Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1ª SECÇÃO | ||
Relator: | GABRIEL CATARINO | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL INDEMNIZAÇÃO DE PERDAS E DANOS DIREITO À INDEMNIZAÇÃO PRAZO DE PRESCRIÇÃO INÍCIO DA PRESCRIÇÃO INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO RECONHECIMENTO DO DIREITO PRAZO DE PROPOSITURA DA ACÇÃO NOTIFICAÇÃO JUDICIAL AVULSA ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA SUBSIDIARIEDADE | ||
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Data do Acordão: | 07/12/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
Área Temática: | DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES | ||
Doutrina: | - Antunes Varela, João, in “Das Obrigações em Geral”, vol. I, Coimbra, 2006, pág. 446, 449, 454, 460-462, 468. - Costa e Silva, Paula, in “Acto e Processo. O Dogma da Irrelevância da Vontade na Interpretação e nos Vícios do Acto Postulativo”, Coimbra Editora, 2003. - Manuel Andrade, in “Teoria Geral da Relação Jurídica – Facto Jurídico, em especial Negócio Jurídico”, vol. II, Coimbra, 1983, págs. 445 e 446, 448, 459, 462. - Menezes Cordeiro, António, in “Tratado de Direito Civil – Parte Geral; Legitimidade, Representação, Prescrição, Abuso de Direito, Colisão de Direitos, Tutela e Provas”, vol. V, 2011 (reimpressão), Coimbra, Almedina, 159 a 177. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 306.º, N.º 1, 309.º, 474.º, 493.º, 498.º, N.º S 1 E 4, 565.º, N.º2, 569.º 1427.º E 1436.º, ALÍNEAS F) E G). CÓDIGO PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 273.º, 467.º. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 03-11-2009, IN WWW.STJ.PT; -DE 02-02-2010, IN WWW.STJ.PT. | ||
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Sumário : | I - Nos termos do art. 306.º, n.º 1, do CC, a partir do momento em que o titular do direito lesado ou merecedor de tutela jurisdicional – v.g., incumprimento de uma obrigação pecuniária ou lesão de um direito real de gozo – tiver conhecimento do facto jurídico donde emerge o direito à sua reintegração ou ressarcimento, inicia-se o prazo a partir do qual deve ser exercitado, sob a cominação de o seu não exercício ocasionar o decesso do poder reclamar em juízo ou de accionar os meios jurisdicionais tendentes a fazê-lo valer. II - O prazo prescricional corre de forma contínua, a não ser que ocorram causas de suspensão ou de interrupção que suspendam ou ilaqueiem, no primeiro caso o decurso do tempo e no segundo apaguem o tempo já decorrido. III - A interrupção da prescrição verifica-se quando ocorre um facto, ou promovido pelo titular do direito – v.g. através de um acto judicial evidenciador de querer agir por forma a reclamar o direito de que se arroga –, ou aceite pelo devedor – v.g. reconhecimento da situação ou do facto a quem a prescrição pode prejudicar. IV - Estando provado, em concreto, que a comunicação da ocorrência do evento danoso – queda da autora num lanço de escadas de um prédio, de que lhe resultaram diversas lesões físicas – à administração do prédio (1.ª ré) se registou a 04/10/2000, 13 dias após a sua verificação (23/09/2000), tendo esta respondido, em 08/10/2000, refutando qualquer responsabilidade, mas mostrando-se colaborante, e tendo junto com a carta de resposta, em que descartava a responsabilidade própria, a apólice da seguradora, nem a suposta atitude colaborante da administração do prédio pode ser tida como reconhecimento tácito da sua responsabilidade, nem ainda a eventual troca de correspondência com a seguradora (2.ª ré) pode inculcar esse efeito. V - Se, no primeiro caso, a administração do prédio rechaçou a sua responsabilidade, já quanto ao segundo só haveria uma maneira da autora/recorrente fazer cessar o prazo prescricional já decorrido, qual fosse a de ter desencadeado um acto postulativo legalmente idóneo: ou a propositura da acção ou a notificação judicial avulsa. VI - Pelas razões elencadas, porque a autora teve conhecimento do seu direito no dia 23/09/2000, por nele ter ocorrido o evento danoso que geraria a responsabilidade a cargo das rés, está prescrito o direito de exigir o pagamento de indemnização pelos danos que reputa ter sofrido, nos termos do art. 498.º, n.º 1, do CC. VII - Constitui requisito irrefragável e inarredável do enriquecimento sem causa que aquele que se coloque na posição de obrigado a restituir tenha, com o acto ou facto jurídico causante, obtido uma vantagem patrimonial que se traduza numa das seguintes situações: aumento do património (activo); diminuição do património (passivo); uso ou consumo de coisa alheia; exercício de direito alheio; ou, por fim, poupança de despesas. VIII - O princípio da subsidiariedade, consagrado no art. 474.º do CC, inculca a ideia de que tendo o “empobrecido” ou o lesado outro meio legal de se ressarcir pelo prejuízo que foi causado pela intromissão abusiva e lesiva de outrem na sua esfera jurídica, está vedado o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa. IX - Se a autora deduziu, em via principal, pedido de indemnização com base na responsabilidade civil extracontratual, por estimar ter a 1.ª ré (administração do prédio) agido com culpa na conservação dos meios do edifício que teriam permitido a utilização das escadas sem qualquer perigo de queda – imputando-lhe um comportamento negligente de que faz derivar um dano e a consequente obrigação de indemnizar a cargo da responsável do facto reputado de ilícito – , a prescrição do direito impede a possibilidade de ressarcimento com base na responsabilidade civil, e ainda que o art. 498.º, n.º 4, do CC, permita que nos casos em que ocorra a prescrição do direito possa subsistir a acção de restituição por enriquecimento sem causa, mister é que possa haver lugar a ela. | ||
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Decisão Texto Integral: |
I. – RELATÓRIO. Desavinda com o decidido no Tribunal da Relação de Lisboa, em que por acórdão, de 30-11-2010, julgou improcedente a apelação interposta da decisão proferida nas Varas Mistas do Tribunal da comarca de Sintra que tinha decidido “absolver as Rés “Administração do Condomínio do Prédio sito na Rua ............., n.º ...., Agualva-Cacém” e “BB, S.A.”, do pedido deduzido por AA”, do mesmo passo que absolveu a A. do pedido de condenação como litigante de má fé, deduzido pela demandada “Administração do Condomínio do Prédio sito na Rua ............., n.º ...., Agualva-Cacém”, recorre, de revista, a demandante, havendo que ter em consideração para a decisão a proferir, os sequentes antecedentes processuais. I.1. – Antecedentes com interesse para a decisão a proferir. - Em 30 de Junho de 2004, a A., AA intentou, no Tribunal Judicial da comarca de Sintra – Varas Mistas, uma acção declarativa com processo ordinário em que pedia a condenação, solidária, das demandadas “Administração do Condomínio do prédio sito na Rua ............., n.º ...., Agualva, Cacém e “BB, S.A.” a pagar-lhe a quantia de vinte mil duzentos e noventa euros e vinte e cinco cêntimos (€ 20.290,25), por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos por virtude de uma queda sofrida nas escadas do prédio onde reside com seus pais – ........ , do prédio sito na supra mencionada Rua; - Com substância para o pedido que formulou alegou no dia 29 de Setembro de 2000, quando descia as escadas para se dirigir para o casamento de sua irmã, porque não havia luz nas escadas do prédio, tropeçou, tendo caído, originando a produção de ferimentos nas pálpebras e fortes dores na perna esquerda. Para sanação dos ferimentos sofridos teve que ser transportada de ambulância para o Hospital Amadora-Sintra onde teve que ser suturada com cinco pontos na pálpebra. Sofreu hematomas e nódoas no braço e perna esquerda, tendo que ficar acamada, na sua residência; - Por força do sucedido não pôde assistir ao casamento de sua irmã; - A escuridão verificada nas escadas do prédio terá sido ocasionada pelo rebentamento dos fusíveis do prédio, o que determinou o não funcionamento do único elevador existente no prédio; - Partiu uns óculos e teve que despender 1.000$00 para ser transportada ao hospital para além de ter que suportar dores; - Por estimar que o direito a peticionar com base na responsabilidade civil extracontratual, poderia estar prescrito – cfr. artigo 334.º da p.i. – com base no artigo 474.º do CC, sempre teria o direito a ser ressarcida pelos danos sofridos, com base no enriquecimento sem causa – “o enriquecimento dos Réus coincide com o empobrecimento da A. que se vê privada da indemnização a que tem direito, por virtude do aumento do património dos réus, sem causa justificativa, isto é, a medida do empobrecimento é o próprio dano da A.”- cfr. artigo 39.º da p.i.; - Tanto a Ré seguradora como a administração do prédio se defenderam por excepção, tendo invocada a excepção (peremptória) de prescrição para além de terem impugnado os factos donde a A. Faz derivar a respectiva obrigação de indemnizar com fundamento na responsabilidade extracontratual, pedindo a 1.ª Ré (e não a 2.ª como a A. viria a afirmar na resposta e ressalvado no requerimento de fls. 67 e 68) a condenação da A. como litigante de má fé; - Em resposta, a A. defende que não ocorreu a excepcionada prescrição – cfr. artigo 11.º “é por isso susceptível de ser entendido que a remessa da resolução do assunto para a Seguradora constituiria um reconhecimento do direito da A. por parte da 1.ª Ré, com os necessários efeitos sobre a interrupção da prescrição – art. 325.º do CC”; - Foi, por despacho de fls. 80, formulado convite à A. para que apresentasse novo articulado onde justificasse, factualmente, a necessidade de passados dois anos ainda se manter a receber assistência médica; - As Rés mantiveram as posições que já tinham enformado as contestações iniciais – cfr. fls. 139 a 141 (ré BB) e 169 a 173 (Administração do prédio); - Após a efectivação de uma audiência preliminar foi proferido despacho saneador/sentença em que foi decidido “Absolver as Rés Administração do Condomínio do prédio sito na Rua ............., n.º ...., Agualva, Cacém e “BB, S.A.” do pedido e absolver a A. do pedido de condenação de má fé; - Interposto recurso viria a decisão a ser revogada e ordenado o prosseguimento dos autos para elaboração da condensação, dado se ter concluído “que os autos contêm neste momento elementos que neste momento deixam dúvidas e interrogações quanto à verificação da prescrição e é por isso de elementar justiça que à A. seja dada possibilidade de provar os factos que alegou e às rés a verificação da excepção de prescrição” – cfr. fls. 336; - Elaborada a condensação e realizada a audiência de discussão de julgamento – cfr. fls. 346 a 481- foi proferida sentença em que foi decidido julgar a acção improcedente, por não provada, com a consequente absolvição do pedido deduzido pela A. bem como absolver a A. do pedido de litigância de má fé; - Desta decisão apelou a A., tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 30-11-2010 decidiu manter a sentença proferida no Tribunal de 1.ª instância. I.2. – Quadro conclusivo. Para fundamento do recurso que interpuseram, formulou a A. o quadro conclusivo que a seguir queda extractado. “I. O presente recurso de revista é interposto do douto acórdão da Relação de Lisboa que, ao confirmar a sentença de primeira instância, manteve o julgado contra a Recorrente das questões da excepção peremptória da prescrição, do instituto subsidiário do enriquecimento sem causa e do mérito substantivo da causa. II. Julgando o Venerando STJ sobre matéria de Direito, as questões de matéria probatória que se levantem nas presentes alegações nunca visarão a reapreciação da prova porquanto correspondem ou a matéria probatória fixada na resposta à matéria de facto ou a depoimentos testemunhais fixados na fundamentação da resposta à matéria de facto ou à própria matéria de facto fixada nos autos, o que é uniformemente aceite como matéria de Direito. III. Surgem as presentes alegações no âmbito do recurso de revista interposto do douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de fls., que, confirmando a sentença de primeira instância, manteve o julgamento de improcedência sobre o pedido indemnizatório da Recorrente contra as Recorridas por facto ilícito, em virtude de ter mantido o julgamento da procedência da excepção peremptória de prescrição e da improcedência do instituto subsidiário do enriquecimento sem causa, bem como sobre o julgamento de improcedência do pedido de mérito por ter considerado como não provada a imputação do facto à lesante Primeira Recorrida, e com o que esta continua a não se poder conformar. IV. Da acção resulta claramente que o pedido dos danos tem como fundamento a queda sofrida pela Recorrente e os posteriores tumefacção e hematomas surgidos já no ano de 2002 e que constituem a essencialidade, quer do facto jurídico, quer do pedido, tendo em consequência a presente acção sido proposta pela Recorrente, apresentando como causa de pedir os danos resultantes da queda por ela sofrida no dia 23 de Setembro de 2000 nas escadas do prédio sito na Rua ............. n.º ...., Agualva, Cacém, onde a recorrente vivia no ........ com seus pais e de acordo com os pontos números 3 e 4 da matéria provada. VI. Para além da questão efectiva da prescrição daqui ressaltam duas situações claras e decisivas para a decisão do presente pleito, sendo a primeira delas a do documento de fls. 62 - a tal carta junta pela Segunda Recorrida - que é aqui chamada à colação não como pretensa confissão extrajudicial segundo o que diz o acórdão recorrido, mas antes com toda a relevância como matéria probatória da falta do dever mínimo de vigilância que o Primeiro Recorrido deveria ter sobre o imóvel, e a segunda sobre o depoimento da testemunha da Segunda Recorrida, CC, nos termos exactos em que consta da fundamentação da resposta à matéria de facto e que declarou que a razão de ter sido declinada a responsabilidade do sinistro ocorrera por os danos em causa terem tido lugar devido à falta de manutenção do edifício seguro. VII. Independentemente de esta matéria vir a ser de novo e devidamente salientada, para já interessa reter que essa queda, derivada da quebra de energia e resultante da falta de manutenção do prédio, originou danos susceptíveis de serem reparados, de três tipos de danos autónomos: VIII. Só a partir dessa efectiva tumefacção é que os sucessivos exames que a Recorrente fez e provados, quer documentalmente nos autos de 18.03.2002 e 22.07.2002, quer pela própria prova dos pontos 16 a 21 da matéria fixada, demonstravam que a formação subcutânea hipoecógena sólida de formato tumular já tinha cerca de 6 cm de diâmetro. IX. Sobre a matéria da prescrição, o Tribunal da Relação de Lisboa julgou singelamente a existência de prescrição porque se ateve exclusiva e unicamente aos danos patrimoniais e não patrimoniais imediatos à data efectiva do sinistro não reconhecendo a existência de danos mediatos e as consequências que o seu aparecimento poderia ter na acção quando é certo que já nestes autos tinha dados em sentido contrário, porquanto em recurso de primitivo saneador sentença que julgou desde logo procedente a excepção de prescrição e absolveu as aqui Recorridas, este mesmo Tribunal da Relação de Lisboa entendeu, quanto a esta matéria, que não era de exigir no caso concreto que a Recorrente tivesse em 2000 um prognóstico da gravidade das lesões que a iriam atingir mais tarde, sendo certo que, se a partir de 2001 os exames médicos iam apontando para o agravamento do quadro clínico, era definitivamente apenas o exame médico de 22.07.2002 que confirmava a formação subcutânea de massas com cerca de 5 cm. XI. Fazendo uma análise adequada e própria do artigo 483.º do Código Civil, o acórdão recorrido determinou os elementos do facto ilícito de onde resulta o dever de indemnizar pelos lesantes e que são o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano, sendo tal facto e tal como se encontra provado no processo a queda ocorrida a 23 de Setembro de 2000. XII. Sobre a ilicitude e a imputação do facto ao lesante e contrariamente ao que mantém o acórdão recorrido, é óbvio que é o condomínio representado pela respectiva administração que é o responsável por manter em bom estado de funcionamento, quer os elevadores, quer as luzes das escadas, o que, por não ter acontecido e já antes reiteradamente não ter acontecido, originou o acidente dos autos e cuja responsabilidade estava transferida para a Segunda Recorrida. XIII. A excepção de prescrição que o acórdão recorrido manteve como procedente teve por base a interpretação singela do artigo 498.º, n.º 1, do Código Civil, pela qual, tendo a queda tido lugar a 23 de Setembro de 2000 e tendo a presente acção dado entrada em juízo a 30.06.2004, que o direito da Recorrente estaria prescrito, o que só acontece com o raciocínio de que esta teve imediatamente conhecimento no dia da queda de todos os direitos que lhe competiam e de todos os danos dela decorrentes, e que implicava fazer tábua rasa de que a mesma recorrente só tivesse conhecimento bem a posteriori de novos danos decorrentes da mencionada queda. XIV. Já em relação à globalidade dos danos, mesmo existindo o decurso do prazo dos três anos, a prescrição não teria ocorrido, atento o que resulta e quanto à Primeira Recorrida dos contactos estabelecidos com esta pela Recorrente, que a mesma declarou que "dentro do melhor espírito de colaboração" junta fotocópia do recibo do prémio de seguro pago, onde constam os elementos referenciadores da apólice e dos riscos cobertos. XV. Se a correspondência trocada com a Primeira Recorrida, tem de se considerar facto interruptivo da prescrição do direito à indemnização emergente do acidente, a resposta da mesma com a junção da própria apólice de seguro não deixava de manter a presunção interrompida,remetia para a posição que pudesse ser tomada pela companhia de seguros, caso esta entendesse assumir a responsabilidade transferida, o que significava a assunção da responsabilidade pela Primeira Recorrida, uma vez que só poderia haver transposição para a seguradora da responsabilidade com o reconhecimento do direito da Recorrente e os necessários efeitos sobre a interrupção. XVI. Iniciadas as conversações com a Segunda Recorrida, esta não excluiu a hipótese de haver dever de indemnizar, mas tomou unicamente a posição de que, havendo uma falta generalizada de manutenção do edifício seguro, a transferência de responsabilidade estava excluída do contrato, o que quer dizer que, não fora a falta de manutenção generalizada, a Segunda Recorrida entenderia que havia matéria para avocar a indemnização do sinistro, o que corresponde a igualmente não negar a existência do direito. XVII. Se assim é quanto à generalidade da causa de pedir, não existe qualquer presunção em relação aos factos mediatos, independentemente da interpretação da correspondência, uma vez que não constituíram danos visíveis e perceptíveis à data do acidente, mas antes se traduziram em danos novos posteriores. XVIII. Analisando a causa de pedir que fundamenta o pedido indemnizatório, admite-se dentro deste raciocínio poder eventualmente ter o tribunal considerado prescritos os danos patrimoniais imediatos, como a perda dos óculos e as despesas médicas, e os danos não patrimoniais imediatos, como a sutura e as dores decorrentes da própria queda. XIX. Só a 13.12.2001 e posteriormente durante o ano de 2002, é que os sucessivos exames imagiológicos determinavam que os hematomas em vez de liquefeitos, estavam a tumefazer-se, sendo certo que foi este facto novo, imprevisível como dano à data do acidente e no primeiro ano após o mesmo, que depois se veio a agravar com o aumento da tumefacção e que deu origem aos sucessivos agravamentos que ainda hoje não permitem à Recorrente e lesada ter conhecimento integral dos danos e sua extensão, conforme está claramente provado no ponto 21 da matéria fixada, pelo que, tendo ocorrido tais factos novos em Dezembro de 2001 e integrando esses factos novos a causa de pedir na acção interposta a 30.06.2004, não está obviamente prescrito, mesmo por singelo decurso do prazo, esse direito à indemnização. XX. Na verdade e conforme dispõe o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido nestes autos e sobre a matéria da prescrição, não era de exigir no caso concreto que a Recorrente tivesse em 2000 um prognóstico da gravidade das lesões que a iriam atingir mais tarde, sendo certo que, se a partir de 2001, os exames médicos iam apontando para o agravamento do quadro clínico, é definitivamente apenas o exame médico de 22.07.2002 que confirma a formação subcutânea de massas com cerca de 5 cm, o que precisamente consta na matéria provada do acórdão recorrido. XXI. Conforme jurisprudência uniforme, depois de decorrido o prazo de três anos e enquanto a prescrição ordinária não se tiver consumado, o lesado pode requerer a indemnização correspondente a qualquer novo dano de que só tenha tido conhecimento dentro dos três anos anteriores, considerando-se como factos novos os danos que não sejam uma consequência ou o desenvolvimento normal e previsível da lesão inicial, o que aconteceu no caso concreto, porquanto era absolutamente imprevisível e anormal que hematomas em liquefacção viessem posteriormente a tumefazer-se e a criar problemas circulatórios. XXII. Quanto ao pedido subsidiário do pagamento indemnizatório com base no instituto do enriquecimento sem causa daqueles que tinham o dever de indemnizar, também sobre esta matéria o acórdão recorrido manteve a improcedência por inexistir uma relação directa entre enriquecimentos das Recorridas e o empobrecimento da Recorrente, ou seja, em suma, uma deslocação patrimonial, declarando inclusive que a Recorrente tinha lançado mão desse instituto sem qualquer razão. XXIII. Apurado o facto ilícito e o dever de indemnizar, o não pagamento duma qualquer indemnização por força de uma declarada prescrição corresponde a um efectivo empobrecimento da lesada e a um efectivo enriquecimento dos responsáveis, tal como é consagrado no n.º 4 do artigo 498.º do CC que determina que a prescrição do direito à indemnização não importa a prescrição da acção de restituição por enriquecimento sem causa e se isto está em sede de prescrição indemnizatória é porque se entende que o não pagamento de uma indemnização por prescrição corresponde ao empobrecimento do lesado e ao enriquecimento dos responsáveis. XXIV. Em consequência, enquanto a Recorrente possa, como entende que pode, gozar da acção de indemnização fundada em responsabilidade civil, não é lícito deduzir o pedido fundamentado no enriquecimento sem causa como pedido principal, mas sim, figurando esse pedido na mesma acção a título subsidiário, o que significa que só no termo do prazo de prescrição do artigo 498.º, n.º 1 do CC, é que começará a correr o prazo de prescrição do enriquecimento em que se funda o pedido, devendo por isso e nesta base ser também matéria relevante a decidir favoravelmente. XXV. Sobre o nexo de causalidade já foi demonstrado a total falta de manutenção do edifício e a escuridão ocasionada nas escadas por quebras de energia como a que ocorreu à data do acidente, de onde se extrai que a Recorrente cumpriu o ónus de provar os respectivos pressupostos fácticos que originaram o facto ilícito a título de dolo ou mera culpa bem como a verificação dos danos patrimoniais e não patrimoniais e a sua correspondente imputação. XXVI. Se a Recorrente exerceu o seu ónus probandi o certo é que o acórdão recorrido vem ainda abrir a porta da responsabilidade civil presuntiva estabelecida no artigo 493.º, n.º 1 do CC, fechando-a, porém, a seguir dizendo que essa presunção seria sempre aferida em função de causa directa e activa do dano e não de causa passiva ou indirecta, o que contraria a Doutrina dominante no sentido de dizer que essa presunção existe desde que a pessoa tenha a posse da coisa móvel ou imóvel, tenha o dever de vigilância e não tome as providências indispensáveis para evitar a lesão. XXVII. É aqui que também se enquadra o documento de fls. 62 e o depoimento da testemunha CC em que reiteradamente é declarado existir uma culpa in vigilando não destruída por qualquer ónus da prova invertido em prejuízo do Primeiro Recorrido e que determina a sua culpabilidade, dentro dos princípios que emanam dos artigos 505.º e 506.º do CPC que o tribunal, ao tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que as deveria produzir, deve repartir o ónus da prova contra a parte a quem o facto aproveita. XXVIII. Assim, no âmbito de toda a prova produzida, fica claro que a existência da quebra da energia teve como causa a falta de manutenção do prédio, como a própria Segunda Recorrida confessa, e que se enquadra quer no conceito quer de culpa activa quer de culpa objectiva. XXIX. No caso dos autos e segundo o disposto no artigo 483.º do CC sobre o dolo e mera culpa, pelo menos a mera culpa e a culpa objectiva ficaram patentes, quer das situações anteriores existentes, confirmadas pela própria Segunda Recorrida e dadas como provadas, quer pela ocorrência que teve lugar de uma quebra de energia. XXX. Verificada e provada a existência de pelo menos negligência, existe em consequência a obrigação das Recorridas indemnizarem os prejuízos imediatos e mediatos, estes últimos ocorridos já em 2002, os quais deverão ser fixados em quantia idónea sobre os danos não patrimoniais e, quanto aos danos patrimoniais fixados os já determinados e relegados os restantes para execução de sentença, tanto mais que, do relatório médico junto sob documento 4 com a petição aperfeiçoada, resulta claro que os hematomas e a sua tumefacção foram consequência do acidente sofrido, apesar de imprevisíveis à data da sua ocorrência. XXXI. Violou por isso a sentença recorrida os artigos 325.º, 342.º, 474.º, 483.º, 493.º, 496.º e 498.º, todos do CC, e artigos 498.º, n.ºs 3 e 4 ex adverso, 505.º e 506.º do CPC.” A demandada “BB, S.A.”, em telegráfica alegação, refere que “a sentença recorrida decorre dos factos apurados após audiência de discussão e julgamento – os quais não foram postos em causa – não sendo merecedora de censura”. I.2. – Questões a merecer apreciação. Em face do (extenso e prolixo) quadro conclusivo sacam-se para apreciação as seguintes questões: a) – Excepção peremptória de prescrição; e na improcedência da matéria exceptiva: b) - Obrigação de indemnizar. Pressupostos da responsabilidade civil. c) – Subsidiariedade (da obrigação de indemnizar) com fundamento no enriquecimento sem causa. II. – FUNDAMENTAÇÃO. II.A. – DE FACTO. As instâncias tiveram como adquirido a factualidade que a seguir queda extractada. “1. A autora (A.) reside com os seus pais no ........ do prédio sito na Rua ............., nº ...., no Cacém – resposta (resp.) ao art. 1º da base instrutória (b.i.); 2. No dia 23 de Setembro de 2000, a A., no preciso momento em que descia as escadas do prédio onde vive para ir para a cerimónia do casamento da sua irmã, tropeçou devido à escuridão existente nas mesmas, caindo pelo lanço de escadas de pedra – resp. ao art. 2º da b.i.. 3. Em virtude de uma quebra de energia eléctrica, o elevador deixou de funcionar e as escadas ficaram totalmente às escuras – resp. ao art. 8º da b.i.. 4. Apesar de existirem dois elevadores, um deles há muito que está avariado – resp. ao art. 11º da b.i.. 5. A administração do prédio reduziu o período de funcionamento do automático, muito antes do dia 23 de Setembro de 2000, permitindo, no entanto, a subida de dois andares em condições normais – resp. aos arts. 12º e 13º da b.i.. 6. Na sequência da queda e face ao estado em que ficou, a A. foi transportada de ambulância para o Hospital Amadora-Sintra – resp. ao art. 4º da b.i.. 7. Ficou desde logo a sangrar da pálpebra e com fortes dores na perna esquerda – resp. ao art. 3º da b.i.. 8. No hospital, a A. foi anestesiada e suturada com alguns pontos na pálpebra – resp. ao art. 5º da b.i.. 9. Para além da sutura, ficou com hematomas e nódoas negras na perna esquerda – resp. ao art. 6º da b.i.. 10. E não pôde assistir ao casamento da irmã – resp. ao art. 7º da b.i.. 11. Na queda, a A. partiu uns óculos de graduação, tendo de ser substituídos por outros – resp. ao art. 14º da b.i.. 12. Teve a A. outras despesas, no valor de € 70,25, discriminadas nos documentos 2 e 3 juntos com a petição – resp. ao art. 16º da b.i.. 13. Em 11 de Janeiro de 2001, a A., mantendo fortes dores na per-na esquerda, em consequência do acidente, fez um exame de imagiologia à perna, requisitado pelo seu médico, em que foi detectado uma tumefacção, clinicamente diferenciável, resultante de pequenos hematomas, eventualmente em fase de reabsorção, embora fosse possível a sua organização fibrótica – resp. ao art. 17º da b.i.. 14. Houve um agravamento das dores e das dificuldades motoras da A., pelo que a mesma teve de realizar novo exame que determinou que tais hematomas estavam a tumefazer-se, o maior dos quais já com 2,1 cm associados aos hematomas e com tendência clara para a organização fibrótica – resp. ao art. 18º da b.i.. 15. O que constituía uma evolução negativa de toda a situação clí-nica que foi confirmada pelos relatórios de 18 de Março de 2002 e 22 de Julho de 2002, tendo este último já confirmado uma formação subcutânea hipo-ecógena sólida de formato tumolar com cerca de 5 cm de comprimento, relacionada com o anterior traumatismo – resp. ao art. 19º da b.i.. 16. A especialista de cirurgia vascular determinou a intervenção cirúrgica – resp. ao art. 20º da b.i.. 17. Na sequência da queda, as dores físicas da A. prolongaram-se por vários dias e agravam-se cada vez mais – resp. ao art. 21º da b.i.. 18. Até agora a evolução clínica tem sido negativa com a solidificação dos nódulos e o seu crescimento – resp. ao art. 22º da b.i.. 19. Não tem ainda a A. conhecimento integral dos danos e da sua extensão – resp. ao art. 23º da b.i.. 20. A A. sentiu um profundo desgosto com o acidente, agravado por ter sido no dia do casamento da sua irmã, onde não pôde estar presente – resp. ao art. 24º da b.i.. 21. A Administração do condomínio teve conhecimento do sinistro acima referido pela carta que lhe foi endereçada em 4 de Outubro de 2000 e junta como doc. nº 1 com a sua contestação – resp. ao art. 25º da b.i.. 22. A R.BB, S.A., é seguradora da responsabilidade civil extracontratual, na qualidade de proprietária, da Administração do condomínio do prédio, por força do contrato de seguro titulado pela apólice nº 34 0498645, do ramo multirriscos habitação, nos ter-mos das condições particulares da apólice o capital seguro que dá cobertura ao referido risco é de 1.500.000$00 – alíneas A) e B) dos Factos Assentes; 23. O então administrador, no dia 8 de Novembro de 2000, respondeu refutando qualquer responsabilidade do condomínio, nos termos do doc. nº 2 junto com a sua contestação, juntando a apólice de seguro com a 2ª R. – resps. aos arts. 26º e 27º da b.i.. 24. Foram estabelecidos contactos com a 2ª R., comunicando o sinistro, tendo esta respondido à A. com a junção da apólice de seguro, conforme doc. n.º 1 junto com a réplica – resps. aos arts. 28º e 29º da b.i..” II.B. – DE DIREITO. II.B.1. – Excepção peremptória de prescrição. Malgrado a ordem de conhecimento das questões por que o acórdão revidendo – primeiro os pressupostos da obrigação de indemnizar, com base na culpa, e por responsabilidade contratual (a seguradora), o facto é que não foi cumprido o disposto nos artigos 713.º, n.º 2 do CPC, ex vi do artigo 660.º do mesmo livro de leis. Na verdade preceitua este preceito, aplicável ex vi do n.º 2 do artigo 713.º do Código Processo Civil, que na sentença o Juiz deve começar por conhecer as excepções dilatórias e outras questões que impeçam o conhecimento da questão de mérito, tal como o autor concebeu a acção. Preceitua o artigo 493.º do CPC que “as excepções peremptórias importam a absolvição total ou parcial do pedido e consistem na invocação de factos que impedem, modifiquem ou extinguem o efeito jurídico dos factos articulados pelo autor”. (o sublinhado é, naturalmente, nosso). A questão que vem controvertida desde a primeira instância atina com o início da contagem do prazo prescricional. Enquanto que para as instâncias o inicio da contagem do mencionado prazo se deve ter como iniciado a partir do momento em que a A. viu emergir o direito na sua esfera jurídica, vale por dizer, desde o momento em que sofreu o evento danoso donde faz derivar a obrigação de indemnizar com base na responsabilidade extracontratual, para a A. esse prazo só se iniciaria a partir do momento em que teve conhecimento da extensão das lesões na sua totalidade, completude e definitividade, pois só a partir desse momento o direito se revelou na sua dimensão objectiva e de modo a poder ser reclamado em juízo. Até esse momento o direito, porque não definido na sua totalidade não poderia ter sido reclamado em juízo. Ou ainda numa outra tese argumentativa da A. o prazo prescricional ter-se-ia que ter por interrompido a partir do momento em que a companhia seguradora, em resposta a uma reclamação de pagamento dos danos efectuado pela A., disse ir ponderar questão. O instituto da prescrição tem o seu fundamento, nos ensinamento do Mestre Manuel Andrade, “[n]a negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei. Negligência que faz presumir ter ele querido renunciar ao direito, ou pelo menos o torna (o titular) indigno de protecção jurídica”. [[1]] Já para António Menezes Cordeiro, são dois os fundamentos do instituto da prescrição: - fundamento atinente ao devedor, e de ordem geral. Quanto ao primeiro “[a] prescrição visa, essencialmente, relevá-lo de prova.” Quanto ao segundo ela relevaria de razões “[a]tinentes à paz jurídica e à segurança”. [[2]] O início da contagem do prazo prescricional reporta-se ao artigo 306.º do Código Civil. Nos termos do n.º 1 deste preceito “o prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido (…)”. Vale por dizer que a partir do momento em que o titular do direito lesado ou merecedor de tutela jurisdicional, v.g. incumprimento de uma obrigação pecuniária ou lesão de um direito real de gozo, tiver conhecimento do facto jurídico donde emerge o direito à sua reintegração ou ressarcimento, se inicia o prazo a partir do qual deve ser exercitado, sob a cominação de o seu não exercício ocasionar o decesso do poder de o reclamar em juízo ou de accionar os meios jurisdicionais tendentes a fazê-lo valer. Tanto um como outro dos citados civilistas situa o facto despoletador do início da contagem do prazo desde que a divida seja exigível. Vale por dizer, que a partir do momento em que a divida, não sujeita a condição ou termo, puder ser exigida, começa a correr o prazo para o credor promover a sua cobrança em juízo. [[3]] Para Manuel de Andrade “[d]esde altura em que o credor pode promover a liquidação da divida começa a correr o prazo prescricional”. O prazo prescricional corre de forma contínua, a não ser que ocorram causas de suspensão ou de interrupção que suspendam ou ilaqueiem, no primeiro caso o decurso do tempo e no segundo apaguem o tempo já decorrido. Não curando aqui dão instituto da suspensão, por não atinar com a situação configurada pela recorrente, vejamos se ocorreu a causa de interrupção que é invocada para delir o tempo transcorrido entre o momento em que se verificou o evento danoso – facto supostamente ilícito e culposo imputado ao demandados – e aquele em que o direito é accionado ou exercitado. A interrupção da prescrição verifica-se quando ocorre um facto, ou promovido pelo titular do direito, v. g. através de uma acto judicial evidenciador de querer agir por forma a reclamar o direito de que se arroga, ou aceite pelo devedor , v. g. reconhecimento da situação ou do facto “[a] quem a prescrição pode prejudicar”, ou seja do prescribente. [[4]] Reclama a recorrente que dirigiu uma carta á 1.ª Ré e que esta tendo-lhe remetido a apólice de seguro e refutando qualquer responsabilidade no sinistro. Nas duas situações-tipo passíveis de desencadear o efeito interruptivo do prazo prescricional, por iniciativa do titular do direito ou por reconhecimento do prescribente (pessoa a favor de quem está a correr a prescrição), a recorrente pretende inculcar a ideia de que a 1.ª Ré reconheceu o direito quando na resposta à sua carta, de 4-10-2000, lhe remeteu a apólice de seguro e se mostrou colaborante. “O reconhecimento é o acto pelo qual o devedor confessa que deve. É um acto unilateral e pode ser expresso ou tácito”. [[5]] No caso concreto, e de acordo com a factualidade provada, [[6]] a comunicação à administração do prédio verificou a 4-10-2000 – 13 dias após a ocorrência do evento danoso (23-09-2000) – tendo esta respondido, em 08-10-2000, refutando qualquer responsabilidade, mas mostrando-se colaborante e tendo junto com a carta de resposta, em que descartava a responsabilidade própria, a apólice da seguradora. Nem a suposta atitude colaborante da administração do prédio pode ser tida como reconhecimento tácito da sua responsabilidade, nem ainda a eventual troca de correspondência com a seguradora pode inculcar esse efeito. Na verdade, se no primeiro caso, a administração do prédio rechaçou a sua responsabilidade, já quanto ao segundo só haveria uma maneira de a recorrente fazer cessar o prazo prescricional já decorrido, qual fosse a ter desencadeado uma acto postulativo, ou melhor dito uma acto postulativo legalmente idóneo, ou a propositura da acção ou notificação judicial avulsa. [[7]] Queda refutada uma das vias argumentativas alancedas pela recorrente para rebater a decisão do aresto revidendo quanto à questão da interrupção do decurso prazo prescricional dado que tendo a acção sido proposta em 30-06-2004 foi-o bastante tempo para além da data em tomou conhecimento de que o direito poderia ser exigido. Anotar-se-á como refere Menezes Cordeiro, que “[p]elo sistema objectivo (aquele que, segundo o Autor, foi consagrado no ordenamento civilista português – cfr. artigo 306.º do CC) o prazo começa a correr assim que o direito puder ser exercido e independentemente do conhecimento que, disso, tenha ou possa ter o respectivo credor”. [[8]] Numa outra via argumentativa para rebater a solução encontrada no aresto para a desinência da prescrição, a recorrente lança mão de um outro argumento, qual seja a de que só teve total a cabal conhecimento da extensão dos danos [[9]] Em nosso juízo, a tese adiantada pela recorrente não colhe, pelas razões teoréticas que ficaram enunciadas supra e que, substantivamente, se prendem com: a) o legislador ao fixar como início do prazo aquele momento em que o titular do direito teve conhecimento da exigibilidade do direito, quis significar que o prazo se inicia quando o direito surge na titularidade ou na esfera jurídica do sujeito activo; b) a lei só difere o início da contagem do prazo no caso das obrigações ilíquidas ou seja, neste caso, quando o credor puder promover a sua liquidação; c) não sendo o direito à obrigação de indemnizar, por responsabilidade aquiliana, um caso de obrigação ilíquida, mas de direito unitário e completo, o direito surge no dia em que ocorre o evento danoso de que emerge a responsabilidade civil extracontratual; d) uma coisa é a iliquidez da obrigação outra é a condenação em quantia a liquidar em execução de sentença que pode acontecer quando o tribunal não lograr apurar a extensão da obrigação de indemnizar (no caso de responsabilidade civil extracontratual); e) não sendo conhecidos todas as consequências decorrentes do facto ilícito danoso, mormente a concreta e exacta extensão dos danos, o titular do direito não deixa de poder exigir ao responsável pela obrigação de indemnizar o pagamento dos danos sofridos, podendo, podendo formular pedido no que se vier a liquidar em execução de sentença; f) nem no caso referido na alínea precedente está inibido de, se no decurso da acção, vier a ser possível conhecer a total amplitude e extensão dos danos, promover a ampliação do pedido, dado que sendo essa ampliação desenvolvimento do pedido primitivo a lei o permite – cfr. artigo 273.º do Código Processo Civil. Acresce que, no domínio das obrigações de indemnização, reza o n.º 2 do Código Civil que “Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”, podendo, no entanto, o tribunal “condenar desde logo o devedor no pagamento de uma indemnização, dentro do quantitativo que considere já provado” – cfr. artigo 565.º do mesmo livro de leis. Para além de que, ainda nos termos do artigo 569.º do mesmo diploma legal, “quem exigir a indemnização não necessita de indicar a importância exacta em que avalia os danos, nem o facto de ter pedido determinado quantitativo o · impede, no decurso da acção, de reclamar quantia mais elevada, se o processo vier a revelar danos superiores aos que foram inicialmente previstos.” A prescrição por responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, enuncia o art. 498.º, nº 1 do Código Civil o seguinte: "1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do facto danoso.” Pelas razões elencadas, e porque a recorrente teve conhecimento do seu direito no dia 23 de Setembro de 2000, por ter sido neste dia que soube, por nele ter ocorrido o evento danoso que geraria a responsabilidade de indemnizar a cargo dos Réus, está prescrito o direito de exigir o pagamento de indemnização pelos danos que reputa ter sofrido. Diversa seria a solução caso estivéssemos perante uma causa de pedir que tivesse por base a relação condominial, ou seja se a A. tivesse alegado que era condómina do prédio em questão. Em face das relações entre os condóminos – relação de natureza contratual – o prazo da prescrição decorreria no término do prazo ordinário que seria de vinte anos – cfr. artigo 309.º do Código Civil. Ocorre, porém, que a A. não alega que estivesse no prédio enquanto condómina, mas sim que se encontrava em casa de seus pais e que daí saiu para o casamento da irmã. Não alega, e por isso não resultou provado, qualquer facto donde resultasse a possibilidade de o tribunal proceder a uma requalificação ou convolação da petição inicial, dentro dos limites fixadas pelos dispositivos adrede – cfr. artigo 467.º Código Processo Civil. [[10]] A A., porém, em ponto nenhum da sua petição alega factos donde se possa retirar uma qualificação diversa da que vem sendo tratada desde a 1ª instância, a saber que a 1.ª Ré deveria ser responsabilizada a título de responsabilidade extracontratual. Considerando-se prescrito o direito, fica prejudicada a questão relativa à análise dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual, que se tinha enunciado supra como questão a apreciar. II.B.2. – Subsidiariedade (da obrigação de indemnizar) com fundamento no enriquecimento sem causa. Subsidiariamente, pretende a recorrente que os Réus sejam compelidos a indemnizá-la, tendo como relação jurídica fundante o enriquecimento sem causa, [[11]] ao amparo do disposto no n.º 4 do artigo 498.º do Código Civil. Preceitua este segmento de norma que “a prescrição do direito de indemnização não importa a prescrição da acção de reivindicação nem da acção de restituição por enriquecimento sem causa, se houver lugar a uma ou a outra” (o sublinhado é, naturalmente, nosso). “A obrigação de restituir e a correspondente pretensão à restituição, constituem assim uma forma compensação instituída pela lei para certas situações que, embora formalmente conformes aos seus preceitos, conduzem a resultados (de injusto enriquecimento) substancialmente reprovados pelo direito”. [[12]] Ainda segundo este Professor são requisitos da obrigação de restituir: a) – que haja um enriquecimento de alguém; b) – que o enriquecimento careça de causa justificativa; c) – que ele tenha sido obtido à custa de quem requer a restituição. Requisito irrefragável e inarredável é que aquele que se coloque na posição de obrigado a restituir tenha, com o acto ou o facto jurídico causante, obtido uma vantagem patrimonial que se traduza num aumento do património (activo) ou numa diminuição do património (passivo) ou ainda no uso ou consumo de coisa alheia ou no exercício de direito alheio ou por fim na poupança de despesas. [[13]/[14]] Na linha do ensinado pelo Professor Antunes Varela, e contrariamente ao que vem afirmado pela Relação, para que ocorra a obrigação de restituir não se torna, inelutável, que ocorra uma correspectiva deslocação patrimonial (enriquecimento) do património do empobrecido para o património daquele que recebeu a vantagem (enriquecido). Tal ocorre, como refere o citado Professor, nas situações em que tendo existido uma violação de bens jurídicos alheios ou de direitos (absolutos) pela intromissão de terceiros na esfera de direitos ou de interesses protegidos pela lei de forma total e absoluta pode, e de ordinário sucede, não acarretar uma deslocação patrimonial correspondente do património do sujeito passivo (titular do interesse ou direito violado) para o autor da violação, originando, fazendo nascer uma obrigação de restituir. [[15]] Tal como não se torna necessário que a vantagem patrimonial seja obtida (directamente) à custa de outrem. É o caso paradigmático do exemplo apontado por este Professor do padeiro que retira pequenas quantidades de massa que o dono lhe entregara para amassar. “A vantagem patrimonial diz-se em tais casos obtida à custa de outrem – por ser obtida com meios ou instrumentos pertencentes a outrem. Mandando, em semelhantes hipóteses, reverter para o titular do direito ou o dono da coisa o lucro proveniente de actos que eles não realizariam, a lei comunga numa ideia muito divulgada na literatura jurídica alemã pelos autores que perfilham a doutrina da destinação ou da afectação (Zuweisungslehre) dos direitos absolutos.” [[16]] A lei – cfr. artigo 474.º do Código Civil - consagra o princípio da subsidiariedade. [[17]] A consagração deste princípio inculca a ideia de que tendo o “empobrecido” ou o lesado outro meio legal de se ressarcir pelo prejuízo que foi causado pela intromissão abusiva e lesiva de outrem na sua esfera jurídica, está vedado o recurso ao instituto do enriquecimento sem causa. Isso mesmo parece resultar da lição do Professor Antunes Varela quando escreve: “[E] vários outros institutos, desde a responsabilidade civil baseada na ilicitude do acto, na culpa do agente e nos danos sofridos pelo lesado, até aos efeitos com que a lei castiga a posse de má fé, podem servir para, entre outros fins concomitantes, pôr termo a situações que, de outro modo, seriam fonte de verdadeiro enriquecimento sem causa.” [[18]] A Autora deduziu, em via principal, pedido de indemnização com base na responsabilidade civil extracontratual, por estimar ter a 1.ª Ré agido com culpa na conservação dos meios do edifício que teriam permitido a utilização das escadas sem qualquer perigo de queda. Imputa, assim, um comportamento negligente de que faz derivar um dano e a consequente obrigação de indemnizar a cargo da responsável do facto reputado de ilícito. Este era efectivamente o meio de ressarcimento do dano, que diz ter sofrido em consequência de um comportamento negligente da 1.ª Ré. A prescrição do direito ilaqueia a possibilidade de ressarcimento com base na responsabilidade civil e ainda que o artigo 498.º, n.º 4 do Código Civil permita que nos casos em que ocorra a prescrição do direito possa subsistir a acção de restituição por enriquecimento sem causa, mister é que possa haver lugar a ela. O raciocínio da Autora radica ou arranca do facto de que [a]purado o facto ilícito e o dever de indemnizar, o não pagamento duma qualquer indemnização por força de uma declarada prescrição corresponde a um efectivo empobrecimento da lesada e a um efectivo enriquecimento dos responsáveis, tal como é consagrado no n.º 4 do artigo 498.º do CC que determina que a prescrição do direito à indemnização não importa a prescrição da acção de restituição por enriquecimento sem causa e se isto está em sede de prescrição indemnizatória é porque se entende que o não pagamento de uma indemnização por prescrição corresponde ao empobrecimento do lesado e ao enriquecimento dos responsáveis”. Apela a recorrente, para justificar o pedido (subsidiário) de enriquecimento sem causa para a existência de um facto ilícito – que teria sido levado a efeito (por omissão) pela 1.ª Ré – donde decorreria o dever de indemnizar. Na análise que é feita dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual em que a A. funda a obrigação de indemnizar a cargo da 1.ª Ré, no aresto sob critica, concluiu-se pela inexistência de uma conduta negligente donde se possa extrair uma responsabilização conducente à obrigação de indemnizar, com base na culpa, efectiva ou sequer presumida. São pressupostos da responsabilidade civil: a) a ocorrência de um facto (comissivo ou omissivo); b) a ilicitude desse facto; c) a culpa; d) o nexo de causalidade de imputação do facto ao agente; e) a ocorrência de um dano. A Autora faz derivar do facto de ter ocorrido uma quebra repentina e súbita da luz eléctrica servia as escadas do prédio a impossibilidade de lobrigar os lanços de escada e com isso ter ocasionado a queda de que resultaram os ferimentos para que pede ressarcimento compensatório. Como causa remota, mas determinante dessa quebra de luz, por rebentamento dos fusíveis, o facto de a 1.ª Ré não ter cuidado, com zelo e no estrito cumprimento dos deveres de administração do condomínio, da instalação eléctrica do prédio. [[19]] Da matéria de facto não resulta que, malgrado alguma falta de manutenção do condomínio, como parece ressaltar da carta junta a fls. 62 pela companhia seguradora, o rebentamento dos fusíveis possa ter ocasionado a queda da A.. Na verdade resulta provado que mesmo na ausência de luz no espaço das escadas a existência de uma luz de presença permite a visibilidade para “subida de dois andares”. (Ter-se-á querido dizer dois lanços de escadas correspondentes a dois andares. Só desta forma é possível compreender a alusão a dois andares. Não se sobem dois andares, sobem-se as escadas que permitem o acesso aos andares). Para que pudesse ser imputada uma conduta negligente á 1.ª Ré, indutora da causa que determinou a queda da A. – neste caso o rebentamento dos fusíveis de que resultaria uma quebra súbita de visibilidade causadora da queda – e induzida por uma deficiente e descuidada conservação e manutenção do estado geral da instalação eléctrica, teria sido necessário provar: primeiro que tinha ocorrido um rebentamento dos fusíveis; e segundo que esse rebentamento tinha sido induzido por uma deficiente e desmazelada incúria da instalação do prédio (de que a administração é, naturalmente, responsável, nos termos dos artigos 1427.º e 1436.º, alíneas f) e g), do CC). Não tendo a A. logrado demonstrar a ocorrência de um comportamento culposo imputável à 1.ª Ré fenece um dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual e, consequentemente, a obrigação de indemnizar que quedaria a seu cargo. A A., como se dessume da sua alegação, induz o enriquecimento sem causa da 1.ª Ré da diminuição do seu próprio património. Vale por dizer que a diminuição do seu património seria equivalente às despesas que teve que suportar para tratamento das lesões sofridas com a queda do passo que o enriquecimento da 1.ª Ré corresponderia ao aforro de quantia equivalente, por não ter que a despender. Para que esse enriquecimento se verificasse, nos preditos termos, tornar-se-ia necessário que a 1.ª Ré tivesse enriquecido à custa da conduta culposa ou dito de forma mais singela que tivesse ocorrido uma deslocação patrimonial que correspondesse ao empobrecimento/diminuição do seu próprio património. Não demonstra a A. que tenha existido uma deslocação patrimonial que tivesse enriquecido o património da 1.ª Ré, pelo que fenecendo este requisito, axial e inderrogável, do instituto de enriquecimento sem causa sucumbiria, desde logo, o pedido formulado a este título. Não procede o pedido subsidiário de obrigação de restituir com base no enriquecimento sem causa. III. – DECISÃO. Na decorrência do que fica exposto, decidem os juízes que constituem este colectivo, na 1.ª secção do Supremo Tribunal de Justiça, em: - Negar a revista. - Condenar a recorrente nas custas. Lisboa, 12 de Julho de 2011 __________________________ [6] cfr. resposta aos quesitos 26 a 29, que queda transcrita. “O então administrador, no dia 8 de Novembro de 2000, respondeu refutando qualquer responsabilidade do condomínio, nos termos do doc. nº 2 junto com a sua contestação, juntando a apólice de seguro com a 2ª R. – resps. aos arts. 26º e 27º da b.i.. 24. Foram estabelecidos contactos com a 2ª R., comunicando o sinistro, tendo esta respondido à A. com a junção da apólice de seguro, conforme doc. n.º 1 junto com a réplica – resps. aos arts. 28º e 29º da b.i..” [9] Queda transcrito o troço conclusivo adrede. “Só a 13.12.2001 e posteriormente durante o ano de 2002, é que os sucessivos exames imagiológicos determinavam que os hematomas em vez de liquefeitos, estavam a tumefazer-se, sendo certo que foi este facto novo, imprevisível como dano à data do acidente e no primeiro ano após o mesmo, que depois se veio a agravar com o aumento da tumefacção e que deu origem aos sucessivos agravamentos que ainda hoje não permitem à Recorrente e lesada ter conhecimento integral dos danos e sua extensão, conforme está claramente provado no ponto 21 da matéria fixada, pelo que, tendo ocorrido tais factos novos em Dezembro de 2001 e integrando esses factos novos a causa de pedir na acção interposta a 30.06.2004, não está obviamente prescrito, mesmo por singelo decurso do prazo, esse direito à indemnização. XX. Na verdade e conforme dispõe o douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido nestes autos e sobre a matéria da prescrição, não era de exigir no caso concreto que a Recorrente tivesse em 2000 um prognóstico da gravidade das lesões que a iriam atingir mais tarde, sendo certo que, se a partir de 2001, os exames médicos iam apontando para o agravamento do quadro clínico, é definitivamente apenas o exame médico de 22.07.2002 que confirma a formação subcutânea de massas com cerca de 5 cm, o que precisamente consta na matéria provada do acórdão recorrido.” [10] cfr. quanto ao principio do dispositivo e o correlato principio da substanciação o acórdão deste Tribunal de 02-02-2010 (relatado pelo Conselheiro Sebastião Povoas). “O seu conceito (da causa de pedir) é delimitado pelos factos jurídicos dos quais procede a pretensão formulada pelo demandante, sendo especificada com alegação de factos ou circunstâncias concretas ou individualizadas. “E, de acordo com o artigo 264.º do Código de Processo Civil “às partes cabe alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as suas excepções’ (n.º 1), sendo que o julgador ‘só pode fundar a decisão nos factos alegados pelas partes, sem prejuízo do disposto nos artigos 514.º e 665.º, de atender, ainda que oficiosamente, aos factos instrumentais que resultem da instrução e da discussão da causa e, finalmente, os factos que sejam ‘complemento ou concretização de outros’ (...) ‘desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar’ e garantido, que seja, o contraditório (n.º 2 e 3). Para além deste preceito e dos artigos 273.º n.º 1 (modificação da causa de pedir) e 660.º°, n.º 2 (questões a conhecer em sede de decisão e seus limites — artigo 661.º, n.º 1) importa aqui acentuar o princípio do artigo 664.º: ‘O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no artigo 264.º’. O demandante, antes de culminar com o pedido, tem de alegar os factos concretos que irão produzir o efeito jurídico que quer obter, de acordo com os artigos 467.º, n.º 1, alínea d) e 498.º, n.º 4, também do Código de Processo Civil, assim delimitando (ou caracterizando precisamente) a sua pretensão (cf., v.g., o Prof. Lebre de Freitas, in “Introdução ao Processo Civil”, 53). Trata-se de consagrar inequivocamente o princípio do dispositivo ou, na expressão do Prof. Teixeira de Sousa, o ‘princípio da disponibilidade do objecto’ ou da ‘disponibilidade objectiva’. E é perante tal que o juiz fica limitado nos termos do citado n.º 1 do artigo 661.º do CPC e, consequentemente, impedido de ir para além desses limites, quer em condenação, quer em absolvição) ou encontrar coisa diversa da que lhe foi pedida. Mas a lei consagrou a teoria da substanciação, precisamente no n.º 4 do artigo 498.º da lei adjectiva. A também chamada ‘teoria da consubstanciação’ implica que a causa de pedir se traduza no facto jurídico em que se baseia o pedido. É o título gerador do direito invocado que tem de se distinguir, em termos dogmáticos, quer dos factos materiais alegados, quer das razões jurídicas invocadas, devendo ser definida em função da qualificação jurídica dos factos necessários à determinação do direito (cf. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 2004 — 04B853). Daí que, quando se define — como atrás de procurou fazer — causa de pedir, tem de entender-se não como o acto, ou facto jurídico, abstracto mas em concreto (aquele, o certo, o que foi determinado, o que o Autor individualizou). (cf., o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 2003 -03 A 1848 — relatado pelo, aqui, 2.º adjunto). É então que é exercida a função delimitadora, impedindo o julgador de ultrapassar essa barreira, deixando-lhe, tão-sómente, a liberdade de buscar, interpretar e aplicar as regras do direito.”, como se diz no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Maio de 2009 – 162/09 – 1YFLSB,deste Colectivo.” [11] “XXII. Quanto ao pedido subsidiário do pagamento indemnizatório com base no instituto do enriquecimento sem causa daqueles que tinham o dever de indemnizar, também sobre esta matéria o acórdão recorrido manteve a improcedência por inexistir uma relação directa entre enriquecimentos das Recorridas e o empobrecimento da Recorrente, ou seja, em suma, uma deslocação patrimonial, declarando inclusive que a Recorrente tinha lançado mão desse instituto sem qualquer razão. XXIII. Apurado o facto ilícito e o dever de indemnizar, o não pagamento duma qualquer indemnização por força de uma declarada prescrição corresponde a um efectivo empobrecimento da lesada e a um efectivo enriquecimento dos responsáveis, tal como é consagrado no n.º 4 do artigo 498.º do CC que determina que a prescrição do direito à indemnização não importa a prescrição da acção de restituição por enriquecimento sem causa e se isto está em sede de prescrição indemnizatória é porque se entende que o não pagamento de uma indemnização por prescrição corresponde ao empobrecimento do lesado e ao enriquecimento dos responsáveis. XXIV. Em consequência, enquanto a Recorrente possa, como entende que pode, gozar da acção de indemnização fundada em responsabilidade civil, não é lícito deduzir o pedido fundamentado no enriquecimento sem causa como pedido principal, mas sim, figurando esse pedido na mesma acção a título subsidiário, o que significa que só no termo do prazo de prescrição do artigo 498.º, n.º 1 do CC, é que começará a correr o prazo de prescrição do enriquecimento em que se funda o pedido, devendo por isso e nesta base ser também matéria relevante a decidir favoravelmente.” [16] cfr. Antunes Varela, in op. loc. cit, pág. 460-462. Consagra esta doutrina – da destinação ou da afectação – a ideia de que “[os] direitos reais, bem como a propriedade intelectual (direitos de autor e propriedade industrial), não constituem simples direitas de exclusão, assentes sobre o dever geral de não ingerência (de terceiros) na ligação do titular com a res, a obra, patente, invento, etc. Mais do que isso, os direitos reais e direitos absolutos afins reservam para o respectivo titular o aproveitamento económico dos bens correspondentes, expresso nas vantagens provenientes do seu uso, fruição, consumo ou alienação. Tudo quanto estes bens sejam capazes de render ou produzir pertence, em princípio, de acordo com o conteúdo da destinação ou afectação (Zuweisungsgehalt) de tais direitos, ao respectivo titular. A pessoa que, intrometendo-se nos bens jurídicos alheios, consegue uma vantagem patrimonial, obtém-na a custa do titular do respectivo direito, mesmo que este não estivesse disposto a realizar os actos donde a vantagem procede. A aquisição feita pelo intrometido carece de causa porque, segundo a tal correcta ordenação jurídica dos bens, a vantagem patrimonial alcançada pelo enriquecido pertence a outra pessoa – ao titular do direito. Trata-se de uma vantagem que estava reservada ao titular do direito segundo o conteúdo da destinação desse direito.” cfr. ainda, neste sentido, o já citado acórdão deste Tribunal de 03-11-2008. [19] Na alegação da Autora: “a falta de luz que originou a sua queda nas escadas do prédio se deveu ao rebentamento dos fusíveis do prédio, tendo o elevador deixado de funcionar (art. 8º), o que aconteceu naquele dia, mas que já vinha sucedendo com frequência devido a infiltrações e humidades (art. 9º); - a falta de luz impossibilita o funcionamento do único elevador que ainda trabalha e, apesar de existirem dois, um deles há muito tempo que está avariado (art. 10º); - a administração do prédio terá reduzido o período de funcionamento do automático das escadas, nas raras vezes que funciona (art. 11º), o que leva a que se apaguem as luzes, após a descida de um único lanço de escadas ou, quando a luz funciona, após a subida do elevador, equivalente a meio andar.” (extracto retirado do acórdão da Relação). |