Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
| Relator: | MÁRIO BELO MORGADO | ||
| Descritores: | RECURSO DE REVISTA EXCECIONAL ÓNUS DE ALEGAÇÃO MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA | ||
| Data do Acordão: | 10/15/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA EXCEPCIONAL | ||
| Decisão: | NÃO ADMITIDA A REVISTA EXCECIONAL | ||
| Sumário : | I. No requerimento de interposição do recurso, a recorrente refere que “vem apresentar recurso de Revista Excecional, nos termos do disposto no artigo 672º e ss. do CPC”. II. Não é efetuada qualquer outra referência à revista excecional, nem aos respetivos fundamentos legais, previstos no art. 672º, nº 1, do CPC, sendo ostensivo o total incumprimento do ónus de alegação a que alude o nº 2 do mesmo artigo. III. Desde logo por esta razão, é manifesta a inadmissibilidade da revista excecional. | ||
| Decisão Texto Integral: | Processo n.º 2922/20.3T8MTS.P1.S1 (revista excecional) Acordam na Formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC, junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça
I. 1. AA intentou ação declarativa especial emergente de acidente de trabalho contra BB, tendo posteriormente intervindo na ação também a seguradora Crédito Agrícola Seguros - Companhia de Seguros de Ramos Reais, S.A. 2. Na 1ª Instância, a ré seguradora foi absolvida, tendo, por seu turno, a ré BB sido condenada a pagar à autora: – A pensão anual, devida desde 7/3/2019, que nesse ano de 2019 corresponde valor de €2.784,25; por força das atualizações legais a pensão ascende ao montante anual de 5.137,96 € a partir de 1/1/2020, de 5.189,34 €, a partir de 1/1/2022, de 5.625,24 €, a partir de 1/1/2023 e de 5.962,75 €, a partir de 1/1/2024, acrescida de juros de mora desde a data de vencimento de cada prestação; – A quantia de 4.302,05 €, a título de subsídio de elevada incapacidade, acrescida de juros de mora, desde 7/3/2019 e até efetivo pagamento; – A quantia de 11.426,84 €, a título de prestação suplementar para assistência de terceira pessoa, já vencida, acrescida de juros de mora, desde o vencimento de cada prestação e até efetivo pagamento, prestação que, no ano de 2025, deverá ser paga em duodécimos de 174,03 €, juntamente com a prestação mensal da pensão, acrescida de igual valor de 174,03 €, aquando do pagamento dos subsídios de férias e de Natal. – A quantia de 40,00 €, a título de reembolso de despesas de deslocação. 3. Interposto recurso de apelação, o Tribunal da Relação do Porto confirmou esta decisão. 4. A ré BB veio interpor recurso de revista excecional, suscitando, em síntese, as seguintes questões: se a atividade principal da recorrente, consubstanciada na criação de animais de leite e produção de leite, está ou não abrangida pela apólice de seguro subscrita; se é admissível a oponibilidade de uma cláusula de exclusão genérica não previamente comunicada nem devidamente explicada ao segurado, em face do regime das cláusulas contratuais gerais; se estão reunidos os pressupostos legais para aplicação da responsabilidade agravada da entidade empregadora; se o valor da pensão atribuída à sinistrada justifica a remição obrigatória; e ainda se a classificação da trabalhadora como "não eventual" mas "a tempo parcial" impede a cobertura pelo contrato de seguro. A autora contra-alegou, pugnando, para além do mais, pela inadmissibilidade da revista. Decidindo. II. 5. No requerimento de interposição do recurso, a recorrente refere que “vem apresentar recurso de Revista Excecional, nos termos do disposto no artigo 672º e ss. do CPC”. Não é efetuada qualquer outra referência à revista excecional, nem aos respetivos fundamentos legais, previstos no art. 672º, nº 1, do CPC, sendo ostensivo o total incumprimento do ónus de alegação a que alude o nº 2 do mesmo artigo. Tendo o Senhor Conselheiro Relator (de turno, durante as férias judiciais) determinado a notificação da recorrente para se pronunciar, querendo, sobre a inadmissibilidade da revista, suscitada pela recorrida, veio a recorrente aludir vagamente no correspondente requerimento (pela primeira vez) às alíneas contempladas no nº 1 daquele artigo, sendo que o ónus de alegação deve ser cumprido nas alegações de recurso e não em requerimento posterior, pelo que é irrelevante o posteriormente alegado. Desde logo por esta razão, é manifesta, pois, a inadmissibilidade da revista excecional. 6. Sempre se dirá, porém, que não se vislumbra a menor fragilidade ou quebra de rigor lógico-jurídico na argumentação do Tribunal da Relação, tal como não se evidencia qualquer questão que, pela sua complexidade ou controvérsia a ela associada, demande a intervenção orientadora do STJ. Do mesmo modo, não estão em causa interesses de particular relevância social, nem se evidencia que o acórdão da Relação esteja em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido por qualquer Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça (para além de apenas ser possível invocar um acórdão-fundamento, a recorrente cita dois arestos do STJ, relativos aos requisitos responsabilidade agravada do empregador, sendo certo que, com o se explica no acórdão recorrido, o cálculo dos valores devidos a título de pensões, subsídios ou outras compensações foi efetuado nos termos gerais e não nos do art. 18º, da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro – cfr. infra nº 7). 7. Com efeito, em termos que não suscitam qualquer dúvida, afirma o acórdão recorrido: « (…) Não subsiste (…) o primeiro argumento para exclusão da responsabilidade da recorrida seguradora, ficando prejudicado o conhecimento dos demais argumentos a este propósito suscitados pela recorrente. Porém, outro é aduzido na sentença no mesmo sentido, o da falta de declaração da sinistrada como trabalhadora da autora, para efeito da sua inclusão na apólice de seguro. Quanto a esta questão alega a recorrente: 36. “A apólice em causa prevê cobertura não apenas para um trabalhador permanente, mas também para trabalhadores eventuais, categoria na qual a autora poderia ser enquadrada. 37. Note-se que o acidente ocorreu numa sexta-feira, dia em que a autora apenas ia trabalhar caso fosse necessário, conforme ficou provado em 6 dos factos provados.” Não assiste razão à recorrente quanto a este fundamento do recurso. Conforme salientado na sentença, nos termos do disposto na cláusula 5ª, nº 1, do CCT celebrado entre a CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal e a FESAHT – Feder. dos Sind. da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal, publicado no BTE nº 33, de 8 de setembro de 2007, com Portaria de Extensão nº 909/2010, de 15 de setembro, os trabalhadores abrangidos por este contrato, salvo os das profissões de apoio, poderão ser contratados com carácter permanente, sazonal, eventual e a termo. Acrescentando-se no nº 2 da mesma cláusula que se consideram trabalhadores eventuais os contratados para fazer face aos acréscimos pontuais de trabalho. Ora, face a esta definição, claramente que a sinistrada não integra o respetivo conceito, porquanto a mesma prestava trabalho regularmente, há mais de quatro meses, com horário definido, ainda que a tempo parcial, atenta a definição do art. 150º, nº 1, do Código do Trabalho. E isso não se altera com a matéria que consta do facto provado 6 (“A autora trabalhava nas instalações da ré no sábado de tarde, das 14:00 às 18:00 horas, no domingo o dia todo, até às 18h, e quintas e sextas-feiras de tarde, quando a BB a chamasse”), tendo o sinistro ocorrido numa sexta-feira. A dispensa da indicação na apólice dos trabalhadores eventuais resulta precisamente da imprevisibilidade e temporalidade do trabalho para que os mesmos são solicitados, associada à circunstância de se desconhecer previamente a sua identidade. Ora, não ocorrendo tal situação com a sinistrada, impunha-se que a recorrente comunicasse à seguradora a sinistrada, com a sua identificação precisa, para poder considerar a mesma abrangida pelo contrato de seguro de acidentes de trabalho de que a mesma pudesse ser vítima. Não o tendo feito, não ocorreu a transferência da sua responsabilidade para a seguradora, aqui se sufragando o entendido na sentença sob recurso. (…) Alega a recorrente que “37. O tribunal fundamental o apuramento da indemnização, entre outros, no artigo 18º, nº 4, alínea b), da Lei nº 98/2009 (RJAT); 38. Depreende-se que concluiu pela responsabilidade agravada da recorrente. 39. sem que, contudo, tenha levado à matéria provada qualquer tipo de facto em que pudesse alicerçar tal entendimento.” Efetivamente, consta da sentença, “Nos termos do disposto nos arts. 23º, alínea b), 18º, nº 4, al. b), 39º, 47º, nº 1, alíneas a), c) e d), 48º, nº 3, al. b) e d), e 67º do RJAT, e atendendo à incapacidade de que a autora ficou a padecer, a reparação deste sinistrado deve assim consistir: (...)”. Porém, o cálculo dos valores devidos a título de pensões, subsídios ou outras compensações foi efetuado nos termos gerais e não nos do referido art. 18º, nº 4, da Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro, nomeadamente “art. 48º, nº 3, al. b) da Lei nº 98/2009” (§ 1º da pág. 18 da sentença), “nº 1 e nº 3 do art. 67º” (penúltimo § da pág. 18 da sentença) e “art. 53º da Lei nº 98/2009 nos seus nº 1 e 2” (§ 2º da pág. 19 da sentença). Assim, nenhuma alteração há que fazer ao que consta da sentença, devendo-se a referência à norma em questão a manifesto lapso. (…) Finalmente, pretende a recorrente que se proceda à remição da pensão, alegando: “76. No caso concreto, a pensão atribuída à sinistrada é de 5.962,75€/ano, sendo inferior ao limite legal de 59.040,00€ (6 x 9.840,00€, que é o RMMG anual de 2024). 77. A decisão judicial não se pronunciou sobre a remissão, violando uma norma imperativa do RJAT. 78. Esta omissão prejudica a empregadora, que tem o direito de extinguir a obrigação mediante pagamento único, evitando encargos contínuos.” Mais uma vez não assiste razão à recorrente. Nos termos do art. 75º, nº 2, da Lei nº 98/2009, de 4 de setembro, é obrigatoriamente remida a pensão anual vitalícia devida a sinistrado com incapacidade permanente parcial inferior a 30%, desde que o valor da pensão anual não seja superior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida, em vigor no dia seguinte à data da alta ou da morte. Em 2018, data da alta da sinistrada, a RMMG era de € 580,00, conforme fixada pelo art. 2º do Dec. Lei nº 156/2017, de 28 de dezembro, sendo assim, a remição só seria obrigatória se a pensão anual fosse igual ou inferior a € 3.480,00 (6X€580). Diga-se que a RMMG em vigor em 2024, era de € 820,00, e não € 9.840,00, como alega a recorrente, sendo esse o valor da RMMG multiplicado por doze, sendo certo que o art. 75º, nº 1, é explícito na referência a seis meses. (…)» III. 8. Nestes termos, acorda-se em não admitir o recurso de revista excecional em apreço. Custas pela recorrente. Lisboa, 15.10.2025 Mário Belo Morgado, relator Júlio Manuel Vieira Gomes José Eduardo Sapateiro |