Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | ANA PAULA LOBO | ||
| Descritores: | PROPRIEDADE HORIZONTAL CONDOMÍNIO PARTE COMUM PAGAMENTO REPARAÇÃO REGRA PROPORCIONAL ACORDO DE PAGAMENTO REPARAÇÕES URGENTES INCUMPRIMENTO RECURSO PER SALTUM ADMISSIBILIDADE NULIDADE ALEGAÇÕES DE RECURSO EXCESSO DE PRONÚNCIA INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO | ||
| Data do Acordão: | 11/06/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | CONCEDIDA | ||
| Sumário : | I. Estando em causa um prédio constituído em regime de propriedade horizontal, a regra é de que cada condómino é responsável pelos encargos de conservação das partes comuns na proporção do valor das suas fracções – art.º 1424.º, n.º 1 do Código Civil. II. Os condóminos, no regulamento do condomínio, podem estabelecer uma diversa repartição dos encargos de conservação, mas os usos anteriores quanto a essa repartição não têm valor jurídico comparável a esse regulamento que tem de ser aprovado, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio e ser dotado de especificação e justificação dos critérios que determinam a sua diversa imputação. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Recorrentes: AA, BB, CC, rés Recorridos: DD, EE, autores * I – Relatório I.1 AA, BB e CC, rés, apresentaram recurso per saltum para o Supremo Tribunal de Justiça, da sentença proferida em 26 de Fevereiro de 2025 pelo Juiz 19 do Juízo Central Cível de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, que julgou a acção parcialmente procedente, por provada, e em consequência: «- Condenou as RR. AA; BB, e CC a pagar à A. MARVÃOGEST – Gestão de Móveis e Imóveis, LDA. a quantia de €74.317,51 (setenta e quatro mil trezentos e dezassete euros e cinquenta e um cêntimos) pelas obras urgentes realizadas em parte comum.», absolvendo-as dos demais pedidos contra elas formulado. As recorrentes apresentaram alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. DA VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS DO RECURSO PER SALTUM PARA O COLENDO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA a) Tanto o valor da causa, como o da sucumbência (respectivamente, € 89.317,51 e € 74.317,51) são superiores à alçada da Relação e as recorrentes não pretendem impugnar a decisão relativa à matéria de facto, nem quaisquer decisões interlocutórias, pelo que, ao abrigo do disposto no art. 678º., nº. 1, do Código de Processo Civil, requerem que o recurso suba directamente ao Colendo Supremo Tribunal de Justiça; 2. SINOPSE DO CASO DOS AUTOS b) A presente acção foi instaurada pela sociedade Marvãogest – Gestão de Móveis e Imóveis, Lda. (1ª. A.) e por três pessoas singulares contra as três Rés, ora recorrentes, peticionando a sua condenação a pagar-lhes € 74.317,51, a título de responsabilidade contratual, e € 15.000,00 por danos não patrimoniais, decorrentes do alegado incumprimento de um suposto acordo; c) As AA. pessoas físicas e as Rés, aqui recorrentes, são condóminas, possuindo diversas fracções autónomas do prédio sito em Lisboa, na Rua 1 e na Rua 2, na freguesia de Marvila, em Lisboa, que é composto por um conjunto de 18 armazéns – facto provado 6; d) As fracções autónomas designadas pelas letras “L”, “M” e “N” (propriedade das Rés) e as designadas pelas letras “O” e “P” (correspondentes aos armazéns 17 e 18, propriedade das AA. Pessoas singulares) constituem uma “unidade construtiva autónoma” – facto provado 8; e) A 1ª. A., Marvãogest, Lda., é uma sociedade comercial que tem por objecto, entre outros, a gestão e a comercialização de imoveis, o seu arrendamento e subarrendamento – facto provado 3 – sendo suas únicas sócias e gerentes as 2ª., 3ª. e 4ª. AA. – facto provado 4; f) As 2ª. 3ª. e 4ª. AA., por contrato de 1 de Janeiro de 2012, deram de arrendamento à Marvãogest, Lda. o “armazém 18”, pelo prazo de dez anos, renovável por iguais períodos e pela renda anual de € 1.000,00 (doc. junto com o requerimento das AA. de 10 de Dezembro de 2021, com as referências CITIUS ......89, no processo electrónico, e ......96, impressa); g) Segundo as AA., foi estabelecido (ou pela mãe delas e pela mãe das Rés, anteriores proprietárias das fracções autónomas que actualmente lhes pertencem, ou por elas próprias e pelas ora recorrentes) um acordo, nos termos do qual o custo de qualquer reparação ou intervenção (independentemente do seu valor) seria repartido na proporção de 2/3 para as primeiras e de 1/3 para as segundas, o que não foi reconhecido pela Mmª. Juiz a quo no facto provado 13, no qual consignou que tal repartição era feita “mediante acordo prévio de todos” (leia-se AA. pessoas singulares e Rés); h) Nos últimos anos, o telhado que cobre as fracções autónomas designadas pelas letras “L”, “M”, “N”, “O” e “P” tinha vindo a apresentar “enormes deficiências e degradação, como sejam a quebra de vigas, caleiras a transbordar água, telhas partidas e chuva dentro do edifício” – facto provado 14; i) Ao longo dos últimos anos procedera-se a reparações pontuais no telhado, tendo o custo dessas intervenções sido suportado na medida de 2/3 pelas AA. e de 1/3 pelas Rés, mediante acordos celebrados em cada ocasião – factos provados 17 e 18; j) Em 10 de Dezembro de 2019 teve lugar uma reunião entre as AA. e as Rés, para discutir uma intervenção de fundo na cobertura do armazém 18 – facto provado 27; k) Na reunião de 10 de Dezembro de 2019, as AA. apresentaram às Rés dois orçamentos para proceder à reparação da cobertura do armazém 18, segundo duas metodologias diferentes – factos provados 29, 30 e 31; l) Na mesma reunião as Rés referiram às AA. não dispor, naquele momento, de meios financeiros para pagar a parte que lhes caberia nas obras – facto provado 32; m) A A. Marvãogest, Lda. adjudicou à “J..., Lda” os trabalhos de reparação da cobertura do armazém 18, pelo valor de € 222.922,54, acrescido de IVA – facto provado 33; n) As Rés nada adjudicaram à “J..., Lda” – facto provado 47; o) Os trabalhos na cobertura iniciaram-se em Março de 2020 – facto provado 34; p) A intervenção efectuada beneficia maioritariamente o armazém 18, pois a cobertura foi intervencionada na área que cobre este armazém, mas também na do acesso comum aos armazéns 16, 17 e 18, todos eles propriedade das AA. pessoas singulares – facto provado 49, alínea f); q) Não tendo dado como provado o acordo cujo incumprimento seria, na tese da AA., ora recorridas, a fonte da obrigação de indemnizar das Rés, aqui recorrentes, a Mmª. Juiz a quo condenou-as a pagar os peticionados € 74.317,51, à Marvãogest, Lda. com fundamento no art. 1427º. do Código Civil; QUANTO ÀS RAZÕES DO PRESENTE RECURSO r) Resulta incontroverso da leitura da petição inicial e do pedido nela formulado que as AA. apenas estribaram a sua pretensão de condenação das Rés no incumprimento de um acordo celebrado entre as partes, nos termos do qual as ora recorrentes teriam dado o seu assentimento à realização da obra que a Marvãogest, Lda. adjudicou à “J..., Lda” e assumido que comparticipariam no respectivo custo, na medida de 1/3; s) Que a causa de pedir (única invocada pelas AA.) era o alegado incumprimento de um suposto acordo é apodíctico, perante a posição tomada pelas AA. na sua resposta à excepção de ilegitimidade da Marvãogest, L.dª, constante do requerimento que apresentaram em 10 de Dezembro de 2021 (melhor identificado na conclusão f) supra) no qual fizeram escrever: “(…) as 2ª., 3ª. e 4ª. AA. pretendem ver provado e confirmado pelo Tribunal um acordo celebrado com as Rés” (art. 12º) e “(…) a 1ª. A. pretende ser ressarcida, em termos patrimoniais, da quota-parte nas obras que cabe às Rés e cuja exigibilidade resulta do apontado acordo” (art. 13º.); t) Da instrução do processo não resultou assente que tal acordo tivesse sido celebrado – factos não provados v, vi, vii, viii, ix, x, xiv, xv, xvii e xviii e facto provado 47 –, nem que as Rés, ora recorrentes, tivessem, dado o dito por não dito, mudado a sua posição – factos não provados xix, xx, xxi, xxii, xxiii, xxiv e xxv – pelo que, atentas as regras de repartição do ónus da prova, a acção deveria ter sido julgada improcedente; 3.1. DA NULIDADE DA, ALIÁS DOUTA, SENTENÇA RECORRIDA, POR EXCESSO DE PRONÚNCIA u) Ao condenar as Rés a pagarem à A. Marvãogest, L.dª os peticionados € 74.317,51, com base na licitude da sua conduta ao abrigo da acção directa consentida pelo art. 1427º. do Código Civil, a Mmª. Juiz a quo conheceu de questão não suscitada pelas partes (nem mesmo na resposta à excepção, onde as AA. pugnaram pela legitimidade da Marvãogest, L.dª), fazendo incorrer a, aliás douta, sentença recorrida na causa de nulidade a que alude o 2º. segmento da alínea d) do nº. 1 do art. 615º. do Código de Processo Civil; v) As questões da indispensabilidade e urgência das obras não foi invocada pelas AA. e não só não foi alegado que o condomínio não tivesse administrador ou este estivesse impedido de agir em tempo útil como, no facto provado 46, a Mmª. Juiz a quo deu como assente a existência de “uma administradora externa, especializada nesse tipo de gestão a «C..., Lda,», representada pelo Senhor Dr. FF”; w) A Mmª. Juiz a quo, em desrespeito pela previsão da 2ª. parte do nº. 2 do art. 608º. do Código de Processo Civil, ocupou-se de questão – a admissibilidade e licitude da conduta de um arrendatário que se substitui ao senhorio e realiza obras nas partes comuns do condomínio, ao abrigo do estatuído no art. 1427º. do Código Civil – não suscitada pelas partes e que não era do conhecimento oficioso, o que determina a nulidade da, aliás douta, sentença recorrida, nos termos expostos na conclusão u) supra; 3.2. DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DO ART. 1427º. E DO ART. 1436º., ALÍNEA F), DO CÓDIGO CIVIL (NA REDACÇÃO ENTÃO VIGENTE, A QUE CORRESPONDE ACTUALMENTE A ALÍNEA G)) x) A licitude da conduta do condómino que realiza obras nas partes comuns do edifício depende da verificação cumulativa de dois requisitos: (i) tratar-se de reparações indispensáveis e urgentes e (ii) faltar ou estar impedido o administrador do condomínio (C.Civil, art. 1427º.); y) Havendo – e não estando impedido – administrador do condomínio é a ele que cabe a realização dos actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns, por força do preceituado (ao tempo) na alínea f) do art, 1436º. do Código Civil (disposição que se manteve inalterada, tendo apenas transitado par a alínea g), na reforma operada pela Lei nº. 8/2022, de 10 de Janeiro); z) As obras em causa – decididas, unilateralmente, pelas 2ª., 3ª. e 4ª. AA. e pagas pela Marvãogest, Lda., ora 1ª. recorrida – não podem classificar-se como urgentes, com o significado que esse adjectivo tem no art. 1427º. do Código Civil, que manifestamente se refere a intervenções cujo adiamento agrave um prejuízo ou dano que já se verifica; aa) No caso dos autos está assente que o telhado tem vindo a apresentar enormes deficiências e degradação (facto provado 14), situação que se verificava há muito tempo, posto que “ao longo dos últimos anos se procedeu a reparações pontuais” (facto provado 17), afigurando-se premente a realização de uma obra de intervenção de fundo e não pequenas reparações” (facto provado 21), não tendo ocorrido um evento que tornasse urgente a intervenção levada a efeito pela A. Marvãogest, L.dª; bb) O facto de os trabalhos terem sido orçamentados mais de meio ano antes do início da sua realização (docs. nºs. 24 e 25 da petição inicial e facto provado 34) desmente que se verificasse uma urgência impeditiva de cometer ao administrador do condomínio a tramitação da obra (com a necessária obtenção de mais de um orçamento para cada tipologia das intervenções possíveis); cc) Na reunião de condóminos que teve lugar em 19 de Fevereiro de 2020 (de que dá fé a acta junta sob doc. nº. 4 da contestação) foram debatidas no ponto 4 da respectiva ordem de trabalhos a “Análise e decisão de obras necessárias no condomínio”, não sendo ali feita qualquer referência à cobertura do armazém 18, ao contrário do que as AA. alegaram nos arts. 69º., 70º. e 71º. da petição inicial, mas que não lograram provar (factos não provados xi, xii, e xiii da, aliás douta, sentença recorrida; dd) Nem as obras em causa eram urgentes (no sentido que lhe é dado no art. 1427º. do Código Civil), nem faltava ou estava impedido o administrador; ee) Havendo administrador do condomínio era a ele que competia realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns (C.Civil, art. 1436º., alínea f), na versão aplicável ao caso dos autos), independentemente dos condóminos que devessem comparticipar no pagamento dos trabalhos; ff) As AA. decidiram, sozinhas (não levando o assunto à assembleia de condóminos e não obtendo o acordo das Rés) a realização das obras na cobertura do armazém 18, que a A. Marvãogest, Lda. adjudicou, sem o concurso das recorrentes, à “J..., Lda”; 3.2. DA ERRADA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DOS ARTS 1031º., Nº. 1, ALÍNEA B), E 1074º., Nº. 1, DO CÓDIGO CIVIL gg) A A. Marvãogest, L.dª, de que são únicas sócias e gerentes as 2ª., 3ª. e 4ª. AA. (factos provados 3 e 4 e doc. nº. 1 da petição inicial) é uma sociedade instrumento para tornar mais rentável o património das demandantes pessoas singulares, pois permite abater à matéria colectável custos que elas não poderiam deduzir aos rendimentos prediais; hh) A A. Marvãogest, Lda. é arrendatária do armazém 18, pelo qual paga a renda anual de € 1.000,00, ao abrigo do contrato de arrendamento junto sob doc. nº. 1 do requerimento autuado em 10 de Dezembro de 2021 – referência CITIUS ......89, no processo electrónico; ii) Foi convencionado entre as senhorias (as 2ª., 3ª. e 4ª. AA.) e a inquilina (a A. Marvãogest, Lda.) que esta assumiria o pagamento das obras em partes comuns e a “responsabilidade exclusiva pela conservação e manutenção da integridade do locado, devendo realizar ou promover a realização de todas as obras necessárias para tal efeito, suportando directamente os respectivos custos”; jj) As 2ª. 3ª. e 4ª. AA., como senhorias, e a A. Marvãogest, Lda., como arrendatária, afastaram a aplicação do disposto na alínea b) do art. 1031º. do Código Civil, no que diz respeito à conservação do local arrendado, que ficou cometida a esta última, assim como convencionaram, como permite a norma supletiva do nº. 1 do art. 1074º. do mesmo Código, que cabia à arrendatária executar todas as obras de conservação, ordinárias ou extraordinárias “adequadas à conservação do prédio”; kk) Não se verifica analogia entre o caso dos autos e aquele que foi objecto do douto acórdão da Veneranda Relação de Lisboa, de 15 de Dezembro de 2009, em que a Mmª. Juiz a quo se louvou, constituindo obrigação da A. Marvãogest, L.dª assegurar – quanto a obras – as condições que lhe permitam o gozo do local arrendado, para o fim a que ele contratualmente se destina; ll) A A. Marvãogest, L.dª, ora 1ª. recorrida, não poderia, em substituição das condóminas suas senhorias, lançar mão da acção directa prevista no art. 1427º. do Código Civil, cujos pressupostos, aliás, não se verificam; mm) A Mmª. Juiz a quo, para além de ter feito incorrer a, aliás douta, sentença recorrida em nulidade por excesso de pronúncia, procedeu a errada interpretação e aplicação dos arts. 1427, 1436º., alínea f) (na redacção aplicável), 1031º. nº. 1, alínea b), e 1074º., nº. 1, todos do Código Civil. Pelo exposto e pelo suprimento do Colendo Tribunal ad quem, deve ser concedido provimento ao recurso e, consequentemente, ser declarada nula, a, aliás douta, sentença recorrida ou, quando assim se não entenda, ser aquela decisão revogada, como é de inteira JUSTIÇA Os recorridos apresentaram contra-alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. O recurso Recorrentes vem interposto da Sentença do Tribunal a quo, que julgou a ação parcialmente procedente e condenou aquelas a pagar à Recorrida (Marvãogest, Lda.), a quantia de € 74.317,51, pelas obras urgentes realizadas em parte comum. 2. Constituíam questões a decidir, designadamente, determinar se as Recorrentes estavam obrigadas a pagar às Recorridas a quantia de €74.317,51, por incumprimento do acordado com aquelas na repartição de custos das obras efetuadas na cobertura comum das frações imobiliárias que a ambos pertencem. 3. As Recorrentes não impugnaram a decisão no respeitante à matéria de facto, havendo que considerar como irreversivelmente assentes todos os factos provados na Sentença, pelo que: 4. O condomínio “V...” é constituído por um conjunto de 18 armazéns, em edifícios autónomos, com coberturas individuais e acessos autónomos, integrando diferentes frações autónomas. 5. Excetuam-se, porém, seis armazéns e uma cantina/balneário – correspondentes às frações designadas pelas letras “L”, “M”, “N”, “O” e “P” – que se encontram numa unidade construtiva autónoma a qual integra: (a) no R/C, os armazéns n.º 13 e 14 e a cantina/balneário, correspondentes, respetivamente, às frações “M” e “N”, parte da “L”; e (b) no 1º andar, os armazéns n.ºs 15, 16, 17 e 18, correspondentes às frações autónomas designadas pelas letras “O” e “P”. 6. Todas estas frações partilham a cobertura, a estrutura, as fachadas, o sistema de drenagem de águas pluviais, rede de esgotos. 7. As Recorrentes são herdeiras na herança de GG, dentro da qual se encontra a propriedade das frações designadas pelas letras “M” (armazém 13), “N” correspondente ao (armazém14), e parte da fração da “L”, todas localizadas no R/C da referida estrutura unificada. 8. As Recorridas (pessoas singulares) são herdeiras na herança de HH, dentro da qual se encontra a propriedade das frações designadas pelas letras “O” (armazéns 15, 16 e 18) e “P” (armazém 17). 9. Desde a constituição da propriedade horizontal no prédio, desde a constituição do condomínio, que alberga os 18 armazéns, os condóminos têm dividido as despesas do seguinte modo: 10. Os direitos e obrigações relativos às partes comuns (p. ex., telhado, infraestrutura,etc.) seriam exercidos ou incumbiriam ao condómino na medida em que essa parte comum afetasse ou incidisse sobre a sua fração; 11. Só as partes comuns – casa da porteira e acessos – seriam da responsabilidade de todos na proporção das suas permilagens. 12. Relativamente às frações das Recorrentes e Recorridas, uma vez que coexistiam no mesmo edifício, foi estabelecido o seguinte: qualquer reparação ou intervenção que fosse necessária, o seu custo era repartido na proporção de 1/3 para o R/C (Frações “M” e “N” e parte da fração “L”) e de 2/3 para as frações “O” e “P”), mediante acordo prévio de todos. 13. O telhado que cobre as frações das Recorrentes e Recorridas tem vindo apresentar enormes deficiências e degradação, como sejam a quebra de vigas, caleiras a transbordar água, telhas partidas e chuva dentro do edifício, que colocaram em causa tudo o quanto integrava o edifício, quer pessoas, quer bens. 14. A queda de água constituía um perigo iminente para os quadros elétricos; inúmeras vigas de madeira que se partiram; tubos de queda de águas pluviais em mau estado. 15. Ao longo dos últimos anos procedeu-se a reparações pontuais do telhado do edifício. 16. Estas reparações, acima aludidas, foram suportadas pelas Recorrentes e Recorridas, nas proporções acordadas. 17. As telhas de toda a cobertura do edifício são em fibrocimento. 18. O acesso ao telhado, por parte de técnicos de reparação, veio a causar acrescidos danos no próprio telhado, originando novas infiltrações. 19. Premente se afigurava antes a realização de uma obra de intervenção de fundo e não pequenas reparações. 20. Pela degradação dos telhados e entradas de água alguns inquilinos requereram a redução de rendas. 21. A Recorrida (Marvãogest, Lda.) viu-se obrigada a celebrar aditamentos aos contratos de arrendamento vigentes, reduzindo as rendas aos arrendatários, a solicitação destes. 22. Para novos inquilinos a Recorrida (Marvãogest, Lda.) foi confrontada com a necessidade de estabelecer uma renda inicial temporariamente reduzida, pelo facto de o espaço necessitar de obras. 23. Considerando o elevado estado de degradação do edifício e o perigo que representa, as Recorridas (pessoas singulares) têm vindo a advertir as Recorrentes para a necessidade realização de uma obra estrutural no edifício por todas partilhado. 24. Com as chuvas do início do Outono de 2019, a situação do armazém n.º 18, sito no 1º piso do edifício, tornou-se insustentável, dado o estado de degradação da cobertura. 25. A 10 de dezembro de 2019 decorreu uma reunião entre as Recorridas (pessoas singulares) e as Recorrentes, onde se colocaram duas hipóteses para a reparação da cobertura do armazém. 26. A primeira consistia na substituição integral do telhado, com um orçamento da empresa “O...” de €280.000,00, acrescido de IVA. 27. A segunda propunha a aplicação de um sistema de isolamento estanque sobre a cobertura existente, com um orçamento da empresa “J..., Lda”, comum teto máximo de € 250.000,00, acrescido de IVA. 28. As Recorrentes referiram, na mesma reunião, não dispor, naquele momento, de meios financeiros para pagar a parte que lhes caberia nas obras. 29. Após a reunião, foi então enviado, a 19 de dezembro de 2019, o orçamento final da obra às Recorrentes, no valor de € 222.922,54, acrescido de IVA. 30. Iniciaram-se os trabalhos na cobertura do edifício durante o mês de março de 2020, uma vez que já se encontravam pagas as faturas referentes à obra. 31. A Recorrida (Marvãogest, Lda.) celebrou com II, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta e indivisa por óbito de HH, em 01.01.2012 um contrato de arrendamento comercial referente ao armazém 18 32. Quanto à decisão sobre a matéria de facto (não impugnada), a convicção do Tribunal estribou-se na prova produzida nos autos. 33. Também a fundamentação de Direito da sentença é intangível. 34. A Recorrida (Marvãogest, Lda.) é arrendatária do armazém 18, por via de contrato de arrendamento celebrado com as Recorridas (pessoas singulares), e do qual resulta que aquela se obrigou a realizar todas as obras de manutenção necessárias e a custeá-las. 35. A jurisprudência tem vindo a admitir a legitimidade dos arrendatários nas ações propostas contra a administração do condomínio em que peticiona a realização de obras nas partes comuns (Ac. Tribunal da Relação de Lisboa, de 15.12.2009, disponível em www.dgsi.pt). 36. Sendo assim reconhecida a legitimidade da Recorrida (Marvãogest, Lda.) em demandar e peticionar o ressarcimento das despesas urgentes tidas com a conservação/manutenção das partes comuns. 37. Apesar da existência de um condomínio e de várias frações autónomas, só existe uma verdadeira administração de condomínio quanto às partes que são tidas por todos como comuns – casa da porteira e pátio central – isto porque se trata de um condomínio vertical, composto por diversas frações independentes, exceção feita às frações das Recorrentes e Recorridas. 38. Em respeito pela prática até então existente, e porque os outros proprietários das frações autónomas têm respeitado este “acordo informal”, o Tribunal a quo considerou – e de forma certeira – ajustado não fazer intervir a assembleia de condomínio, pois isso iria penalizar todos os demais que não veriam as suas legítimas expectativas respeitadas. 39. Diante do teor do relatório pericial e da prova carreada aos autos pelas Recorridas, mostra-se justificada a intervenção da Recorrida (Marvãogest, Lda.). 40. A lei não dá um conceito concreto de obras urgentes, decorrendo o mesmo de especificidades concretas, mas pode considerar-se que haverá urgência na sua realização quando a omissão de obras ponha em risco ou perigo a saúde ou integridade física dos condóminos ou utentes de alguma das fracções, “nomeadamente e a título de exemplo, quando exista uma infiltração que incida sobre determinada divisão de forma permanente e por tempo elevado.” (in acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02.12.2021, disponível em www.dgsi.pt). 41. Quanto ao valor que será da responsabilidade das Recorrentes, se atentássemos à regra da permilagem (com a premissa de exclusão de todos os outros condóminos, proprietários de uma unidade edificada e em respeito pela prática instituída até agora) verificávamos que a responsabilidade seria igualitária, pois que as frações L, M e N valem 254 de permilagem e as frações O e P valem exatamente o mesmo. 42. O Tribunal está balizado pelo princípio do pedido, pelo que, não pode condenar em mais ou em coisa diversa do que foi pedido. 43. Defendem as Recorrentes que a sentença ora em crise padece da nulidade, a que faz referência o artigo 615.º, n.º 1, alínea d), segunda parte, do CPC, porquanto entendem que a sentença incorreu num excesso de pronúncia. 44. Pois o direito de crédito invocado pelas Recorridas emergiria de responsabilidade contratual, designadamente do incumprimento do acordo celebrado entre ambas. 45. Tendo o Tribunal condenado as Recorrentes pela realização de obras urgentes em parte comum, desencadeadas e custeadas pela Recorrida (Marvãogest, Lda.), com base no dispositivo do artigo 1427.ºdo CC, atenta a posição de arrendatária da Recorrida (Marvãogest, Lda.), consideram aquelas que o Tribunal apreciou de questão não suscitada por estas. 46. Sucede, porém, que a questão de as obras nas partes comuns se afigurarem urgentes e indispensáveis foi efetivamente suscitada pelas AA., desde logo, na Petição Inicial – cfr. p. ex. os seus artigos 23.º, 24.º, 25.º, 31.º, 32.º, 33.º, 34.º, 35.º, 36.º, 37.º, 38.º, 42.º, 51.º, 62.º. 47. A Sentença em crise deu como provados múltiplos factos atinentes à urgência e indispensabilidade da intervenção na parte comum do edifício partilhado pelas Recorrentes e Recorridas (a cobertura), designadamente os vertidos nos artigos 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 19.º, 20.º, 21.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º e 26.º. 48. Essa prova foi lograda através dos documentos juntos pelas Recorridas – p. ex., fotografias do estado de degradação do edifício, reclamações dos inquilinos e pedidos de redução das rendas destes – bem como da prova produzida em audiência de julgamento e, ainda, pelo importante contributo da prova pericial, cujo relatório pendeu para uma situação calamitosa do edifício, carecida de uma intervenção urgente e indispensável. 49. Mais a mais, a invocação da inexistência ou impedimento do administrador do condomínio estava precludida, pois que as Recorridas alegaram e demonstraram a existência de um convénio entre todos os condóminos relativamente à administração das partes comuns. 50. Desde a constituição da propriedade horizontal, todos os condóminos têm dividido as despesas de modo que só a casa da porteira e os acessos seriam da responsabilidade de todos na proporção das permilagens, quedando as restantes a cada condómino na medida em que essa parte comum o afetasse ou incidisse sobre a sua fração (artigo 12.º dos factos provados). 51. Ao invocarem este acordo, as Recorridas sempre estariam dispensadas de alegar e demonstrar o impedimento do administrador do condomínio – pois a intervenção deste nem sequer era necessária. 52. Não configura uma decisão surpresa a agora crise, já que a questão de se tratarem de obras urgentes e com dispensa de intervenção do administrador de condomínio foi suscitada pelas Recorridas nos articulados e, a final, veio a ser confirmada pelo Tribunal e integrada nos factos provados. 53. Sabendo as Recorrentes que o Tribunal não se encontra sujeito às alegações das partes no que toca á indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (cfr. artigo 5.º, n.º 3, do CPC), deveriam ter-se conformado com a possibilidade de este vir a condená-las seguindo um caminho interpretativo distinto do que foi apresentado pelas Recorridas na Petição Inicial, embora alicerçado na matéria que estas trouxeram aos autos, e que integra uma causa de pedir complexa. 54. Como nota do Supremo Tribunal de Justiça, “I – A causa de pedir, como decorre da definição legal constante do art. 498.º, n.º 4, do CPC, é o facto jurídico concreto em que se baseia a pretensão deduzida em juízo; isto é, o facto ou conjunto de factos concretos articulados pelo autor e dos quais dimanarão o efeito ou efeitos jurídicos que, através do pedido formulado, pretende ver juridicamente reconhecidos. II – O enquadramento jurídico da situação não é elemento da causa de pedir. III – Conhecendo o tribunal de pedidos que se fundavam na causa de pedir complexa invocada, embora sem a considerar em toda a sua dimensão fáctica, não se verifica a nulidade (…)”. 55. A causa de pedir é constituída pelo conjunto de factos concretos, a invocar pelo autor, que subsumidos a normas de direito substantivo, devem ser aptos à produção do efeito que se pretende fazer valer. 56. As Recorridas lançaram mão de múltiplos factos concretos, todos com a mesma finalidade – a condenação das Recorrentes ao pagamento de uma quantia – sendo certo que esses factos consubstanciaram mais do que uma causa de pedir (ou, pelo menos, uma causa de pedir complexa), tendo o Tribunal, a final, condenado as Recorrentes com base num desses factos: na realização, pela Recorrida (Marvãogest, Lda.), de obras urgentes em parte comum do edifício, recorrendo à aplicação da norma do artigo 1427.º do CC, ao invés do regime da responsabilidade contratual – questão que é, pura e simplesmente, de aplicação do direito. 57. Como assinala o Acórdão do STJ de 16.02.2023, “Sempre que o enquadramento jurídico realizado pelo tribunal se contenha dentro dos limites da factualidade essencial alegada e seja adequado ao efeito prático-jurídico pretendido, pode o tribunal realizá-lo, posto que as partes tenham tido oportunidade de se pronunciar sobre ele, sendo poder-dever do julgador proceder à requalificação ou reconfiguração normativo-jurídica do caso quando cumpridas aquelas condições”. 58. .A putativa anulação da Sentença recorrida despoletaria uma consequência profundamente ilógica: que as Recorridas intentassem uma nova ação, alegando exatamente os mesmos factos dados como provados na presente ação, e peticionando, a final, a condenação das Recorrentes no pagamento da quantia correspondente à permilagem no edifício, com a única diferença de que o regime aplicável não ser o da responsabilidade contratual mas, antes, o do artigo 1427.º do Código Civil – o que é demonstrativo de que apenas se trata da aplicação do Direito, e não da apreciação de questões diferentes. 59. O Tribunal fez foi o uso dos seus legítimos poderes de cognição e livre aplicação do Direito à factualidade alegada pelas Recorridas, ao abrigo do disposto no artigo 5.º, n.º 3, do CPC. 60. A Sentença em crise procedeu a uma correta aplicação do artigo 1427.º do Código Civil. 61. A realidade do condomínio “V...” comporta especificidades que, de resto, foram dadas como provadas – e não contestadas pelas próprias Recorrentes em sede de recurso. 62. Só existe uma verdadeira administração de condomínio quanto às partes que são tidas por todos como comuns – casada porteira e pátio central– isto porque se trata de um condomínio vertical, comporto por diversas frações independentes, exceção feita às frações das Recorrentes e Recorridas. 63. O acordo informal entre todos os condóminos, porque há muito posto em prática, deve ser respeitado, dispensando-se assim a intervenção da assembleia do condomínio. 64. A dispensa da intervenção da assembleia de condomínio relativamente à obra incidente sobre as frações das Recorrentes e das Recorridas é uma decorrência lógica e necessária da cristalização dos factos provados n.ºs 12 e 13 da Sentença. 65. Fazer intervir a assembleia de condomínio para a realização da obra aqui em causa constituiria uma violação do acordo vigente entre todos os proprietários (dado como provado) e, encontrando-nos no campo da liberdade contratual e da iniciativa privada (que devem ser respeitadas), inexistem razões de qualquer outra ordem que impusessem a submissão da referida intervenção à aprovação da assembleia de condóminos, quando todos eles pretenderam afastar essas decisões dessa assembleia. 66. Estando dispensada a apreciação e aprovação da obra pelo condomínio, por maioria de razão encontrava-se igualmente preterida a necessidade de intervenção do administrador do condomínio, designadamente, para a obtenção de orçamentos, pelo que não ocorreu – como pretendem as Recorrentes em manifesto desespero de causa – qualquer omissão de aplicação da alínea g) do artigo 1436.º do CC. 67. Também não pode merecer qualquer contestação o cariz urgente e indispensável da obra realizada na cobertura dos referidos armazéns, considerando os factos dados como provados nos pontos 14., 15., 16., 20., 21., 22. e 26. 68. Não ocorreu nenhum “lapso superior a 6 meses na preparação da intervenção”, pois que os orçamentos datam de julho e agosto de 2019, mas a adjudicação viria a ocorrer no início do inverno, pois foi aí que a precipitação frequente causou o agravamento galopante da situação da cobertura e obrigou a Recorrida a adjudicar (de modo urgente) o orçamento, tendo a intervenção iniciado em março – e não antes por não ser possível intervir na cobertura em pleno período de chuvas. 69. E considerando, igualmente, o teor do relatório pericial, que assinala a absoluta prioridade da intervenção face aos graves danos causados na cobertura pela entrada de águas pluviais e o perigo para a segurança do edifício, pois avizinhava-se o colapso parcial da cobertura que colocaria em perigo pessoas e bens. 70. Embora a lei não defina o conceito de obras urgentes, “haverá urgência na sua realização quando a omissão de obras ponha em risco ou perigo a saúde ou integridade física dos condóminos ou utentes de alguma das frações” (cfr. a Sentença). 71. Relativamente à obtenção e adjudicação dos orçamentos, embora não fosse exigível às Recorridas que aguardassem pela aprovação das Recorrentes (com o que ficaria prejudicada a urgência da intervenção), resulta também da factualidade provada – pontos n.ºs 27., 29., 30., 31., 32., 33. – que aquelas estavam ao corrente dos orçamentos apresentados, pelo que bem andou o Tribunal ao considerar legitima a intervenção da Recorrida. 72. Finalmente, a Sentença recorrida não incorreu em nenhuma interpretação errada dos artigos 1031.º, n.º 1, alínea b) e 1074.º, n.º 1, do Código Civil. 73. O raciocínio das Recorrentes parece encerrar uma enorme confusão, pois uma coisa é aquilo que foi acordado entre o senhorio (as Recorridas, pessoas singulares) e a Recorrida (Marvãogest, Lda.) no que respeita ao pagamento das despesas de conservação e manutenção do locado e/ou das partes comuns, e outra é a responsabilidade que recai sobre as Recorrentes na comparticipação das despesas de conservação das partes comuns (isto é, comuns às Recorrentes e às Recorridas). 74. Se, por um lado, a Recorrida (Marvãogest, Lda.) não pode reclamar das Recorridas (pessoas singulares) o pagamento das despesas de conservação das partes comuns, porque afastaram o regime supletivo através do contrato de arrendamento (ao abrigo da liberdade contratual), por outro lado nada impede que aquela Recorrida reclame das Recorrentes a quota-parte que cabe a estas na manutenção e conservação de uma parte comum, visto que foi aquela quem socorreu a essa despesa (urgente e indispensável). 75. Afigura-se escorreito o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo ao reconhecer legitimidade à Recorrida (Marvãogest, Lda.) “em demandar e peticionar o ressarcimento das despesas urgentes tidas com a conservação/manutenção das partes comuns”. Nestes termos e nos demais de Direito que V.Exas., Venerandos Srs. Juízes Desembargadores doutamente suprirão, deverá o presente recurso ser julgado improcedente, por não provado, e em consequência ser integralmente confirmada a decisão recorrida, com todos os efeitos legais. Pois só assim se fará JUSTIÇA. * I.2 – Questão prévia - admissibilidade do recurso O recurso de revista é admissível ao abrigo do disposto no art. 678.º, do Código de Processo Civil. * I.3 – O objecto do recurso Tendo em consideração o teor das conclusões das alegações de recurso e o conteúdo da decisão recorrida, cumpre apreciar a seguinte questão: 1. Nulidade por excesso de pronúncia 2. Interpretação dos arts. 1427, 1436º, alínea f) (na redacção aplicável), 1031º. nº. 1, alínea b), e 1074º., nº. 1, todos do Código Civil. * I.4 - Os factos O Tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos: I. O condomínio da "V..." foi instituído por escritura de 25 de Março de 1986, lavrada de fls. 53v. a 58 do Lº. nº. 223-E das notas do então 20º. Cartório Notarial de Lisboa. II. Através dessa escritura pôs-se termo à compropriedade paritária de três irmãs: Senhora D. GG (mãe das Rés), Senhora D. HH (mãe das 2ª., 3ª. e 4ª. AA.) e Senhora D. JJ. III. A 1ª Autora, "Marvãogest - Gestão de Móveis e Imóveis, L.dª ", é uma sociedade comercial cuja actividade consiste na gestão e comercialização de móveis e imóveis, compra, venda, arrendamento, subarrendamento, actividades agrícola, silvícola, pecuária, turismo e outras acessórias ou complementares. IV. E todas as demais AA. são sócias e gerentes da 1ª Autora. V. As Rés são irmãs, entre si, e todas primas das 2ª, 3º e 4ª Autoras. VI. Fruto de relações familiares, receberam, por herança, a propriedade de fracções autónomas de um prédio urbano sito no ..., na Rua 1 e Rua 2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o n.º .70, da freguesia do ..., inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ..35, da freguesia de Marvila. VII. O referido imóvel é constituído por um conjunto de 18 armazéns, em edifícios autónomos, com coberturas individuais e acessos autónomos, integrando diferentes fracções autónomas. VIII.Exceptuam-se, porém, seis armazéns e uma cantina/balneário - correspondentes às fracções autónomas designadas pelas letras "L", "M", "N", "O" e "P" - que se encontram numa unidade construtiva autónoma a qual integra: a. No R/C, os armazéns nº 13 e 14 e a cantina/balneário, correspondentes, respectivamente, às fracções "M" e "N", parte da "L"; b. No 1º andar, os armazéns n.ºs 15, 16, 17 e 18, correspondentes às fracções autónomas designadas pelas letras "O" e "P". IX. Todas estas fracções partilham a cobertura, a estrutura, as fachadas, o sistema de drenagem de águas pluviais, rede de esgotos. X. As Rés são herdeiras na herança de GG, dentro da qual se encontra a propriedade das fracções designadas pelas letras "M", correspondente ao armazém 13, "N", correspondente ao armazém 14, e parte da fracção da "L", todas localizadas no R/C da referida estrutura unificada. XI. As 2ª, 3ª e 4ª Autoras são herdeiras na herança de HH, dentro da qual se encontra a propriedade das fracções designadas pelas letras "O", correspondente aos armazéns 15, 16 e 18, e "P", correspondente ao armazém 17. XII. Desde a constituição da propriedade horizontal no prédio, desde a constituição do condomínio, que alberga os 18 armazéns, os condóminos têm dividido as despesas do seguinte modo: a. Os direitos e obrigações relativos às partes comuns (p. ex., telhado, infra-estrutura, etc.) seriam exercidos ou incumbiriam ao condómino na medida em que essa parte comum afectasse ou incidisse sobre a sua fracção. b. Só as partes comuns - casa da porteira e acessos - seriam da responsabilidade de todos na proporção das suas permilagens. XIII. Relativamente às fracções das Autoras e das Rés, uma vez que coexistiam no mesmo edifício, foi estabelecido o seguinte: qualquer reparação ou intervenção que fosse necessária, o seu custo era repartido na proporção de 1/3 para o R/C (Fracções "M" e "N" e parte da fracção "L") e de 2/3 para as fracções "O" e "P"), mediante acordo prévio de todos. XIV. O telhado que cobre as fracções das Autoras e das Rés tem vindo apresentar enormes deficiências e degradação, como sejam a quebra de vigas, caleiras a transbordar água, telhas partidas e chuva dentro do edifício. XV. Todas estas vicissitudes colocaram em causa tudo o quanto integrava o edifício, quer pessoas, quer bens. XVI. A queda de água constituía um perigo iminente para os quadros eléctricos; inúmeras vigas de madeira que se partiram; tubos de queda de águas pluviais em mau estado. XVII. Ao longo dos últimos anos procedeu-se a reparações pontuais do telhado do edifício. XVIII. Estas reparações, acima aludidas, foram suportadas pelas Autoras e pelas Rés, nas proporções acordadas. XIX. As telhas de toda a cobertura do edifício são em fibrocimento. XX. O acesso ao telhado, por parte de técnicos de reparação, veio a causar acrescidos danos no próprio telhado, originando novas infiltrações. XXI. Pelo que premente se afigurava antes a realização de uma obra de intervenção de fundo e não pequenas reparações. XXII. Pela degradação dos telhados e entradas de água alguns inquilinos requereram a redução de rendas. XXIII. A 1.ª Autora viu-se obrigada a celebrar aditamentos aos contratos de arrendamento vigentes, reduzindo as rendas aos arrendatários, a solicitação destes. XXIV. Para novos inquilinos a 1.ª Autora foi confrontada com a necessidade de estabelecer uma renda inicial temporariamente reduzida, pelo facto de o espaço necessitar de obras. XXV. Considerando o elevado estado de degradação do edifício e o perigo que representa, as 2ª, 3ª e 4ª Autoras têm vindo a advertir as Rés para a necessidade realização de uma obra estrutural no edifício por todas partilhado. XXVI. Com as chuvas do início do Outono de 2019, a situação do armazém n.º 18, sito no 1º piso do edifício, tornou-se insustentável, dado o estado de degradação da cobertura. XXVII. A 10 de Dezembro de 2019 decorreu uma reunião entre as 2ª, 3ª e 4ª Autoras e as Rés. XXVIII. Na qual estiveram presentes também KK e LL, trabalhadores da 1ª Autora. XXIX. Na sobredita reunião, colocaram-se duas hipóteses para a reparação da cobertura do armazém. XXX. A primeira consistia na substituição integral do telhado, com um orçamento da empresa "O..." de €280.000,00, acrescido de IVA. XXXI. A segunda propunha a aplicação de um sistema de isolamento estanque sobre a cobertura existente, com um orçamento da empresa "J..., Lda", com um tecto máximo de €250.000,00, acrescido de IVA. XXXII. As Rés referiram, na mesma reunião, não dispor, naquele momento, de meios financeiros para pagar a parte que lhes caberia nas obras. XXXIII. Após a reunião, foi então enviado, a 19 de Dezembro de 2019, o orçamento final da obra às Rés, no valor de €222.922,54, acrescido de IVA. XXXIV. Iniciaram-se os trabalhos na cobertura do edifício durante o mês de Março de 2020, uma vez que já se encontravam pagas as facturas referentes à obra. XXXV. Toda a situação causou, nas 2ª, 3ª e 4ª Autoras angústia, mágoa, frustração, preocupação e stress. XXXVI. No dia 19.12.2019, LL enviou para as RR., com conhecimento das AA., um email com o seguinte teor: "Olá tias, Junto envio orçamento que estamos a analisar para a cobertura, onde consideramos a solução que mostrei na reunião passada. Pedimos ainda valor para o revestimento interior, que aguardo, mesmo que possa ser feito numa fase posterior." XXXVII. No dia 14.03.2020, a R. CC remeteu um email às AA. dizendo que "Estivemos a conversar entre as três e considerámos que para bem de todas, dadas as circunstâncias em que nos encontramos, perigo de contágio e respeito pelas medidas de contenção, não nos devíamos reunir nesta próxima segunda-feira, dia 16 de Março. Queremos transmitir-vos que, neste momento, somos forçadas a admitir que não temos condições financeiras para contribuir para a obra de cobertura do armazém. Esta instabilidade deve-se, essencialmente, à dificuldade no cumprimento do pagamento das rendas por parte dos nossos inquilinos, pois esta pandemia tem causado graves repercussões nas suas actividades. Considerámos prematuro o arranque da obra sem o nosso parecer sobre o orçamento. Na última reunião ficou acordado que o iríamos discutir e analisar, mas isso não aconteceu. Assim sendo, apenas vos poderemos comunicar que, quando tivermos maiores capacidades financeiras, entraremos em contacto convosco." XXXVIII. Este email mereceu resposta pela mesma via das AA., no dia 18.03.2020, no qual estas informaram que "Quanto ao orçamento lembramos que na reunião que tivemos sobre este assunto tivemos oportunidade de vos colocar duas possibilidades de soluções técnicas e apresentados os correspondentes valores de referência: 280 mil para a substituição e de 250 mil para encapsulamento exterior e interior. Concordámos sobre a solução técnica e sobre a ordem de valores apresentada, que iriamos tentar que fosse mais próxima dos 220.000, do que dos 280.000. Ficámos depois de vos enviar o orçamento final, o que fizemos em 19 de Dezembro. Ficou só pendente as questões estruturais das madeiras das vigas que estão podres. Sempre que por alguma razão foi abordado o assunto de parte a parte, foi com a clareza da sua concretização nas condições em que todas tínhamos conhecimento, nomeadamente do orçamento há muito enviado. Dada a urgência sabida de resolução do problema, no final da reunião de condomínio tivemos oportunidade de vos referir que no início de Março teríamos que assumir face à banca o compromisso financeiro do empréstimo. Lembramos também que já tivemos que reduzir as nossas rendas com o início do Inverno, em virtude do volume de água que cai em cima dos nossos inquilinos quando chove. Assim, veremos os impedimentos por questões de saúde pública, mas já estamos com pagamento de juros ao banco, pelo que a obra não poderá ser adiada, salvo, como já referido, por exigências de saúde pública." XXXIX. No dia 13.04.2020, LL enviou para as RR., com conhecimento das AA., um email com o seguinte teor: "Venho enviar-lhes algumas fotografias da obra no telhado. Noutra circunstância diria para irem lá ver, mas pelo menos desta forma conseguem acompanhar o desenvolvimento dos trabalhos. Se quiser enviar também ao tio MM, ou se tiverem alguma sugestão ou dúvida digam-me que vou falando com o empreiteiro." XL. Em resposta a este email, a R. AA escreveu: "Olá Primas Esperamos que estejam de boa saúde, bem como toda a Família. Relativamente à reabilitação da cobertura do armazém nº18, colocamos as seguintes questões: ? Qual o total da área que está a ser intervencionada? ? Como é resolvido o grande caudal resultante das águas pluviais? Como e onde funcionam as caleiras? ? Por fim, qual a % que cabe à Família ... e qual a forma de podermos também beneficiar das condições fiscais inerentes à mesma. (…). XLI. A A. LL respondeu à R. AA, com conhecimento de demais AA. e RR., no dia 21.04.2020, por email com o seguinte teor: "(…) O total da área intervencionada são 2 695,20 m2 (uma vez que o somatório da área de um telhado inclinado é sempre consideravelmente superior à área em planta). Relativamente ao caudal das águas, o sistema de caleiras actual será todo "anulado" passando a água a ser recolhida e encaminhada pelo novo sistema montado sobre as caleiras. Ou seja, as caleiras ficam lá, porque seria complicado tirá-las, mas sem função. O novo sistema de perfis + isolamento + impermeabilização passa de forma contínua por cima da caleira existente fazendo uma "segunda caleira", com pendentes correctas e em total continuidade com as chapas do telhado. Deixa assim de haver espaço entre a caleira e a chapa, por onde tantas vezes transborda a água para o interior do armazém. Este sistema novo liga aos tubos de queda existentes, refazendo e corrigindo ligações defeituosas, sendo que os elementos em pior estado serão substituídos. Quanto às questões fiscais, não sabemos bem quais as implicações nas vossas circunstâncias, uma vez que são diferentes das nossas, que somos uma empresa. Talvez seja bom ouvirem a opinião de algum contabilista, sendo que em qualquer caso seria necessário uma factura em vosso nome (com IVA, por serem pessoas singulares) e paga por vocês no final da obra (prevista para o final de Maio), no montante correspondente. No entanto, ficámos contentes pois conseguimos negociar com o empreiteiro o IVA em autoliquidação (ou seja, ao valor da obra não acresce IVA, por sermos uma empresa, o que é muito bom para todas). Quanto à isenção do IMI vimos essa possibilidade com a Câmara, que enviou um técnico ao local. Este considerou que, no nosso caso, o estado actual do imóvel é "médio a bom" (porque os critérios para ser classificado como "mau" incluem não ter água, electricidade ou casas de banho etc). Para talvez e sem garantias, ser considerada essa possibilidade, a totalidade do prédio (todas as fracções do condomínio) tinha que, por consequência da obra, passar a "Excelente" (subindo 2 níveis na classificação). Isto incluindo fachadas, pavimentos exteriores e interiores das fracções (o que não vai ser feito por consequência da obra). O que nos explicaram é que este benefício existe para aquelas obras integrais em que se pega num edifício devoluto e se reabilita totalmente todas as fracções e zonas comuns. Ou seja, não tendo nós outros benefícios fiscais, vocês irão beneficiar do IVA, mas confirmem se haverá mais alguma coisa que possamos entretanto ver. O IVA da obra sem reparações estruturais ou encapsulamento interior são 13.375,35€ para taxa a 6% ou 55.730,64€ para taxa a 23%. Considerando a vossa proporção de 1/3, estão a beneficiar de 4.458,45€ ou 18.576,87€ correspondentemente. (…)". XLII. No dia seguinte (22.04.2020) a R. AA respondeu "Visto não termos ficado elucidadas nas questões colocadas anteriormente, e para nos podermos pronunciar sobre os valores em causa, precisamos que nos enviem o orçamento definitivo e detalhado, uma vez que até à data temos apenas em nosso poder o descritivo da proposta." XLIII. No dia 23.04.2020, a R. AA enviou às AA. o seguinte email: "Este é o nosso comentário ao e-mail recebido "O documento que as tias têm é o orçamento final. Nas páginas iniciais está o descritivo dos trabalhos detalhado com o valor de cada trabalho. Na página final está o valor total 222.922,54€ + IVA (como está na última folha não é a leitura mais imediata, mas está lá indicado). Volto a enviar em anexo, para caso de dúvidas. " - O documento enviado é uma proposta de orçamento, não o orçamento final do contrato, pois está datado de 2019-12-13 e não tem preenchido as condições de adjudicação do trabalho requeridas pelo empreiteiro no documento para fecho do contrato e início das obras. - O valor do IVA também não está mencionado. - Não duvidamos que os valores indicados na proposta sejam iguais aos valores contratados, mas este não será efectivamente o documento final contratual. - Aproveitamos para perguntar se após a apresentação desta proposta de orçamento, datado de 2019-12-13, para v/análise e aprovação, não se procedeu de imediato, como é habitual nestes casos, a uma fase de negociações entre as duas partes, com o objectivo de esclarecimentos técnicos, prazos de execução, mas principalmente na tentativa de baixar os valores propostos, antes da eventual adjudicação. Não houve sucesso na negociação para redução do orçamento? "O último trabalho que fica por confirmar é se avançamos nesta fase ou não com a pintura/encapsulamento interior, que é o que completa a segurança interior das fibras de amianto. Gostaríamos de fazer já, mas também estamos a fazer contas e podemos fazer este trabalho mais tarde no tempo." Consideramos que este trabalho não será da nossa responsabilidade, pois a opção desta solução técnica foi apenas vossa e nem sequer fomos consultados. O confinamento ( pintura/encapsulamento) é para nós um extra e uma consequência do material escolhido por vós. Consideramos também como um extra por ser um benefício unicamente para os vossos armazéns: a colocação dos tubos solares térmicos, a chamadas clarabóias, cujo valor total são de 45,891.44€ , valor que iremos suprimir ao total da fatura. Tendo em consideração os elevados valores em causa, questionamos qual terá sido a razão pela qual não se optou por uma solução mais barata e menos complexa, do tipo "Standard"? Estamos a falar apenas da substituição da cobertura existente em canaletes de fibrocimento por uma solução mais simples em chapa metálica sanduiche. Foi esta a solução que optámos para a substituição nos nossos armazéns, por questões dos custos associados, ficando aproximadamente 60,00 €/m2, obra faseada em três anos. Quando se falou numa cobertura do vosso armazém, nunca nos foi dito que pretendiam uma cobertura como a que acabaram por adjudicar, de um valor elevadíssimo, cerca de 82,72 €/m2, muito longe dos valores que nós tínhamos em mente! Por essa razão achamos que não temos que pagar este diferencial entre as duas soluções. Como é do vosso conhecimento, sempre afirmámos que os armazéns estavam velhos e que não estávamos dispostas a investir neles quantias elevadas, somente pequenos ajustamentos para poderem funcionar. Mais acrescentamos que devido ao período que atravessamos (com rendas reduzidas a 50% até ao final do ano), não nos é possível contribuirmos neste momento para o pagamento da cobertura do armazém. As condições económico-financeiras para os próximos três anos, não são de forma nenhuma sorridentes e irão com toda a certeza comprometer a nossa estabilidade." XLIV. A A. LL respondeu, pela mesma via, no dia 29.04.2020, referindo que "De facto, os temas que abordam no vosso e-mail, seriam os que queríamos abordar pessoalmente nas várias conversas propostas. No seguimento do que referem, poderemos enviar-vos o orçamento assinado, logo que voltemos ao escritório da V..., que neste momento se encontra fechado. Quanto aos dois tipos de solução técnica possíveis, na última reunião que tivemos na V... tivemos oportunidade de falar dos dois orçamentos. Um com a solução que se está a executar e outro com a solução que vocês colocam no vosso e-mail (esta última com um orçamento total que rondava os 280.000€). O problema maior dessa solução é que a estrutura do A18 está significativamente mais degradada do que a estrutura dos outros armazéns, tendo sido durante muitos anos sacrificada pelas entradas de água do telhado. Levantar as chapas existentes para colocar os painéis iria implicar um arranjo muito significativo da referida estrutura de madeira, sendo que ajustes com calços não seriam suficientes para corrigir os alinhamentos e implicando possivelmente a substituição integral de todo o ripado (para poder assentar os painéis que necessitam de estar planos). O arranjo da estrutura rondaria por volta de 45.000€. Mais referimos que a proposta mais barata que se arranjou para a substituição por painéis sandwich neste último orçamento foi de 88€/m2 (a acrescer correções ao ripado). Empresa que dois anos antes fazia a obra por 60€/m2, mas que, devido ao aumento dos materiais, subiu os preços para estes valores à data do final do ano passado. Referimos também que a partir de Janeiro de 2021 vai acrescer aos juros que já estamos a pagar, o montante relativo ao capital, pelo que consideramos essencial a vossa comparticipação a partir dessa data. Independentemente do exposto e do sistema escolhido, tomaremos como referência o valor de 60€/m2 x 2.695,20m2 = 161.712€, sendo a vossa parte 53.904€, com pagamentos a partir de Janeiro de 2021, num montante mensal que deixamos à vossa proposta." XLV. No dia 17.07.2020, foi enviado pela 1.ª A, representada por I. Advogado uma missiva em resposta à enviada pelas RR. XLVI. O condomínio foi gerido por uma administradora externa, especializada nesse tipo de gestão, a "C..., Lda", representada pelo Senhor Dr. FF. XLVII. As RR. nada adjudicaram à "J..., Lda". XLVIII. A 1.ª A celebrou com II, na qualidade de cabeça de casal da herança aberta e indivisa por óbito de HH, em 01.01.2012 um contrato de arrendamento comercial referente ao armazém 18. XLIX. Realizada perícia concluiu-se, designadamente, que: a. O edifício objecto da Perícia consiste numa unidade orgânica composta por diversas fracções no seu interior - fracções "M", "N", "O", "P" e parte da "L", correspondendo, respectivamente, aos armazéns: A13, A14, A15 e A16, e A17 e A18, sendo a parte ao A12. b. As fracções "M" e N" estão sob a fracção "O", sendo a cobertura desta fracção e da "P" em chapa de fibrocimento com um desenvolvimento de 2 águas, formando 9 alinhamentos diferenciados, desde a alinha férrea, sendo 8 de maior dimensão e um mais pequeno, a Nascente. c. Esta cobertura tem uma forma continua e cobre toda a dimensão, em largura, dos referidos armazéns, numa extensão de cerca de 85 metros de comprimento. d. A cobertura é suportada por alinhamentos de asnas em madeira pintada a esmalte cinza, com travamentos em "cruz" / "X" no sentido transversal, também de madeira, em que alguns desses travamentos se verificou terem sido removidos. e. O conjunto de armazéns em causa, com a mesma estrutura, a mesma modelação de suporte em madeira e o mesmo tipo de cobertura contínua, (sem qualquer descontinuidade), embora com divisões e separações físicas interiores e entradas exclusivas (fracções autónomas), constitui uma mesma unidade e as fracções fazem parte do mesmo conjunto. f. A intervenção efectuada beneficia maioritariamente o armazém A18, pois a cobertura foi intervencionada na área que cobre este armazém, mas também na do acesso comum aos armazéns A16, A17 e A18, uma vez que inclui o átrio exterior que lhes franqueia a entrada. g. Existiam entradas de água das chuvas que afectaram a segurança do edifício e poderiam colocar em causa também a segurança de pessoas e bens. h. Os danos com a entrada sistemática de águas através da cobertura já apresentavam consequências no interior e, sem qualquer intervenção, iriam agravar-se, podendo vir a haver colapso parcial de partes da cobertura e mesmo danos de maior envergadura, já que se a água atingisse quadros ou infra-estruturas eléctricas a probabilidade de um incêndio poderia afectar todos os armazéns. i. Continuam a existir áreas, fora da zona da cobertura intervencionada, com indícios de entrada de águas, ainda que na área do armazém A18 a situação se mostrasse absolutamente prioritária de intervenção. Factos não provados: I. A progressiva e cada vez mais acentuada degradação do edifício levou, por isso, a que alguns inquilinos ameaçar fazer cessar os contratos de arrendamento. II. Essa situação conduziu a que potenciais arrendatários optassem por não arrendar as fracções das Autoras III. As Autoras viram-se obrigadas a praticar rendas de valor bastante inferior ao valor de mercado. IV. Sendo em todo o caso as Autoras alvo de inúmeras e constantes reclamações por parte dos inquilinos. V. Na aludida reunião, concluiu-se ser mais apropriado e económico adjudicar o orçamento da empresa “J..., Lda” para implementar o sistema de isolamento estanque. VI. Foi, de resto, uma decisão unânime, tendo por isso sido consensual entre as Autoras e as Rés adjudicar o referido orçamento, uma vez que tinha sido acordado que o orçamento se situasse abaixo dos €250.000,00. VII. Cujo custo seria repartido de acordo com a proporção vertida no convénio há muito vigente entre as partes sobre as despesas do edifício. VIII. As Autoras disponibilizaram-se para assumir o financiamento bancário, ficando as Rés devedoras às Autoras da quota-parte que lhes caberia nas obras – a aludida proporção de 1/3. IX. Mais propuseram as Autoras que fosse estabelecido com as Rés um plano de pagamentos. X. Tendo estas aceite essa solução. XI. Em reunião de condomínio ocorrida a 19 de Fevereiro de 2020, foi o condomínio devidamente informado da realização da referida obra. XII. Sendo que, na sobredita reunião, estiveram presentes tanto as Autoras como as Rés. XIII. Tendo sido também informado o condomínio de que as despesas da obra seriam divididas entre as Autoras e as Rés à luz do acordo vigente desde a constituição da propriedade horizontal. XIV. Após a reunião de condomínio, as Autoras informaram as Rés de que tudo se encontrava a postos para dar início às obras no edifício e que o financiamento bancário havia sido concedido para o pagamento da totalidade dessas obras. XV. As Rés prontamente anuíram, e acordam com as Autoras que se agendasse uma reunião para estabelecer o plano de pagamento às Autoras do montante que lhes competia nas obras. XVI. Aí, as Rés sugeriram também a contratação de um advogado para redigir, por escrito, o acordo que vigorava há muito entre todos os condóminos, desde os anos 80. XVII. Sendo que, entre as Autoras e as Rés havia sido acordado que as obras seriam facturadas à 1ª Autora. XVIII. Pelo que as 2ª, 3ª e 4º Autoras deram nota às Rés de que haviam iniciado os trabalhos e o valor das obras havia sido liquidado. XIX. Com a emergência da pandemia causada pela propagação do coronavírus, as Rés alteraram substancial e surpreendentemente a sua posição relativamente às obras. XX. As Autoras decidiram enviar uma comunicação, através de advogado, às Rés, para ter lugar uma reunião onde pudesse ser debatida a questão do pagamento das obras. XXI. Ao que as Rés responderam mostrando-se indisponíveis para falar sobre o assunto. XXII. As Autoras decidiram convocar uma assembleia de condóminos, para informar o condomínio de que o acordo vigente entre todos desde o início da propriedade horizontal estava a ser violado pelas Rés. XXIII. Nessa reunião, as Rés referiram que estariam disponíveis para reunir posteriormente no sentido de resolver o assunto, apresentando uma solução. XXIV. Porém, mais referiram que, a partir daí, as despesas relativas às partes comuns seriam repartidas de acordo com o regime do Código Civil. XXV. No entanto, uma vez questionadas pelas Autoras sobre disponibilidade para reunir, as Rés recusaram-se a indicar uma data ou ter disponibilidade para reunir, mediante comunicação enviada pelo advogado das mesmas. XXVI. O telhado que cobre o armazém 18 não “afecta”, nem “incide” sobre qualquer fracção autónoma da propriedade das Rés. XXVII. O telhado que está em causa nestes autos não cobre um 1º. andar, mas um piso térreo, que integra, exclusivamente, uma fracção autónoma que é propriedade das AA. *** II – Fundamentação 1. Nulidade por excesso de pronúncia Alegam as recorrentes que: - as AA. apenas estribaram a sua pretensão de condenação das Rés no incumprimento de um acordo celebrado entre as partes, nos termos do qual as ora recorrentes teriam dado o seu assentimento à realização da obra que a Marvãogest, Lda. adjudicou à “J..., Lda” e assumido que comparticipariam no respectivo custo, na medida de 1/3, sendo tal causa de pedir reforçada na resposta que apresentaram quanto à suscitada ilegitimidade da Marvãogest, L.dª, constante do requerimento que apresentaram em 10 de Dezembro de 2021. - a sentença condenou as RR. no pagamento de € 74.317,51, com base na licitude da sua conduta ao abrigo da acção directa consentida pelo art. 1427º do Código Civil, apesar de aquele acordo não ter sido provado, e, também o seu incumprimento. - As questões da indispensabilidade e urgência das obras não foi invocada pelas AA. e - não foi alegado que o condomínio não tivesse administrador ou este estivesse impedido de agir em tempo útil - no facto provado 46, foi dado como assente a existência de “uma administradora externa, especializada nesse tipo de gestão a C..., Lda,», representada pelo Senhor Dr. FF. - a admissibilidade e licitude da conduta de um arrendatário que se substitui ao senhorio e realiza obras nas partes comuns do condomínio, ao abrigo do estatuído no art. 1427º. do Código Civil não foi suscitada pelas partes, e, não era do conhecimento oficioso. As recorridas não partilham desta visão apresentada pelas recorrentes. Indicam que a urgência e indispensabilidade das obras foi suscitada na petição inicial, a inexistência ou impedimento do administrador do condomínio estava precludida, pela a existência de um convénio entre todos os condóminos relativamente à administração das partes comuns sendo o tribunal livre de aplicar o direito aos factos provados, independentemente da qualificação jurídica efectuada pelas partes. Percorrida a petição inicial recolhem-se nela os seguintes elementos: “(…)21.º Relativamente às frações das Autoras e das Rés, uma vez que coexistiam no mesmo edifício, foi estabelecido o seguinte: qualquer reparação ou intervenção que fosse necessária, o seu custo era repartido na proporção de 1/3 para o R/C (Frações “M” e “N” e parte da fração “L”) e de 2/3 para as frações “O” e “P”); 22.º O que equivale a dizer: entre a 2ª, 3ª e 4ª Autoras e as Rés foi estabelecido que, qualquer intervenção necessária no edifício onde se integravam as suas frações, 1/3 do custo seria suportado pelas Rés, e 2/3 eram suportados pelas Autoras; 23.º Nos últimos anos, o telhado que cobre as frações das Autoras e das Rés tem vindo apresentar enormes deficiências e degradação, como sejam a quebra de vigas, caleiras a transbordar água, telhas partidas e chuva dentro do edifício; 24.º Todas estas vicissitudes colocaram em causa tudo o quanto integrava o edifício, quer pessoas, quer bens; 25.º A queda de água constituía um perigo iminente para os quadros elétricos; inúmeras vigas de madeira que se partiram; tubos de queda de águas pluviais em mau estado (cfr. doc. n.º 9, 10 e 11, que ora se junta e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido para todos os efeitos legais); 26.º Nessa medida, ao longo dos últimos anos procedeu-se a reparações pontuais do telhado do edifício, quer em termos de caleiras de recolha da água das chuvas, arranjo de vigas partidas, arranjos no sistema de drenagem de águas pluviais, remendo pontual de telhas, entre outras; 27.º Estas reparações, acima aludidas, foram suportadas pelas Autoras e pelas Rés, nas proporções acordadas (cfr. doc. n.ºs 12 e 13, que ora se juntam e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido para todos os efeitos legais); 31.º A realidade é que essas reparações (pontuais) apenas postergaram os efeitos das deteriorações, que acabaram sempre por reaparecer; 32.º Por isso, persiste a queda de chuva dentro do edifício – e que se faz sentir, naturalmente, no 1º andar do edifício, isto é, nas frações autónomas das Autoras; 33.º A qual danifica progressivamente a estrutura de vigas e pilares em madeira (cfr. docs. 9, 10 e 11, supra juntos); 34.º Colocando em perigo pessoas (máxime, inquilinos ou terceiros) e bens (dos proprietários, ou de inquilinos); 35.º Acresce que as telhas de toda a cobertura do edifício são em fibrocimento com cerca de 80 anos, portanto contendo amianto, o que representa um grave risco para a saúde de quem ali circule (porquanto o amianto, quando degradado e em queda, é nocivo para a saúde) 36.º Ademais, o acesso ao telhado, por parte de técnicos de reparação, veio a causar acrescidos danos no próprio telhado, originando novas infiltrações; 37.º O próprio acesso ao telhado já constituía um perigo significativo, dado o risco de poder ceder; 38.º Pelo que premente se afigurava antes a realização de uma obra de intervenção de fundo (uma impermeabilização ou um encapsulamento), e não pequenas reparações;(…) 60.º Foi, de resto, uma decisão unânime, tendo por isso sido consensual entre as Autoras e as Rés adjudicar o referido orçamento, uma vez que tinha sido acordado que o orçamento se situasse abaixo dos €250.000,00; 61.º Cujo custo seria repartido de acordo com a proporção vertida no convénio há muito vigente entre as partes sobre as despesas do edifício; 62.º Na referida reunião, as Rés reconheceram a necessidade e urgência da intervenção na cobertura do edifício; 63.º Porém, as Rés referiram, na mesma reunião, não dispor, naquele momento, de meios financeiros para pagar a parte que lhes caberia nas obras; 64.º Tendo, por outro lado, manifestado a indisponibilidade em assumir um financiamento bancário para o efeito; 65.º Perante essa posição das Rés, as Autoras disponibilizaram-se para assumir o financiamento bancário, ficando as Rés devedoras às Autoras da quota-parte que lhes caberia nas obras – a aludida proporção de 1/3; 66.º Mais propuseram as Autoras que fosse estabelecido com as Rés um plano de pagamentos, 67.º Tendo estas aceite essa solução;(…) 69.º Adiante, em reunião de condomínio ocorrida a 19 de fevereiro de 2020, foi o condomínio devidamente informado da realização da referida obra; 70.º Sendo que, na sobredita reunião, estiveram presentes tanto as Autoras como as Rés; 71.º Tendo sido também informado o condomínio de que as despesas da obra seriam divididas entre as Autoras e as Rés à luz do acordo vigente desde a constituição da propriedade horizontal; 72.º Após a reunião de condomínio, as Autoras informaram as Rés de que tudo se encontrava a postos para dar início às obras no edifício e que o financiamento bancário havia sido concedido para o pagamento da totalidade dessas obras; 73.º As Rés prontamente anuíram, e acordam com as Autoras que se agendasse uma reunião para estabelecer o plano de pagamento às Autoras do montante que lhes competia nas obras; 74.º Aí, as Rés sugeriram também a contratação de um advogado para redigir, por escrito, o acordo que vigorava há muito entre todos os condóminos, desde os anos 80;(…) 77.º As Autoras conseguiram que tivessem início os trabalhos na cobertura do edifício durante o mês de março de 2020, uma vez que já se encontravam pagas as faturas referentes à obra (cfr. doc. 28, que ora se junta e cujo conteúdo se dá aqui por reproduzido); 78.º Sendo que, entre as Autoras e as Rés havia sido acordado que as obras seriam faturadas à 1ª Autora;(…) 82.º As quais, entretanto, tiveram início em março de 2020; 83.º Após o início das obras e de todos os compromissos firmados pelas Autoras com o empreiteiro e com o banco, com o conhecimento e concordância das Rés, e em nome de ambas, as Rés começaram a colocar diversas questões, até então não levantadas, relativamente às obras;(…) 101.º Não obstante, as Rés sugeriram que o valor de referência para a obra seria de €60,00 por m2 – o qual implicaria um prejuízo de €20.403,51 para as Autoras;(…) 127.º Assim, resulta do acordo celebrado entre todos os condóminos que as despesas necessárias à conservação da cobertura do edifício onde se inserem as frações das Autoras e das Rés seriam suportadas por estas, e não por todos os condóminos; 128.º As Rés, com a sua conduta, encontram-se em frontal e deliberado incumprimento do convénio celebrado entre todos os condóminos, onde se incluem as Autoras;(…) 133.º In casu, as Rés, ao incumprirem o acordo vigente com as Autoras, causaram-lhes prejuízos, os quais devem, por isso, ser indemnizados; 134.º E encontrando-nos, aqui, no campo da responsabilidade contratual, a culpa das Rés, inerente ao incumprimento, presume-se, nos termos do artigo 799º, n.º 1, do Código Civil(…) 136.º O incumprimento, pelas Rés, do acordo celebrado entre todos os condóminos, resultou também em danos não patrimoniais na esfera das 2ª, 3ª e 4ª Autoras, senão vejamos(…) 150.º As 2ª, 3ª e 4ª Autoras viram-se, por isso, confrontadas com um incumprimento infundado e imprevisível do acordo que vincula todos os condóminos;(…) 156.º Assim, é forçoso concluir que toda esta situação, provocada pelas Rés, causou às 2ª, 3ª e 4ª Autoras Autoras danos de índole não patrimonial, os quais merecem, igualmente, a tutela do Direito; (…) nestes termos e nos mais de Direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, deverá a presente acção ser julgada procedente, por provada e, em consequência: a) Serem as Rés condenadas a pagar às Autoras a quantia de €74.317,51 (setenta e quatro mil trezentos e dezassete euros e cinquenta e um cêntimos), em virtude do incumprimento do acordo celebrado; b) Serem as Rés condenada a pagar às Autoras, a título de danos morais ou não patrimoniais, uma indemnização no valor de €15.000,00 (quinze mil euros); “ Estamos perante uma acção declarativa de condenação em que as A.A. pedem a condenação das rés a pagar um montante, correspondente a 1/3 do custo das obras suportadas pela primeira A. de reparação do telhado, em imóvel constituído em propriedade horizontal que pertence a ambas e a outros condóminos. Essa parte que as A.A. alegam ser da responsabilidade das R.R. decorreria de um acordo, há muito existente, de repartição de despesas de parte desse imóvel e de terem as R.R. concordado com as obras, com a parte da sua responsabilidade quanto a esse custo, e da sua facturação à 1.ª A.. A sentença recorrida, depois de ter concluído pela legitimidade da 1.ª A., na qualidade de arrendatária das fracções pertencentes às demais A.A. de demandarem as R.R. para obterem delas o pagamento dos montantes que despenderam com a realização das obras aqui em discussão, passou a estatuir do seguinte modo: “(…) Apesar da existência de um condomínio e de várias fracções autónomas, só existe uma verdadeira administração de condomínio quanto às partes que são tidas por todos como comuns – casa da porteira e pátio central – isto porque se trata de um condomínio vertical, composto por diversas fracções independentes, exceção feita às frações das AA. e RR. Pelo que, em respeito pela prática até então existente, e porque os outros proprietários das fracções autónomas têm respeitado este “acordo informal”, afigura-se-nos ajustado não fazer intervir a assembleia de condomínio, pois que isso iria penalizar todos os demais que não veriam as suas legitimas expectativas respeitadas. Concluímos, deste forma, que as RR. serão assim parte legitima. Provado que se mostra que: - O telhado que cobre as frações das Autoras e das Rés tem vindo apresentar enormes deficiências e degradação, como sejam a quebra de vigas, caleiras a transbordar água, telhas partidas e chuva dentro do edifício. - Todas estas vicissitudes colocaram em causa tudo o quanto integrava o edifício, quer pessoas, quer bens. - A queda de água constituía um perigo iminente para os quadros elétricos; inúmeras vigas de madeira que se partiram; tubos de queda de águas pluviais em mau estado. - Ao longo dos últimos anos procedeu-se a reparações pontuais do telhado do edifício. - As telhas de toda a cobertura do edifício são em fibrocimento. - O acesso ao telhado, por parte de técnicos de reparação, veio a causar acrescidos danos no próprio telhado, originando novas infiltrações. - Pelo que premente se afigurava antes a realização de uma obra de intervenção de fundo e não pequenas reparações. - Com as chuvas do início do Outono de 2019, a situação do armazém n.º 18, sito no 1º piso do edifício, tornou-se insustentável, dado o estado de degradação da cobertura. Mostra-se justificada a intervenção da 1.ª A. Com efeito, a lei não dá um conceito concreto de obras urgentes, decorrendo o mesmo de especificidades concretas, mas pode considerar-se que haverá urgência na sua realização quando a omissão de obras ponha em risco ou perigo a saúde ou integridade física dos condóminos ou utentes de alguma das fracções, “nomeadamente e a título de exemplo, quando exista uma infiltração que incida sobre determinada divisão de forma permanente e por tempo elevado.” (in acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 02.12.2021, disponível em www.dgsi.pt). Quanto ao valor que será da responsabilidade das RR., se atentássemos à regra da permilagem (com a premissa de exclusão de todos os outro condóminos, proprietários de uma unidade edificada e em respeito pela prática instituída até agora) verificávamos que a responsabilidade seria igualitária, pois que as fracções L, M e N valem 254 de permilagem e as fracções O e P valem exactamente o mesmo. Porém, o Tribunal está balizado pelo princípio do pedido, pelo que, não pode condenar em mais ou em coisa diversa do que foi pedido. Destarte, serão as RR. Rés condenadas a pagar à 1.ª Autora, na qualidade de arrendatária, a quantia de €74.317,51 (setenta e quatro mil trezentos e dezassete euros e cinquenta e um cêntimos) pelas obras urgentes realizadas em parte comum.”. O tribunal está balizado pelo princípio do pedido e, acrescentaríamos, pela intrínseca relação entre o pedido e o seu fundamento que é a causa de pedir. O art.º 3.º, n. 2 do Código de Processo Civil determina que: “O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.” A função jurisdicional tem por objectivo dirimir conflitos de forma heterocompositiva e em conformidade com a lei, mas não pode, oficiosamente, resolver conflitos apenas porque os entende existentes, ou, num quadro jurídico diverso daquele que lhe foi presente. Neste caso, imperioso seria que as AA tivessem demonstrado, para além da urgência das obras que realizaram, duas coisas: I. que as RR tinham acordado na realização das obras; II. que as RR tinham acordado em suportar 1/3 do seu custo. Em obediência ao princípio da liberdade contratual – art.º 405.º do Código Civil – “1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver.” tinham as RR o direito de se obrigar perante as AA a suportarem estas, ou quaisquer outras obras, a realizar no dito móvel, dado que está em causa a disposição do seu património que é inteiramente livre. Se se demonstrasse que esse acordo existiu, constituíam-se na obrigação de o cumprir – art.º 406.º do Código Civil -. Porém resultou não provado que: 5. Na aludida reunião, concluiu-se ser mais apropriado e económico adjudicar o orçamento da empresa “J..., Lda” para implementar o sistema de isolamento estanque. 6. Foi, de resto, uma decisão unânime, tendo por isso sido consensual entre as Autoras e as Rés adjudicar o referido orçamento, uma vez que tinha sido acordado que o orçamento se situasse abaixo dos €250.000,00. 7. Cujo custo seria repartido de acordo com a proporção vertida no convénio há muito vigente entre as partes sobre as despesas do edifício. 8. As Autoras disponibilizaram-se para assumir o financiamento bancário, ficando as Rés devedoras às Autoras da quota-parte que lhes caberia nas obras – a aludida proporção de 1/3. 9. Mais propuseram as Autoras que fosse estabelecido com as Rés um plano de pagamentos. 10. Tendo estas aceite essa solução. 14. Após a reunião de condomínio, as Autoras informaram as Rés de que tudo se encontrava a postos para dar início às obras no edifício e que o financiamento bancário havia sido concedido para o pagamento da totalidade dessas obras. 15. As Rés prontamente anuíram, e acordam com as Autoras que se agendasse uma reunião para estabelecer o plano de pagamento às Autoras do montante que lhes competia nas obras. 17. Sendo que, entre as Autoras e as Rés havia sido acordado que as obras seriam facturadas à 1ª Autora.”. 18. Pelo que as 2ª, 3ª e 4º Autoras deram nota às Rés de que haviam iniciado os trabalhos e o valor das obras havia sido liquidado. O acordo que as AA alegaram que foi constituído entre ambas as partes, relativo a estas concretas obras e à repartição do seu custo, não resultou provado. Também o acordo que o Tribunal recorrido reputou de informal e que vincularia todos os condóminos, não passa da forma como têm sido repartidas as despesas entre todos os condóminos, como revela o ponto 12 dos factos provados: 12. Desde a constituição da propriedade horizontal no prédio, desde a constituição do condomínio, que alberga os 18 armazéns, os condóminos têm dividido as despesas do seguinte modo: a. Os direitos e obrigações relativos às partes comuns (p. ex., telhado, infraestrutura, etc.) seriam exercidos ou incumbiriam ao condómino na medida em que essa parte comum afectasse ou incidisse sobre a sua fracção. b. Só as partes comuns - casa da porteira e acessos - seriam da responsabilidade de todos na proporção das suas permilagens.” Tal como estabelecido no art. 3.º do Código Civil - Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine. Mas nesta acção está em causa o custo de obras urgentes realizadas num prédio constituído em regime de propriedade horizontal, com 18 armazéns, ignorando-se quantas fracções autónomas, ou a correspondente permilagem - 1.O condomínio da “V...” foi instituído por escritura de 25 de Março de 1986, lavrada de fls. 53v. a 58 do Lº. nº. 223-E das notas do então 20º. Cartório Notarial de Lisboa 46. O condomínio foi gerido por uma administradora externa, especializada nesse tipo de gestão, a “C..., Lda”, representada pelo Senhor Dr. FF. - , suportadas pelo arrendatário de uma fracção autónoma que demanda o proprietário de outras fracções autónomas. Uma vez não provado o acordo invocado como causa de pedir não é possível chegar a uma decisão que aplique de forma aligeirada as regras da propriedade horizontal apenas porque estavam em causa obras urgentes. Estando em causa um prédio em regime de propriedade horizontal, como este é, a regra é de que cada condómino é por elas responsável na proporção do valor das suas fracções – art.º 1424.º, n.º 1 do Código Civil. Os condóminos, no regulamento do condomínio, podem estabelecer uma diversa partição dos encargos de conservação, mas os usos anteriores não têm valor jurídico comparável a esse regulamento que tem de ser aprovado, sem oposição, por maioria dos condóminos que representem a maioria do valor total do prédio e ser dotado de especificação e justificação dos critérios que determinam a sua diversa imputação. Prevendo o art.º 1427º que – “As reparações indispensáveis e urgentes nas partes comuns do edifício podem ser levadas a efeito, na falta ou impedimento do administrador, por iniciativa de qualquer condómino”, não existe na matéria provada qualquer indicação de impedimento do administrador, dado que há administrador nomeado e a exercer as suas funções e a necessidade das obras foi discutida em assembleia de condóminos. Do mesmo modo, não pode o Tribunal considerar um acordo informal apenas para não onerar os demais condóminos com o que seria a sua contribuição para o encargo de conservação de uma parte comum, o telhado de uma das fracções autónomas, na ausência de regulamento do condomínio que o permitisse. Existindo no prédio 18 armazéns, é provável que existam mais que 4 fracções autónomas pelo que nos termos do disposto no art.º 1429.º-A do Código Civil já deveria ter sido elaborado um regulamento do condomínio disciplinando o uso, a fruição e a conservação das partes comuns. O tribunal recorrido ignorando os fundamentos da acção e tendo apenas em conta que tinham sido realizadas obras no edifício, que considerou urgentes, mesmo perante a não prova dos factos constitutivos do direito invocado pelas AA fez uma errada interpretação do disposto no art.º 1427.º do Código Civil conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento, pelo que a sentença é nula ao abrigo do disposto no art.º 615.º do Código de Processo Civil. Em face da ausência de prova do alegado acordo estabelecido entre as AA e as RR para repartição custo das obras realizadas, e, de qualquer deliberação da assembleia de condóminos ou do regulamento do condomínio que estabeleça o dever de suportar tais encargos na proporção peticionada, improcede a acção. Contudo, sempre a acção teria de improceder na medida em que não há prova de que qualquer das AA haja despendido nas obras seja que quantia seja, conhecendo-se apenas que a obra foi adjudicada, sem estarem provados os efectivos custos nem, a terem existido, quem os suportou. *** III – Deliberação Pelo exposto acorda-se em conceder a revista, revogar a sentença recorrida, e, julgar improcedente a acção. Custas pelas AA. * Lisboa, 6 de Novembro de 2025 Ana Paula Lobo (relatora) Emídio Francisco Santos Fernando Baptista de Oliveira |