Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
4097/22.4T8GMR.G1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: FERNANDO BAPTISTA
Descritores: HERANÇA INDIVISA
HERDEIRO
POSSE
QUOTA IDEAL
AQUISIÇÃO
SERVIDÃO POR DESTINAÇÃO DE PAI DE FAMÍLIA
SERVIDÃO DE PASSAGEM
SINAIS VISÍVEIS E PERMANENTES
DIREITO DE PROPRIEDADE
Data do Acordão: 06/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. Antes da partilha dos bens da herança, não se pode falar em actos de posse dos herdeiros sobre qualquer dos bens que a integram, na medida em que enquanto co-herdeiros são meros titulares de uma quota ideal sobre a herança no seu todo e não proprietários, ou comproprietários, dos bens da herança.

II. São três os pressupostos (ou requisitos) para a aquisição da servidão por destinação do pai de família: i) que os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio, tenham pertencido ao mesmo dono; ii) que exista uma relação estável de serventia de um prédio a outro ou de uma fracção a outra correspondente a uma servidão aparente revelada por sinais visíveis e permanentes; e iii) que tenha existido uma separação dos prédios ou fracções em relação ao domínio, inexistindo qualquer declaração no respectivo documento contrária à constituição do encargo.

III. A existência de sinais visíveis e permanentes deve reportar-se ao tempo da separação do domínio dos prédios, sendo que a visibilidade dos sinais respeita à sua materialidade, no sentido de serem percecionáveis e interpretáveis como tais, pela generalidade das pessoas que se confrontem com eles e a permanência consiste na manutenção dos sinais, com a aludida visibilidade, ao longo do tempo, sem interrupções (pelo menos nos casos em que a ausência temporária dos sinais torne equívoco o seu significado), por modo a gerar e manter a ideia de que se trata de uma situação estável e duradoura e, ao mesmo tempo, afastar a hipótese de se tratar de uma situação precária, podendo tais sinais, no entanto, ser alterados ao longo do tempo ou substituídos por outros

IV. O acordo relativo à separação de uma parcela de terreno que sempre foi utilizada como caminho, do prédio em que está integrada, tendo por objectivo assegurar a sua utilização em benefício do prédio mãe e de prédio confrontante com essa parcela, constituiu sinal visível e permanente bastante para a constituição de servidão de passagem por destinação de pai de família.

V. Se os sinais forem equívocos ou ambíguos quanto ao tipo de servidão, é admissível o recurso a outros elementos de prova para esclarecer o seu exacto significado – sendo que um exemplo de sinal visível e permanente será, na servidão de passagem, a existência de uma abertura ou carreiro, pelo qual a passagem se exerce. Qualquer pessoa pode ver esse sinal e o mesmo permanece, ainda que a abertura ou carreiro possam ser modificados.

VI. Deduzida, pelos AA, pretensão indemnizatória apenas com base na violação de direito de propriedade (que não, também, com base em violação de direito de servidão – pedido de reconhecimento deste direito de servidão que foi formulado apenas como pedido subsidiário), não provado aquele direito de propriedade, não têm os AA direito a serem indemnizados com base em violação de direito de servidão.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível

I – RELATÓRIO

AA e BB intentaram acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra CC e DD

Pedem a condenação dos réus a:

a) reconhecer que os autores são os legítimos proprietários do caminho;

b) reconhecer que a esse caminho corresponde a área de 283 m2;

c) restituírem aos autores, completamente livre e devoluto, esse caminho;

d) absterem-se de praticar atos que lesem o direito de propriedade dos autores sobre o referido caminho;

e) pagar aos autores uma indemnização por danos não patrimoniais, em valor não inferior a € 5.000,00.

Para tanto alegam, em síntese, que as partes são proprietárias de uns prédios que fizeram parte de uma Quinta partilhada em 2017, tendo na altura os herdeiros decidido que o caminho que se encontrava entre os prédios permaneceria como caminho que serviria os dois, para acesso a ambos os prédios, como já acontecia na altura dos avós e pais dos herdeiros.

O prédio foi comprado pelos réus em 2021, sabendo previamente dos termos da utilização do caminho, no entanto, foi alterado o registo e inscrição matricial, incorporando o trato de caminho na área do seu prédio e depois colocaram pedras num portão de acesso existente para o prédio dos autores e erigiram um muro, impedindo o acesso ao caminho e a todos os campos do prédio dos autores com maquinaria, tratores e camiões.

Foram citados os réus, excepcionando a ineptidão da petição inicial e a inexistência de factos demonstrativos da aquisição do caminho, nomeadamente por usucapião.

Impugnam a existência de um acordo vinculativo, e a evidência de utilização do caminho, tendo, por generosidade cedido uma parte junto à entrada, que permite o acesso aos campos.

Concluem pela improcedência da ação e pela condenação dos autores como litigantes de má fé.

Os autores responderam concluindo pela improcedência das excepções.

Notificados para esclarecerem em que circunstâncias é que o caminho foi por eles adquirido (sic, nos termos do despacho de 06/10/2022), os autores alegaram que usam o caminho como os anteriores proprietários, cabendo agora a propriedade aos artigos 63 e atual .51 (antiga 11) e que o mesmo mede cerca de 75 metros de comprimento e 3.024 de largura, juntando foto aérea.

Atendendo à factualidade alegada, e a impulso do Tribunal, os autores ampliaram o pedido, com inclusão de pedido subsidiário de constituição de servidão (identificando-a primeiro como sendo “legal” e eliminando de seguida tal menção, novamente após interpelação do Tribunal).

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença nos seguintes termos:

face ao exposto, julgo a presente parcialmente procedente, e, em consequência, reconheço o direito de compropriedade dos Autores AA e BB sobre a parcela de terreno com uma área de 226,80 m2 (cerca de 3x75 metros de comprimento, nos termos dos levantamentos juntos) que configurava o caminho de acesso à Rua da ... a poente do seu prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número .46/...0...50401 e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 63/....

Condeno os Réus CC e DD a reconhecerem tal direito e à restituição do caminho ao estado em que se encontrava, retirando os obstáculos existentes, muro e pedras, e a absterem-se de impedir o seu acesso e passagem pelos Autores.

Condeno ainda os Réus a indemnizarem os Autores pelos danos sofridos na quantia de € 3.500 (três mil e quinhentos euros), acrescida dos juros legais, contados da citação e até efetivo e integral pagamento.

Inconformados, apelaram os Réus, tendo a Relação de ..., em acórdão, proferido a seguinte

“Decisão:

Perante o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação apresentada pelos réus e, em conformidade:

a. revogam a sentença proferida no que se refere ao reconhecimento do direito de compropriedade dos autores sobre a parcela de terreno com a área de 226,80 m2, a restituição dessa área e a condenação dos réus na indemnização de 3.500,00 euros, acrescida de juros de mora desde a citação.

b) reconhecem a constituição de uma servidão de passagem por destinação de pai de família sobre a parcela de terreno com a área de 225,00 m2, identificada no ponto 4 da matéria de facto provada, para acesso à Rua da ..., em benefício do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º.46 e inscrito na matriz sob o art.º 63, e a onerar o prédio descrito na mesma Conservatória sob o n.º .50 e inscrito na matriz sob o art.º .51, resultando deste reconhecimento a obrigação de os réus respeitarem o direito de passagem dos autores, abstendo-se da prática de atos que impeçam o exercício desse direito.”.


*

Inconformados com a decisão da Relação, dela recorrem os Réus (da parte do acórdão que reconhece a constituição de uma servidão de passagem por destinação de pai de família – al. b) da Decisão) e os Autores (pedem a revogação do acórdão e repristinação da sentença).

Apresentam ambos alegações de recurso, as quais rematam com as seguintes

CONCLUSÕES

A. DOS AUTORES (AA e BB)

I. O douto Tribunal da Ia Instância bem andou ao reconhecer o direito de compropriedade dos Recorrentes sobre o caminho em causa por meio do instituto da usucapião, uma vez que se preenchem todos os requisitos no caso em apreço para esse reconhecimento;

II. Os Recorrentes utilizavam o caminho à vista de toda a gente, procedendo à sua limpeza e manutenção, sendo o caminho utilizado por todos aqueles que se serviam deste para aceder ao terreno dos Recorrentes, nomeadamente, todos aqueles que cultivavam o terreno;

III. Encontrando-se preenchido o elemento corpus por haver por parte dos Recorrentes o domínio de facto sobre a coisa, quando exercem poderes materiais efetivos sobre o caminho, mormente, a sua utilização e preservação do mesmo, bem como, o animas em consequência dos Recorrentes agirem com a intenção de possuidor ao efetuar sobre o caminho atos como titulares do seu direito real;

IV. Devendo o Acórdão proferido ser devidamente revogado.

V. Não é relevante para o caso subjudice o ano da realização da escritura pública da partilha, uma vez que o decurso do tempo para se verificar a usucapião não está dependente de um ato de natureza formal ou substancial;

VI. Não obstando, a constituição originária de um direito de usucapião não se encontra sujeita a qualquer outro circunstancialismo juridicamente relevante, bastando apenas o decurso do tempo necessário à sua conformação;

VII. Pelo que está preenchido o período de tempo necessário para a constituição do direito de usucapião;

VIII. Pelo que deverá ser reconhecido o direito de compropriedade dos Recorrentes sobre o caminho de acesso ao seu prédio.

IX. Os Recorrentes, viram-se impedidos de aceder pelo referido caminho, com privação plena do próprio prédio.

X. Situação que se mantém atualmente, porquanto o portão de acesso ao prédio dos Recorrentes permanece inacessível pelo facto de as pedras lá colocadas pelos Recorridos ainda não terem sido removidas.

XI. Com tal atitude, o direito de propriedade dos Recorrentes foi, e é, violado pelos Recorridos, privando os mesmos do uso pleno do prédio que lhes pertence.

XII. Factos demonstrados através do depoimento do Recorrente marido e dos elementos fotográficos que se encontram juntos aos autos, nomeadamente o documento n° 18 junto com a petição inicial.

XIII. Os Recorridos pretenderam impedir os Recorrentes - e efetivamente lograram impedir - de aceder ao seu prédio e de utilizar o caminho, mesmo sabendo que não o podiam fazer.

XIV. Deliberadamente, colocaram pedras de grande envergadura a bloquear o acesso dos Recorrentes ao seu terreno, bem sabendo que com isso estariam a causar transtorno aos Recorrentes.

XV. Mal andou o Tribunal a quo ao entender que o desgaste revelado pelo autor com o Réu, apenas se cingia a um processo crime e nada tinha a ver com os presentes autos.

XVI. 0 processo crime instaurado pelo Recorridos contra os Recorrentes foi apresentado já na pendência da contenda que deu origem ao presente processo e que, como seria de esperar, veio a ser arquivado por se entender não existir violação de propriedade,

XVII. Evidentemente que o desgaste psicológico tem que abarcar esta circunstância e não ser relevado de forma absoluta como entendeu o Tribunal a quo.

XVIII. Os Recorrentes foram, de facto, perturbados na sua posse e utilização do caminho, impedidos de aceder na plenitude ao seu prédio rústico, por consequência dos comportamentos do Recorrentes, que, mesmo tendo perfeita consciência das circunstâncias referentes à delimitação e utilização do caminho e ficaram, de facto, constrangidos com tal situação.

XIX. Ainda que não tivesse ficado demonstrado o desgaste e constrangimento causado, sempre seria de considerar o pagamento de indemnização aos Recorrentes por via do comportamento dos Recorridos em impedir o acesso do Recorrentes ao seu terreno.

XX. Pelo que, deve a decisão do Tribunal da Relação ser devidamente revogada e substituída por outra que determine a obrigação de os Recorridos indemnizarem os Recorrentes, mantendo-se o montante fixado pelo Tribunal de Ia Instância.

Termos em que, e por tudo o mais que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso subordinado ser julgado totalmente procedente, revogando-se o Acórdão proferido e reconhecendo-se a compropriedade do caminho, bem como a obrigação de os Recorridos indemnizarem os Recorrentes.

A. DOS RÉUS (CC e DD)

1ª- Vem o presente recurso interposto do Acórdão do Tribunal da Relação de ... na parte em que reconhece a constituição de uma servidão de passagem por destinação de pai de família sobre a parcela de terreno com área de 225,00 m2, identificada no ponto 4 da matéria de facto provada, para acesso à Rua da ..., em benefício do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº .46 e inscrito na matriz sob o art.º 63, e a onerar o prédio descrito na mesma Conservatória sob o nº .50 e inscrito na matriz sob o art.º .51, resultando deste reconhecimento aobrigação deos réus respeitarem o direito depassagem dos autores, abstendo-sedapráticadeatos queimpeçam o exercício desse direito, porquanto, com este não se conformam os Recorrentes, por padecer de erro quanto à aplicação do Direito.

2ª- O Tribunal da Relação fundamenta a sua decisão da seguinte forma: “Todo o circunstancialismo que resulta da matéria de facto provada evidencia, sem qualquer dúvida, que os herdeiros proprietários de ambos os imóveis em causa nestes autos quiseram, no momento da partilha e, portanto, quando os mesmos passaram a ter proprietários diferentes, que a parcela de terreno identificada no ponto 4,, de terra batida, que sempre foi utilizada como caminho para acesso a todos os prédios, assim continuasse a ser utilizada pelo prédio que foi adjudicado à autora e pelo prédio adjudicado ao irmão EE, tendo, para concretizar tal desígnio, acordado até que a mesma fosse separada para esse efeito, do prédio adjudicado a este último, de forma a servir ambos os prédios.

Os sinais visíveis epermanentes, para além da clara identificação da parcela como sendo um caminho, assim sempre sendo pressuposta pelos proprietários e depois pelos seus herdeiros, são na situação em apreço, a clara separação daquela parcela da restante parte do imóvel adjudicado ao herdeiro EE, como se a área correspondente pudesse deixar de integrar aquele imóvel.”

3ª- Pelo que, a questão a decidir é a de saber se, no caso em apreço, estão ou não preenchidos os requisitos legais para se verificar a existência de servidão de passagem por destinação de pai de família.

4ª- Para a constituição de uma servidão por destinação do pai de família é necessária a verificação de 3 requisitos: 1- os dois prédios ou as duas fracções do prédio em causa tenham pertencido ao mesmo proprietário; 2- existam sinais visíveis e permanentes que revelem inequivocamente uma relação estável de serventia de um prédio para com o outro; e 3- que os prédios ou as fracções do prédio se separem quanto ao seu domínio enãohajano documento respectivo nenhuma declaração opostaàconstituição do encargo (Art. 1549.º do CC).

5ª- Considera o Tribunal da Relação estarem preenchido os 3 requisitos cumulativos, reconhecendo assim, a constituição de servidão de passagem por destinação de pai de família.

6ª- Quanto ao primeiro requisito, dúvidas não restam que este encontra-se preenchido, porquanto, tal como resulta do ponto 1, 2 e 5 dos factos dados como provados, os dois prédios em questão pertenciam, aquando da partilha, a um mesmo proprietário, a saber, a autora e os restantes herdeiros da herança aberta por óbito de FF.

7ª- Quanto ao terceiro requisito, efetivamente, não existe na escritura de partilhas nenhuma declaração oposta à constituição do encargo, encontrando-se assim preenchido.

8ª- Quanto ao segundo requisito, considera o Tribunal da Relação estar este requisito preenchido, apresentando como sendo sinais visíveis e permanentes, para além da clara identificação da parcela como sendo um caminho, assim sempre sendo pressuposta pelos proprietários e depois pelos seus herdeiros, a decisão clara de separação daquela parcela da restante parte do imóvel adjudicado ao herdeiro EE, como se a área correspondente pudesse deixar de integrar aquele imóvel.

9ª- O Tribunal da Relação dá como provada a existência de uma vontade/decisão dos herdeiros na constituição da relação de serventia entre os dois prédios, mas não apresenta prova de quaisquer sinais concretos e visíveis que materializem ou concretizem essa vontade ou decisão em criar uma situação de facto estável e duradoura, uma situação que objectivamente corresponda à de uma servidão, ainda que aparente. (ponto 6 dos factos provados)

10ª- E não apresenta/prova a existência desses sinais, porque os mesmos nunca foram, sequer, alegados pelos autores queapenas alegaram efoi dado como provado, acolocação no seu prédio, com o consentimento do irmão e cunhado EE de uma rede, cancela e portão e muro, mas depois de celebrada a escritura de partilhas. (ponto 6 A dos factos provados).

11ª- A simples alegação e prova da existência de uma parcela de terreno em terra batida, utilizada como caminho, para acesso aos campos da quinta, instalações agrícolas, casa dos caseiros e feitor, com aproximadamente 75 metros de comprimento e 3 metros de largura, no sentido sul-norte, que sempre foi utilizada pelos Autores, réus e anteriores proprietários, sem interrupção e de forma pacífica, não é suficiente para preenchimento do requisito da existência de sinais visíveis e permanentes que revelem inequivocamente uma relação estável de serventia de um prédio para com o outro.

12ª- Assim sendo, apenas ficou provada a existência de uma decisão, um acordo verbal entre os herdeiros aquando da partilha de que a parcela de terreno utilizada como caminho, seria separada e ficaria a servir ambos os prédios.

13ª- Ora, o acordo verbal dos herdeiros aquando da partilha, por si só, não permite a constituição de qualquer direito real, nomeadamente, direito real de gozo, como é a servidão de passagem por destinação de pai de família, tendo apenas efeitos obrigacionais, nos termos do disposto no Art. 1306º do CC.

14ª- Incidindo sobre os autores o ónus da prova dos factos constitutivos do direito invocado, a falta de prova dos mesmos tem como consequência o não reconhecimento do direito, nos termos do disposto no Art. 342º CC.

15º-Pelo exposto, mal andou o Tribunal da Relação quando julgou verificada a existência de sinais visíveis e permanentes postos em um ou em ambos os prédios e que revelem inequivocamente uma relação estável de serventia de um prédio para com o outro e consequentemente, reconheceu a existência de servidão de passagem por destinação de pai de família.

16ª- Assim, ao decidir como decidiu, violou o Acórdão do Tribunal da Relação entre outras, as disposições constantes nos Art. 342º, nº 1, 1306º e Art. 1547º todos do CC, pelo que não pode manter-se, devendo ser revogado e substituído por outro que julgando o presente recurso, procedente, por provado, declare a não existência de servidão por destinação de pai de família, com as demais consequências legais.

Nestes termos e nos que V. Exa. Doutamente suprirá deve, pois, o presente recurso ser julgado procedente, por provado, declarando-se a não existência de servidão por destinação de pai de família, com todas as suas legais consequências.


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Ambas as partes apresentaram contra-alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.


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II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Nada obsta à apreciação do mérito das revistas.

Com efeito, a situação tributária mostra-se regularizada, o requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC). Para além de que tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC).


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Considerando que o objecto dos recursos (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), as questões a decidir são as seguintes:

REVISTA DOS AUTORES

I. Do reconhecimento do direito de “compropriedade” aos Autores/Recorrentes sobre a parcela de terreno, por usucapião;

II. Do direito de indemnização aos Autores/Recorrentes por força do comportamento dos RR/recorridos em impedir o acesso dos Recorrentes ao seu terreno

REVISTA DOS RÉUS

I. Do preenchimento dos pressupostos legais para a existência de servidão de passagem por destinação de pai de família.

III – FUNDAMENTAÇÃO

III. 1. FACTOS PROVADOS

É a seguinte a matéria de facto provada (fixada na Relação após impugnação em recurso):

1. Por escritura pública de partilha, celebrada no dia ... de ... de 2017 e que aqui se dá como reproduzida, foi adjudicado à Autora mulher, entre outros, o prédio rústico, composto de cultura arvense, vinha em ramada e pastagem, sito no Lugar do ..., freguesia de ..., Concelho de ..., descrito na Conservatória do registo Predial de ..., sob o número .46/...0...50401 (desanexado do prédio .31/...0...30529), inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 63 da referida freguesia de ..., inscrito a seu favor pela Ap. ..04, de 2017/07/10.

2. Na mesma escritura de partilha, foi adjudicado ao herdeiro EE, o prédio urbano composto de casa de dois pisos e logradouro, sito na Rua da ..., freguesia de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o número .50/...0...50427 (desanexado do prédio .31/...0...30529) e inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo 11.

3. Ambos os prédios faziam parte de uma quinta dos falecidos avós e pais da Autora mulher, estes falecidos a ... de ... de 1991 e ... de ... de 1997.

4. O acesso aos campos da quinta, instalações agrícolas, casa dos caseiros e feitor, num comprimento de cerca de 75 metros, sempre foi feito por uma parcela de terreno utilizada como caminho, em terra batida caminho de terra batida desde a rua da ..., no sentido sul-norte e com cerca de 3 metros de largura.

5. Os herdeiros desanexaram os dois referidos prédios da descrição .31/...0...30529, em 01/04/2015 e 27/04/2015, respetivamente, e averbaram o registo em seu nome, em comum e sem determinação de parte, ficando o prédio referido em 2) com a seguinte descrição - casa de dois pisos e logradouro, com a área coberta de 110 m2 e descoberta de 3046 m2, sendo as confrontações indicadas a norte e poente com herdeiros de FF, a sul com Rua da ... e a nascente com GG e outros, correspondente ao artigo matricial 11.

6. Na altura da realização da partilha, os herdeiros decidiram separar a parcela de terreno utilizada como caminho, referida no facto 4, que permaneceria a servir os dois prédios identificados em 1) e 2), separando-a do prédio referido em 2).

6 A. Após a realização da partilha, os autores colocaram com o consentimento do irmão e cunhado EE um portão junto à Rua da ... e colocaram ainda rede e uma cancela entre o prédio identificado em 1) e a parcela de tereno utilizada como caminho e, no fim desta parcela, onde antes estava a casa principal, foi construído um muro.

7. Tal nunca mereceu oposição, continuando a ser utilizado para acesso ao logradouro do prédio referido em 2 (onde antes se encontrava a casa dos caseiros) e para acesso aos campos e leiras do prédio referido em 1.

8. O trato da parcela de terreno utilizada como caminho era limpo pelos Autores e pelos então proprietários do prédio identificado em 2), que o tratavam como sendo seu e com exclusão de todos os outros.

9. Para aceder com tratores, maquinaria ou camiões a alguns campos e leiras que constituem o prédio dos Autores não era possível o acesso pela outra entrada do prédio pela Rua ..., atendendo ao desnível.

10. Em 16 de abril de 2020, foi vendido por HH o prédio descrito em 2) a II e esposa JJ.

11. Aquando da venda, aqueles foram esclarecidos pela vendedora e pela sociedade imobiliária, da existência da parcela de terreno em questão, utilizada como caminho, que se encontrava fora dos limites do prédio vendido e de que servia ambos os imóveis, constando tal informação da publicidade:

12. Em cinco de agosto de dois mil e vinte e um foi celebrada escritura pública de compra e venda, por via da qual, aqueles vendem aos Réus o prédio, que ficou registado a seu favor pela Ap...83, de 2021/08/09, declarando que o prédio tem efetivamente a área descoberta de 3229 m2, com uma divergência decorrente de erro de medição.

13. Ainda antes da compra, e perante a mesma informação pela mediadora imobiliária, os Réus foram informados pelo Autor da utilização daquela parcela de tereno utilizada como caminho por ambos os prédios e que não prescindiam do mesmo, nem de parte.

14. Perante a posição dos Autores, os Réus e vendedores procederam ao levantamento topográfico e alteraram a área descoberta do prédio na matriz, incluindo nesta a área correspondente à parcela de terreno utilizada como caminho.

15. Em janeiro de 2022, os Autores reforçaram a rede que ladeava o caminho, colocando junto dessa já existente uma malha ovelheira, mais perto do caminho, para defesa das ovelhas que têm no seu terreno.

16. A 28 de janeiro de 2022 os Réus remeteram uma carta para interpelarem os Autores a retirar a vedação da sua propriedade.

17. Em meados de abril de 2022, os Réus iniciaram a construção de um muro de pedra, ordenando que fossem colocadas diversas pedras no caminho, em frente ao portão que dava acesso aos campos do meio do prédio dos Autores.

18. Em 24 de maio de 2022, os Autores interpelaram os Réus, solicitando que os mesmos procedessem à retirada das pedras.

19. A 31 de maio de 2022, os Réus encostaram mais pedras junto à vedação dos Autores, impedindo o acesso à parcela de terreno utilizada como caminho e danificaram o tubo de rega dos Autores (depois reparado).

20.Os Réus, entretanto, concluíram a construção do muro, ocupando a parcela de terreno utilizada como caminho, deixando livre uma parte junto à estrada que permite acesso ao campo mais a sul.

21. A parcela de terreno utilizada como caminho vem sendo utilizada pelos Autores, Réus e anteriores proprietários, sem interrupção e de forma pacífica, mantendo o uso dado pelos proprietários da Quinta, com aproveitamento de todas as utilidades e vantagens que a mesmo lhes proporciona.

22. À vista de toda a gente, por serem os donos dos referido prédios que são servidos pela parcela de terreno utilizada como caminho.


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III. 2. DO MÉRITO DO RECURSO

REVISTA DOS AUTORES

Do reconhecimento do direito de “compropriedade” aos Autores/Recorrentes sobre a parcela de terreno, por usucapião.

A alegação dos Recorrentes é, convenhamos, no mínimo, um tanto confusa, pois se, por um lado, sustentam que os factos provados provam a compropriedade sobre a parcela de terreno que identificam como “caminho”, por outro lado – e em simultâneo – sustentam que a mesma matéria factual prova a existência de uma servidão de passagem por destinação de pai de família.

Não pode ser: ou uma coisa ou outra!

Isso mesmo é salientado, com toda a pertinência, no acórdão recorrido.

Escreveu-se ali:

“A dificuldade da apreciação da matéria de facto provada e a sua subsunção jurídica reside na forma como os autores alegaram a existência de um direito de propriedade sobre o “caminho” que identificam.

Desde logo, porque tal identificação sugere, pela própria natureza da palavra “caminho”, que os autores invocam não o direito de propriedade sobre a parcela que indicam ser caminho, mas um direito de a utilizar como caminho, o que encerra um direito real, menor, de servidão (como resulta claro do entendimento da Mm.ª Juiz titular do processo quando determinou que os autores esclarecessem o seu direito de propriedade sobre o caminho, no despacho de 06/10/2022).

E os autores parecem não perceber que para terem tal direito de servidão, tal significa que a parcela de terreno que utilizam como caminho não lhes pertence, pois que tal direito exige a existência de um prédio dominante (aquele que beneficia da servidão) e um serviente (que é precisamente o que está onerado com a servidão).

Ora, o prédio serviente e onerado pela servidão não podem ser o mesmo prédio.

Os autores retiram da descrição predial do imóvel que foi adjudicado à autora que a poente do seu prédio existe um caminho, como se de tal realidade se concluísse, sem mais, que aquela parcela de terreno confinante fosse, por tal indicação, um caminho.

Não estando em causa um caminho público – como não está porque ninguém o alega – tal caminho tem de ser, ele próprio, um prédio ou integrar um prédio.

A confusão na alegação dos autores é total.

Depois de estruturarem a sua pretensão num acordo que, como alegaram e resultou provado, se verificou aquando da partilha e, portanto, apenas em 2017, referindo que o caminho “permaneceria como sendo um caminho que serviria os dois”, por reporte aos prédios identificados em 1) e 2) da matéria de facto provada, adjudicados, respetivamente à autora e ao irmão EE (art. 26.º da petição inicial), acrescentaram no art. 17º da sua resposta à contestação “que o caminho sempre foi entendido pelos autores como parte integrante do prédio sua propriedade”.

Por outro lado, depois de alegarem que o acordo realizado aquando da partilha individualizou a parcela de terreno que era utilizada como caminho, confrontados com o despacho de 06/10/2022 (“notifique os Autores para esclarecerem, atendendo que a confrontação do seu prédio é o caminho, e atendendo que foi alegado que o caminho serve ambos os prédios, em que circunstâncias é que ele foi por eles adquirido (dos factos alegados resulta, na realidade a existência de uma servidão”), vieram alegar no art.º8º da resposta a este convite que “pelas partilhas da herança já junta na PI, sob o doc. 78, cabe a propriedade do caminho à matriz 63 e à matriz 11 (atualmente, matriz .51)”».

A Relação fundamenta assim a inexistência da alegada compropriedade:

« … o acordo verbal dos herdeiros, na data em que foi realizado, seja na primeira versão da individualização (que resultou demonstrada), seja nesta segunda versão da pertença de uma parcela de terreno a dois imóveis diferentes, não permite a constituição de qualquer direito real, como resulta do art.º 1306.º do C. Civil, tendo apenas efeitos obrigacionais.

Aquela parcela de terreno (ou o “caminho” na forma de alegação dos autores) não constitui um imóvel autónomo, não tendo os autores alegado qualquer válida desanexação daquela do imóvel (urbano) a que pertencia. O acordo dos herdeiros, que estes realizaram de forma verbal, não a torna numa coisa autónoma do prédio urbano onde se integrava e só a coisa corpórea pode ser objeto do direito de propriedade – art.º 1302.º do C. Civil.

A parcela de terreno não tem, pois, autonomia e não pode, por isso, ser objeto do direito de propriedade, sendo certo que se demonstrou que os herdeiros procuraram separá-la do prédio que foi adjudicado ao herdeiro EE e que, entretanto, foi transmitido ao réu.

E se não pode ser objeto de direito de propriedade, não pode ser de compropriedade, sendo que não estavam sequer alegados os factos que permitiam afirma-la.».

Em específico, sobre a questão de saber a que prédio pertence ou faz parte a parcela de terreno em causa (o tal denominado (pelos AA) caminho), escreveu-se no acórdão recorrido:

« Que a parcela de terreno a que os autores apelidam de caminho não integra o imóvel que lhes foi adjudicado, resulta evidente da inscrição matricial do imóvel – rústica art.º 63 – pois que, logo ali, pertencendo o imóvel desde sempre à família dos autores, a sua confrontação poente está definida como sendo com “caminho”.

Assim, se confrontava com a parcela de terreno que aqui descrevem como caminho, é porque esta não integra tal imóvel, o que acontece pelo menos desde 1997, já que ninguém referiu ter existido qualquer alteração das confrontações daquele imóvel na respetiva inscrição matricial.

Convidado a alegar os factos relativos à origem do seu direito de propriedade, o que alegaram os autores foi que “cabe a propriedade do caminho à matriz 63 e à matriz 11 (atualmente matriz .51)”.

Ora, como se retira destes documentos, esta alegação não é verdadeira em relação à matriz 63.

Veja-se que o imóvel adjudicado à autora foi vedado, por ordem dos autores, na confrontação com esta parcela de terreno, deixando do lado de fora dessa vedação a parcela de terreno identificada como caminho e que tinha, visivelmente, tais características, o que também permite concluir que a mesma não integra o prédio adjudicado à autora.

(…).

… até à partilha, nenhum elemento de prova existe, documental ou de outra natureza, que permita concluir que a parcela de terreno identificada como caminho foi autonomizada do que quer que fosse, sendo certo que, resulta da prova documental, que não integrava o prédio que veio a ser adjudicado à autora, pois que, como vimos, se este confronta com caminho é porque a parcela de terreno deste não o integra.

Foram os próprios autores que alegaram que, em relação ao imóvel que foi adjudicado à autora, este não “sofreu alterações aquando da partilha do acervo hereditário dos pais da autora mulher”, sendo certo que “nessa altura, os autores e HH e EE (…) decidiram que o caminho que se encontrava entre os prédios partilhados permaneceria como sendo um caminho que serviria os dois” (art.sº 26.º e 27.º da petição inicial).

Ou seja, tal como resultava já do articulado e se retira dos depoimentos prestados, a autonomização da parcela de terreno identificada como caminho foi sempre referida pela herdeira, cônjuge e cunhada viúva como se tendo verificado aquando da partilha, não sendo sequer um assunto em discussão entre as partes, resultando do levantamento topográfico que a viúva do herdeiro EE exibiu em audiência (e que não foi junta) que aquela parcela de terreno estava fora dos limites do imóvel que veio a ser adjudicado ao marido, perfeitamente identificados, e deixando de fora, na confrontação com o prédio adjudicado à autora, a parcela que todos identificam como caminho e que sempre teve, notoriamente, tais características.

(…)

Sabemos que a parcela de questão não pertencia ao prédio que foi adjudicado à autora (pelas razões acima expendidas).

E pertencia ao prédio que, pela partilha, foi adjudicado ao irmão EE?

Ora, não temos dúvidas que, no contexto dos autos, atenta a sua localização, se foi então individualizado, no sentido de ter sido separado, foi-o de algum prédio e, assim, não sendo do que foi adjudicado à autora, só poderia sê-lo do que veio a ser adjudicado ao irmão EE.

Note-se que são os próprios autores que reconhecem que “cabe a propriedade do caminho à matriz 11 (atualmente matriz .51)”, embora afirmem idêntico direito à matriz 63 (como resulta do art.º 17/10/2022), tendo, aquela primeira afirmação carater confessório, porque desfavorável à versão que apresentam nos autos.».

Não vemos, pois, como não dar razão ao acórdão recorrido, ao concluir que não resultou da matéria de facto provada qualquer forma de aquisição derivada da parcela de terreno em causa, sequer a sua desanexação/individualização do prédio a que pertencia, pois não é qualquer acordo verbal dos herdeiros que vai converter tal parcela de terreno numa coisa corpórea susceptível de ser objecto do direito de propriedade e consequentemente de compropriedade.


*

Sem embargo, sempre se dirá que, nunca estariam preenchidos os pressupostos da usucapião, tendentes à aquisição da pretensa propriedade da parcela por banda dos AA.

Com efeito – como bem observam os RR/Recorridos –, tendo a desanexação dos prédios dos autores e dos réus, da descrição .31/...0...30529, tido lugar em 2015 e sendo que desde essa data e até às partilhas, em 2017, todos os prédios se encontravam registados em nome de todos os herdeiros, em comum e sem determinação de parte ou direito, é claro que antes de 2017 (altura das partilhas) não se pode falar em actos de posse dos herdeiros, seja sobre o caminho, seja sobre qualquer dos prédios da herança, na medida em que enquanto co-herdeiros são meros titulares de uma quota ideal sobre o total da herança e não proprietários dos bens da herança.

Da mesma forma, até à partilha não podem os AA (ou qualquer dos herdeiros) invocar direito de compropriedade sobre tais bens da herança indivisa, pois, como dito, apenas detêm uma quota ideal sobe a herança no seu todo.

Com efeito, como diz A. VARELA1, compropriedade ou propriedade em comum existe sempre que duas ou mais pessoas sejam simultaneamente contitulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa. É a situação de titularidade plural do direito de proprieda­de sobre uma coisa (art. 1403). Essa situação dá a cada comproprietário faculdades sobre a coisa no seu todo, mas não sobre partes especificadas da coisa (art. 1408).

Tal como se não pode falar numa comunhão pro indiviso – esta que se caracteriza pelo facto de aos contitulares pertencerem direitos de propriedade distintos sobre fracções individualizadas da coisa comum2. Como ensina HENRIQUE MESQUITA3, verifica-se esta modalidade quando a cada consorte fica pertencendo uma parte certa, fisicamen­te determinada, do objecto comum. Ela é admissível quando reportada a situa­ções de comunhão em que o uso da coisa, por força da lei ou do negócio jurídico, se encontra dividido entre os consortes. Mas se a divisão ou fraccio­namento se referirem ao próprio domí­nio, se a cada consorte pertencer, em propriedade, uma certa fracção do objecto já não há comunhão, mas uma situação que nada diverge da proprie­dade exclusiva.

Ora, não sendo o herdeiro comproprietário, não são aplicáveis à herança indivisa, não partilhada, os princípios da propriedade comum.

Logo os herdeiros até à data da partilha, não podiam exercer actos de posse sobre qualquer dos bens que integram a herança.

Consequentemente, a existir actos de posse sobre o caminho, estes nunca podiam verificar-se antes da data da partilha (2017).

Assim se vê, à saciedade, que nunca a pretensão dos AA de reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o caminho, por via da usucapião, se poderia verificar, atento o prazo para usucapir previsto no artº 1296º do CC.

Mas mais: tendo a utilização da parcela de terreno (o alegado caminho) em questão resultado de um acordo entre os herdeiros EE e AA, não pode falar-se em actos de posse da banda de tais herdeiros. Temos, apenas, um acordo que se obrigaram a respeitar.

Assim improcede a pretensão dos AA/Recorrentes em que lhes seja reconhecido o direito de “compropriedade” sobre a parcela de terreno, por via da usucapião.

I.Do direito de indemnização aos Autores/Recorrentes por força do comportamento dos RR/recorridos em impedir o acesso dos Recorrentes ao seu terreno

A improcedência da questão anterior conduz, fatalmente, à improcedência desta outra questão: o pedido indemnizatório formulado pelos AA estava (exclusivamente) relacionado com a alegada violação do direito de propriedade que os autores imputavam aos réus. Nada mais alegaram que pudesse estribar tal pretensão.

Isso mesmo é bem explicado pelo acórdão recorrido:

“Como se conclui do requerimento dos autores de 17/11/2022, o reconhecimento do direito de servidão foi formulado a título subsidiário em relação a todos os demais pedidos formulados, incluindo o pedido de indemnização (naquele requerimento todos os pedidos iniciais estão elencados de a) a e) e o pedido subsidiário consta como alínea f), depois da expressão “ou caso assim não se entende”.

Daqui se retira que a pretensão indemnizatória deduzida estava relacionada com a alegada violação do direito de propriedade que os autores imputavam aos réus, não estando deduzida idêntica pretensão caso se reconhecesse que o direito violado era o seu direito de servidão.

Não existindo tal direito de propriedade, a conduta dos réus não o violou e, como tal, não existe a conduta ilícita que foi alegada para fundamentar a referida pretensão indemnizatória.

(…)Ainda que não fosse este o entendimento do Tribunal, temos como claro que não resultam demonstrados quaisquer dos danos não patrimoniais alegados (face à eliminação do facto provado no ponto 23) e muito menos a sua relação com este direito de servidão agora reconhecido, sendo certo que a mera privação do uso de passagem pela parcela de terreno utilizada como caminho não está alegada como fundamento de qualquer dos danos alegados e não pode assim, fundamentar qualquer pretensão indemnizatória com base no instituto da responsabilidade civil.” destaques nossos.

Assim sendo – e sem mais delongas – , improcede esta questão.

REVISTA DOS RÉUS

Do preenchimento dos pressupostos legais para a existência de servidão de passagem por destinação de pai de família.

Sustentam os RR/Recorrentes que não existe servidão de passagem por destinação de pai de família, dado que, a seu ver, a matéria de facto não permite considerar preenchidos todos os seua pressupostos ou requisitos – mais precisamente, discordam os recorrentes quanto ao requisito da existência de “sinais visíveis e permanentes” (ut artº 1549º do CC).

Sem razão, porém.

Um caso de servidão que tem merecido especial atenção na doutrina e jurisprudência é a servidão por destinação de pai de família4 (artº 1549º5).

A servidão por destinação do pai de famí­lia tem lugar na divisão de imóveis. E porque é na divisão de imóveis da massa hereditária que vul­garmente ela se constitui, por virtude do "de cujus" ter criado uma determina­da situação de facto sobre um prédio e em proveito doutro, daí o dar-se-lhe aquela denominação6.

Em causa neste tipo de servidão, está apreciar a relevância jurídica de actos de afectação de utilidades de um prédio (ou de uma fracção de um prédio) em benefício de outro prédio (ou de outra fracção do mesmo prédio), praticados pelo proprietário de ambos.

Se antes da alienação algum dos prédios desempenhasse ostensivamente (a lei fala de “sinais visíveis e permanentes”) uma função de serventia em relação ao outro, o titular do prédio em benefício do qual a serventia se dá terá direito à constituição de uma servidão com o mesmo conteúdo que antes já tinha. Só assim não será caso o contrário seja estipulado no documento que formalize a alienação em causa.

Em vista do clássico princípio, que exclui a servidão sobre coisa própria (nemini res sua servit), na verdade, aqueles actos de afectação de utilidades de um prédio a outro não podem ser fonte de uma verdadeira servidão, daí a terminologia a esse respeito utilizada pelo legislador, ao falar apenas em “serventia de um para com outro…”.

Deste modo, são três os pressupostos (ou requisitos) para a aquisição da servidão por destinação do pai de família:

i. que os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio, tenham pertencido ao mesmo dono; ii) que exista uma relação estável de serventia de um prédio a outro ou de uma fracção a outra correspondente a uma servidão aparente revelada por sinais visíveis e permanentes; e iii) que tenha existido uma separação dos prédios ou fracções em relação ao domínio, inexistindo qualquer declaração no respectivo documento contrária à constituição do encargo7.

O primeiro dos referidos pressupostos consiste em que os dois prédios tenham pertencido ao mesmo dono, sendo irrelevante que os dois prédios sejam rústicos ou um rústico e outro urbano, sendo igualmente irrelevante a aplicação que seja dada a cada um deles. Por outro lado, os prédios não têm de ser contíguos entre si8.

Assim, a servidão constitui-se desde que exista uma relação de serventia entre os dois prédios que deixam de ter o mesmo dono9, sendo essencial que os dois prédios tenham sido pertença da mesma pessoa.

Por outro lado, para a constituição de servidão por destinação do pai de família é indispensável a existência de sinal ou sinais no momento da transmissão dos prédios, sendo este um elemento um requisito fundamental da constituição dessa mesma servidão por destinação do pai de família10.

Quanto ao terceiro requisito, anote-se que é irrelevante a declaração não constante do próprio documento da separação do domínio, tendo o legislador entendido que a presunção derivada dos sinais só deveria reputar-se destruída pela previsão expressa de cláusula contrária ao encargo, excluindo-se quaisquer outros documentos11.

A transformação da serventia em servidão só se torna viável, portanto, quando, como diz o citado artº 1549º, «os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio vierem a separar-se».

E tanto faz, para efeitos do seu regime, que o proprietário divida o prédio em que existem esses sinais, alienando, uma das partes, ou aliene um dos prédios já autónomos12. Sendo que a separação de domínios pode dar-se por qualquer título negocial (compra e venda, doação, permuta, partilha, testamento, etc) ou por outro título de transmissão (v.g., expropriação, usucapião, etc)

Para que possa ter lugar essa transformação da serventia em servidão predial, além da já referida alienação de um dos prédios ou de uma das parcelas, torna-se naturalmente necessário que a serventia seja patente por si mesma, mediante «sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos os prédios», revelando qual deles suporta a serventia – a serventia deve, pois, ser aparente. Mas não se deve olvidar que esses sinais devem revelar uma situação estável, mostrando que foram postos com intenção de assegurar a serventia de um para outro prédio (ou de uma fracção para outra), com carácter de permanência; tais sinais devem revelar de uma forma inequívoca uma relação ou situação estável de serventia de um prédio para com o outro, devem ser permanentes e com a expressa inferência que foram postos ou deixados com a intenção de assegurar uma certa utilidade a um à custa ou por intermédio do outro.

Se pode questionar-se da exigibilidade da prova de uma vontade subjectiva do proprietário ou proprietários de constituição da relação de serventia, o certo é que – como é referido no ac. do STJ proferido na revista nº 1021/15.4T8PTG.E1.S1 – “.não se dispensa a prova de sinais que revelem “a vontade ou consciência de criar uma situação de facto estável e duradoura, uma situação que objetivamente corresponda à de uma servidão aparente”.

Note-se que, como escreveu Carlos Gonçalves Rodrigues13, “enquanto os dois prédios ou as duas fracções pertencem ao mesmo dono, não se pode falar, [...], em servidão, existindo apenas uma situação de facto que não tem qualquer significado jurídico, pois o proprietário ao gozar as utilidades usa do direito de domínio e não do direito de servidão, só o podendo vir a ter na hipótese dos dois prédios ou das duas fracções se virem a separar14, pois é neste momento que a servidão latente e causal, passa a ser aparente e formal15”.

Sobre esta matéria, pode ver-se ainda, com interesse, a Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 80º-186 ss.

Por outro lado, é, de todo, irrelevante os sinais visíveis e permanentes terem sido produzidos no prédio pelo proprietário antecedente, ou por outro ainda anterior a este, ou ainda por um usufrutuário ou locatário – sendo certo, porém, que as coisas não eram assim tratadas no Código de 1867, pois um dos requisitos para que se verificasse a servidão por destinação de pai de família (ut artº 2274º) era que os sinais visíveis e permanentes fossem postos “por ele” dono – “ou pelos seus antecessores”16.

Os sinais aparentes e permanentes (anotando-se que embora os sinais tenham de ser permanentes, pode dar-se a sua substituição ou transformação17) serão havidos como prova de servidão, se ao tempo da separação outra coisa se não houver declarado no respectivo documento. Trata-se de uma declaração (a que se refere a última parte do artº 1549º do CC vigente e que já era referida na última parte do artº 2274 do CC de 1867) de capital importância, pois, como já ensinava GUILHERME MOREIRA18, a mesma “pode ser [....] quanto à não subsistência dos encargos atestados por sinal ou sinais aparentes e permanentes, expressa, determinando-se que directamente ficam extintas determinadas servidões, ou consistir em alterações que no modo de ser do prédio sejam feitas ou tenham de efectuar-se em virtude desse título e que pressupunham a supressão de determinados encargos” – sublinhado nosso19.

Aliás, é importante realçar que a declaração em contrário constante do documento há-de ser feita de forma especialmente clara e terminante, não bastando dizer-se que o prédio se encontra livre de qualquer encargo, quando se aliena o prédio serviente.

Dito de outra forma: sendo voluntária20 a servidão constituída por destinação de antigo pai de família, nela se presume que transmitente e adquirente quiseram que se perpetuasse a situação existente no tempo da separação. Nada sendo dito em contráriono respectivo documento” (artº 1549º CC), é irrelevante qualquer declaração não constante do próprio documento da separação do domínio, pois entendeu o legislador que a presunção (ilidível, portanto) derivada dos sinais – nessa data existentes – , só deveria reputar-se destruída por esta forma, excluindo-se quaisquer outros documentos.

E se para que no acto de separação não nasça a servidão, é essencial que seja aposta no documento, que lhe dá forma, uma cláusula contrária à sua constituição, tal conclusão não se pode inferir de um qualquer comportamento. Ou seja, a lei não se basta com uma declaração tácita21

Como seguro, temos que a existência dos sinais visíveis e permanentes se deve reportar ao tempo da separação do domínio dos prédios.


**

Regressando ao caso, não há dúvidas que os 1º e 3º requisitos deste tipo de servidão estão verificados: i) como resulta do ponto 1, 2 e 5 dos factos dados como provados, os dois prédios em questão pertenciam, aquando da partilha, a um mesmo proprietário, a saber, a autora e os restantes herdeiros da herança aberta por óbito de FF; ii) não há na escritura de partilha nenhuma declaração oposta à constituição do encargo, encontrando-se assim preenchido (donde não ser possível ilidir a presunção estabelecida no referido artº 1549º do CC).

Resta o 2º requisito: existência de uma relação estável de serventia de um prédio a outro correspondente a uma servidão aparente revelada por sinais visíveis e permanentes.

Temos como acertado o entendimento do acórdão recorrido, de que os factos provados permitem concluir pela verificação desse requisito – assim rematando pela existência da servidão em causa.

Efectivamente, os factos provados mostram tais sinais visíveis, a revelar uma situação estável, mostrando que foram postos com intenção de assegurar a serventia para ambos os prédios, antes pertencentes ao mesmo dono, com óbvio carácter de permanência, sendo claro que foram postos ou deixados com a intenção de assegurar uma certa utilidade a um à custa ou por intermédio do outro.

Efectivamente, parece evidente que a concreta configuração do “caminho” revela caraterísticas inerentes a um uso sedimentado ou efectivo do mesmo, de forma que qualquer pessoa pode apreender que aquele é um local de passagem habitual, pelo menos para os prédios de Autores e Réus.

Ou seja, tais sinais que o referido “caminho” revela, permitem visualizar com clareza a existência de uma relação estável de serventia do prédio dos AA.

Atente-se, em particular, nos seguintes factos provados:

«… 4. O acesso aos campos da quinta, instalações agrícolas, casa dos caseiros e feitor, num cumprimento de cerca de 75 metros, sempre foi feito por uma parcela de terreno utilizada como caminho, em terra batida caminho de terra batida desde a rua da ..., no sentido sul-norte e com cerca de 3 metros de largura.

(...)

7. Tal nunca mereceu oposição, continuando a ser utilizado para acesso ao logradouro do prédio referido em 2) (onde antes se encontrava a casa dos caseiros) e para acesso aos campos e leiras do prédio referido em 1.

(...)

9. Para aceder com tratores, maquinaria ou camiões a alguns campos e leiras que constituem o prédio dos Autores não era possível o acesso pela outra entrada do prédio pela Rua ..., atendendo ao desnível.

10. Em 16 de abril de 2020, foi vendido por HH o prédio descrito em 2« - isto é, o prédio que “foi adjudicado ao herdeiro EE” – «a II e esposa JJ”.

11. Aquando da venda, aqueles foram esclarecidos pela vendedora e pela sociedade imobiliária, da existência da parcela de terreno em questão, utilizada como caminho que se encontrava fora dos limites do prédio vendido e que servia ambos os imóveis, constando tal informação da publicidade.

(...)

13. Ainda antes da compra, e perante a mesma informação pela mediadora imobiliária, os Réus foram informados pelo Autor da utilização daquela parcela de terreno utilizada como caminho por ambos os prédios e que não prescindiam do mesmo, nem de parte22.

A visibilidade dos sinais respeita à sua materialidade, no sentido de serem percecionáveis e interpretáveis como tais, pela generalidade das pessoas que se confrontem com eles e a permanência consiste na manutenção dos sinais, com a aludida visibilidade, ao longo do tempo, sem interrupções (pelo menos nos casos em que a ausência temporária dos sinais torne equívoco o seu significado), por modo a gerar e manter a ideia de que se trata de uma situação estável e duradoura e, ao mesmo tempo, afastar a hipótese de se tratar de uma situação precária, podendo tais sinais, no entanto, ser alterados ao longo do tempo ou substituídos por outros23.

Como acima dissemos, a existência dos sinais visíveis e permanentes deve-se reportar ao tempo da separação do domínio dos prédios24.

E como visto, à data da partilha já se reconhecia a existência do caminho, referido no ponto 4 dos factos provados, que servia os prédios deferidos nos pontos de facto 1) e 2), sendo utilizado do modo descrito pelos Autores e, outrossim, pelos Autores da sucessão, continuando tal parcela a ser utilizada, como sendo um caminho, pelos seus herdeiros e de forma ininterrupta (caminho esse com cerca de 75 metros e 3 metros de largura que, portanto, sempre foi assim utilizado para acesso aos campos da quinta, instalações agrícolas, casa dos caseiros e feitor).

Como refere LUÍS MENEZES LEITÃO25 ”Um exemplo de sinal visível e permanente será, na servidão de passagem, a existência de uma abertura ou carreiro, pelo qual a passagem se exerce. Qualquer pessoa pode ver esse sinal e o mesmo permanece, ainda que a abertura ou carreiro possam ser modificados".

Assim, perante a clareza e expressividade dos factos provados, temos como seguro o preenchimento do requisito da existência de sinais visíveis e permanentes próprios da servidão de passagem (in caso por destinação de pai de família).

Note-se que, como ensinam PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA26, se “os sinais forem equívocos ou ambíguos quanto ao tipo de servidão, é admissível o recurso a outros elementos de prova para esclarecer o seu exacto significado” – como, naturalmente, fez o tribunal, recorrendo também à prova testemunhal para melhor perceber o exacto significado do dito caminho.

Perante os factos assentes, cremos dever aceitar que o acordo relativo à separação da parcela de terreno em causa – que, como visto, sempre foi utilizada como caminho – do prédio em que estava integrada, visando-se, dessa forma, assegurar a sua utilização em benefício do prédio mãe e do prédio confrontante com essa parcela, constituiu sinal visível e permanente bastante para se poder concluir pela constituição de servidão de passagem por destinação de pai de família.

Em jeito de remate, diríamos que um bonus pater familias se visitasse os prédios seguramente que reconheceria ali a existência de uma servidão, nos sobreditos termos.

Assim, também improcede esta pretensão recursória.


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IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedentes os recursos e, consequentemente, negar ambas as revistas, mantendo-se o decidido no Acórdão da Relação.

Custas das revistas a cargo dos respectivos recorrentes.

Lisboa, em 18.06.2024

Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator)

Emídio Santos (Juiz Conselheiro 1º adjunto)

Paula Carvalho (Juíza Conselheira 2º Adjunto)

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1. Revista de Leg. e de Jur., 115º-68.

2. P. LIMA e ANTUNES VARELA, C. C. Anot, 1 ed., 3.°-318

3. In R.D.E.S., XXIII - 144. '

4. Ver MANUEL HENRIQUE MESQUITA, in R.L.J., 3936, ano 135, Janeiro/Fevereiro de 2006, pp. 145 ss (em anotação ao Ac. STJ de 20.05.05).

5. Que reza assim: "Se em dois prédios do mesmo dono, ou em duas fracções de um só prédio, houver sinal ou sinais visíveis e permanentes, postos em um ou em ambos, que revelem serventia de um para com outro, serão esses sinais havidos como prova da servidão quando, em relação ao domínio, os dois prédios, ou as duas fracções do mesmo prédio, vierem a separar-se, salvo se ao tempo da separação outra coisa se houver declarado no respectivo documento.".

6. PIRES DE LIMA, Dir. Reais, 3ª ed., 320.

7. Cfr., inter alia, Acórdãos da Relação do Porto, de 10-02-2003 e 21-04-2005, ambos publicados em www.dgsi.pt.

8. Acórdão da Relação do Porto, de 03-06-97, CJ, III, página 201.

9. A. VARELA, RLJ, ano 115º, p.222.

10. Neste sentido, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 19-10-1996, BMJ, 430, página 352 e de 02-11-1988, CJ, 1988, V, página 65.

11. Cfr. MÁRIO TAVARELA LOBO, in Manual do Direito de Águas, Volume II, Coimbra Editora, 2ª Edição, página 245; no sentido ainda de que a cláusula contrária a constituição do encargo não se basta com uma declaração oral, veja-se PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, 2ª Edição, página 635.

12. Por vezes distingue-se aqui duas modalidades diferentes de aquisição, falando-se, então, no primeiro caso, de destinação de pai de família e, no segundo caso, de destinação do antigo proprietário.

  Não se vê qualquer interesse prático nessa destrinça.

13. Da Servidão Legal de Passagem (Separata do volume XIII do Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra), Almedina, a pág. 93.

14. PIRES DE LIMA, Lições de Direito Civil (Direitos Reais), publicadas por DAVID FERNANDES, 4ª ed., a pág. 332.

15. DIAS FERREIRA, Cód. Civil Português Anotado, IV, 229.

16. Cfr., MOTA PINTO, Direitos Reais, a pág. 323 e RDES nº 21, a pág. 137 e Ac. STJ in Col./STJ 1996, 3º, a pág. 101.

17. Neste sentido, GONÇALVES RODRIGUES, Da Servidão Legal de Passagem, Coimbra,1962, p. 96.

18. As Águas no Direito Civil Português, vol. II, a pág. 102.

19. Na obra e local acabados de citar se refere, como exemplo de alteração da servidão a fazer no referido documento, o caso de haver uma servidão de passagem de um prédio para outro pertencente ao mesmo proprietário e no referido título de separação declarar-se que a servidão será exercida sobre o mesmo prédio, mas por outro local.

20. Há, porém, quem assim não entenda (cfr. Parecer de Menezes Cordeiro, Servidões Legais e Direito de Preferência, in Col. Jur. , 1992, I, a págs 64 segs, em especial pág. 75).

  De especial interesse neste aspecto, ver o Ac. do STJ de 14.11.1996, Col. Jur./STJ Ano IV, T. III, a págs. 101 segs. que, embora abordando particularmente a questão da servidão de passagem por destinação de pai de família no caso de Venda em Hasta Pública, contém um voto de vencido assaz desenvolvido onde, com o fito de nos dar conta do fundamento da constituição dessa servidão, discorre acerca das duas posições sobre essa matéria: a tradicional, de carácter subjectivista, que explica a constituição da servidão fundamentando-a na vontade tácita ou presumida do proprietário dos dois prédios ou do prédio que se divide—daquele que seja proprietário no momento em que se procede à separação dos domínios--, posição essa que foi consagrada no CC português de 1867, nas legislações francesa, espanhola e italiana anterior ao “Codice Civile” de 1942, e veio a ser mantida em vigor pelo legislador do CC Portugês de 1966; a posição objectivista, que surge com o CC Italiano de 1942, segundo a qual, a transformação da situação de facto em situação legal tem o seu fundamento na própria lei, na vontade do legislador, e não na vontade do proprietário (cfr. Biondo Biondi, “Le servitú”, in “Trattato do Diritto Civile e Commerciale”, dirigido por Cicu e Messineo, XII).

21. Cf. Ac. STJ de 13.11.2003, processo n.º 03B3029.

22. Destaques nossos.

23. Neste sentido, PIRES DE LIMA /ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Vol. III, 2.ª edição, reimpressão. Coimbra Editora, 1987, pág. 630 e GUILHERME MOREIRA, quando referiu que «o que é sempre indispensável é a permanência de sinais ou obras, podendo dar-se a sua substituição ou transformação (As Águas no Direito Civil Português, Vol. II (Das Servidões das Águas). Coimbra Editora, 1960, pág. 83).

24. Assim também, v.g., o ac. STJ de 26.11.2020, proc. 2607/17.8T8BRG.G1.S1, disponível em www.dgsi.pt

25. Direitos Reais, pág. 43.

26. Código Civil Anotado, cit., p. 633.