos vitais e, desse modo, colocar em perigo a vida de CC, como sucedeu, actuou, no entanto, sem se conformar com esse resultado”.

Ora, desta factualidade só pode tirar-se a conclusão de que houve representação mental por parte do arguido, da colocação em perigo da vida da vítima, mas que não houve uma conformação com esse resultado. Ou seja, o dolo de perigo que se exige no art. 144º d) do C P estará preenchido quanto ao elemento intelectual, mas falha em relação ao elemento volitivo. A agravação do artº 144ª, e concretamente por via da sua al. d), não se compadece com a simples negligência consciente, em relação ao resultado “pôr a vida em perigo”. Tal resulta da estruturação do tipo e do disposto no art. 13º do C P, nos termos do qual a punição a título de negligência depende da sua concreta previsão (cf. Acórdão do S T J de 12/2/2003, Pº 3725/02, 3ª Secção).

Assim sendo, entendemos não dever ter lugar a agravação do artº 144º al. d) do C P, subsistindo apenas, até ver, o crime do art. 143º do C P.

2. 3.  À luz do art. 145º nº 1 al. a) e nº 2, a ofensa à integridade física é qualificada, se for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, tendo por referência o que, a tal respeito, consagra o art. 132 nº 2 do C P. O acórdão recorrido tomou a este propósito a seguinte posição:

“(…) Ora nos termos do art. 145º nº 2 “são susceptíveis de revelar especial censurabilidade ou perversidade, entre outras, as circunstâncias previstas no nº 2 do art. 132º”. Significa serem “susceptíveis” que o preenchimento de qualquer das referidas alíneas não significa a qualificação automática do tipo. Por outro lado, outras circunstâncias que não as previstas nas mesmas alíneas são susceptíveis de revelar a mencionada censurabilidade ou perversidade.

Nos termos da alínea e) do art. 132º nº 2 do Código Penal - alínea d) à data dos factos -, é susceptível de revelar especial censurabilidade ou perversidade ser o agente determinado pelo prazer de causar sofrimento ou qualquer (outro) motivo torpe ou fútil.

Resultou assente, após ter o arguido AA agarrado e desferido em CC, com muita força, vários pontapés no abdómen e nas pernas, e já com CC prostrado no solo – rogando que lhe abrissem a porta – e incapaz de reagir, o arguido AA continuou a desferiu-lhe, com força, pontapés no abdómen e nas pernas.

Se este comportamento – bater, daquela forma, em alguém vencido, que roga clemência - não é revelador de um prazer de causar sofrimento, se não é especialmente censurável, não vislumbramos nenhum que o seja.

Na realidade, revela o comportamento do arguido uma muito baixa ou mesmo nula consideração pelo ser humano que, diante dele, e à sua mercê, lhe pedia que parasse. O que o arguido ignorou, continuando, sem manifestamente outro propósito para além de se satisfazer com o acto, pontapear CC.

Não se pode, portanto, duvidar da especial censurabilidade do comportamento do arguido.

E não pode, por isso, deixar de ser condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, prevista no art. 145º nº 1 alínea b) do Código Penal.”

Desta passagem parece resultar que, para o acórdão recorrido, a especial censurabilidade da actuação do agente arranca da consideração de que o mesmo actuou, nos termos da alínea e) do art. 132º nº 2 do C P [d) à data dos factos], “determinado pelo prazer de causar sofrimento ou qualquer (outro) motivo torpe ou fútil”. Os factos provados a convocar são:

“3) A dada altura, por razões não apuradas, verificou-se uma contenda, com agressões físicas entre vários dos clientes que se encontravam naquele estabelecimento;

4) Nessa sequência o arguido AA colocou as mãos no peito de CC e empurrou-o;

5) Entretanto, CC saiu do bar e dirigiu-se à sua residência, que dista poucos metros do local, sita na Rua …;

6) No momento em que foram separados, CC encontrava-se no chão, de joelhos, agarrado à cintura do arguido AA

13) Após o descrito em 5), o arguido AA encaminhou-se na direcção de CC, logrando alcançá-lo já no exterior do estabelecimento, tendo-o agarrado e lhe desferido, com muita força, vários pontapés no abdómen e nas pernas;

14) Com CC já prostrado no solo – rogando que lhe abrissem a porta – e incapaz de reagir, o arguido AA continuou a desferiu-lhe, com a mesma força, pontapés no abdómen e nas pernas”.

Na origem da agressão está uma “contenda” surgida por razões não apuradas. Portanto, desconhece-se se o motivo da agressão foi torpe ou fútil. Por outro lado, os elementos de prova são escassos no sentido de se concluir que o agente actuou “pelo prazer (…) de causar sofrimento”. Na verdade seria necessário dispor de uma factualidade que levasse a pensar que o agente assumiu uma atitude de satisfação com a provocação da dor.

O que tudo afasta os factores de especial censurabilidade que se apontaram.

Acontece porém que, sobretudo o facto 14, denuncia uma actuação em que se pode dizer que o arguido empregou acto de crueldade – continuou a desferir com a mesma força, pontapés no abdómen e nas pernas – que só podia ter por objectivo aumentar o sofrimento da vítima, já que esta estava então incapaz de reagir. O que torna o seu comportamento especialmente censurável por essa via. Cometeu pois o arguido o crime do artº 145º nº 1 al. a) do C P.

2. 4.  Discorrendo depois sobre a agravação pelo resultado morte, e assim sobre a aplicação ou não do artº. 147º nº 1 do C P, o acórdão pronunciou-se negativamente, com a seguinte justificação:

“Ao arguido AA é igualmente imputada a agravação pelo resultado prevista no art. 147º do Código Penal (art. 145º à data dos factos) – CC morreu em virtude das agressões por aquele perpetradas.

Entendemos, contudo, não ser aqui de proceder tal agravação: é inequívoco que CC morreu por causa das agressões supra referidas. Mas esta linearidade pode ser equívoca, uma vez que não tivesse a vítima recusado a assistência médica do INEM – como recusou – muito diferente poderia ser o desfecho. Se é certo que não sabemos se o tratamento produziria os resultados desejados (e, quanto a isso, poder-se-á apenas conjecturar, uma vez que, quando recusou o tratamento, não foi a vítima examinada e não se sabe, por isso, qual o seu estado de saúde naquele momento), é certo que a recusa determinou um curso de eventos distinto do que poderia ter, de outra forma, ocorrido, com um desenlace eventualmente menos trágico…

Desta forma, entendemos não poder ser ao arguido AA imputada a agravação pelo resultado morte.”

Em relação ao afastamento do resultado morte, desconhece-se, de facto, se o tratamento atempado e recusado pela vítima teria evitado o resultado. É dizer, se teria interrompido o processo causal.  

Importa também acrecentar que a causalidade adequada entre a acção do arguido, e o resultado morte, se tem que estender a todo o processo causal. E então, concluir-se-ia que, segundo as regras gerais da experiência comum, não é uma atitude normal, que alguém que é barbaramente agredido a ponto de outrem ter chamado o INEM, se recuse a ser por este assistido. Nesta linha, dir-se-ia que “É claro que a morte ou a ofensa à integridade física grave deverão ser expressão de um perigo específico que o comportamento do agente envolve (…). Parece ser assim de afastar a existência de um perigo específico, e de aceitar a quebra do nexo causal, quando está em causa um comportamento intencional (…) da própria vítima que descura, por exemplo, um tratamento que lhe era exigível (não procura auxílio médico ou fá-lo tarde demais, recusa uma operação que lhe poderia ter salvo a vida) [1].

Cremos porém que a questão deve ser abordada com melhor atenção aos contornos do caso.

Tendo em conta a necessidade de a adequação se referir a todo o processo causal, estando perante uma actuação de terceiro ou da vítima que se integre no processo causal, ela excluirá a imputação. Mas não será assim se tal actuação se puder considerar previsível ou provável. [2]

Segundo o facto “18) CC recusou, poucos minutos após entrar na sua casa, ser assistido por uma equipa do INEM que entretanto fora chamada ao local e ali compareceu;

A vítima dos autos conscientemente recusou ser socorrida pelo INEM, mas nada nos autos inculca que o tivesse feito por motivos masoquistas ou suicidários, tudo apontando, segundo as regras gerais de experiência da vida, que o fez porque não se apercebeu da gravidade da sua situação. Sendo possível aceitar a sua opção “de que a deixassem em paz”, face à indisposição em que estava, e sobretudo face aos dados de que dispunha sobre a sua situação. De tal maneira que o INEM retrocedeu.

Roxin é peremptório ao excluir a imputação ao agente por interferência da vítima, apenas nos casos em que “a vítima de uma lesão se nega a receber o auxílio que ainda era possível, com plena consciência do risco”. “Pelo contrário, na medida em que a vítima não esteja consciente das possíveis consequências da sua conduta negligente não é possível a exclusão da imputação do ponto de vista da colocação em perigo dolosa”[por parte do agente] [3]. E diz mais adiante que “no caso de consequências já predispostas (como a lesão que conduz à morte) isso só sucederá [entrarem as consequências exclusivamente na esfera de responsabilidade da vítima], se a produção do resultado se deve a uma conduta gravemente inadequada da vítima, por exemplo, a que não chama o médico embora tenha os sintomas mais preocupantes” [4].

No caso em apreço e pelo que já se viu não podemos afirmar que se está perante uma conduta gravemente inadequada da vítima. Nada inculca que a vítima tivesse plena consciência do risco que estava a correr, e nesse caso, sim, a sua conduta seria gravemente inadequada. Ora, na medida em que fosse gravemente desajustada, a adequação de todo o processo causal interromper-se-ia aí, e poderia excluir-se a imputação. Os elementos de que se dispõe ainda permitem qualificar o comportamento do falecido como uma aceitável reacção, no condicionalismo, o que afasta a configuração de uma inesperada porque insólita atitude da sua parte.

Serve para dizer que entendemos dever agravar a conduta do arguido pelo resultado morte, nos termos do art. 147º nº 1 do C P.

3. O recorrente foi condenado numa pena de 6 anos de prisão dentro de uma moldura abstracta que vai de 3 a 12 anos de prisão.

Imputando-se-lhe o crime das disposições combinadas dos art.s 143º nº 1, 145º nº 1 al. a), e 147º nº 1, todos do C P, como decorre do que antecede, a pena a aplicar terá que ser encontrada numa moldura de 40 dias a 5 anos e 4 meses. Vejamos então qual deva ser.
A tal respeito, temos que retomar considerações que já anteriormente temos tecido, mas que não modificámos, e que partem da ideia prévia segundo a qual, a escolha e medida da pena constituem tarefas cuja sindicabilidade se tem que assegurar. Daí que o julgador tenha que ter em conta, nessas tarefas, a natureza, a gravidade e a forma de execução do crime, optando por uma das reacções penais legalmente previstas, numa verdadeira aplicação do direito, e não num exercício do que possa ser apelidado, simplesmente, de “arte de julgar”. Ora, a sindicabilidade da escolha e medida da pena implica portanto que, em sede de recurso de revista para este S.T.J., possa haver algum controlo sobre a concreta pena que foi aplicada. Vejamos pois em que é que se cifrará esse “algum controlo”.
Acolhendo a lição da doutrina, tem-se enveredado na jurisprudência deste Supremo Tribunal por uma orientação em que se legitima a fiscalização, dos passos dados no estabelecimento do limite da culpa que o arguido deve suportar ou das necessidades de prevenção reclamadas pelo caso, e, por outro lado, se legitima o controle da relevância que se deu ou não se deu, a circunstâncias de facto, com valor atenuativo ou agravativo.
Para além disto, a determinação do quantum certo de pena deverá ser apanágio do juiz recorrido, designadamente se esse juiz beneficiou de um julgamento em audiência com as vantagens da oralidade e imediação.  
Importa então recordar os critérios a que deve obedecer a determinação da pena concreta.

3. 1.  Assinale-se que o ponto de partida e enquadramento geral da tarefa a realizar na sindicância das penas aplicadas, não pode deixar de se prender com o disposto no artº 40º do C. P., nos termos do qual toda a pena tem como finalidade “a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. Em matéria de culpabilidade, diz-nos o nº 2 do preceito que “Em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.
Ao exprimir as finalidades exclusivamente preventivas da pena, o nº1 do art.º 40º serve-se das expressões “protecção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade”, o que levanta algumas dificuldades. Por um lado, a reintegração social, como forma de prevenção especial positiva, é ela mesma uma forma de protecção de bens jurídicos, que não deveria, pois, cumular-se com esta última finalidade. Mas, sobretudo, a protecção de bens jurídicos é no fundo o objectivo de toda a política criminal, repressiva e também preventiva, pelo que não representa nada que se possa considerar específico das penas.  
Somos então levados a englobar na expressão “protecção de bens jurídicos” todas as finalidades que, sendo preventivas, se não confundam com a prevenção especial positiva, ou seja, com a reinserção social do delinquente.
De qualquer modo, com este preceito, fica-nos a indicação de que a pena assume agora, e entre nós, um cariz utilitário, no sentido de eminentemente preventivo, não lhe cabendo, como finalidade, a retribuição “qua tale” da culpa. A avaliação da culpa do agente fica ao serviço, fundamentalmente, de finalidades garantísticas, e só do interesse do arguido.
Quando, pois, o art. 71º do C. P. nos vem dizer, no seu nº 1, que “A determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”, não o podemos dissociar daquele art. 40º.
Concretizando, e seguindo a doutrina largamente dominante na matéria, a partir da moldura penal abstracta procurar-se-á encontrar uma “sub-moldura” para o caso concreto, que terá como limite superior a medida óptima de tutela dos bens jurídicos com atenção às expectativas comunitárias, e, como limite inferior, o “quantum” abaixo do qual “já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar.” [5]
Ora, será dentro dos limites consentidos pela prevenção geral positiva que deverão actuar os pontos de vista da reinserção social. Quanto à culpa, para além de suporte axiológico normativo de toda e qualquer repressão penal, compete-lhe, como se viu já, estabelecer o limite inultrapassável da medida da pena a aplicar. A prevenção geral negativa ou intimidatória surgirá como consequência de todo este procedimento, e já aflorava ao nível da própria tipificação na lei penal do comportamento.
A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem-se orientado quase unanimemente num sentido igual ao que acaba de se referir.
O nº 2 do artº 71º do C. P. manda atender, na determinação concreta da pena, “ a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele”. Enumera a seguir, a título exemplificativo, circunstâncias referentes à ilicitude do facto, à culpa do agente, à sua personalidade, ao meio em que se insere, ao comportamento anterior e posterior ao crime.

3. 2.  Regressando ao caso concreto, vemos que o comportamento pelo qual o recorrente foi condenado, é cada vez mais frequente em estabelecimentos frequentados à noite, resultado de altercações que muitas vezes descambam em mortes. O álcool e a droga, de que se não fala no presente caso, estão no entanto em geral presentes. Torna-se arriscado entrar em muitos bares “dancings”ou “boîtes” depois de certas horas, face ao que aí poderá acontecer. Aos olhos da comunidade, o recorrente esteve por certo implicado na morte da vítima, e a expectativa da punição em termos que o julgador não pode evidentemente ignorar, tem que se traduzir num “quantum” de pena com significado. As exigências de prevenção geral são apreciáveis.

O recorrente tinha 30 anos quando cometeu os factos destes autos e tem agora 39. O crime teve lugar na madrugada de 18/5/2002. Depois disso o arguido cometeu um crime de ofensas à integridade física a 31/10/2003, outro de tráfico de estupefacientes de quantidades diminutas a 22/3/2004, e ainda outro de tráfico de estupefacientes em Maio de 2005. Antes dos factos destes autos já havia sido condenado por condução de veículo sem habilitação legal.

O crime destes autos ocorreu há 11 anos.  

Deu-se por provado que o recorrente vive com a família e trabalha na construção civil.

As necessidades de prevenção especial não deixam de existir pelo facto de desde há 6 não haver notícia de ter voltado a delinquir.

O arguido viu o crime por si cometido ser agravado pelo resultado morte da vítima, e ser qualificado pela especial censurabilidade de que se revestiu o modo de execução do mesmo. Quanto a circunstâncias agravantes ou atenuantes gerais, eventualmente existentes, que se não confundam com o que esteve por detrás das referidas agravação e qualificação, apontar-se-á respectivamente o comportamento delituoso anterior e posterior à prática do crime, e o tempo decorrido desde a sua prática.  

Tudo ponderado, entendemos que a pena justa a aplicar deve ser de 3 anos e 6 meses de prisão.


3. 3.  Coloca-se então, em face da nova medida, a questão da suspensão da execução de tal pena de prisão.
O artº 70º do C. P. refere que, “Se ao crime forem aplicáveis, em A...., pena privativa e pena não privativa de liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
O nº 1 do artº 50º do C. P.(redacção da Lei nº 59/2007 de 4 de Setembro) estipula, a seu turno, que “O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”
Segundo o nº 2 do preceito,
“O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina   a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada do regime de prova.”
E de acordo com o nº 3 do artº 53º do CP, “O regime de prova é ordenado (…) quando a pena de prisão cuja execução foi suspensa tiver sido aplicada em medida superior a três anos”.
É sabido que só se deve optar pela suspensão da pena quando existir um juízo de prognose favorável, centrado na pessoa do arguido e no seu comportamento futuro. A suspensão da pena tem um sentido pedagógico e reeducativo, sentido norteado, por sua vez, pelo desiderato de afastar, tendo em conta as concretas condições do caso, o delinquente da senda do crime.
Também importa acrescentar que esse juízo de prognose não corresponde a uma certeza, antes a uma esperança fundada de que a socialização em liberdade se consiga realizar. Trata-se pois de uma convicção subjectiva do julgador que não pode deixar de envolver um risco, derivado, para além do mais, dos elementos de facto mais ou menos limitados a que se tem acesso [6].
De um lado, cumpre assegurar em que a suspensão da execução da pena de prisão não colida com as finalidades da punição. Numa perspectiva de prevenção especial, deverá mesmo favorecer a reinserção social do condenado.
Por outro lado, tendo em conta as necessidades de prevenção geral, importa que a comunidade não encare, no caso, a suspensão, como sinal de impunidade, retirando toda a sua confiança ao sistema repressivo penal.
Acresce que a aposta que a opção pela suspensão, sempre pressupõe, há-de fundar-se num conjunto de indicadores que a própria lei adianta. Personalidade do agente, condições da sua vida, conduta anterior e posterior ao crime e circunstâncias deste.
No caso em apreciação, como já referimos, e tanto quanto os autos revelam, não deixam de se colocar preocupações ao nível da reinserção social do arguido. Continua a mostrar-se importante fazer sentir ao agora condenado os efeitos da condenação. O seu comportamento foi muito censurável, e o recorrente não pode deixar de o interiorizar.  
Tanto mais que, em termos de prevenção geral, a reacção penal aos factos em apreço só poderá, a nosso ver, mostrar-se suficiente, optando-se pelo cumprimento de uma pena de prisão efectiva. Sob pena de, uma possível suspensão, ser vista como “mais um perdão judicial” de que decorresse uma perda da confiança no sistema repressivo penal, por parte da sociedade. Não podemos esquecer que o recorrente se envolveu numa brutal agressão à vítima, e se não tivesse havido tal agressão ela não teria morrido a seguir como morreu. O arguido é visto aos olhos da comunidade como a pessoa que, embora não tendo desejado a morte da vítima, tanto quanto se apurou, lhe bateu e lhe causou a morte
Daí que se entenda não estarem reunidas as condições da reclamada suspensão, da execução da pena de prisão aplicada ao recorrente.

D – DECIDINDO
Tudo visto e ponderado, delibera-se neste Supremo Tribunal de Justiça, e em conferência, conceder parcial provimento ao recurso, ficando o recorrente condenado, pela prática de um crime das disposições combinadas dos art.s 143º nº 1, 145º nº 1 al. a), e 147º nº 1, todos do C P, numa pena de três anos e seis meses de prisão efectiva, no mais se mantendo a decisão recorrida.     

                                      

 Custas pelo recorrente com taxa de justiça de 4 U C.


Lisboa, 13 de Outubro de 2011


Souto de Moura (Relator)
Isabel Pais Martins

____________________________
[1]  Cf. Paula Ribeiro de Faria in “Comentário Conimbricense do Código Penal – Parte Especial”, Tomo I, pag. 242 .
[2] Cf. Figueiredo Dias in “Direito Penal- Parte Geral” tomo I, pag. 330.
[3] In “Derecho Penal - Parte General Tomo I”, Madrid, Civitas, pag. 382 e 383. 
[4] Idem pag. 402.
[5] Cf. Figueiredo Dias in “Direito Penal Português – As consequências Jurídicas do Crime” pág. 229.
     
[6] Cf. Figueiredo Dias, ob. cit. pag 344.