Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2198/12.6TBPBL.C1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: ROSA RIBEIRO COELHO
Descritores: NOVAÇÃO
ANIMUS NOVANDI
REQUISITOS
CONTRATO DE MÚTUO
GARANTIA DAS OBRIGAÇÕES
AVAL
FALSIFICAÇÃO
ASSINATURA
Data do Acordão: 06/28/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: CONCEDIDA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / CAUSAS DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES ALÉM DO CUMPRIMENTO / NOVAÇÃO.
Doutrina:
-Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10.ª Edição, p. 1111 e 1113;
-Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume II, p. 235;
-Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, IX, 3.ª Edição, p. 201, 1122, 1123, nota 4138;
-Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Volume II, 10.ª Edição, p. 199 a 201 e 1122.
Sumário :
I - Através da novação objetiva opera-se a substituição da obrigação emergente de um certo contrato, mantendo-se os respetivos sujeitos; está-se perante a novação subjetiva se a obrigação, por substituição do credor ou do devedor, passa a ser outra.

II – O “animus novandi” tem de ser exteriorizado pelas partes de forma expressa, não podendo ser presumido nem extraído, tacitamente, de outras declarações contratuais.

III – Tendo as partes, já vinculadas por um mútuo, celebrado sucessivamente novos e diferentes contratos, cada um deles outorgado com vista à aquisição, por parte dos mutuários, de liquidez que lhes permitisse saldar o anterior empréstimo, não pode dizer-se que cada uma das novas obrigações se identifica economicamente com a obrigação anterior, o que exclui a verificação de novação.

IV – Cada um destes mútuos é independente dos restantes, não se comunicando aos posteriores as garantias eventualmente convencionadas no âmbito dos anteriores.

V – Não se tendo constituído validamente as garantias de que a mutuante pretendeu munir-se para os contratos subsequentes, através de avales viciados por falsificação das assinaturas dos avalistas, estes últimos não são responsáveis pela dívida que a autora pretende ver reconhecida.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2ª SECÇÃO




I - Caixa AA, CRL, intentou contra BB e CC, DD e EE, e FF e GG, a presente ação declarativa pedindo:

a) A condenação dos réus a reconhecer que todo o suporte contratual posterior ao contrato nº 28…4 de 19/11/1993 (contratos nºs 31…4, 32…1, 34…1, 36…3, 59…0, 590…9, 59…4, 59…6) foi entregue à autora sob concertada simulação da fidedignidade das assinaturas dos garantes ali identificados, designadamente os réus BB, CC, DD e EE;

b) A condenação dos réus FF e GG a reconhecerem-se devedores à autora da quantia 74.819,68€ acrescida de juros moratórios à taxa de 18% que se vencerem de há cinco anos para trás contados da respetiva citação, até efetivo e integral pagamento à autora (conforme contrato nº 28…4 de 19/11/1993, último contrato objeto de reconhecimento presencial de assinaturas);

c) A condenação dos réus BB, CC, DD e EE a reconhecer que o contrato nº 28…4 de 19/11/1993, último contrato objeto de reconhecimento presencial de assinaturas, é eficaz quanto a eles, destacadamente quanto à fiança ali assumida;

d) A condenação dos réus BB, CC, DD e EE a reconhecer que continuam pessoal e solidariamente obrigados ao pagamento à autora da quantia de 74.819,68€, com renúncia a todo o benefício ou direito que de qualquer modo possa limitar, restringir ou anular esta obrigação;

e) A condenação dos réus BB, CC, DD e EE a pagar tal quantia à autora, acrescida de juros moratórios à taxa de 18% que se vencerem de há cinco anos para trás contados da respetiva citação, até efetivo e integral pagamento.


Alegou, em síntese nossa, o seguinte:

1 – Celebrou em 13.11.1992 com os réus FF e GG um contrato de mútuo pelo qual lhes emprestou a quantia de 15.000.000$00 (€ 74.819,68), tendo os demais réus assumido a posição de fiadores, com reconhecimento notarial e presencial das assinaturas; em 19.05.1993, foi prorrogado o prazo para a sua amortização, mantendo-se todas as demais condições contratuais acordadas, bem como o reconhecimento notarial e presencial das assinaturas dos réus;

2 – Em 19.11.1993 celebrou com os réus FF e GG um segundo contrato de mútuo da mesma quantia, destinado à liquidação do primeiro, tendo os demais réus assumido a posição de fiadores, com reconhecimento presencial das assinaturas.

3 – Em 18.11.1994 celebrou com os réus FF e GG um terceiro contrato de mútuo da mesma quantia, destinado à liquidação do segundo, garantido por aval cambiário dos restantes réus, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

4 – Em 17.11.1995 celebrou com os réus FF e GG um quarto contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do terceiro empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

5 – Em 22.11.1996 celebrou com os réus FF e GG um quinto contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do quarto empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

6 – Em 21.11.1997 celebrou com os réus FF e GG um sexto contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do quinto empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

7 – Em 04.12.1998 celebrou com os réus FF e GG um sétimo contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do sexto empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

8 – Em 10.12.1999 celebrou com os réus FF e GG um oitavo contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do sétimo empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

9 – Em 30.11.2000 celebrou com os réus FF e GG um nono contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do oitavo empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

10 – Em 14.12.2001 celebrou com os réus FF e GG um décimo contrato de mútuo com aval cambiário dos demais réus, destinado à liquidação do nono empréstimo, em que continuou a emprestar a quantia de 15.000.000$00, não tendo havido qualquer reconhecimento de assinaturas;

11 – Com base neste contrato instaurou ação executiva contra os aqui réus, a qual correu termos sob o nº 1609/04.9 TBPBL, tendo merecido a posição dos primeiros e segundos réus com o argumento de que não eram suas as assinaturas constantes daquele contrato, o que foi reconhecido por acórdão da Relação de Coimbra;

12 – A autora deixou de exigir o reconhecimento das assinaturas porque aquela sucessão de contratos não traduzia mais do que prorrogações de prazo para reembolso do capital, estando convicta da subsistência das garantias pessoais concedidas pelos quatro primeiros réus, cujas assinaturas eram simuladas em abuso da confiança daquela;

13 – Envolve abuso do direito a invocação, pelos réus, da extinção ou ineficácia da fiança assumida nos dois primeiros contratos, devendo ser considerada subsistente a fiança prestada ao contrato de 19.11.1993.

        

Houve contestação e, realizado o julgamento, foi proferida sentença que fixou a matéria de facto provada e não provada e julgou a ação improcedente, absolvendo os réus dos pedidos.

         Nela seguiu-se a seguinte linha de raciocínio:

- cada um dos acordos havidos constitui um contrato, criando novas obrigações distintas, quanto a prazos de vencimento e juros remuneratórios, o que traduz sucessivas novações;

- por isso, apenas subsiste o último contrato, que se encontra destituído das garantias pessoais dos réus BB, CC, DD e EE;

- a invocação da falsidade das assinaturas, feita pelos réus na sua contestação, não envolve abuso do direito.


Inconformada, a autora apelou, tendo a Relação de Coimbra proferido acórdão que, julgando o recurso procedente, revogou a sentença e condenou os réus no pedido.

    A argumentação e raciocínio que estiveram na base da decisão assim emitida podem resumir-se do seguinte modo:

- o animus novandi não se presume nem pode ser tacitamente demonstrado, antes carecendo de ser manifestado de forma cabal, expressa, inequívoca e diretamente, seja por palavras, por escrito ou por outro meio;

- a novação não se compadece com a simples alteração/modificação de alguns elementos do contrato, antes pressupondo a sua substituição in totum;

- para haver novação, é indispensável que a nova obrigação se constitua validamente;

- não foi manifestada a vontade de novar, sendo que nos contratos subsequentes o termo «liquidação» não está usado com o significado e alcance de extinção do contrato inicial e dos seguintes, mas antes e apenas reportado  ao pagamento da quantia naquele anteriormente mutuada e depois  transferida para cada um destes;

- continuou a ser emprestada a mesma quantia de 15.000.000$00, e não sucessivas quantias sempre neste montante;

- o escrito  contratual genético, qual seja o escrito particular de empréstimo com fiança, sempre esteve na posse da credora mutuante, nunca tendo sido inutilizado ou devolvido aos mutuários;

- a simulação das assinaturas dos garantes traduz dolo, ainda invocável por o contrato não ter sido cumprido;

- o vício dos acordos posteriores ao contrato inicial sempre impediriam a novação, pois que a obrigação primeira subsistiria.


    Contra este acórdão recorreram os quatro primeiros réus, tendo apresentado alegações onde, pedindo a sua revogação e substituição por outro que confirme a decisão de 1ª instância, formulam as conclusões que passamos a transcrever:

“1 – O acórdão recorrido deturpa o sentido e alcance da expressão utilizada em cada nova proposta de crédito que foi aberta pela autora mutuamente E correspondente à expressão "liquidação" e quando identifica com total clareza e sem margem para dúvida o que liquida, dúvidas não restarão de que a pretensão, dos intervenientes foi extinguir o contrato inicial e os seguintes:

2 – Com a celebração de cada contrato de mútuo, relatados nos factos provados, a autora mutuante e os réus mutuários, pretenderam substituir a obrigação anterior pela constituição de sucessivas novas obrigações.

3 – As diversas novações geradas com a celebração de cada novo contrato foram manifestamente expressadas com a utilização da expressão "liquidação de empréstimo…";

4 – Constituindo a novação uma modalidade de extinção das obrigações, a extinção de cada obrigação emergente de cada um dos contratos de mútuo celebrados, a extinção que se verificou decorreu da constituição de uma nova obrigação, emergente de cada novo contrato que foi sucessivamente celebrado, ocupando assim o lugar da obrigação primeira.

5 O facto de a autora mutuante, haver deixado de exigir dos réus mutuários o reconhecimento de assinaturas, nomeadamente a partir da celebração do contrato identificado no facto 17 e nos subsequentes, considerando por suficiente a oposição de assinaturas simples nos documentos que sucessivamente os réus mutuários iam entregando e, tratando-se de simulação das assinaturas dos ora réus fiadores/recorrentes, jamais poderá constituir fundamento para a não verificação da novação, conforme defende o acórdão recorrido,

6 – Foi a autora mutuante que com a sua negligente conduta permitiu e consentiu que os réus mutuários simulassem as assinaturas dos ora recorrentes como fiadores, ao exigir apenas em cada contrato celebrado as assinaturas simples.

7 - Apesar de o facto 69 com a decisão proferida no acórdão recorrido, o mesmo haver sido alterado e assim poder considerar-se que os Réus mutuários tiveram uma atuação dolosa, atendendo a que não foi dado como provado que o contrato referido no facto 59, não foi garantido por aval cambiário dos ora réus recorrentes, jamais tais contratos poderão ser anuláveis, porquanto a Autora mutuante nenhum pedido formulou nesse sentido em sede de petição inicial e, portanto, impedidos estão os Exm°. Senhores Juízes Relatores impedidos de conhecer de tal eventual anulabilidade.

8 - Não tendo sido invocada e peticionada a anulabilidade de qualquer dos contratos celebrados após o contrato descrito no facto 17, nenhum motivo legal se verifica para que não ocorra a novação.

9 - Entendem assim os ora recorrentes que bem andou a julgadora em sede de 1ª instância e mal andaram os Exm°s. Senhores Juízes Desembargadores ao considerarem por procedente o recurso, uma vez que na realidade com os sucessivos contratos de mútuo que foram celebrados ocorreu a novação e verificaram-se todos os requisitos legalmente exigidos conforme exposto nestas alegações de recurso.

10 – Assim, tendo ocorrida a extinção da obrigação primeira e as seguintes, pelas sucessivas novações e, substituindo apenas o contrato de mútuo identificado no facto 59, no qual não foi provada a prestação de qualquer garantia por parte dos ora réus recorrentes, deverão V. Exas substituir o acórdão recorrido por outro que venha a confirmar ter-se verificado a novação e portanto, confirmar a decisão proferida em 1ª instância, julgando improcedente a ação, porquanto os pedidos formulados pela autora assentam em obrigação extinta, e absolvidos os réus dos pedidos formulados pela autora.

11 - Com o acórdão recorrido violado foi o disposto nos artigos 857°, 859°, 236°, 238º/1º, 342º/1, 217 do C. Civil.”


Contra-alegando, a autora sustenta a improcedência do recurso.


Colhidos os vistos cumpre decidir.


  II - Na 1ª instância foram consagrados como provados e não provados os seguintes factos:

FACTOS PROVADOS

1 - A autora é uma cooperativa de responsabilidade limitada que se dedica ao exercício de funções de crédito agrícola a favor dos seus associados e à prática dos demais atos inerentes à atividade bancária nos termos da legislação aplicável, a título próprio e/ou como agente da Caixa Central.

2 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 06/11/1992 e de escrito particular outorgado em 13.11.1992, a autora celebrou com os réus FF e mulher, GG, um contrato de mútuo garantido por fiança que assumiu o nº 27…5, exarando-se que se destinava à compra de uma propriedade. Docs. 1 e 2

3 - Por tal contrato a autora emprestou a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários efetivamente receberam mediante entrega em conta dos mesmos (nº 916.0.00.7) e da qual estes se confessaram devedores.

4 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 20,50%; acrescia a sobretaxa de 2% em caso de mora e/ou incumprimento.

5 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, numa prestação semestral, vencendo-se a mesma em 23/05/1993.

6 - Enquanto garantes fiadores, os réus BB, CC, DD e EE, contemporaneamente à celebração do contrato de mútuo garantido por fiança, vincularam-se pessoal e solidariamente com os mutuários nos seguintes termos e condições:

Que ficam por fiadores e principais pagadores dos primeiros outorgantes e solidariamente entre si e com eles se obrigam ao pagamento da dívida confessada, juros e demais despesas na forma estipulada no presente escrito, renunciando a todo o benefício ou direito que de qualquer modo possa limitar, restringir ou anular esta obrigação.

7 - Do escrito particular para empréstimo concedido por fiança que cristalizou as vontades plasmadas pelos réus consta o reconhecimento notarial, presencial, das respetivas assinaturas.

8 - Em 19.05.1993, deixando intangível o capital, que não conheceu qualquer amortização, o contrato referido em 2 foi, no sentido de prorrogar o prazo para a amortização do capital, com a prestação semestral prevista a vencer-se agora a 23.11.1993. doc 3

9 - Na alteração referida em 8, mantiveram-se as demais garantias prestadas pelos réus BB, CC, DD e EE, tendo as suas assinaturas sido reconhecidas presencialmente perante notário.

10 - Na sequência de proposta aprovada a 05/11/1993 e de escrito particular outorgado em 19.11.1993, a autora celebrou com os réus FF e mulher, GG, um contrato de mútuo garantido por fiança que assumiu o nº 28…4. Doc 4 e 5

11 - No contrato referido em 10 ficou exarado que o mesmo se destinava à liquidação do empréstimo nº 27…5, no qual não fora amortizado capital algum.

12 - Por um tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 91….7) e da qual estes se confessaram devedores.

13 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 18,00%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

14 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, numa prestação anual, vencendo-se a mesma em 23.11.1994.

15 - Enquanto garantes fiadores, os réus BB, CC, DD e EE, contemporaneamente à celebração do contrato de mútuo garantido por fiança, vincularam-se pessoal e solidariamente com os mutuários nos seguintes termos e condições:

Que ficam por fiadores e principais pagadores dos primeiros outorgantes e solidariamente entre si e com eles se obrigam ao pagamento da dívida confessada, juros e demais despesas na forma estipulada no presente escrito, renunciando a todo o benefício ou direito que de qualquer modo possa limitar, restringir ou anular esta obrigação.

16 - Do escrito particular para empréstimo concedido por fiança referido em 10 que cristalizou as vontades plasmadas pelos réus consta o reconhecimento notarial, presencial, das respetivas assinaturas.

17 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 18.11.1994, a autora celebrou com os réus FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 31…4, tendo a ré EE subscrito o mesmo na qualidade de fiadora e assinado livrança e respetivo pacto de preenchimento entregues nessa data à autora. Docs 6, 7 e 8

18 - No contrato referido em 17 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 28984, no qual não fora amortizado capital algum.

19 - Por tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 91…7).

20 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 16,00%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

21 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após duas prestações semestrais sucessivas de juros, sendo a segunda e última de capital e juros com vencimento em 05.12.1995.

22 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 17 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto de preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

23 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 17.11.1995, a autora celebrou com os réus com FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 32…1, tendo a ré EE subscrito o mesmo na qualidade de fiadora e assinado livrança e respetivo pacto de preenchimento entregues nessa data à autora. Docs 9, 10 e 11

24 - No contrato referido em 23 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 31…4, no qual não fora amortizado capital algum.

25 - Por tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 91…7).

26 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 15,25%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

27 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 06.12.1996.

28 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 23 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto de preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

29 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 22.11.1996, a autora celebrou com os réus FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 34…1, tendo a ré EE subscrito o mesmo na qualidade de fiadora e assinado livrança e respetivo pacto de preenchimento entregues nessa data à autora. Doc 12, 13 e 14

30 - No contrato referido em 29 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 32…1, no qual não fora amortizado capital algum.

31 - Por um tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 91…7).

32 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 13,40%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

33 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 09.12.1997.

34 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 29 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto de preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

35 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 21.11.1997, a autora celebrou com os réus FF e mulher, GG um contrato de mútuo que assumiu o nº 36…3, posteriormente renumerado com o nº 59…4, tendo a ré EE subscrito o mesmo na qualidade de fiadora e assinado livrança e respetivo pacto de preenchimento entregues nessa data à autora. Doc 15, 16 e 17

36 - No contrato referido em 35 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 34651, no qual não fora amortizado capital algum.

37 - Por tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 91…7).

38 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 12,10%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

39 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 10.12.1998.

40 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 35 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto de preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

41 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 04.12.1998, a Autora celebrou com os réus com FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 59….0, tendo a ré EE assinado livrança e respetivo pacto de preenchimento entregues nessa data à autora. Doc 18, 19 e 20

42 - No contrato referido em 41 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 59…4, no qual não fora amortizado capital algum.

43 - Por tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 91…7).

44 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 11,20%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

45 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 22.12.1999.

46 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 41 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto de preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

47 - No âmbito e exercício da sua actividade, na sequência de proposta aprovada a 10.12.1999, a autora celebrou com os réus com FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 59….9. Doc 21, 22 e 23

48 - No contrato referido em 47 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 59…0, no qual não fora amortizado capital algum.

49 - Por um tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 40…19).

50 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 10,60%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

51 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 22.12.2000.

52 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 47 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

53 - No âmbito e exercício da sua actividade, na sequência de proposta aprovada a 30.11.2000, a Autora celebrou com os réus FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 59…4. Doc 24, 25 e 26

54 - No contrato referido em 53 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 59…9, no qual não fora amortizado capital algum.

55 - Por tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de Esc. 15.000.000$00 que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 40….19).

56 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 12, 25%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

57 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 22.12.2001.

58 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 53 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

59 - No âmbito e exercício da sua atividade, na sequência de proposta aprovada a 14.12.2001, a autora celebrou com os réus FF e mulher, GG, um contrato de mútuo que assumiu o nº 59…6. Doc 27, 28 e 29

60 - No contrato referido em 59 ficou exarado que o empréstimo destinou-se à liquidação do empréstimo nº 59…4, no qual não fora amortizado capital algum.

61 - Por tal contrato a autora continuou a emprestar a quantia de 74.819,68 € que os mutuários receberam mediante entrega contabilística em conta dos mesmos (nº 40…19).

62 - Foi convencionado que o capital venceria juros à taxa nominal e líquida de 12,25%; acrescia a sobretaxa de 4% em caso de mora e/ou incumprimento.

63 - O capital mutuado deveria ser restituído, com os acordados juros remuneratórios, após quatro prestações trimestrais sucessivas de juros, sendo a quarta e última de capital e juros com vencimento em 22.12.2002.

64 - Os réus FF e mulher, GG na data referida em 59 apresentaram à autora uma livrança, bem como um pacto preenchimento, dos quais constavam os nomes dos réus BB, CC, DD e EE, sem qualquer reconhecimento das assinaturas.

65 - A autora nos contratos referidos em 17, 23, 29, 35, 41, 47, 53 e 59 deixou de exigir o reconhecimento de assinaturas, bastando-se com a aposição de assinaturas simples nos documentos que lhe foram entregues pelos réus FF e GG, verificando apenas a similitude das mesmas.

66 - A autora quando celebrou os contratos referidos em 17, 23, 29, 35, 41, 47, 53 e 59 estava convicta de que as livranças e pactos de preenchimento entregues haviam sido assinados pelos réus BB, CC, DD e EE.

67 - Os réus BB, CC, DD e EE não responderam às missivas que lhes foram enviadas pela autora em 28.02.2003, 29.05.2003, 17.11.2003 e 19/02/2004, referentes à regularização dos empréstimos 59…6 e 59…5, tendo os réus BB e CC recebidos as mesmas em 03.06.2003 e 19.11.2003.

68 - Os réus FF, BB e DD são irmãos.


FACTOS NÃO PROVADOS

Para além de factos contrários aos dados como provados, manifestamente conclusivos ou que contenham matéria de direito, não se provou que:

a) O contrato referido em 17 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC e DD em livrança com pacto de preenchimento;

b) O contrato referido em 23 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC e DD em livrança com pacto de preenchimento;

c) O contrato referido em 29 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC e DD em livrança com pacto de preenchimento;

d) O contrato referido em 35 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC e DD em livrança com pacto de preenchimento;

e) O contrato referido em 41 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC e DD em livrança com pacto de preenchimento;

f) O contrato referido em 47 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC, DD e EE em livrança com pacto de preenchimento;

g) O contrato referido em 53 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC, DD e EE em livrança com pacto de preenchimento.

h) O contrato referido em 59 foi garantido por aval cambiário dos réus BB, CC, DD e EE em livrança com pacto de preenchimento;

i) Os réus, em convergência de vontades e urdidura de plano comum, aproveitando a confiança neles depositada pela autora, que passou a prescindir de assinaturas reconhecidas, decidiram passar a simular a subscrição dos documentos nos contratos que sucederam o contrato nº 28…4 de 19/11/1993, por parte dos réus BB, CC, DD e EE;

j) Nas datas referidas em 8 e 10, os réus BB, CC, DD e EE não estiveram presentes no Cartório Notarial;

l) As missivas referidas em 67 foram recebidas pelos réus DD e EE, respetivamente em 02.03.2003, 30.05.2003, 18.11.2003 e 20.02.2004;

m) As expressões “liquidação” ou “pagamento” foram empregues em termos de abstração contabilística para evitar a incursão dos réus em situação de mora ou incumprimento impeditivo do recurso a outras operações de financiamento bancário;

n) Os réus BB, CC, DD e EE estavam convictos de que os réus FF e GG haviam liquidado o empréstimo referido em 2.

        

E, no seguimento da impugnação, em sede de apelação, da decisão proferida sobre a matéria de facto, a Relação aditou aos factos provados um novo facto, antes englobado no facto não provado i) e que, com o nº 69, tem o seguinte teor:

69 - Aproveitando a confiança depositada pela autora, a qual passou a prescindir das assinaturas reconhecidas presencialmente pelo notário, os réus mutuários, pelo menos a partir de dezembro de 1999, data em que a autora celebrou com eles o contrato de mútuo que assumiu o nº 59…9 e até ao contrato nº 59…6, passaram a simular as assinaturas dos réus fiadores.


  III – É altura de abordar as questões suscitadas.


Da novação

Os recorrentes, pugnando pela repristinação do decidido em 1ª instância, sustentam que os acordos descritos sob os nºs 10, 17, 23, 29, 35, 41, 47, 53 e 59 dos factos provados traduzem outras tantas novações das obrigações emergentes dos contratos que imediatamente os antecederam, estando a intenção novatória manifestada expressamente ao falar-se em “liquidação de empréstimo …”.

  Diverso foi o entendimento adotado pela Relação que lhes negou essa caraterização, considerando, em síntese, que se está perante o mesmo e único contrato celebrado em 13.11.1992, com as garantias que nele foram prestadas pelos réus ora recorrentes.

        

Que posição tomar?


   Regulando a novação objetiva, o art. 857º do CC[1] dispõe:

Dá-se a novação objectiva quando o devedor contrai perante o credor uma nova obrigação em substituição da antiga.

Através dela opera-se, pois, a substituição da obrigação emergente de um certo contrato, mantendo-se os respetivos sujeitos.

Já se estará perante a novação subjetiva se a obrigação, por substituição do credor ou do devedor, passa a ser outra – art. 858º.

    As normas relativas a este instituto estão incluídas no capítulo do Código Civil que rege as causas de extinção das obrigações que se não traduzem no seu cumprimento.

 

Como escreve Menezes Leitão[2], a novação objetiva “(…) consiste na extinção de uma obrigação em virtude da constituição de uma nova, que a substitui. A razão determinante da extinção da obrigação é neste caso a constituição de um novo vínculo que, embora se identifique economicamente com a obrigação extinta, tem uma fonte jurídica diferente.

(…) O que carateriza a novação é (…) a circunstância de que o facto jurídico que desencadeia a extinção da obrigação antiga ser simultaneamente o facto jurídico que constitui a nova obrigação.

Da novação objetiva, que pode operar-se, tanto por substituição da prestação, como por substituição da causa ou fonte da obrigação, são exemplos, respetivamente, o caso de o devedor, com o acordo do credor, se obrigar a entregar-lhe, em vez da máquina combinada, certa quantia em dinheiro, e o caso de o mandatário obrigado a restituir ao mandante quantias que dele recebera para exercer o mandato, ficar com elas a título de mútuo.[3]


Por seu turno, o art. 859º prescreve que: “A vontade de contrair a nova obrigação em substituição da antiga deve ser expressamente manifestada.”

O “animus novandi” tem de ser exteriorizado pelas partes de forma expressa, não podendo ser presumido nem extraído, tacitamente, de outras declarações contratuais[4],[5].

Menezes Cordeiro[6] explica esta exigência legal pela perigosidade que é suscetível de envolver a novação, tanto para o credor como para o devedor.

Na verdade, salvo estipulação em contrário, ao primeiro priva, nos termos do art. 861º, das garantias de que beneficiava, e ao segundo retira, de acordo com o art. 862º, os meios de defesa que podia opor à obrigação antiga.

Com a novação, tudo recomeça sem passado. A exigência do animus expresso protege ambas as partes.”  


Feita esta brevíssima abordagem à figura da novação, importa atentar nos factos provados e proceder à sua análise à luz das enunciadas regras e conceitos.

Desde logo, os factos não revelam que as partes tenham ficado pela sucessiva substituição da obrigação de restituição da quantia de 15.000.000$00 já existente na esfera jurídica dos mutuários – contração de uma nova obrigação com concomitante extinção da já existente -, mostrando, diversamente, que celebraram novos e diferentes contratos, cada um deles outorgado com vista à aquisição, por parte dos mutuários, de liquidez que lhes permitisse saldar o anterior empréstimo.

E a consulta das propostas dirigidas pelos mutuários à mutuante, ora recorrida - sempre visando a celebração dos novos empréstimos que nos aludidos factos se referem –, mostra que em todas elas foi mencionado que a operação proposta – sempre no montante de 15.000.000$00, exceto na última, na qual foi mencionada a quantia equivalente de € 74.819,68 – se destinava à liquidação do empréstimo anterior.[7]

Não foi alegada, nem se conhece, a existência de declarações apostas em documentos, ou outras manifestações de vontade, de onde conste qualquer referência a “novação”, sendo que a exigência legal de manifestação de uma vontade expressa, no sentido de que se está a novar uma obrigação já existente – extinguindo-a e substituindo-a por outra -, é aceite de forma dominante pela jurisprudência[8] e pela doutrina[9].

Aliás, dizendo cada um dos mútuos respeito a períodos de tempo diferentes e sucessivos, não pode dizer-se que cada uma das novas obrigações se identifica economicamente com a obrigação anterior, o que exclui, à partida, a verificação de novação.

E, por aplicação do regime instituído nos nºs 1 e 2 do art. 236º, segundo o qual, na falta de conhecimento da vontade real, a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição real do declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, é para nós manifesto que a “liquidação” anunciada nos contratos não é mais do que o pagamento da dívida existente, ou seja, a restituição da quantia mutuada através do contrato anterior - art. 1142º.

Isto mesmo se considerou no acórdão impugnado, quando aí se afirmou que o termo liquidação fora reportado pelas partes ao pagamento da quantia naquele (1º contrato) anteriormente mutuada e depois transferida para cada um destes (contratos posteriores),   

Não existem, tal como se entendeu no acórdão recorrido, as novações afirmadas na 1ª instância e que os recorrentes pretendem aqui ver reconhecidas.

 

Da caraterização dos sucessivos acordos outorgados:

Mas a conclusão a que acabámos de chegar, não leva, salvo o devido respeito por opinião diversa, a que se acolha como boa a tese adotada no acórdão recorrido.

Discorda-se, desde logo, da afirmação que nele consta, segundo a qual a expressão “liquidação” não fora usado pelas partes “com o significado e alcance de extinção do contrato inicial e dos seguintes (…)”, pois que a extinção do contrato anterior é a consequência necessária do cumprimento da obrigação (única, e não renovável) de reembolso da quantia através dele mutuado.

Daí que, apesar de a dívida de capital ser sempre no valor de 15.000.000$00 - ou o seu equivalente em euros -, a mesma é constituída através de cada um dos contratos que foram sucessivamente celebrados.

E, sendo o dinheiro coisa fungível, não interessa especular com juízos sobre se se trata de quantias diferentes ou se está em causa sempre a mesma quantia, relevando antes a certeza de que estamos perante a sucessiva e ininterrupta constituição de obrigações de montante idêntico, mas provenientes de diferentes mútuos que as partes (mutuante e mutuários) foram acordando entre si ao longo de vários anos.

Não pode aceitar-se, portanto, o entendimento adotado no acórdão recorrido, segundo o qual os contratos posteriores se reportaram, ainda e sempre, ao primeiramente celebrado, com ele formando um negócio único.

O exposto leva-nos a conclusão idêntica àquela a que se chegou em 1ª instância: a de que cada um destes mútuos é independente dos restantes, não se comunicando aos posteriores as garantias eventualmente convencionadas no âmbito dos anteriores - nomeadamente, as fianças prestadas em garantia do cumprimento dos contratos referidos nos factos provados nºs 2 e 10, não se estenderam aos restantes.

Uma vez extintas as obrigações decorrentes destes contratos, extintas ficaram as respetivas fianças, por força do art. 651º.

E não se tendo constituído validamente as garantias de que a mutuante pretendeu munir-se para os contratos subsequentes, na medida em que os avales estão viciados por falsificação das assinaturas dos avalistas, estes, aqui réus e recorrentes, não são responsáveis pela dívida que a autora pretende ver reconhecida.

Diga-se ainda que a invocação desta defesa por parte dos pretensos avalistas não pode ser apodada de abusiva, visto não se ter apurado que estes, pese embora a relação familiar evidenciada no facto nº 68, tivessem sabido ou participado na criação do logro em que a mutuante caiu.

        

Finalmente, não tendo sido alegado que a vontade negocial da mutuante manifestada nos terceiro e subsequentes contratos foi viciada por dolo, não é legítimo raciocinar com base nesse pressuposto – cfr. os arts. 254º e 287º.

Ademais, em face do que acima se disse, os terceiro a nono contratos foram já cumpridos, o que sempre determinaria a extemporaneidade de tal alegação.

  Assim, a ação tem de improceder quanto aos réus aqui recorrentes.



IV - Pelo exposto, julgando-se a revista procedente, absolvem-se os réus, ora recorrentes, do pedido.

Custas a cargo da recorrida.


Lisboa, 28.06.2018


Rosa Maria M. C. Ribeiro Coelho (Relatora)

João Bernardo

Oliveira Vasconcelos

__________

[1] Diploma a que pertencem as normas de ora em diante referidas sem menção de diferente proveniência.
[2] Cfr. Direito das Obrigações, Vol. II, 10ª edição, pág. 199-200
[3] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10ª edição, pág. 1111 e Menezes Leitão, obra citada, pág. 199.
[4] Menezes Leitão, obra citada, pág. 201.
[5] Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, IX, 3ª edição, pág. 1122, 1123 e numerosa jurisprudência aí citada
[6] Obra citada, pág. 1122

[7] E isso mesmo ficou a constar nos últimos nove contratos de empréstimo outorgados, como se vê dos factos nºs 11, 18, 24, 30, 36, 42, 48, 54 e 60.
[8] Cfr., desde logo, os acórdãos citados por Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil, IX, 3ª edição, pág. 1123, nota 4138 e os vários arestos citados no acórdão recorrido.
[9] Cfr. Menezes Leitão, ibidem, pág. 201, Menezes Cordeiro, ibidem pág. 1122, Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, pág. 235 e Almeida Costa, Direito das Obrigações, 10ª edição, pág. 1113