Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
| Relator: | SANTOS CARVALHO | ||
| Descritores: | REVOGAÇÃO MANDATO PRAZO | ||
| Nº do Documento: | SJ200505120013105 | ||
| Data do Acordão: | 05/12/2005 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 9774/01 | ||
| Data: | 02/27/2003 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REC PENAL. | ||
| Decisão: | REJEITADO O RECURSO. | ||
| Sumário : | I - Sendo obrigatória a constituição de defensor (nomeadamente, art.º 64, n.º 1, d), do CPP), a revogação do mandato só opera após a substituição respectiva. Enquanto isso, o primitivo mandatário permanece em funções de representação. O processo não pára apenas porque alguém decide revogar a procuração ao mandatário constituído. II - Por isso, a revogação do mandato forense apresentada pelo arguido não suspendeu o prazo em curso para a interposição de recurso, nem o colocou na posição de ficar sem defensor, pois o advogado constituído não chegou a ser notificado da revogação e, portanto, mantiveram-se os efeitos daquele mandato que lhe havia sido regularmente conferido. III - É certo que o tribunal podia e devia ter sido lesto a notificar o mandatário da revogação, mas isso não exclui os deveres deontológicos e estatutários deste em representar o arguido no processo. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A" foi submetido a julgamento na 1ª Vara Criminal de Lisboa - 2ª Secção, no Processo Comum n.º 355/99.8TDLSB, juntamente com B, após terem sido pronunciados, o primeiro, pela prática de dois crimes de burla qualificada dos art.ºs 217 e 218 do C. Penal, e ambos, pela co-autoria de um crime de branqueamento de capitais do art. 2.°, als. a) e c) do D.L. n.º 325/95 de 02/12, na redacção da Lei n.º 65/98. Foram deduzidos pedidos cíveis pela C e D. Efectuado o julgamento, o Tribunal Colectivo, quanto à parte criminal, absolveu ambos os arguidos do crime de branqueamento de capitais, mas condenou o arguido A, como autor dos dois referidos crimes de burla qualificada, respectivamente, nas penas de quatro anos e seis meses de prisão (ofendido E) e de seis anos e seis meses de prisão (ofendida C) e, em cúmulo jurídico, na pena única de oito anos e seis meses de prisão, ordenando a sua expulsão do território nacional por dez anos. No que respeita à parte criminal, o arguido interpôs recurso da decisão final (e também de uma interlocutória) para o Tribunal da Relação de Lisboa, mas este Tribunal, por Acórdão de 27 de Fevereiro de 2003, confirmou a decisão recorrida. 2. Após vicissitudes processuais que serão narradas mais adiante, o referido arguido interpôs recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, em 24 de Janeiro de 2005, do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27 de Fevereiro de 2003, e nele, como questão prévia, justifica a tempestividade do recurso nos seguintes termos: 1 - Por força de Douto despacho da Relação de Lisboa foram considerados nulos todos os actos supervenientes, processados nos presentes autos, que contendiam com a revogação da procuração efectuada a fls. 2.452 e 2.453. 2 - Até terem sido revogados, a 11 de Março de 2003, os poderes forenses dos anteriores mandatários do arguido, apenas tinha decorrido uma fracção do prazo para exercer o direito de recurso (a notificação do Acórdão da Relação foi enviada aos mandatários por carta registada de dia 28 de Fevereiro de 2003). Como o supra aludido despacho refere, com a revogação da procuração o arguido ficou formalmente sem advogado (consequentemente, o recurso entretanto apresentado em seu nome deveria ter sido rejeitado por ausência de poderes de representação forense por parte dos seus signatários) e, consequentemente, o prazo para recorrer suspendeu-se. 3 - Só a partir de 17 de Janeiro de 2005, com a notificação do signatário do supra referido despacho assim como do Acórdão da Relação que o acompanhava em anexo, é que recomeçou a contar o prazo para efeitos de recurso. 4 - Pelos motivos supra expostos é fácil de ver que arguido ainda se encontra em tempo para recorrer do Acórdão da Relação de Lisboa que aqui se impugna. 3. O recurso foi admitido sem ter sido questionada a sua tempestividade, embora o Sr. Desembargador relator tenha manifestado dúvidas quanto à sua admissibilidade, face ao disposto no art.º 400, n.º 1, al. f), do CPP. O Ministério Público no Tribunal da Relação de Lisboa respondeu ao recurso, dizendo o seguinte: QUESTÃO PRÉVIA E PREJUDICIAL: O caso julgado material Repristinando a nossa posição expressa a fls. 2594 dos autos em epígrafe indicados: É nosso entendimento, e à semelhança do consignado no despacho de fls. 2403 a 2447, que o acórdão prolatado a fls. 2403 a 2447 transitou em julgado. Chamamos à colação a jurisprudência expressa no acórdão do S.T.J. de 29/10/2003 (p. n.º 2605/03), relatado pelo Cons. Borges de Pinho, cujo sumário se encontra disponível em www.dgsi.pt: "O art.º 425.º, n.º 6, do C.P.P. não impõe a notificação pessoal ao arguido dos acórdãos proferidos pelos tribunais superiores, sendo bastante a notificação do seu defensor. Aliás, tendo-se em equação o art.º 63°, n.º 1, do C.P.P., em que não se faz qualquer reserva pessoal ao arguido quanto à intervenção no julgamento dos recursos e à consequente notificação, forçoso é concluir-se que na esfera dos tribunais superiores, e a nível de recursos, assumem particular relevância e significado as intervenções e as notificações dos defensores ou dos mandatários dos arguidos, vingando e valendo por conseguinte os prazos das notificações que lhes tenham sido feitas." O recurso interposto não devia, pois, ter sido admitido (C.P.P., art.º 414°, n.º 2). Tendo-o sido, porém, segue-se que deve ser rejeitado (idem, art.ºs 420°, n.º 1, e 419°, n.º 4, a), em conferência (idem, art.º 419°, n.º 4, al. a). 4. A Excm.ª Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo não questionou a tempestividade do recurso, mas a sua admissibilidade face ao estatuído no art.º 400.º, n.º 1, al. f), do CPP. O relator, porém, mandou os autos à conferência para aí se decidir se o recurso era ou não tempestivo. 5. Colhidos os vistos e realizada a conferência com o formalismo legal, cumpre decidir. Via fax e com entrada no Tribunal da Relação de Lisboa em 24 de Janeiro de 2005, o arguido A, por intermédio do seu actual Advogado, Dr. F, a quem conferiu procuração em 24 de Outubro de 2003 (fls. 2555), interpõe recurso para este Supremo Tribunal de Justiça do acórdão daquela Relação de 27 de Fevereiro de 2003. A tempestividade do recurso de uma decisão proferida quase dois anos antes só pode encontrar suporte no despacho do Sr. Desembargador relator do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 13 de Janeiro de 2005, tal como, à cautela, o próprio recorrente vem evocar. Nesse despacho, tendo considerado que o dito arguido remetera para o Tribunal, em 11 de Março de 2003 (fls. 2452 e 2453), uma missiva em que revogava os poderes de representação aos seus anteriores defensores, o Sr. Desembargador relator verificou que o mesmo não estivera representado por advogado, como era obrigatório, já que não fora ordenado o cumprimento do art.º 39.º do C. P. Civil, e, por isso, decidiu anular o processado a partir daquela missiva e mandar notificar novamente o Acórdão de 27/02/2003, agora ao novo Advogado constituído (o Dr. F). Ora, mesmo passando por cima do insólito historial de advogados constituídos, revogações e renúncias de mandatos, que se verificou antes do julgamento da 1ª instância (1), o arguido ficou representado a partir do início deste acto processual pelo Dr. G (procuração de fls. 1569, unicamente conferida a este advogado e não a outros da sociedade em que então trabalhava), que substabeleceu, sempre com reserva, nas Dr.ªs H e I (fls. 1570) e mais tarde no Dr. J (fls. 1759). Esse Advogado, Dr. G, acompanhou todo o julgamento na 1ª instância, subscreveu vários requerimentos e interpôs dois recursos para a Relação de Lisboa, um dos quais o do Acórdão condenatório. Para a audiência de julgamento do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Lisboa do acórdão condenatório foi notificado o Dr. G (fls. 2398 v.), mas compareceu o Dr. L (fls. 2400), com substabelecimento do Dr. M (fls. 2402), ambos da mesma sociedade de advogados a que (anteriormente) pertencia o Dr. G, mas sem procuração ou substabelecimento junto aos autos. O Acórdão da Relação de Lisboa de 27 de Fevereiro de 2003 foi notificado, por carta registada remetida em 28 de Fevereiro de 2003, ao Dr. G (fls. 2449 v.). Pela carta do arguido que deu entrada em 11 de Março de 2003, já anteriormente referida, requereu o mesmo que se considerassem "revogado(s) todos os poderes de representação aos defensores, quer com procuração, quer com substabelecimentos que tenham sido passados pelos anteriores mandatários". Este requerimento não foi objecto de despacho. Com data de 17 de Março de 2003, o Dr. L, agindo em nome do arguido, interpõe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão da Relação, mas, ainda na mesma data, mas às 20:16 horas, o mesmo Advogado remete um fax em que indica que, tendo verificado no processo que o arguido revogara o mandato aos seus defensores, "os mandatários aceitam a revogação do mandato". Logo de seguida, o Sr. Desembargador relator lavra despacho em que não admite esse recurso para o S.T.J., por irrecorribilidade nos termos do art.º 400, n.º 1, al. f), do CPP, despacho esse que é notificado ao Dr. G (fls. 2486). Em 26 de Março de 2003, o Sr. Desembargador relator, tendo em consideração a revogação do mandato por parte do arguido e a respectiva aceitação por parte do mandatário, solicita à O. A. a nomeação de defensor (fls. 2500), o que acontece a fls. 2518. Na mesma data (26-03-2003), o arguido é libertado, por se ter atingido o prazo máximo de prisão preventiva. A fls. 2511-2513 o arguido escreveu uma carta ao tribunal a informar que em 9 de Março rescindiu a procuração com os Advogados da Sociedade ...., entre os quais os Drs. M, N e L e que soube que estes, à sua revelia, tinham interposto recurso para o STJ, mas que ele conferira poderes ao Dr. G para o representar e interpor recurso para os tribunais superiores. Pediu mais uma vez que lhe fosse dado conhecimento do acórdão (estava então em prisão preventiva) e, junto com esse documento, apresentou nova procuração ao Dr. G! A fls. 2525, o Sr. Desembargador relator mandou notificar o despacho que não recebeu o recurso para o STJ (novamente) ao Dr. G, mas este, antes de ser notificado, veio informar o tribunal que se afastou da defesa do arguido na pendência do recurso para a Relação, embora sem ter apresentado a respectiva renúncia de mandato, mas que o arguido voltou a contactá-lo em Março de 2003 no seu novo escritório e que entende que devia ser dada oportunidade ao arguido de exercer o direito ao recurso com advogado da sua confiança. A fls. 2560, o Sr. Desembargador relator considera transitado o acórdão da Relação, mas a fls. 2602 lavra o referido despacho em que anula parte do processado e manda notificar ao último Advogado constituído pelo arguido o mesmo acórdão, o que é feito por carta registada de 14 de Janeiro de 2005, remetida ao Dr. F. É, então, interposto (novo) recurso para este STJ, que é recebido (embora com dúvidas quanto à recorribilidade) e que é o que agora está em causa. É ou não tempestivo este recurso ou, pelo contrário, no momento da interposição já havia transitado em julgado o Acórdão da Relação de Lisboa, como defende o M.º P.º nesse Tribunal? Nos termos do art.º 61.º, n.º 1, als. d) e e), do CPP (diploma a que nos referiremos, salvo indicação em contrário), o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e, salvas as excepções da lei, dos direitos de escolher defensor ou solicitar ao tribunal que lhe nomeie um e de ser assistido por defensor em todos os actos processuais em que participar. O arguido pode constituir advogado em qualquer altura do processo (art.º 62.º). «O defensor exerce os direitos que a lei reconhece ao arguido, salvo os que ela reservar pessoalmente a este» (art.º 63.º, n.º 1, do CPP). |