Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 6.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANA RESENDE | ||
Descritores: | ADMISSIBILIDADE DE RECURSO REVISTA EXCECIONAL OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS CONTRADIÇÃO ACORDÃO FUNDAMENTO TRÂNSITO EM JULGADO CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO REJEIÇÃO DE RECURSO | ||
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Data do Acordão: | 12/19/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA (COMÉRCIO) | ||
Decisão: | RECLAMAÇÃO INDEFERIDA. | ||
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Sumário : | I- Interposto recurso de revista excecional, por julgados contraditórios o Acórdão fundamento suscetível de poder desencadear o recurso apontado, tem de estar devidamente certificado e transitado em julgado, desde logo na observância dos termos formais, mas também, quanto aos substanciais, com vista a aferir da existência do facto gerador da dissidência, o que apenas se pode concluir, de igual modo, quando haja uma decisão definitiva sobre o objeto da ação. II- A aferição apenas pode ser feita perante uma certidão ou cópia certificada do Acórdão fundamento, com nota de trânsito em julgado, e não perante uma cópia de um repositório jurisprudencial como é a base de dados da DGSI. III- Incumprido o ónus de apresentação, não tendo sido dado cumprimento ao convite formulado para suprir a falha verificada, tal importa a rejeição do recurso excecional de revista apresentado. IV- O Tribunal não pode suprir essa omissão, através dos meios informáticos de suporte à sua atividade, suprindo o ónus impendente sobre a Recorrente, não só face à autorresponsabilização das partes, decorrente do princípio do dispositivo, como também pela imperiosa equidistância que o julgador deve manter em relação às mesmas. Ana Resende | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 6ª SECÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I - RELATÓRIO 1. BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A. veio deduzir execução para pagamento de quantia certa, contra JESSIMO – SOCIEDADE IMOBILIÁRIA, LDA., solicitando o pagamento da quantia de 67.888,56€, acrescida de juros remuneratórios e moratórios, relativamente a contratos de mútuo com garantia hipotecária celebrados com AA e BB, que não satisfizeram todas as prestações a que se vincularam, tendo vendido os imóveis hipotecados e dados em garantia à aqui executada, e assim por ser a legítima dona e possuidora dos mesmos, não respondendo pelas dívidas decorrentes das responsabilidades assumidas pelos mutuários, mas pelas garantias dadas sobre os imóveis a favor da Exequente. 2. A Executada alegando que fora declarada a insolvência dos devedores e concedida de forma definitiva a exoneração do passivo restante aos mesmos, verificava-se a extinção dessas obrigações, causa da extinção de hipotecas, com o cancelamento do respetivo registo que pretendia fosse ordenada. 3. Foi proferido Despacho que indeferiu o requerido. 4. Inconformada veio a Executada interpor recurso de apelação, sendo proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto de 9.02.2023, que indeferindo a pretensão da Recorrente, confirmou a Decisão recorrida. 5. Novamente inconformada, veio a Executada interpor recurso para este Tribunal, formulando nas suas alegações as seguintes conclusões: (transcritas) 1ª- O recurso é admissível dado que o douto acórdão recorrido se mostra em contradição com um outro, igualmente douto, datado de 07/12/2018 e transitado em julgado, proferido pelo distinto Tribunal da Relação do Porto no domínio da mesma legislação, no âmbito do processo n.º 16211/18.0T8PRT.P1 da ... Secção, versando a mesma questão de direito, sobre a qual não foi proferido acórdão de uniformização de jurisprudência. 2ª- O douto acórdão recorrido sentencia que, para que a responsabilidade do terceiro se mantenha, não é necessário que ele seja garante da obrigação, e, por sua vez, o acórdão fundamento sentencia que, para que a responsabilidade do terceiro se mantenha, é necessário que o terceiro seja garante da obrigação. 3ª- A mera reprodução do teor do relatório do acórdão equivale à inexistência, ou falta absoluta da fundamentação da matéria de facto tida por provada e por não provada, pois que não se vislumbram os factos tidos por provados e não se vislumbram os factos tidos por não provados, o que viola o estatuído nos n.ºs 3 e 4 do artigo 607.º do C.P.C., e é causa do vicio consignado na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do mesmo diploma, que se argui. 4ª- Não sendo terceira garante da obrigação, a executada não está abrangida pela exceção contida no n.º 4 do artigo 217.º, aplicável ex vi artigo 245.º, n.º 1 in fine, ambos do C.I.R.E., pelo que o despacho final de exoneração do passivo dos devedores extingue a execução. 5ª- A extinção da dívida é causa de extinção da hipoteca, e, por conseguinte, da execução, em virtude da inexistência superveniente do título. 6. Habilitada em substituição do Exequente, M....... ......., S.A. veio apresentar contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: (transcritas) A. O recurso deverá, salvo douto entendimento, ser rejeitado por inexistência de contradição entre Acórdãos, isto é, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no âmbito do processo 16211/18.0T8PRT.P1 não está em contradição com o proferido nos presentes autos, na medida em que versam diferente legislação e diferente “…questão fundamental de direito,…”, não sendo aplicável a c) do artigo 672º CPC. B. Isto porque, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no âmbito do processo 16211/18.0T8PRT.P1 diz respeito a Processo Especial de Revitalização (PER)/Insolvência e a procedimento cautelar comum e o Acórdão dos presentes autos versa sobre a extinção ou não de execução de terceiro garante após a exoneração do passivo restante dos mutuários. C. De igual forma, consideramos dever ser rejeitado o recurso por ter sido apresentado de forma extemporânea, isto é, no prazo de 30 dias e não de 15 dias por aplicação do disposto na alínea a) do artigo 673º conjugado com o artigo 677º, ambos do CPC. D. Conforme Acórdão do Tribunal da Relação expressamente refere, para “garantia de todas as responsabilidades assumidas no mútuo” celebrado a 2/07/1999 e a 28/04/2003 com AA e BB “…foi constituída hipoteca a favor do exequente sobre o prédio urbano, composto por casa de r/c, andar e logradouro, sito no Lugar de ..., descrito na C. R. P. com o n.º 1427 e inscrito na respetiva matriz, sob o artigo 1298.º” e, quanto ao contrato de mútuo celebrado a 25/01/2005 foi constituída “…hipoteca sobre o prédio rústico, composto de pinhal denominado "...", sito no Lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na CRP deste concelho com o n.º 133 e inscrito na respetiva matriz sob o artigo 3218º” E. O douto Acórdão recorrido refere igualmente que “os mutuários venderam os imóveis à empresa Jessimo - Sociedade Imobiliária, Lda., razão pela qual, a empresa Jessimo -Sociedade Imobiliária, Lda. é aqui executada, na qualidade de legítima dona e possuidora dos imóveis.” F. Pelo que, conclui o douto Acórdão do Tribunal da Relação “a ora executada não responde pelas dívidas dos mutuários, provenientes das responsabilidades supra referidas, mas sim pelas garantias dadas sobre os imóveis, a favor do aqui exequente, nos termos do disposto no artigo 735.º, n.º 2, do C. P. C” (último ponto do “Relatório”). G. Assim, as hipotecas e penhora do imóvel mantêm-se válidas e eficazes perante o terceiro adquirente/Recorrente que é o atual proprietário e possuidor do bem já anteriormente onerado com hipotecas. H. A Lei prevê exceções ao “objeto da execução” aplicando-se ao caso sub judice, tal como indicado pelo Acórdão recorrido, o disposto no artigo 818º, no n.º 1 e n.º 2 do artigo 735º CPC conjugado com o n.º 2 do artigo 54º todos do CPC, os quais preveem a possibilidade de bens de terceiros responderem se a execução derivar de dívida com garantia real e o exequente pretender fazer valer a garantia (“…o exequente, querendo fazer-se pagar do seu crédito, pode executar bens de terceiro que estejam a garantir esse pagamento, no caso, penhorar e vender bens da executada/recorrente que estão hipotecados como garantia do pagamento da dívida dos sempre indicados mutuários”). I. Relativamente aos efeitos da exoneração do passivo restante dos mutuários e seus efeitos na execução contra terceiro, conforme decidiu o douto Acórdão recorrido: “Nos termos do artigo 217.º, n.º 4, ex vi artigo 245.º, n.º 1, parte final, ambos do C. I. R. E., não se extingue a execução movida contra terceiro garante por força da prolação de despacho final de exoneração passivo dos devedores.” Sublinhado nosso. J. Como fundamento o douto Acórdão recorrido conjuga o disposto no n.º1 do artigo 245ºcom o n.º 4 do artigo 217º ambos do CIRE ao referir expressamente “…as providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afetam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência, designadamente os que votem favoravelmente o plano, contra os codevedores ou os terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas podem agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos – nosso sublinhado –“. K. Pelo que, sufragamos a “visão” do douto Acórdão recorrido quando refere: “…a lei não permite que a execução se extinga1 e, por isso, também as penhoras sobre os imóveis se têm de manter (só se execução se extinguisse neste momento – que no fundo é o que a executada pretende - é que a mesmas teriam de ser levantadas; já a hipoteca só seria cancelada se houvesse venda executiva, conforme artigo 824.º, n.º 2, do C. C.-)”, isto é, independentemente da exoneração do passivo dos mutuários o terceiro garante continua a responder pelas dívidas na medida em que possui na sua esfera bens imóveis onerados com hipotecas (anteriormente registadas) e penhora. L. Em guisa de conclusão, a execução deverá prosseguir com a venda dos imóveis hipotecados e penhorados de modo a ser o credor ressarcido com a venda dos bens dados em garantia independentemente de estes se encontrarem na esfera jurídica de terceiro, in casu, Recorrente. 6. Foi proferido despacho convidando a Recorrente a juntar aos autos cópia certificada do Acórdão fundamento com nota de trânsito em julgado, bem como notificada nos termos do art.º 655, n.º1, do CPC, nada vindo juntar ou dizer. 7. Foi proferida Decisão singular que não conheceu do objeto do recurso. 8. A Recorrente veio reclamar para a Conferência, invocando que a não junção de cópia certificada com nota de trânsito em julgado do acórdão fundamento não pode constituir fundamento para a não apreciação do recurso, pois sendo certo que esse trânsito em julgado consubstancia requisito da admissão da revista, deveria ter sido solicitado o acesso pelo sistema informático de suporte à atividade dos tribunais ao processo devidamente identificado onde foi proferida tal acórdão fundamento, sendo a omissão aludida a causa do não conhecimento do recurso. 9. A Recorrida pronunciou-se no sentido do decidido na Decisão singular. II – APRECIANDO 1. Na Decisão singular consignou-se: “Vem a Executada interpor recurso de revista excecional, nos termos do art.º 672, n.º 1, c), do CPC, por julgados contraditórios no concerne ao proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 9.02.2023, e o aresto desse mesmo Tribunal de 7.12.2018, processo n.º 16211/18.0T8PRT.P1. Elege como questão fundamental de direito, a “não afetação do crédito hipotecário em caso de terceiro garante da obrigação, por aplicação do disposto no n.º 4 do artigo 217.º, do CIRE”, sob a indicação que no acórdão fundamento foi obtida decisão diversa. Ora, o Acórdão fundamento suscetível de poder desencadear o recurso apontado, tem de estar devidamente certificado e transitado em julgado, desde logo na observância dos termos formais, face ao disposto no art.º 619, n.º1, do CPC, mas também, quanto aos substanciais, com vista a aferir da existência do facto gerador da dissidência, o que apenas se pode concluir, de igual modo, quando haja uma decisão definitiva sobre o objeto da ação, pelo que configura-se que tal aferição apenas pode ser feita perante uma certidão ou cópia certificada do Acórdão fundamento, com nota de trânsito em julgado, e não perante uma cópia de um repositório jurisprudencial como é a base de dados da DGSI. Desta forma, incumprido que se mostra o ónus de apresentação, nos termos enunciados, não tendo sido dado cumprimento ao convite formulado para suprir a falha verificada, art.º 637, n.º 2, do CPC, tal importa a rejeição do recurso excecional de revista apresentado, porquanto, antes da remessa do processo à Formação, incumbe ao Conselheiro relator aferir dos pressupostos gerais de admissibilidade do recurso e respetiva interposição, sendo certo que, também não se configurava a subsunção ao disposto no art.º 671, n.º1, e n.º 3, para poder ser admitido o recurso excecional, nos termos do art.º 672, nº 1, ainda do CPC. Acresce que não se mostra possível a convolação para o recurso de revista normal, por vedado o recurso para este Tribunal, conforme o disposto no art.º 854, do CPC, estando inviabilizada a consideração do art.º 629, n.º 2, do CPC, quer por não alegada nenhuma situação constantes das alíneas a), b) e c), nem contemplada a vertida na d), face à apontada desconsideração do indicado acórdão fundamento contraditório”. 2. Não se configura na situação sob análise, que outro deva ser o entendimento, a que assim se adere em conformidade. Aliás, se atentarmos ao alegado pela Recorrente, verifica-se que o mesmo não contradiz o vertido na decisão ora em causa, invocando tão só uma “omissão” que decorreria de este Tribunal não ter diligenciado no sentido de suprir o ónus que sobre a mesma impendia, o que como naturalmente se evidencia, não só face à autorresponsabilização das partes, decorrente do princípio do dispositivo, como também pela imperiosa equidistância que o julgador deve manter em relação às partes, não poderia ocorrer. Inexiste, deste modo, qualquer fundamento para alterar o decidido. 3. Pelo exposto indefere-se a reclamação deduzida, confirmando a Decisão singular. Custas pela Recorrente, com três UCs de taxa de justiça. Lisboa, 19 de dezembro de 2023 Ana Resende (Relatora) Graça Amaral Luís Espírito Santo
Sumário, (art.º 663, n.º 7, do CPC). |