Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | LOPES DA MOTA | ||
Descritores: | DETENÇÃO PRISÃO ILEGAL EXPULSÃO COLOCAÇÃO EM CENTRO DE INSTALAÇÃO TEMPORÁRIA | ||
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Data do Acordão: | 05/23/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | HABEAS CORPUS | ||
Decisão: | INDEFERIR O PEDIDO DE HABEAS CORPUS | ||
Área Temática: | DIREITO PROCESSUAL PENAL – MEDIDAS DE COACÇÃO E DE GARANTIA PATRIMONIAL / MEDIDAS DE COACÇÃO / MODOS DE IMPUGNAÇÃO. DIREITO CONSTITUCIONAL – DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS PESSOAIS. | ||
Doutrina: | - Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, p. 508; - Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2005, p. 303, 343 e 344. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 142.º, N.º 1, ALÍNEA C), 220.º, N.º 1, 221.º, 222.º, 223.º E 224.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 27.º, 28.º E 31.º, N.º 1. ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E AFASTAMENTO DE ESTRANGEIROS, APROVADA PELO DL N.º 244/98, DE 8 DE AGOSTO. LEI N.º 53/2003, DE 22 DE AGOSTO. CENTROS DE INSTALAÇÃO TEMPORÁRIA, APROVADO PELA LEI N.º 34/94, DE 14 DE SETEMBRO: - ARTIGO 3.º, N.º 2. ENTRADA, PERMANÊNCIA, SAÍDA E AFASTAMENTO DE ESTRANGEIROS DO TERRITÓRIO NACIONAL, APROVADA PELA LEI N.º 23/2007, DE 4 DE JULHO E RESPECTIVA ALTERAÇÃO DADA PELA LEI N.º 29/2012, DE 9 DE AGOSTO: - ARTIGO 160.º. PROPOSTA DE LEI N.º 50/XII. | ||
Referências Internacionais: | CONVENÇÃO DE APLICAÇÃO DO ACORDO DE SCHENGEN. DIRECTIVA 2008/115/CE DO PARLAMENTO EUROPEU E DO CONSELHO DE 16-12-2008 (CONHECIDA COMO “DIRECTIVA RETORNO”): - ARTIGO 160.º. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 13-03-2008, PROCESSO N.º 08P926, IN WWW.DGSI.PT; - DE 09-02-2011, PROCESSO N.º 25/10.8MAVRS-B.S1; - DE 21-11-2012, PROCESSO N.º 22/12.9GBETZ-0.S1; - DE 11-02-2015, PROCESSO N.º 18/15.9YFLSB.S1; - DE 30-09-2015, PROCESSO N.º 8/15. 1ZRCTB, IN WWW.DGSI.PT; - DE 17-03-2016, PROCESSO N.º 289/16.3JABRG-A.S1. | ||
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Sumário : | 1. A Constituição da República consagra, no artigo 31.º, n.º 1, como direito fundamental, a providência de habeas corpus contra o abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente. O abuso de poder deve afectar o direito à liberdade, isto é, o direito à liberdade física, à liberdade de movimentos, o direito de locomoção, e ao consequente direito de não ser detido, aprisionado, confinado a um espaço. 2. O regime de habeas corpus constante dos artigos 220.º a 224.º do CPP repercute a distinção entre detenção e prisão, conferindo competência ao juiz de instrução ou ao Supremo Tribunal de Justiça consoante se trate de habeas corpus em virtude de detenção ilegal ou de habeas corpus em virtude de prisão ilegal, no pressuposto de que a privação da liberdade ocorre por acção de “qualquer autoridade” (artigo 220.º, n.º 1, do CPP) ou em virtude de “prisão” (artigo 222.º, n.º 1, do CPP), respectivamente. 3. O âmbito de protecção constitucional da liberdade por via de habeas corpus e a coerência interna do sistema obrigam a uma assimilação de regimes, de modo a incluir-se a medida detentiva de colocação em instalação temporária por ordem do juiz no conceito processual de “prisão” utilizado no artigo 222.º do CPP. Tratando-se de uma privação de liberdade por decisão judicial, a petição de habeas corpus deverá ser dirigida ao Supremo Tribunal de Justiça. 4. Em interpretação teleologicamente orientada em conformidade com o âmbito da tutela constitucional do direito à liberdade (artigos 27.º, 28.º e 31.º da Constituição), a providência de habeas corpus constitui um meio de defesa contra possíveis abusos de poder em virtude de privação ilegal da liberdade mediante colocação em centro de instalação temporária, nomeadamente em caso de ultrapassagem dos respectivos prazos. Tendo em conta o regime legal e as condições de execução da medida, as quais se traduzem no confinamento da pessoa num espaço do qual não pode sair, a medida constitui-se numa restrição profunda do direito de liberdade que, pelo seu grau e intensidade, afecta o núcleo essencial deste direito, devendo concluir-se que a pessoa fica privada da sua liberdade, isto é, que a pessoa fica presa, na acepção e para os efeitos do n.º 1 do artigo 222.º do CPP. 5. No âmbito dos “processos de expulsão” (em que, na lógica do regime da Lei n.º 23/2007, se compreendem quer os processos de afastamento coercivo, quer os de expulsão judicial) podem ser aplicadas as medidas de coacção previstas no CPP, com excepção da prisão preventiva, e ainda as previstas no artigo 142.º, entre as quais se inclui a colocação do expulsando em centro de instalação temporária (al. c. do n.º 1), sendo competente para o efeito os tribunais de comarca com competência no local onde for encontrado o cidadão estrangeiro. 6. Na falta de regulamentação de prazos máximos no Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, e na Lei n.º 53/2003, de 22 de Agosto, seria aplicável o disposto no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro, quanto à colocação em centro de instalação temporária, que, assim, não podia exceder dois meses. 7. Porém, com as alterações decorrentes da Lei n.º 29/2012, de 9 de Agosto, o artigo 160.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, passou a prever prazos específicos de duração da colocação em centro de instalação temporária para efeitos de execução coerciva da decisão de afastamento ou expulsão do território nacional. Prevê-se agora que o SEF possa requerer ao juiz competente que o cidadão estrangeiro fique sujeito ao regime de colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, por período não superior a 30 dias, e que este prazo pode ser superior, embora não possa nunca exceder três meses, nos casos em que existam, relativamente ao cidadão estrangeiro, fortes indícios de ter praticado ou tencionar praticar factos puníveis graves, ou ter sido condenado por crime doloso, ou constituir uma ameaça para a ordem pública, para a segurança nacional ou para as relações internacionais de um Estado membro da União Europeia ou de Estados onde vigore a Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen. 8. Tendo o peticionante sido colocado por decisão judicial no centro de instalação temporária do aeroporto, pelo prazo máximo de 30 dias, após ter saído da prisão em liberdade condicional, tendo, dentro desse prazo, sido autorizada a manutenção dessa colocação pelo prazo máximo de 90 dias e mantendo-se a detenção dentro deste prazo máximo, não se verifica fundamento para deferimento da petição de habeas corpus. | ||
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Decisão Texto Integral: | ACÓRDÃO Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça:
I. Relatório 1. AA, identificado nos autos, detido no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro, apresenta petição de habeas corpus, alegando encontrar-se em situação de prisão ilegal, com fundamento nas disposições conjugadas dos artigos 31.º da Constituição, 222.º, n.º 1 e n.º 2, al. c) do Código de Processo Penal (CPP), 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro, e 146.º, n.º 3 da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho. É do seguinte teor a petição apresentada: «1. No dia 16 de Março de 2018, o aqui Peticionante foi detido pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, no âmbito do Processo de Afastamento Coercivo (PAC) n.º 29/2012 que correu termos na Delegação de Setúbal do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras que decidiu aplicar ao Peticionante a medida de expulsão de território nacional pelo período de 7 (sete) anos – cf. documento nº 1 que se junta; 2. A detenção do Peticionante pelo SEF no dia 16/03/2018 teve como objectivo a executoriedade da decisão administrativa e a promoção do seu afastamento coercivo de território nacional e repatriamento para ... de onde é natural. 3. Por despacho judicial proferido no âmbito do proc. n.º 965/18.6T8FAR pelo Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Faro - Juiz 1, datado de 16 de Maço de 2018, notificado ao Peticionante em 17/03/2018 – cfr. Documento n.º 2 que junta – foi ao abrigo do disposto no nº 3 da Lei nº 34/94, de 14 de Setembro validada a detenção do arguido nas instalações temporárias do SEF no Aeroporto de Faro. 4. Da decisão administrativa de afastamento coercivo, interpôs o aqui peticionante Providência Cautelar de Suspensão de Eficácia de Acto Administrativo, que deu entrada no dia 19/03/2018 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, e que aí corre termos na Unidade Orgânica 1, sob o nº 147/18.5BELLE, cf. documentos nº 3 e 4 que junta. 5. encontrando-se agendado o dia 30 de Maio de 2018, pelas 14h30 para a realização da audiência de discussão e julgamento – cf. mesmo documento nº 4 junto. Ora, 6. Dispõe o n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro, que “A instalação, sempre que determinada, manter-se-á até à concessão de visto de permanência ou da autorização de residência, ou à execução da decisão da expulsão ou ao reembarque do estrangeiro, não podendo exceder o período de dois meses, e deve ser judicialmente reapreciada ao fim de cada período de oito dias. 7. Por seu turno o artigo 146.º, nº 2, da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, dispõe que “Se for determinada a detenção em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, é dado conhecimento do facto ao SEF para que promova o competente processo visando o afastamento do cidadão estrangeiro do território nacional.” 8. E o n.º 3 do mesmo preceito legal prescreve que “a detenção prevista no número anterior não pode prolongar-se por mais tempo do que o necessário para permitir a execução da decisão de expulsão, sem que possa exceder 60 dias.” 9. Sucede que desde a data da sua detenção (16/03/2018) para efectivação da decisão de expulsão administrativa, até à presente data (17/05/2018), mantém-se o aqui Peticionante em situação de privação da liberdade nas Instalações Temporárias (I.T.) do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras no Aeroporto de Faro, 10. ou seja, encontra-se ininterruptamente privado da liberdade há já 62 (sessenta e dois) dias, 11. tendo sido ultrapassado o prazo máximo legalmente previsto no supra aludido artigo 3.º da Lei nº 34/94, de 14 de Setembro, para a manutenção da situação processual do Peticionante à ordem do processo administrativo de expulsão. Termos em que Sempre com o douto suprimento de V. Exa., deve ser concedido provimento à presente Petição de Habeas Corpus, por se tratar, indiscutivelmente, de uma situação de prisão ilegal por força das disposições conjugadas dos artigos 222.º, n.º 1 e n.º 2 al. c) do Código de Processo Penal e artigo 3.º da Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro, ordenando-se que o arguido seja imediatamente restituído à liberdade, aguardando os ulteriores termos do processo em liberdade (…)». 2. A petição foi enviada ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça acompanhada da informação a que se refere o artigo 223.º, n.º 1, do CPP, sobre as condições em que foi efectuada e se mantém a prisão. Da informação consta o seguinte: «Ao abrigo do disposto no art.º 223.º, n.º 1 do CPP ordeno o envio imediato da petição ao Ex.mo Sr. Presidente do Supremo Tribunal de Justiça com as seguintes informações: 3. Foram juntas aos autos cópias de documentos dos quais resulta o seguinte: a) Do relatório do processo de afastamento coercivo n.º 29/GAF/12, de 27.7.2016, em que é proposto que seja imposta ao peticionante a medida de afastamento coercivo do território nacional para ..., com interdição de entrada em território nacional por um período de 7 anos, com fundamento na alínea a) do n.º 1 do artigo 134.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 29/2012, de 4 de Julho, em virtude de se encontrar em situação irregular em território nacional, por não deter autorização de residência válida nem visto válido e ter excedido o tempo de permanência em Portugal (fls. 8-11); b) Da decisão do Director Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de 28.7.2016, que, em concordância com a proposta, com fundamento na citada alínea a) do n.º 1 do artigo 134.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, determinou a “expulsão” do peticionante do território nacional e a sua interdição de entrada por um período de 7 anos (fls. 13); c) Da notificação desta decisão de “expulsão” (“afastamento coercivo”, diz-se na notificação) ao peticionante em 27.10.2016, no Estabelecimento Prisional do Montijo, da qual consta que, no mesmo acto, o peticionante foi informado de que poderia impugnar a decisão junto do tribunal administrativo e de que seria afastado do território nacional assim que fosse determinada a sua libertação, nos termos do n.º 1 do artigo 160.º da Lei n.º 23/2007 (fls. 23); d) Da decisão do Tribunal de Execução das Penas de Lisboa (TEP) de 16.3.2018, no processo n.º 838/14.1.TXLSB-C, que concedeu a liberdade condicional ao peticionante a partir dessa data e pelo tempo de prisão que lhe faltava cumprir, até 11.12.2019 (fls. 29-36), da qual consta que este se encontrava a cumprir, desde 5.5.2014, em execução sucessiva, as penas de 4 anos e 9 meses de prisão, pela prática de um crime de estupefacientes, de 100 dias de prisão subsidiária, pela prática de um crime de furto simples e de um crime de furto de uso de veículo, de 80 dias de prisão subsidiária, pela prática de um crime de furto simples na forma tentada, e de 133 dias de prisão subsidiária pela prática de um crime de detenção de arma proibida (fls. 29-36); e) Do pedido do SEF, de 16.3.2018, dirigido ao juiz do tribunal de Faro, pelo qual informava esse tribunal que o TEP havia determinado, nessa data, a libertação do peticionante e que o “foi buscar” ao Estabelecimento Prisional do Montijo para execução da medida de afastamento coercivo e solicitava ao juiz que autorizasse a sua “instalação e manutenção no EECIT do Aeroporto de Faro, nos termos do n.º 3 do art.º 160.º da Lei 23/07 de 04JUL, com as alterações introduzidas pela Lei 102/17 de 28AGO, até ao seu embarque (fls. 21) f) Do despacho do juiz do Juízo Local de Faro (Juiz 1) do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, da mesma data (16.3.2018), no processo 965/18.6T8FAR, do seguinte teor: «O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras veio requerer que seja determinada a instalação e manutenção do cidadão estrangeiro AA (…) no Centro de Instalação Temporária do Aeroporto de Faro, pelo período estritamente necessário à execução da decisão de expulsão do território nacional. Verificado o circunstancialismo a que aludem os artigos 160.º, n.º 3, e 161.º, n.º 2, da Lei n.º 23/2007, de 4.07, determina-se que o identificado cidadão estrangeiro permaneça no Centro de Instalação Temporária do Aeroporto de Faro pelo tempo estritamente necessário à execução da aludida decisão. (…) Enquanto não houver informação do SEF acerca do abandono do território nacional, conclua os autos ao fim de cada período de oito dias de permanência do cidadão no centro de instalação temporária, para os efeitos previstos no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, de 14.09» (fls. 37); g) Do despacho de 5.4.2018, proferido no mesmo processo, em que foi ordenado se solicitasse ao SEF informação urgente sobre se o peticionante já havia sido afastado (fls. 38); h) Da informação prestada pelo SEF ao tribunal de Faro, em 9.4.2018, da qual consta que o peticionante interpôs uma providência cautelar no TAF de Loulé, no dia 19.3.2018, tendo em vista a suspensão de eficácia do acto administrativo de expulsão, pelo que este ainda se encontrava no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro (fls. 39); i) Do despacho judicial de 10.4.2018, que manteve a decisão de permanência no centro de instalação temporária, do seguinte teor: «Por se manterem os pressupostos de facto e de direito verificados no despacho de 16/03/2018 e ainda não se mostrar esgotado o prazo de 2 meses a que alude o artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, de 14/09, decido manter a decisão de permanência do cidadão AA no Centro de Instalação Temporária pelo período estritamente necessário à execução da decisão de expulsão do território nacional» (fls. 40); j) Do pedido do SEF, de 11.4.2018, dirigido ao juiz do tribunal de Faro, em que se solicitava a manutenção do peticionante no centro de instalação temporária pelo prazo máximo de 90 dias, nos seguintes termos: «Uma vez que o prazo de 30 dias referido no n.º 3 do art.º 160.º da Lei 23/07 de 04JUL, com as alterações introduzidas pela Lei 102/17 de 28AGO se esgota no próximo dia 14ABR2018 e uma vez que se aguarda despacho relativo à providência cautelar interposta pelo cidadão aos 19MAR2018 no TAF de Loulé (proc.º 148/18.5BELLE), vimos por este meio solicitar a V.ª Ex.ª se digne autorizar a sua manutenção no EECIT do Aeroporto de Faro, nos termos do n.º 6 do art.º 160.º da Lei 23/07 de 04JUL, com as alterações introduzidas pela Lei 102/17 de 28AGO, ou seja pelo prazo máximo de 90 dias» (fls. 41); k) Do despacho do juiz do Juízo Local de Faro (Juiz 1), do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, no processo n.º 965/18.6T8FAR, de 11.5.2018, que deferiu o pedido do SEF nos seguintes termos: «O SEF veio requerer que se mantivesse a instalação pelo prazo de 90 dias, nos termos do art.º 160.º, n.º 6, da Lei n.º 23/2007, de 04/07, invocando que o cidadão estrangeiro interpôs providência cautelar para impedir o afastamento de território nacional e o processo administrativo se encontra a aguardar a prolação de decisão (a proferir após a audiência a realizar no dia 30/05/2018). Nos termos do preceito legal acima referido, o período de detenção em centro de instalação temporária pode ser determinado pelo período máximo de 3 meses “nos casos em que existam, relativamente ao cidadão estrangeiro, fortes indícios de ter praticado ou tencionar praticar factos puníveis graves, ou ter sido condenado por crime doloso, ou constituir uma ameaça para a ordem pública, para a segurança nacional ou para as relações internacionais de um estado membro da União Europeia ou de Estados onde vigore a Convenção de Aplicação”. Na medida em que AA foi condenado por diversos crimes dolosos, incluindo tráfico de estupefacientes, que é indiscutivelmente grave (cf. fls. 35 a 49), mostra-se legalmente justificado o prolongamento do período de colocação no centro de instalação temporária até ao período máximo de 90 dias. Por outro lado, mantêm-se os pressupostos de facto e de direito que determinaram a manutenção de AA em Centro de Instalação Temporária até à execução da decisão de expulsão. Pelo exposto, decido manter a decisão de colocação do cidadão no Centro de Instalação Temporária pelo período estritamente necessário à execução da decisão de expulsão do território nacional e, no máximo, 90 dias” (fls. 44). 4. Convocada a secção criminal, notificados o Ministério Público e o defensor, realizou-se audiência, tudo em conformidade com o disposto nos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 223.º do CPP. Terminada a audiência, a secção reuniu para deliberar (artigo 223.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPP), fazendo-o nos termos que se seguem. II. Fundamentação 5. A Constituição da República consagra, no artigo 31.º, n.º 1, como direito fundamental, a providência de habeas corpus contra o abuso de poder por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente. O abuso de poder deve afectar o direito à liberdade, isto é, o direito à liberdade física, à liberdade de movimentos, o direito de locomoção, e ao “consequente direito de não ser detido, aprisionado, confinado a um espaço”. O habeas corpus, que pode ser requerido pela própria pessoa lesada no seu direito à liberdade ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos (n.º 2 do artigo 31.º), consiste numa providência expedita e urgente contra a prisão ou detenção ilegais, “contrários aos princípios da constitucionalidade e da legalidade das medidas restritivas da liberdade”, numa “providência de carácter excepcional destinada a proteger a liberdade individual nos casos em que não haja outro meio legal de fazer cessar a ofensa ao direito à liberdade”, sendo, por isso, uma garantia privilegiada deste direito, por motivos penais ou outros, garantido nos artigos 27.º e 28.º da Constituição (assim, Gomes Canotilho / Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, anotação ao artigo 31.º, p. 508, e Jorge Miranda / Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2005, anotação ao artigo 31.º, p. 303, 343-344). Nos termos do artigo 27.º, todos têm direito à liberdade e ninguém pode ser privado dela, total ou parcialmente, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de acto punido por lei com pena ou de aplicação judicial de medida de segurança. Exceptua-se deste princípio a privação da liberdade, no tempo e nas condições que a lei determinar, nos casos previstos no n.º 3 do mesmo preceito constitucional, em que se inclui a “prisão, detenção ou outra medida coactiva sujeita a controlo judicial, de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou de expulsão” (n.º 3, al. c). 6. A Lei n.º 34/94, de 4 de Julho, regula o acolhimento de estrangeiros, em centros de instalação temporária, distinguindo entre acolhimento por razões humanitárias e acolhimento por razões de segurança. Nos termos do artigo 3.º, n.º 1, deste diploma, a instalação por razões de segurança é uma medida detentiva ordenada pelo juiz competente, com base num dos seguintes fundamentos: garantia do cumprimento da decisão de expulsão, desobediência a decisão judicial de apresentação periódica ou necessidade de assegurar a comparência perante a autoridade judicial. De acordo com o disposto no artigo 146.º, n.ºs 1, 2 e 3, da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, o cidadão estrangeiro que entre ou permaneça ilegalmente em território nacional é detido por autoridade policial, devendo ser presente, no prazo máximo de 48 horas a contar da detenção, ao juiz do juízo de pequena instância criminal ou do tribunal de comarca para validação e eventual aplicação de medidas de coacção; se for determinada a colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, é dado conhecimento do facto ao SEF para que promova o competente processo visando o afastamento do cidadão estrangeiro do território nacional, não podendo a colocação prolongar-se por mais tempo do que o necessário para permitir a execução da decisão de afastamento coercivo, sem que possa exceder 60 dias. E, nos termos do artigo 160.º, n.º 3, al. a), do mesmo diploma, pode ser requerido ao juiz competente, enquanto não for executada a decisão de afastamento coercivo ou de expulsão judicial, que o cidadão estrangeiro fique sujeito ao regime de colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, isto é, sujeito a detenção, por período não superior a 30 dias, o qual pode ser prolongado até ao limite máximo de 3 meses (n.º 6 do mesmo preceito). A detenção (privação da liberdade) mediante colocação em centro de instalação temporária no âmbito do processo de afastamento coercivo (artigo 146.º da Lei n.º 23/2007) ou para execução de decisão de afastamento coercivo ou de expulsão (artigo 160.º do mesmo diploma) distingue-se, por um lado, da detenção prevista nos artigos 254.º e seguintes do CPP, a qual obriga à apresentação da pessoa detida a um juiz, que aprecia da sua validade, e, por outro, da prisão preventiva, enquanto medida de coacção que só pode ser ordenada por um juiz na verificação dos pressupostos previstos no artigo 202.º do CPP. Tal como se distingue da privação da liberdade e entrada no estabelecimento prisional por mandado do juiz para efeitos de execução da pena de prisão ou da privação da liberdade em execução da pena de prisão aplicada por decisão transitada em julgado (artigos 467.º e 478.º do CPP). Estando, porém, em causa o direito de liberdade, ela só pode ter lugar mediante decisão do juiz, que verifica a sua necessidade, adequação e proporcionalidade, desde logo em função das exigências constitucionais relativas à restrição de direitos fundamentais (artigo 18.º da Constituição) e dos requisitos e pressupostos legalmente previstos, e com respeito pelos respectivos prazos máximos de duração. A modelação do regime de habeas corpus constante dos artigos 220.º a 224.º do CPP, repercute a distinção operada entre detenção e prisão nos termos da lei processual penal, conferindo competência ao juiz de instrução ou ao Supremo Tribunal de Justiça consoante se trate de habeas corpus em virtude de detenção ilegal ou de habeas corpus em virtude de prisão ilegal, no pressuposto de que a privação da liberdade ocorre por acção de “qualquer autoridade” (artigo 220.º, n.º 1, do CPP) ou de “prisão” (artigo 222.º, n.º 1, do CPP), respectivamente. O âmbito de protecção constitucional da liberdade por via do habeas corpus (artigo 31.º), que garante o exercício deste direito em todos os casos de privação da liberdade, e a coerência interna do sistema obrigam, porém, por razões de identidade substancial, a uma assimilação de regimes, de modo a incluir no conceito processual de “prisão” utilizado no artigo 222.º do CPP a medida detentiva de colocação em instalação temporária por ordem do juiz. Tratando-se de uma privação de liberdade por decisão judicial, a petição de habeas corpus deverá ser dirigida ao Supremo Tribunal de Justiça (neste sentido, em particular sobre a questão da competência, o acórdão de 13.3.2008, Proc. 08P926, rel. Cons. Arménio Sottomayor, in www.dgsi.pt). Nesta perspectiva se deverão resolver as questões que possam suscitar-se quanto à admissibilidade de recurso à providência de habeas corpus junto do Supremo Tribunal de Justiça em caso de colocação em centro de instalação temporária, afastando-se, assim, uma mera interpretação literal da expressão “ilegalmente presa”, constante do n.º 1 do artigo 222.º do CPP, limitada aos casos de cumprimento de pena de prisão e de aplicação da medida de prisão preventiva, regulados no CPP. 7. Assim, em interpretação teleologicamente orientada em conformidade com o âmbito da tutela constitucional do direito à liberdade (artigos 27.º, 28.º e 31.º da Constituição), a providência de habeas corpus deverá, também ela, constituir um meio de defesa contra possíveis abusos de poder em virtude de privação ilegal da liberdade mediante colocação em centro de instalação temporária, nomeadamente em caso de ultrapassagem dos respectivos prazos. Neste sentido pode ler-se no acórdão de 30.9.2015 (proc. 8/15. 1ZRCTB, rel. Cons. Raul Borges, in www.dgsi.pt, contendo detalhada informação de jurisprudência deste Tribunal): “Muito embora o art. 31.º, da CRP refira apenas “prisão” ou “detenção ilegal” e as sequentes disposições especificadoras da lei adjectiva penal respeitante a este específico modo de impugnação – arts. 220.º e 222.º, do CPP - apenas refiram como objecto da reacção do habeas corpus a detenção e prisão ilegais, o STJ tem vindo a entender que a legitimação do uso desta medida de garantia para defesa de direitos fundamentais não deve ficar-se por uma leitura restritiva, buscando legitimação de aplicação em outros campos e situações em que são afectados o direito à liberdade e o direito à segurança do cidadão. A detenção para expulsão de cidadão estrangeiro, e consequente restrição à sua liberdade decorrente da aplicação da medida de coacção de colocação em centro de instalação temporária, nos termos do art. 146.º da Lei 23/2007, de 04-07 (…), pode constituir fundamento de habeas corpus, uma vez que a consequência do decretamento da medida em causa é, necessariamente, a privação/limitação da liberdade do indivíduo, na sua manifestação do jus ambulandi”. Tendo em conta o regime legal e as condições de execução da medida, as quais se traduzem no confinamento da pessoa num espaço do qual não pode sair, a medida constitui-se numa restrição profunda do direito de liberdade que, pelo seu grau e intensidade, afecta o núcleo essencial deste direito, de modo a poder afirmar-se que a pessoa fica privada da sua liberdade, isto é, que a pessoa fica presa, na acepção e para os efeitos do n.º 1 do artigo 222.º do CPP. Neste pressuposto, e para os efeitos deste preceito, não adquirem relevância as diferenças que possam encontrar-se entre o confinamento num estabelecimento prisional e o confinamento em centro de instalação temporária. Considera-se, assim, legalmente admissível a petição de habeas corpus, apresentada com fundamento no disposto na al. c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, em conformidade com anteriores decisões deste Tribunal. 8. Dispõe o artigo 222.º do CPP: “1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus. 2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de: a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente; b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.” A petição é enviada ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, acompanhada de informação sobre as condições em que a prisão foi efectuada ou se mantém, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 223.º do CPP, seguindo-se os termos processuais previstos nos n.ºs 2 e 3 deste preceito. Realizada a audiência, a secção criminal, conhecendo da petição, delibera nos termos do n.º 4 do artigo 223.º do CPP, no sentido de: a) Indeferir o pedido por falta de fundamento bastante; b) Mandar colocar imediatamente o preso à ordem do Supremo Tribunal de Justiça e no local por este indicado, nomeando um juiz para proceder a averiguações, dentro do prazo que lhe for fixado, sobre as condições de legalidade da prisão; c) Mandar apresentar o preso no tribunal competente e no prazo de vinte e quatro horas, sob pena de desobediência qualificada; ou d) Declarar ilegal a prisão e, se for caso disso, ordenar a libertação imediata. Como tem sido sublinhado na jurisprudência constante deste Tribunal (cfr., nomeadamente, as decisões anteriormente citadas), a providência de habeas corpus constitui uma medida excepcional de urgência, em relação aos recursos admissíveis, perante ofensas graves à liberdade por abuso de poder, sem lei ou contra a lei; não constitui um recurso sobre actos de um processo através dos quais é ordenada ou mantida a privação da liberdade do arguido, nem se destina a apreciar erros de direito ou a formular juízos de mérito sobre decisões judiciais determinantes da privação da liberdade. A procedência do pedido de habeas corpus pressupõe ainda uma actualidade da ilegalidade da prisão reportada ao momento em que é apreciado o pedido. Assim tem decidido uniformemente este tribunal, em jurisprudência sedimentada, como se dá nota no acórdão de 21.11.2012 (Proc. n.º 22/12.9GBETZ-0.S1 – 3.ª Secção) e na jurisprudência nele mencionada, bem como nos acórdãos de 09.02.2011 (Proc. n.º 25/10.8MAVRS-B.S1 – 3.ª Secção), de 11.02.2015 (Proc. n.º 18/15.9YFLSB.S1 – 3.ª Secção), e de 17.03.2016 (Proc. n.º 289/16.3JABRG-A.S1 – 3.ª Secção). À luz do princípio da actualidade, assim enunciado, o que está em causa no caso sub judice é unicamente a apreciação da legalidade da actual situação de privação de liberdade do requerente. 9. Da informação a que se refere o artigo 223.º, n.º 1, do CPP e dos documentos juntos (supra, 2 e 3), resulta, em síntese, o seguinte, com relevo para a apreciação e decisão sobre a petição de habeas corpus: a) Por decisão do Director Nacional Adjunto do SEF, de 28.7.2016, foi determinada a “expulsão” do peticionante do território nacional e a sua interdição de entrada por um período de 7 anos, com fundamento na alínea a) do n.º 1 do artigo 134.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, em virtude de este se encontrar em situação irregular em território nacional; b) A decisão de expulsão foi notificada ao peticionante em 27.10.2016, quando este se encontrava preso em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional do Montijo e, no mesmo acto, foi o peticionante informado de que seria afastado do território nacional assim que fosse determinada a sua libertação; c) Em 16.3.2018 foi-lhe concedida a liberdade condicional e, nesse mesmo dia, o peticionante foi detido pelo SEF para execução da medida de expulsão, tendo o juiz do juízo local de Faro, a pedido do SEF, determinado, também nesse dia, que o peticionante permanecesse no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro pelo tempo “estritamente necessário à execução da medida de expulsão”, “por verificado o circunstancialismo a que aludem os artigos 160.º, n.º 3, e 161.º, nº 2, da Lei n.º 23/2007, de 4.07”; d) Em 10.4.2018, o juiz decidiu manter a decisão “pelo período estritamente necessário à execução da decisão de expulsão”, por se manterem os pressupostos verificados no despacho de 16.3.2018 e por não se mostrar esgotado o prazo de dois meses estabelecido no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro; e) Em 11.4.2018, o SEF pediu ao juiz que autorizasse a manutenção do peticionante no centro de instalação temporária pelo prazo máximo de 90 dias, nos termos do n.º 6 do artigo 160.º da Lei n.º 23/2007, uma vez que se estava a esgotar o prazo de 30 dias referido no n.º 1 do mesmo preceito e que se aguardava decisão do TAF de Loulé relativa a uma providência cautelar requerida pelo peticionante no sentido de impedir a expulsão; f) Tendo em conta que o peticionante havia sido condenado por diversos crimes dolosos, incluindo um crime de tráfico de estupefacientes, considerado grave, e que se verificavam os pressupostos que determinaram a aplicação da medida, o juiz decidiu manter a decisão de colocação do peticionante no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro “pelo período estritamente necessário à execução da decisão de expulsão do território nacional e, no máximo, 90 dias”. 10. O afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional encontra-se previsto no Capítulo VIII da Lei n.º 23/2007, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional. Pode haver lugar a afastamento mediante afastamento coercivo determinado por autoridade administrativa, da competência do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, por decisão do director nacional, com fundamento na entrada ou permanência ilegais, nos termos regulados nos artigos 145.º a 150.º (Secção II), ou por decisão judicial de expulsão (Secção III), através de aplicação de pena acessória de expulsão (artigo 151.º) ou de medida autónoma de expulsão judicial (artigos 152.º a 158.º). 10.1. Os trâmites da decisão de afastamento coercivo por decisão da autoridade administrativa encontram-se regulados no artigo 146.º, que dispõe: «1 - O cidadão estrangeiro que entre ou permaneça ilegalmente em território nacional é detido por autoridade policial e, sempre que possível, entregue ao SEF, acompanhado do respectivo auto, devendo o mesmo ser presente, no prazo máximo de 48 horas a contar da detenção, ao juiz do juízo de pequena instância criminal, na respectiva área de jurisdição, ou do tribunal de comarca, nas restantes áreas do País, para validação e eventual aplicação de medidas de coacção. 2 - Se for determinada a colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, é dado conhecimento do facto ao SEF para que promova o competente processo visando o afastamento do cidadão estrangeiro do território nacional. 3 - A colocação prevista no número anterior não pode prolongar-se por mais tempo do que o necessário para permitir a execução da decisão de afastamento coercivo, sem que possa exceder 60 dias. 4 – (…) 5 – (…) 6 – (…). 7 - São competentes para efectuar detenções, nos termos do n.º 1, as autoridades e os agentes de autoridade do SEF, da Guarda Nacional Republicana, da Polícia de Segurança Pública, da Polícia Judiciária e da Polícia Marítima». No âmbito dos “processos de expulsão” (em que, na lógica do regime da Lei n.º 23/2007, se compreendem quer os processos de afastamento coercivo, quer os de expulsão judicial – assim, comentário ao artigo 142.º em Legispédia, SEF (https://sites.google.com/site/leximigratoria/) podem ser aplicadas as medidas de coacção previstas no CPP, com excepção da prisão preventiva, e ainda as previstas no artigo 142.º, entre as quais se inclui a colocação do expulsando em centro de instalação temporária (al. c. do n.º 1), sendo competente para o efeito os tribunais de comarca com competência no local onde for encontrado o cidadão estrangeiro (de acordo com a lei de organização judiciária actualmente vigente, que não adopta a denominação dos tribunais que consta do preceito). 10.2. Os artigos 159.º a 162.º (Secção IV) regulam a execução das decisões de afastamento coercivo e de expulsão judicial, prevendo-se a intervenção do “juiz competente” na fase de execução das decisões de afastamento, administrativas ou judiciais (ressalvando-se o caso de execução da pena acessória de expulsão, que é da competência do juiz de execução de penas – artigo 151.º e artigos 138.º, n.º 4, al. e), e 188.º-A do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade), que é da competência do SEF (artigo 159.º), sempre que deva haver lugar à aplicação de medidas privativas ou restritivas da liberdade. Estabelece o artigo 160.º, na redacção introduzida pela Lei n.º 29/2012, de 9 de Agosto: “1 - Ao cidadão estrangeiro contra quem é proferida uma decisão de afastamento coercivo ou de expulsão judicial é concedido um prazo de saída de território nacional, entre 10 e 20 dias. 2 - Em situações devidamente fundamentadas, nomeadamente quando se verifiquem razões concretas e objectivas geradoras de convicção de intenção de fuga, sempre que o nacional de um Estado terceiro utilizar documentos falsos ou falsificados, ou tenha sido detectado em situações que indiciam a prática de um crime, ou existam razões sérias para crer que cometeu actos criminosos graves ou indícios fortes de que tenciona cometer actos dessa natureza, o cidadão fica entregue à custódia do SEF, com vista à execução da decisão de afastamento coercivo ou de expulsão judicial. 3 - Pode ser requerido ao juiz competente, enquanto não for executada a decisão de afastamento coercivo ou de expulsão judicial e não expirar o prazo referido no n.º 1, que o cidadão estrangeiro fique sujeito ao regime: a) De colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, por período não superior a 30 dias; b) De obrigação de permanência na habitação com utilização de meios de vigilância electrónica; c) De apresentação periódica no SEF ou às autoridades policiais; d) De pagamento de uma caução. 4 – (...) 5 – (...) 6 - O prazo definido na alínea a) do n.º 3 pode ser superior, embora não possa nunca exceder os três meses, nos casos em que existam, relativamente ao cidadão estrangeiro, fortes indícios de ter praticado ou tencionar praticar factos puníveis graves, ou ter sido condenado por crime doloso, ou constituir uma ameaça para a ordem pública, para a segurança nacional ou para as relações internacionais de um Estado membro da União Europeia ou de Estados onde vigore a Convenção de Aplicação”. O n.º 6 deste artigo, que não continha disposição equivalente na versão anterior, foi aditado pela Lei n.º 29/2012. Na versão originária, a alínea a) do n.º 3 não estabelecia qualquer prazo. 10.3. Estas alterações ao artigo 160.º decorreram da transposição da Directiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 16.12.2008 (conhecida como “Directiva Retorno”), relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados-Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular (cfr. Proposta de Lei n.º 50/XII, que esteve na origem da Lei n.º 29/2012), à qual importa recorrer, se necessário, para efeitos de interpretação da lei de transposição, tendo em conta o respeito, que se impõe, pelo princípio de interpretação conforme ao direito da União Europeia. Salientando que os Estados-Membros devem assegurar a cessação de situações irregulares de nacionais de países terceiros através de um “procedimento justo e transparente” (preâmbulo, 6), “no respeito pelos direitos fundamentais enquanto princípios gerais do direito comunitário e do direito internacional, nomeadamente os deveres em matéria de protecção de direitos do Homem” (artigo 1.º), a directiva sublinha que “o recurso à detenção para efeitos de afastamento deverá ser limitado e sujeito ao princípio da proporcionalidade no que respeita aos meios utilizados e aos objectivos perseguidos” e que “a detenção só se justifica para preparar o regresso ou para o processo de afastamento e se não for suficiente a aplicação de medidas coercivas menos severas” (preâmbulo, 16). Dispondo sobre “detenção”, estabelece o artigo 15.º da directiva, para além do mais, que os nacionais de países terceiros só podem ser mantidos em situação de detenção quando houver receio de fuga ou o nacional de pais terceiro em causa evitar ou entravar a preparação do regresso ou o procedimento de afastamento (n.º1), que a detenção é ordenada pela autoridade administrativa ou judicial, devendo, no primeiro caso, ser sujeita a controlo judicial célere de legalidade, o mais rapidamente possível a contar do início da detenção, devendo a pessoa ser imediatamente libertada no caso de a detenção ser ilegal (n.º 2), e que a detenção se mantém enquanto se verificarem as condições que a determinaram e na medida do necessário para garantir a execução da operação de afastamento, por um prazo máximo limitado, nunca superior a 6 meses (n.º 5), devendo ser concedida a faculdade de a pessoa visada intentar uma acção através da qual possa ser controlada a legalidade da detenção, a decidir o mais rapidamente possível (n.º 2). 10.4. De acordo com a lei processual, o controlo da legalidade da detenção efectiva-se por via de recurso (ordinário), nos termos gerais (artigos 399.º e 400.º do CPP), através do qual é facultada à pessoa detida a possibilidade de questionar o mérito da decisão de aplicação da medida, nomeadamente quanto aos respectivos pressupostos, e ainda por via da providência de habeas corpus, nos termos e com os fundamentos taxativamente previstos no artigo 222.º do CPP, antes explicitados. Como já se sublinhou, não cabe no âmbito e objecto do habeas corpus a apreciação do mérito da decisão da detenção, mas apenas a verificação de alguma das situações de ilegalidade indicadas nas alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, em particular do excesso de prazo de duração da medida, a qual, sendo, em princípio, de 30 dias, não pode exceder o prazo máximo de 90 dias (artigo 160.º, n.ºs 3 e 6, da Lei n.º 23/2007). 11. Alega o peticionante que se verifica uma situação de ilegalidade da sua detenção – uma situação de “prisão ilegal” – consistente na colocação e manutenção no centro de instalação temporária, por desrespeito do prazo de 2 meses (60 dias) estabelecido no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, que define o regime de acolhimento de estrangeiros em centros de instalação temporária, e no artigo 146.º, n.º 3, da Lei n.º 23/2007, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional. Sucede, porém, que à situação do recorrente não é aplicável – nem foi aplicado – o disposto no artigo 146.º, n.º 3, da Lei n.º 23/2007, o qual, como anteriormente se viu (supra, 10.1), diz respeito à aplicação da medida de colocação em centro de instalação temporária durante o processo de afastamento coercivo, ou seja, de uma medida especial de coacção prevista no artigo 142.º do mesmo diploma, sem que possa exceder o prazo máximo de 60 dias. Como resulta dos autos (supra, 3), o peticionante encontra-se actualmente detido para execução da decisão de afastamento coercivo tomada pelo director nacional adjunto do SEF em 27.7.2016, que lhe foi notificada em 27.10.2016, com base num despacho do juiz da comarca de Faro de 16.3.2018, que determinou a sua colocação no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro “pelo tempo estritamente necessário à execução da decisão de expulsão do território nacional”, pelo prazo máximo de 30 dias, com fundamento no disposto no n.º 3 do artigo 160.º da Lei n.º 23/2007, prazo esse que, por despacho do mesmo juiz, de 11.5.2018, foi alargado até ao limite máximo de 90 dias, nos termos do n.º 6 do mesmo preceito. Também não é actualmente aplicável ao caso o disposto no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, face às alterações que a Lei n.º 29/2012 introduziu no artigo 160.º da Lei n.º 23/2007. 11.1. Nos termos do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 34/94, “A instalação, sempre que determinada, manter-se-á até à concessão de visto de permanência ou da autorização de residência, ou à execução da decisão da expulsão ou ao reembarque do estrangeiro, não podendo exceder o período de dois meses, e deve ser judicialmente reapreciada ao fim de cada período de oito dias”. Dispunha o artigo 123.º do Decreto-Lei n.º 244/98, de 8 de Agosto, revogado pela Lei n.º 23/2007 (artigo 218.º) – artigo da lei que anteriormente regulava as condições de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território português, que antecedeu o artigo 160.º da Lei 23/2007 –, que o estrangeiro contra quem fosse proferida decisão de expulsão devia abandonar o território nacional no prazo que lhe fosse determinado (n.º 1), podendo ser requerido ao juiz competente, enquanto não expirasse esse prazo, que o expulsando ficasse sujeito ao regime de colocação em centro de instalação temporária (n.º 2). Estabelecia o artigo 107.º desse diploma que a colocação de estrangeiros em centros de instalação temporária obedecia ao disposto na Lei n.º 34/94, de 14 de Setembro. O artigo 5.º da Lei n.º 53/2003, de 22 de Agosto, também revogado pela Lei n.º 23/2007, veio entretanto dispor que o nacional de país terceiro que permanecesse ilegalmente em território nacional e sobre o qual existisse uma decisão de afastamento seria detido por autoridade policial e entregue ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, devendo o mesmo ser presente, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, ao juiz competente para a sua validação e eventual aplicação de medidas de coacção, e ser entregue à custódia do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras para efeitos de condução à fronteira e afastamento no mais curto espaço de tempo possível. Na sua redacção originária, o artigo 160.º da Lei n.º 23/2007 veio estabelecer que o cidadão estrangeiro contra quem houvesse sido proferida decisão de expulsão devia abandonar o território nacional, ficando entregue à custódia do SEF, com vista à execução da decisão de expulsão (n.º 1), podendo ser requerido ao juiz competente, enquanto não fosse executada a decisão de expulsão ou enquanto não expirasse o prazo que lhe fosse fixado, que o expulsando ficasse sujeito ao regime de colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado (n.º 3). Na falta de regulamentação de prazos máximos no Decreto-Lei n.º 244/98 e na Lei n.º 53/2003, seria aplicável o disposto no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94 quanto à colocação em centro de instalação temporária, que, assim, não podia exceder dois meses. 11.2. Com as alterações decorrentes da Lei n.º 29/2012, de 9 de Agosto, o artigo 160.º da Lei n.º 23/2007, na redacção actualmente em vigor, passou a prever prazos específicos de duração da colocação em centro de instalação temporária para efeitos de execução coerciva da decisão de afastamento ou expulsão do território nacional, nos termos deste diploma. Prevê-se agora que o SEF possa requerer ao juiz competente, enquanto não for executada a decisão de afastamento coercivo ou de expulsão judicial e não expirar o prazo de saída voluntária, fixado entre 10 e 20 dias (referido no n.º 1), que o cidadão estrangeiro fique sujeito ao regime de colocação em centro de instalação temporária ou espaço equiparado, por período não superior a 30 dias (al. a) do n.º 3), e que este prazo pode ser superior, embora não possa nunca exceder três meses, nos casos em que existam, relativamente ao cidadão estrangeiro, fortes indícios de ter praticado ou tencionar praticar factos puníveis graves, ou ter sido condenado por crime doloso, ou constituir uma ameaça para a ordem pública, para a segurança nacional ou para as relações internacionais de um Estado membro da União Europeia ou de Estados onde vigore a Convenção de Aplicação. É neste quadro que deve analisar-se o caso dos autos quanto ao respeito pelos prazos de detenção. 12. Como se referiu, em 16 de Março de 2018, data em que saiu em liberdade condicional, o peticionante foi colocado por decisão judicial no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro, pelo prazo máximo de 30 dias, nos termos do artigo 160.º, n.º 3, da Lei n.º 23/2007, prazo que terminaria no dia 15 de Abril de 2018. Porém, em 11 de Abril de 2018, antes de terminar esse prazo, o SEF veio pedir ao juiz que autorizasse a manutenção do peticionante no centro de instalação temporária do aeroporto de Faro pelo prazo máximo de 90 dias, nos termos do n.º 6 do artigo 160.º, o que foi deferido por decisão do juiz de 11 de Maio de 2018. A detenção mantém-se, assim, actualmente, dentro do prazo máximo de 90 dias, a contar de 16 de Março de 2018, determinado pelo juiz nos termos deste preceito. A circunstância de, no despacho judicial de 10.4.2018, que manteve a anterior decisão 16.3.2018, ter sido considerado o prazo máximo de dois meses previsto no artigo 3.º, n.º 2, da Lei n.º 34/94, que na altura não estava esgotado, em nada afecta a legalidade da situação actual da detenção no centro de instalação temporária, pois que esta se mantém por força da decisão judicial de 11 de Maio de 2018, exigida pelo n.º 6 do artigo 160.º da Lei 23/2007. Pelo exposto se conclui que não se verifica o fundamento de ilegalidade da prisão que se refere a alínea c) do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, invocado pelo peticionante, em virtude de ainda não estar ultrapassado o termo do prazo máximo de 90 dias previsto na lei e fixado por decisão judicial. Para além disso, não se verifica qualquer dos fundamentos indicados nas alíneas a) e b) deste mesmo preceito, pois que a privação da liberdade foi motivada por facto que a lei permite e foi ordenada pela autoridade competente, que, no caso, é o juiz que a determinou. Pelo que a petição deve ser indeferida por falta de fundamento bastante. III. Decisão 13. Pelo exposto, deliberando nos termos do n.ºs 3, 4, al. a), e 6 do artigo 223.º do CPP, acordam os juízes da secção criminal em: a) Indeferir o pedido de habeas corpus por falta de fundamento bastante. c) Condenar o peticionante em custas, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC, nos termos do artigo 8.º, n.º 9, e da Tabela III do Regulamento das Custas Processuais.
Supremo Tribunal de Justiça, 23 de Maio de 2018.
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