Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
335/20.6S7LSB.L1-A.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ADELAIDE MAGALHÃES SEQUEIRA
Descritores: FURTO QUALIFICADO
QUALIFICAÇÃO JURÍDICA
MEIOS DE PROVA
PROVA PROIBIDA
IN DUBIO PRO REO
PENA PARCELAR
PENA ÚNICA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Data do Acordão: 05/19/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: PROVIDO.
Sumário :
I - Em processo penal não existe um verdadeiro ónus da prova em sentido formal, vigorando o princípio da aquisição da prova ligado ao princípio da investigação, do qual resulta que são boas as provas validamente trazidas ao processo, sem importar a sua origem, devendo o tribunal, em último caso, investigar e esclarecer os factos na procura da verdade material e com vista à boa decisão da causa, desde que respeite o princípio do contraditório (art. 340.º, n.º 1, e n.º 2, do CPP).
II - A identificação das arguidas através das imagens de videovigilância foi feita de acordo com as normas processuais aplicáveis (art. 147.º, do CPP), já que foi registada em auto e passou a constituir prova documental, daí que, caso as mesmas pretendessem invocar a nulidade deste meio de prova deveriam ter accionado o regime legal de arguição de nulidades dentro do prazo legal para esse efeito, não o podendo agora pôr em causa ao invocar que o reconhecimento através do visionamento das imagens de vídeo não obedeceu ao disposto no n.º 5, do art. 147.º do CPP.
III – O STJ tem considerado que as regras de reconhecimento pessoal prescritas pelo art. 147.º, do CPP não se aplicam em julgamento, mas antes à fase de inquérito e de instrução. O reconhecimento feito em audiência integra-se num conjunto probatório que lhe retira não só autonomia como meio de prova especificamente previsto no citado art. 147.º, como lhe dá um cariz de instrumento para avaliar a credibilidade de determinado depoimento, inserindo-se assim numa estrutura de verificação do discurso produzido pela testemunha. Nesta perspectiva, tal reconhecimento feito em audiência, deve ser avaliado segundo as regras próprias do art. 127.º, do CPP, não carecendo para ser válido, de ser precedido do reconhecimento propriamente dito realizado na fase de investigação, seja em sede de inquérito, seja em sede de instrução.
IV - No caso, não se verifica uma relação causal necessária da eficácia do depoimento das testemunhas, após o visionamento das imagens de videovigilância com o próprio visionamento, uma vez que as imagens visionadas não foram indicadas probatoriamente como reconhecimento, sendo somente nesta hipótese que seria de aplicar o disposto no n.º 5, do art. 147.º, do CPP, pelo que a identificação das arguidas efectuada em audiência de julgamento pelas diversas testemunhas (vítimas e elementos da PSP) não configura um estrito acto de reconhecimento, mas sim um meio de prova que deve ser encarado como integrante do respectivo depoimento testemunhal, o qual foi submetido ao princípio do contraditório (art. 327.º, n.º 2, do CPP), tratando-se assim de uma prova não proibida, a valorar nos termos do art. 355.º, do CPP.
V - A agravação dos crimes de furto prevista na al. d), do n.º 1, do art. 204.º, do CP, cometidos pelas arguidas identifica-se com a especial debilidade das vítimas, com a situação das pessoas particularmente indefesas, prevista na al. c), do nº 2, do art. 132.º, do CP, sendo que esta especial debilidade se prende aqui com o facto de os actos terem sido praticados contra pessoas indefesas em razão da sua idade.
VI - A agravação dos crimes de furto prevista na al. h), do n.º 1, do art. 204.º, do CP, cometidos pelas arguidas encontra-se preenchida face à matéria de facto dada como provada da qual resulta que estas, entre os meses de Outubro de 2019 e de Março de 2021, em períodos de dias úteis entre as 09H00 e as 17H00, apropriaram-se de quantias de dinheiro em espécie, que ascenderam pelo menos a € 6.215,00, que lhe permitiram uma liquidez imediata e permanente com facilidade no acesso directo à compra de bens para fazer face a despesas diárias, tendo tal prática passado a constituir um seu modo de vida, que poderia ser conciliado com uma outra ocupação.
VII - A agravação dos crimes de furto prevista na al. g), do n.º 2, do art. 204.º, do CP (bando) cometidos pelas arguidas encontra-se preenchida já que ficou provado que estas dedicaram-se com regularidade a retirar dinheiro às vitimas, maioritariamente do sexo feminino, entre os 70 e os 91 anos de idade, que entretanto tinham previamente vigiado, escolhendo datas definidas para o efeito (coincidentes em algumas situações com o recebimento das suas reformas), aguardando em locais estratégicos que estas procedessem ao levantamento em numerário das respectivas quantias (entre os €300,00 e os €450,000) seguindo-as de seguida, e quando estas estavam distraídas e/ou preocupadas com alguma actividade, uma delas abordava a vitima (colocando-se propositadamente na sua frente ou rodeando-a), enquanto a outra lhe retirava do interior da mala a carteira, verificando-se uma concreta associação de vontades de ambas, que preenche os elementos de um bando, já que comparticiparam em todos os furtos qualificados pelos quais vieram a ser condenadas, actuaram sempre em conjugação de esforços e de intentos, e em obediência a um plano querido e que traçaram anteriormente.
VIII – Os crimes de furto praticados pelas arguidas demandam elevadas necessidades de prevenção geral, dada a frequência deste tipo de criminalidade (sobretudo nos centros urbanos onde muita da população envelhecida vive sozinha e cresce a cada ano), que gera forte alarme (devidos aos consequentes sentimentos de insegurança), sendo abundantes as noticias da sua prática, não apenas na rua como também em estabelecimentos comerciais, e que atingem pessoas idosas que face à sua vulnerabilidade acabam por ser um alvo fácil para os carteiristas, justificando-se nestes casos uma adequada resposta punitiva.
IX – As necessidades de prevenção especial também são elevadas, já que as arguidas agiram sempre com dolo directo e intenso, demonstraram uma acentuada insensibilidade e desrespeito para com a idade e a vulnerabilidade das vitimas, não revelaram qualquer tipo de arrependimento e de consciência critica perante este seu comportamento, que se prolongou entre os meses de Outubro de 2019 a Março de 2021, e do qual fizeram um modo de vida, apropriando-se de montantes em numerário que utilizaram para a compra de bens.
X – Face à moldura penal dos ilícitos cometidos [crimes de furto qualificado previstos nos arts. 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, als. d) e h), e n.º 2, al. g), ambos do CP e punidos com pena de prisão de 2 a 8 anos, e crimes de furto qualificado, previstos nos arts. 203.º, n.º 1, e 204.º, n.º 1, als. d) e h), e n.º 2, al. g), ambos do CP, mas em que houve restituição (arts. 206.º, n.º 2, e 73.º, do CP), punidos com pena de prisão de 1 mês até 5 anos e 4 meses], entendem-se correctas as medidas das penas parcelares aplicadas (a pena de 3 anos de prisão, por cada um dos crimes de furto qualificado e a pena de 1 ano e 3 meses de prisão por cada um dos crimes em que houve restituição para uma das arguidas, e a pena de 2 anos e 9 meses de prisão por cada um dos crimes de furto qualificado e a pena de 1 ano de prisão, por cada um dos crimes em que houve restituição para a outra arguida), não sendo comunitariamente suportável aplicar penas inferiores àquelas que foram impostas pela 1.ª instância.
XI – A censurabilidade ético-jurídica global é elevada, já que as arguidas não assumiram a responsabilização pelos factos cometidos, agiram sempre com dolo directo e persistente, indiferentes à situação em que colocaram as vítimas, o que demanda a aplicação de uma pena única que respeite os limites traçados pela prevenção geral de integração e pela culpa, e que seja suficiente e adequada a adverti-las séria e fortemente, instando-as a reflectir sobre o seu comportamento futuro, permitindo-lhes ao mesmo tempo a sua reintegração na comunidade, podendo afirmar-se que caso não tivessem sido detidas certamente continuariam a praticar crimes, dada a ausência de quaisquer hábitos de trabalho, sublinhando-se também que as suas condenações anteriores não foram suficientes para as afastarem da prática de novos crimes.
XII - A moldura penal abstracta dos crimes em concurso, decorrente dos arts. 41.º, n.º 2, e 77.º, n.º 2, ambos do CP, situa-se entre os 3 anos (limite mínimo) e 25 anos (limite máximo) para uma das arguidas que foi condenada na pena única de 6 anos de prisão, e situa-se entre os 2 anos e 9 meses (limite mínimo) e os 25 anos, (limite máximo) para a outra arguida que foi condenada na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão. Entende-se que estas penas se afiguram justas e proporcionais à natureza dos ilícitos cometidos, à intensidade do dolo, às elevadas necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir, e à defesa do ordenamento jurídico.
XIII - Os pressupostos da suspensão da execução da pena vêm enunciados no art. 50.º, n.º 1, do CP, sendo que o pressuposto formal da sua aplicação determina que a medida concreta da pena aplicada não possa ser superior a 5 anos, e o pressuposto material determina que o Tribunal conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão possam realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. Atendendo a que as arguidas foram condenadas em penas únicas de prisão superiores a 5 anos não se mostra verificado o respectivo pressuposto formal, ficando assim prejudicada a necessidade de apuramento de existência do pressuposto material desta pena de substituição não detentiva da liberdade.
Decisão Texto Integral:


Proc. nº 335/20.6S7LSB.L1-A.S1
5ª Secção Criminal
Supremo Tribunal Justiça

Recurso Penal de Acórdão da 1ª Instância
(crimes de furto qualificado; qualificação jurídica; meios de prova proibidos; violação do princípio in dúbio pro reo; medida das penas parcelares; medida da pena única)

Acordam, em conferência, na 5ª Secção Criminal, do Supremo Tribunal de Justiça:

I - RELATÓRIO

1. As arguidas AA e BB foram submetidas a julgamento, conjuntamente com o arguido CC[1], no Proc. Comum Colectivo nº 335/20.6S7LSB, do Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz 17, da Comarca de Lisboa, e por acórdão proferido em 17/12/2021:
A arguida AA foi condenada pela prática em concurso real, e na forma consumada, de:
- 8 (oito) crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, por cada um dos crimes (NUIPC 547/19…, vítima DD, NUIPC 415/20, vítima EE, NUIPC 1534/20…, vítima FF, NUIPC 740/20...., vítima GG, NUIPC 1778/20...., vítima HH, NUIPC 884/20...., vítima II, NUIPC 14/21...., vítima JJ, e NUIPC 16/21...., vítima KK);
- 3 (três) crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, mas em que houve restituição (arts. 206º, nº 2, e 73º do Cod. Penal), na pena de 1 (um) ano e 3 (três meses) de prisão, por cada um dos crimes (NUIPC 1021/19…, vítima LL, NUIPC 282/2…, vítima MM e NUIPC 32/21...., vítima NN);
- Operando o respectivo cúmulo jurídico foi condenada na pena única de 6 (seis) anos de prisão (arts. 30º e 77º do Cod. Penal).
A arguida BB foi condenada pela prática em concurso real, e na forma consumada de:
- 8 (oito) crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, na pena de 2 (dois) anos e 9 (nove) meses de prisão, por cada um dos crimes (NUIPC 547/19…, vítima DD, NUIPC 415/20, vítima EE, NUIPC 1534/20…, vítima FF, NUIPC 740/20…, vítima GG, NUIPC 1778/20...., vítima HH, NUIPC 884/20...., vítima II, NUIPC 14/21...., vítima JJ, e NUIPC 16/21...., vítima KK);
- 3 (três) crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, mas em que houve restituição (arts. 206º, nº 2, e 73º do Cod. Penal), na pena de 1 (um) ano de prisão por cada um dos crimes (NUIPC 1021/19…, vítima LL, NUIPC 282/2…, vítima MM e NUIPC 32/21...., vítima NN);
- Operando o respectivo cúmulo jurídico foi condenada na pena única de 6 (seis) anos de prisão, nos termos dos art. 30º e 77º do Cod. Penal.

2. A arguida AA interpôs recurso para este Supremo Tribunal, no qual questiona a qualificação jurídica dos factos por si cometidos, a medida das penas parcelares aplicadas, e da pena única, concluindo nos seguintes termos (transcrição):
1. No acórdão recorrido não consta qualquer facto provado, que permita concluir que a Recorrente praticou os crimes de que vem acusada, com a qualificação prevista no art.º 204.º, n.º 1, al. d), do CP, pelo que, o Tribunal a quo, ao subsumir a conduta da Recorrente a esta norma legal, violou-a, por erro de interpretação.
2. Assim, deve a Recorrente, quanto a esta qualificativa, ser absolvida.
3. O “modo de vida” é a atividade com que o agente se sustenta, não sendo, porém, necessário que se trate de uma ocupação exclusiva ou contínua, no entanto, tem de contribuir de forma significativa para o sustento do agente.
4. A Recorrente aufere rendimentos lícitos, sendo a subsistência do seu agregado assegurada pelas atividades laborais, sua e de seu filho, num registo equilibrado.
5. Os proventos líquidos da atividade criminosa provada nos autos, resulta num valor médio mensal que não pode ser contabilizado como sendo significativo para o sustento da Recorrente.
6. Perante os factos provados, não é possível subsumir a conduta da Recorrente à previsão da al. h), do art.º 204.º, n.º 1, do CP, pelo que, o Tribunal a quo, ao subsumir a conduta da Recorrente a esta norma legal, violou-a, por erro de interpretação.
7. Assim, deve a Recorrente, quanto a esta qualificativa, ser absolvida.
8. Em obediência ao disposto no art.º 71.º, nos. 1 e 2, do CP, impõem-se uma redução das penas parcelares aplicadas, para um quantum próximo dos seus mínimos, porquanto, a Recorrente beneficia de atenuantes da sua conduta, que não foram ponderas na determinação da medida da pena.
9. A determinação da pena única, nunca deverá exceder os 5 anos de prisão, por este quantum se mostrar suficiente para assegurar as exigências de prevenção geral e especial.
10. O Tribunal a quo ao decidir como decidiu, quer na fixação das penas parcelares, quer na determinação da pena única, violou, por erro de interpretação, o disposto no art.º 71.º, do CP.
11. Sendo justa, proporcional e suficiente para assegurar as exigências de prevenção geral e especial, a fixação de uma pena que não exceda os cinco anos de prisão, deve a mesma ser suspensa na sua execução.
2. Tendo em conta toda a factualidade e circunstâncias que avultam dos autos e porque se evidencia a possibilidade séria de fazer um juízo de prognose favorável relativamente à inserção da Recorrente na sociedade, é de suspender a execução da pena de prisão em que venha a ser condenada, em obediência ao disposto no art.º 50.º, do CP.
NESTES TERMOS
e nos mais e melhores de direito, que V. Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado integralmente procedente, com todas as legais consequências.
Assim se fazendo a habitual JUSTIÇA!”


3. A arguida BB também interpôs recurso para este Supremo Tribunal concluindo nos seguintes termos (transcrição)[2]:

“1. Ora, certo é que o princípio in dúbio pro reo, quando constitucionalmente consagrado, não prevê apenas o sentido da dúvida da prova que está escrito, mas sim qualquer dúvida que em benefício do arguido possa surgir, qualquer facto cuja certeza não seja justificada, qualquer pormenor mal explicado.

2. Entendemos que, numa primeira análise, os indicados meios de prova, quer de per si quer coligidos entre si não permitem com segurança para além de toda a dúvida formar a convicção positiva de culpabilidade do recorrente.

3. Primeiramente importará referir que o douto tribunal à quo procurou primeiro ajuizar da culpabilidade da Recorrente e depois ajustar a prova a essa culpabilidade, em violação dos mais elementares direitos constitucionais do arguido, mormente o n.º 1 do art.º 32º da CRP e o princípio do in dúbio pro reo.

4. Antes de mais interessa escalpelizar a motivação do douto tribunal à quo para percebermos como chegou o aquele tribunal à convicção da culpabilidade da Recorrente.

5. Entendemos que da prova que validamente se pode valorar, apenas no NUIPC 1021/19.... se demonstrou para além de qualquer dúvida a culpabilidade da Recorrente. No mais entendemos que

assim não seja.

6. Se analisarmos toda a motivação, não há uma testemunha que em inquérito ou julgamento tenha reconhecido e/ou identificado qualquer uma das arguidas (com excepção do NUIPC 1021/19…).

7. Segundo a própria motivação também, não há uma testemunha que tenha visto a Recorrente a praticar qualquer crime. Aqui realçamos as testemunhas agentes da PSP que (sempre segundo a motivação):

a. 1. OO, chefe de PSP, que essencialmente visionou imagens de CCTV

b. 2. PP, comissário da PSP, “já conhecia os arguidos de outras investigações, e no dia 08.03.2021, detectou as arguidas numa viatura ... no ... de ..., presenciou a abordagem das arguidas, de forma a rodear a vítima KK, e depois do afastamento destas aproximou-se da vitima e perguntou à mesma se tinha tudo, tendo a ofendida dado por falta dos €250 que tinha acabado de levantar”, ou seja, apesar de ter visto alegadamente as arguidas junto da ofendida não visualizou qualquer subtracção, como se afere da motivação e das próprias declarações da testemunha.

c. 3. QQ, agente da PSP, que essencialmente visionou imagens de CCTV, sendo que as que respeitam ao NUIPC 16/21.... em que o mesmo refere ter visto uma subtracção, inexistem imagens que o possam confirmar.

d. 4. RR, agente da PSP, no dia 08.03.2021, fez o seguimento da viatura entre o ... e o ... e interceptou as arguidas, tendo a arguida BB entregue os €250 que se encontravam no porta luvas do ..., que foi apreendido.

e. 5. SS, agente da PSP, que essencialmente visionou imagens de CCTV sem ter visualizado qualquer subtracção e participou no seguimento entre o ... e a ..., concretamente até ao centro comercial ....

f. 6. TT, agente da PSP, não teve intervenção em qualquer diligência.

g. 7. UU, agente da PSP, no ... de ..., não tendo reconhecido a Recorrente.

8. Das declarações da ofendida KK (NUIPC 16/21…) não resulta que a mesma tenha referido quem lhe subtraiu o dinheiro e não havendo neste momento imagens que possam ser apreciadas.

9. Aquilo que se retira da motivação é que a Recorrente sempre foi identificada através das imagens de CCTV.

10. Nos termos do n.º 5 do art.º 147º do Cód. Processo Penal “o reconhecimento por fotografia, filme ou gravação realizado no âmbito da investigação criminal só pode valer como meio de prova quando for seguido de reconhecimento efectuado nos termos do n.º 2”.

11. A lei veda assim a validade do reconhecimento por fotografia ou mesmo por filme.

12. Ora, se de uma vítima que pode ter estado largos minutos, horas ou mesmo dias na presença do seu agressor, com tempo para reter todas as suas camerísticas físicas e fisionómicas, podendo até ser familiar ou com conhecimento pessoal de largos anos, não tem validade o reconhecimento por fotografia ou por vídeo se não for seguido de um reconhecimento pessoal, pode esse reconhecimento valer para o OPC ou para um Sr. Juíz? Não nos parece que esse seja o espírito da lei.

13. Então se a quem presenciou os factos está vedado o reconhecimento por fotografia e vídeo a quem não os presenciou não está vedado esse reconhecimento?

14. Aquilo que resulta da douta motivação é o facto de as testemunhas agentes da PSP amiúde terem reconhecido a Recorrente através das imagens (em violação do disposto no n.º 5 do art.º 147º do Cód. Processo Penal).

15. Igualmente os Sr. Juízes que compuseram o colectivo que procedeu ao julgamento descreveram por diversas vezes na motivação, referentemente a quase todos os NUIPC´s, expressões como “auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. (…), onde são visíveis e identificáveis as arguidas” fazendo assim também o douto colectivo a reconhecimento da Recorrente através das imagens (em violação do disposto no n.º 5 do art.º 147º do Cód. Processo Penal).

16. A proibição da utilização de um meio de prova ou a valoração em violação de um preceito legal trata-se uma questão de direito, questão essa de direito que se pretende aqui apreciada e que pode influir na factualidade dada como assente.

17. Temos assim que a culpabilidade do recorrente não resulta da prova testemunhal, nem da prova documental, nem tão-pouco da análise conjugada de ambas.

18. Pelo que se impunha a sua absolvição.

19. Ora, pelo exposto, apenas podemos concluir que foram dados como provados factos que o não deveriam ter sido, havendo factos sobre os quais houve total ausência de prova.

20. Sendo que o circunstancialismo da matéria de facto que ora se pretende ver alterada sempre influi directamente na condenação do recorrente, impondo-se assim a sua absolvição.

21. Termos em que deveria ser alterada a factualidade dada como provada nos pontos dos factos dados como assentes de onde se afere a culpabilidade da Recorrente, devendo daquela factualidade serem retirados os factos de onde se afere ter o Recorrente praticado aquela factualidade, assim se impondo a sua Absolvição.

22. Impõe-se assim que este Colendo Tribunal aprecie os factos expurgada que seja aquela prova proibida e, em consequência, absolva a Recorrente, ou que reenvie os autos para novo julgamento com a menção de que tal prova proibida deva ser expurgada.

23. Ainda que assim se não entenda, deverão ser apreciadas as qualificativas dos crimes de furto.

24. Quanto à questão da especial vulnerabilidade das vítimas, o douto tribunal à quo apenas identifica para a situação de especial debilidade da vítima a questão de:

a. Terem todas mais de setenta anos

b. Apresentarem alguma lentidão de movimentos

25. Sendo certo de que da idade avançada não resulta necessariamente uma especial vulnerabilidade, não resultando também essa vulnerabilidade necessariamente de “apresentarem alguma lentidão de movimentos”.

26. Não se encontrando assim preenchida aquela qualificativa da al. d) do n.º 1 do art.º 204 do CP.

27. No que respeita à aquela qualificativa da al. h) do n.º 1 do art.º 204 do CP sempre diremos que se a recorrente vivesse destas actividades “muita fome passaria”, pois se atentarmos ao valor de todos os furtos para um período de cerca de 18 meses seriam os mesmos insuficientes para a mesma se sustentar.

28. Apesar de estarmos a falar de diversos furtos (para os quais a arguida pugna pela sua absolvição), certo é que não se trata de diversos furtos num curto espaço de tempo ou de diversos furtos num mês, antes de diluindo ao longo do tempo.

29. Entendemos assim que igualmente não se encontra preenchida a qualificativa da al. d) do n.º 1 do art.º 204 do CP.

30. No que respeita à qualificativa da al. g) do n.º 2 do art.º 204º do CP, aqui duas questões existem que em nosso modesto entender fazer “cais” a agravante da actuação em bando.

31. Em primeiro lugar, estamos a falar de duas irmãs, pelo que o facto de haver uma relação de proximidade entre as mesmas resulta das mais elementares regras naturais.

32. Não são pessoas que apenas se juntam com vista à prática de crimes, antes sendo pessoas que diariamente fazem vidas muito próximas e que antes de detida todos os dias estavam juntas várias vezes por dia.

33. Não são assim pessoas que apenas se juntam com vista à prática de crimes ou que as suas relações estejam maioritariamente ligadas à prática de crimes.

34. Tanto deveria bastar para o afastamento de tal agravante no crime de furto.

35. Mas, ainda que assim se não entenda, preceitua a al. g) do n.º 2 do art.º 147º do CP que “Como membro de bando destinado à prática reiterada de crimes contra o património, com a colaboração de pelo menos outro membro do bando”

36. Salienta-se aqui o texto da norma: com a colaboração de pelo menos outro membro do bando

37. Daqui parece resultar que, apesar de bastarem dois elementos do bando para a prática do crime de furto (sendo isso pacifico na jurisprudência), se atentarmos à letra da lei parece que o espírito do legislador impõe que para a existência de bando tenha de haver mais de 2 membros desse bando (ainda que depois bastem dois membros para a qualificação).

38. De facto, a letra da lei refere “de pelo menos outro membro do bando”, sendo que se para a qualificativa de bando bastasse que o bando tivesse apenas 2 (ou mais) membros sempre a letra da lei deveria referir ““de outro membro do bando”.

39. Entendemos assim que para a qualificação bastarão 2 membros do bando, mas para a existência de bando serão necessários pelo menos 3 membros (mais do que dois), apenas assim se justificando a expressão da al. g) do n.º 2 do art.º 204º do CP “de pelo menos outro membro do bando”, sendo aliás isso que distingue desde logo da co-autoria.

40. Entendemos assim não se encontrar preenchida a agravante da al. g) do n.º 2 do art.º 204º do CP

41. Desde logo e em caso de desqualificação dos crimes deverá para a Recorrente também operar as desistências de queixa nos NUIPC`s 1021/19.... (lesado LL) e nuipc 282/20.... (lesada MM)

42. Ainda que assim se não entenda, deverão ser apreciadas as medidas das penas parcelares bem como a medida da pena única em cúmulo jurídico.

43. Devemos atender à idade da recorrente, à sua condição social, económica e cultural, à sua modesta formação e fracos recursos económicos bem como devemos atender a que a medida da pena deve ser atribuída em função da culpa do agente, sob pena de se violar o disposto no 1 e 2 do art.º 40º e n.º 1 do art.º 71º, ambos do Cód. Penal, pelo que deve a pena de prisão a aplicar à recorrente ser mais próxima dos seus limites mínimos.

44. A medida da pena não deverá em caso algum ser superior à culpa do agente, atendendo às necessidades de prevenção geral e especial, sempre atendendo a um juízo de equidade.

45. Nos termos do disposto no art. 71º nº 2 do Código Penal, para a medida concreta da pena concorre por um lado a culpa e grau de ilicitude e por outro lado o escopo da ressocialização do agente.

46. Em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa, dependendo ainda da personalidade do arguido.

47. Por todas estas razões, estamos em crer que deverão ser inferiores as penas parcelares bem com o inferior a pena única imposta à recorrente, não devendo a mesma ultrapassar o limite mínimo legal.

48. Pelo que se demonstram excessivamente elevadas as penas aplicadas à recorrente.

49. Por todas estas razões, estamos em crer que deverá ser inferior a pena a ser imposta à recorrente, não devendo a mesma ultrapassar o limite mínimo legal.

50. Em concreto entendemos que em caso de condenação nunca deveriam as penas parcelares a serem aplicadas à Recorrente superiores ao mínimo legal, devendo igualmente ser menos a pena única em cúmulo jurídico, devendo ainda a pena única ser sempre suspensa na sua execução.

51. Violados se revelam, em consequência, salvo melhor opinião, os preceitos legais invocados nas presentes alegações de recurso. Nestes termos e nos mais de direito, deve ser julgado procedente o presente recurso, assim se fazendo...

...JUSTIÇA!!!”

5. Os recursos foram admitidos, com subida imediata, nos autos, e com efeito suspensivo (arts. 399º, 401º, nº 1, al. b), 406º, nº 1, 407º, nº 2, al. a), 408º, nº 1, al. a), 411º, 413º, e 414º todos do Cod. Proc. Penal) - cfr. despacho judicial de 19/01/2022.

6. O Ministério Público em 1ª Instância respondeu ao recurso apresentado pela arguida AA e fez constar que esta participou em diversos actos sem que tenha assumido outro projecto de vida, não tinha actividade profissional remunerada, actuou entre as 9H00 e as 17H00 dos dias úteis, era da actividade criminosa que obtinha proventos para o seu sustento traduzido em dinheiro que lhe permitia uma liquidez imediata e permanente com facilidade no acesso directo à compra de bens, estando preenchido o requisito da al. h), do nº 1, do artº 204.º do Cod. Penal, que as vítimas tinham mais de setenta anos, apresentavam debilidades inerentes à terceira idade e lentidão de movimentos, está preenchido o requisito da al. d), do nº 1, do artº 204º do Cod. Penal, e que face ao elevado grau de ilicitude da sua conduta, ao dolo que é directo, aos antecedentes criminais, à ausência de actividade profissional regular, à não demonstração de assunção pela gravidade do seu comportamento, e às muito intensas razões de prevenção geral, considera correcta a medida das penas parcelares aplicadas e a medida da pena única, face à moldura penal aplicada, à sua conduta global, à desinserção profissional, e ao desconhecimento de um projecto de vida.

7. O Ministério Público em 1ª Instância também respondeu ao recurso apresentado pela arguida BB e fez constar que a prova produzida em sede de julgamento e que levou à sua condenação pela prática dos onze crimes de furto qualificado comprova que esta actuava conjuntamente com a sua irmã, de forma reiterada, organizando-se pela zona metropolitana de Lisboa, escolhendo as vítimas e preparando as deslocações até às agencias bancárias ou dos CTT, utilizava os valores obtidos para meio de subsistência, verifica-se aqui a agravante do “bando” e não a mera co-autoria (nº 2, al. g), do artº 204º do Cod. Penal) e atendendo ao elevado grau de ilicitude da sua conduta, ao dolo directo, aos seus antecedentes criminais, à ausência de uma actividade profissional regular, à não demonstração de assunção pela gravidade do seu comportamento, às muito intensas razões de prevenção geral muito intensas, considera correcta a medida das penas parcelares aplicadas e a medida da pena única, face à moldura penal aplicada, à sua conduta global, e à sua desinserção profissional.

8. A 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa declarou-se incompetente para a apreciação dos recursos apresentados pelas arguidas AA e BB e determinou a extracção das peças processuais pertinentes para o conhecimento dos recursos neste Supremo Tribunal – cfr. despacho de 19/03/2022.

9. O Sr. Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça emitiu parecer, nos termos do art. 416º, nº 1, do Cod. Proc. Penal, questionou a eventual competência deste Supremo Tribunal para o conhecimento dos recursos, na medida em que as arguidas invocam certos vícios para impugnarem a matéria de facto considerada provada, pronunciou-se no sentido da improcedência dos recursos, acompanhando a resposta apresentada pelo Ministério Público em 1ª Instância, e fez constar que a decisão impugnada fixou as penas de forma muitíssimo moderada, adicionando à parcelar mais baixa, cerca de um sétimo da diferença entre esta e o limite de 25 anos, que não é a soma aritmética de todas as penas parcelares, e concluindo que o acórdão recorrido qualificou e puniu de forma adequada e criteriosa a matéria fáctica fixada, sem incorrer em qualquer vício.

10. As arguidas AA e BB foram notificadas nos termos do art. 417º, nº 2, do Cod. Proc. Penal, e nada disseram.

11. Colhidos os vistos, e atendendo a que não foi requerida a realização de audiência, o processo foi presente à conferência para a emissão de decisão.

II - FUNDAMENTAÇÃO

A -Dos Factos

Com interesse para a decisão da causa, foi dada como provada a seguinte factualidade[3]:
“A) FACTOS PROVADOS
1. Desde, pelo menos, o mês de Outubro de 2019, as arguidas AA, BB e CC delinearam e executaram um plano, previamente elaborado, o qual consistia unicamente na subtracção de carteiras e quantias monetárias de habitantes da zona da ..., que depois utilizavam em proveito próprio, sem o conhecimento nem autorização dos seus legítimos proprietários.
2. As arguidas AA e BB actuaram sempre em par, como membros de um grupo destinado à prática de um número indeterminado crimes contra o património, com funções previamente definidas (normalmente uma delas distraía a vítima, caso fosse necessário, e a outra retirava-lhes os bens), ou foram acompanhadas pelo arguido CC, o qual assumiu a posição de vigia, e elegeram sempre cuidadosamente as possíveis e futuras vítimas, maioritariamente do sexo feminino e de idade avançada, aproveitando o momento em que as mesmas se encontravam distraídas e/ou preocupadas com a sua actividade (em que se encontravam num estabelecimento comercial a efectuar uma compra, ou numa agência bancária a realizar uma qualquer operação bancária) para concretizar os furtos.
3. Na execução do plano delineado, em várias ocasiões, as arguidas AA e BB escolheram as vítimas de forma particularmente cuidadosa, depois de as vigiarem durante um determinado período de tempo, escolhendo datas previamente definidas, normalmente coincidentes com o recebimento das reformas pelas vítimas, e aguardando que as mesmas procedessem ao levantamento em numerário das quantias correspondentes, as quais serviriam para as despesas de todo o mês das ofendidas.
Concretamente:
(NUIPC 547/19…):
4.No dia 29.10.2019, pelas 10h14m, quando o ofendido DD se encontrava na agência bancária da Caixa Geral de Depósitos, SA, sita na Estrada ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, local onde acabara de realizar um levantamento da conta bancária da sua entidade patronal, no valor de € 300,00 (trezentos euros), e se preparava para sair da mesma, a arguida BB colocou-se à sua frente, impedindo a sua passagem e a arguida AA aproximou-se do ofendido e retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, do interior da sua mala, a referida quantia de € 300,00 (trezentos euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 1021/19…)
5. No dia 17.12.2019, pelas 16h40m, quando o ofendido LL, nascido em .../.../1948 (com 71 anos de idade) se encontrava no estabelecimento comercial ..., sito no Centro Comercial ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, o arguido CC rodeou-o e colocou-se de vigia, a arguida BB colocou-se à sua frente, impedindo a sua passagem e a arguida AA aproximou-se do ofendido e retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, do interior da bolsa que o mesmo transportava, a sua carteira, a qual continha no seu interior uma caderneta bancária emitida em seu nome pela Caixa Geral de Depósitos, SA, bem como a quantia de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
6. Posteriormente, foi restituido ao ofendido LL o valor de €350.
(NUIPC 415/20…):
7. No dia 14.05.2020, no período da manhã, depois de terem observado a ofendida EE, nascida em .../.../1935 (com 84 anos de idade), quando a mesma se encontrava na agência bancária do Banco CTT, SA, sita na Rua ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, a efectuar um levantamento de € 300,00 (trezentos euros), e quando a mesma se encontrava no estabelecimento comercial ..., sito na Rua ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, as arguidas BB e AA rodearam-na e esta última retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, do interior da bolsa que a mesma transportava, o envelope contendo a quantia € 300,00 (trezentos euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 282/20…):
8. No dia 09.10.2020, no período da manhã, depois de terem observado a ofendida MM, nascida em .../.../1941 (à data com 79 anos de idade), quando a mesma se encontrava na agência bancária do Banco CTT, SA, sita na Praça ..., na ..., a efectuar o levantamento da sua reforma, no valor de € 400,00 (quatrocentos euros), e quando a mesma se encontrava no estabelecimento comercial D..., nessa mesma artéria, a arguida BB deu-lhe um encontrão, como forma de a distrair, e a arguida AA retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, o envelope contendo a referida quantia de € 400,00 (quatrocentos euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
9. Posteriormente, foi restituido à ofendida MM o valor de €400.
(NUIPC 1534/20…):
10. No dia 14.10.2020, no período da manhã, depois de terem observado a ofendida FF, nascida em .../.../1943 (com 77 anos de idade) quando a mesma se encontrava na agência bancária do Banco CTT, SA, sita na Rua ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, a efectuar o levantamento da reforma da sua mãe, no valor de € 450,00 (quatrocentos e cinquenta euros), e quando a mesma se encontrava no estabelecimento comercial B..., sito na Estrada ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, as arguidas BB e AA rodearam a ofendida e esta última retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, o envelope contendo a referida quantia de € 450,00 (quatrocentos e cinquenta euros) em numerário bem como o seu cartão de cidadão, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 740/20…):
11. No dia 13.11.2020, no período da manhã, depois de terem observado a ofendida GG, nascida em .../.../1950 (com 70 anos de idade) quando a mesma se encontrava no ATM da agência bancária do Novo Banco, SA, em ..., a efectuar um levantamento, e quando a mesma se encontrava no estabelecimento comercial P..., naquela cidade, enquanto o arguido CC se encontrava de vigia, as arguidas BB e AA bloquearam a saída do estabelecimento e, aproveitando esse momento de distracção, esta última retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, da mala que a mesma transportava, a sua carteira, avaliada em € 5,00 (cinco euros), a qual continha no seu interior cartões das lojas e cartões bancários, bem como a quantia de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 1778/20…):
12. No dia 22.12.2020, antes da hora de almoço, após a ofendida HH, nascida em .../.../1929 (com 91 anos de idade) ter procedido ao levantamento da sua reforma, no valor de € 700,00 (setecentos euros) na agência bancária da Caixa Geral de Depósitos, SA, sita no Largo ..., nesta cidade e comarca de Lisboa, e quando a mesma se encontrava no estabelecimento comercial M..., situado no referido largo, a arguida BB colocou-se de vigia e a arguida AA, aproveitando um momento de distracção, retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, do interior da mala que a mesma transportava, a sua carteira, a qual continha no seu interior a quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 884/20…):
13. No dia 28.12.2020, pelas 10h18m, quando a ofendida II se deslocou à agência bancária do Millennium BCP, sita na ..., para efectuar um depósito bancário, e retirou a senha de atendimento, as suspeitas BB e AA bloquearam a saída da referida agência (uma vez que, por força da pandemia, os clientes retiravam a sua senha e aguardavam a sua vez no exterior da agência bancária) e, aproveitando esse momento de distracção, a suspeita AA colocou a mão no interior do bolso do casaco da ofendida e retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, um envelope contendo a quantia de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros) em numerário, que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 14/21…):
14. No dia 08.01.2021, pelas 10h30m, após a ofendida JJ, nascida em .../.../1936 (com 84 anos de idade) ter procedido ao levantamento da sua reforma, no valor de € 350,00 (trezentos e cinquenta euros) na agência bancária da Caixa Geral de Depósitos, SA, sita na Rua ..., na ..., a arguida BB impediu a sua saída do referido local e, aproveitando esse momento de distracção, a arguida AA colocou a mão no interior do bolso do casaco da ofendida e retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, um envelope contendo a referida quantia de € 360,00 (trezentos e sessenta euros) em numerário, bem como o cartão de cidadão, quantia que fizeram sua, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
(NUIPC 32/21…):
15. No dia 14.01.2021, pelas 10h15m, após a ofendida NN, nascida em .../.../1952 (com 68 anos de idade) ter procedido ao levantamento da sua reforma, no valor de € 315,94 (trezentos e quinze euros e noventa e quatro cêntimos) no balcão dos CTT localizado na Avenida ..., em ..., e quando a mesma se encontrava no interior do estabelecimento comercial ..., localizado na Rua ..., também naquela localidade, as arguidas BB e AA rodearam-na e esta última, aproveitando um momento de distracção da ofendida, abriu-lhe a mala e retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, a referida quantia de € 315,00 (trezentos e quinze euros) em numerário, bem como o seu cartão de cidadão, bens que fizeram seus, abandonando o local e ausentando-se para parte incerta.
16. Contudo, como poucos momentos depois, a ofendida reparou na falta dos seus bens, alertou o agente da PSP ..., o qual se encontrava no exercício das suas funções naquele local e que, após visionar as imagens de videovigilância, contactou a arguida AA e solicitou que a mesma regressasse ao local e devolvesse a quantia monetária à ofendida, o que a mesma fez.
(NUIPC 16/21…):
17. No dia 08.03.2021, pelas 13h15m, após a ofendida KK, nascida em .../.../1944 (com 77 anos de idade) se ter deslocado ao ATM localizado no estabelecimento comercial ..., localizado no ..., e ter procedido a dois levantamentos, no valor total de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros), e quando a mesma se encontrava no interior do referido estabelecimento, junto a um expositor, a arguida BB impediu que a mesma se movimentasse (atirando algo para o chão) e, aproveitando esse momento de distracção, a arguida AA colocou a mão no interior do bolso do casaco da ofendida e retirou-lhe, sem o seu conhecimento nem autorização, a referida quantia de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros, juntamento com o respectivo talão de levantamento), que fizeram sua, abandonando de imediato o local e apenas não se ausentando para parte incerta porquanto foram imediatamente detidas por agentes da PSP, tendo o valor de €250
sido apreendido e entregue à ofendida.
18. Com a conduta descrita, os arguidos AA, BB e CC obtiveram para si próprio um benefício patrimonial ilegítimo e causaram às vítimas acima identificadas um igual prejuízo patrimonial de, pelo menos, € 6.215,00 (seis mil, duzentos e quinze euros).
19. No âmbito do processo com o NUIPC 955/06…, que correu termos no Juiz ... do Juízo Central Criminal de Lisboa, a arguida AA foi condenada, por acórdão datado de 16.01.2013 e transitado em julgado em 20.02.2014, pela prática de factos que consubstanciam os crimes de furto e de burla informática e nas comunicações, ocorridos em 03.10.2010 e 27.07.2007, na pena única de dois anos de prisão.
20. A arguida AA cumpriu a referida pena de prisão até ao dia 30.09.2016, data em que lhe foi concedida a liberdade definitiva no âmbito do processo com o n.º 1821/14…, que correu termos no ... Juízo do Tribunal de Execução de Penas ..., correspondente à decisão referida no ponto anterior.
21. No âmbito do processo com o NUIPC 332/17…, que correu termos no Juiz ... do Juízo Local de Pequena Criminalidade ..., a arguida AA foi condenada, por sentença datada de 24.10.2017 e transitada em julgado em 09.11.2017, pela prática de factos que consubstanciam o crime de furto, ocorridos em 10.03.2017, na pena de seis meses de prisão em regime de permanência na habitação com vigilância electrónica.
22. A arguida AA cumpriu a referida pena de prisão até ao dia 11.07.2018, data em que lhe foi concedida a liberdade definitiva no âmbito do processo com o n.º 1821/14…, que correu termos no ... Juízo do Tribunal de Execução de Penas ..., correspondente à decisão referida no ponto anterior.
23. No âmbito do processo com o NUIPC 938/10…, que correu termos no Juiz ... do Juízo Central Criminal ..., as arguidas AA e BB foram condenadas, por acórdão datado de 31.10.2018 e transitado em julgado no dia 15.11.2018, pela prática de pela prática de factos que consubstanciam os crimes de furto e de burla informática e nas comunicações, ocorridos em 15.07.2010, na pena única de vinte e dois meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período
24. Com as condutas descritas, os arguidos AA, BB e CC, actuando em comunhão de esforços, meios e intenções, previram, quiseram e conseguiram fazer seus os bens acima descritos, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam, que agiam sem o conhecimento e contra a vontade dos seus legítimos proprietários, intentos que lograram alcançar.
25. As arguidas, actuando em comunhão de esforços, meios e intenções, previram, quiseram e conseguiram sempre actuar como membros do bando criminoso que formavam, dedicando-se unicamente à prática de ilícitos contra o património durante quase ano e meio, de modo a obter proventos que suprissem as suas necessidades, agindo de acordo com as funções antecipadamente definidas e escolhendo, quase sempre, como vítimas pessoas especialmente vulneráveis em razão da sua provecta idade, objectivos que conseguiram atingir.
26. Os arguidos agiram de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
27. Do certificado de registo criminal da arguida AA constam condenações (já supra referidas):
- processo 955/06…, transito em 20.04.2014, crime de burla informática e crime de furto simples, dois anos de prisão efectiva, pena já cumprida;
- processo 332/17…, transito em 09.11.2017, crime de furto, pena de seis meses de prisão efectiva, pena já cumprida;
- processo 938/10…, transito em 15.11.2018, crime de burla informática e crime de furto simples, pena de 22 meses de prisão suspensa por igual período, pena já extinta.
28. Do certificado de registo criminal da arguida BB constam as seguintes condenações (uma já supra referida):
- processo 206/15…, transito em 24.03.2017, crime de furto simples, multa de € 480, substituída por trabalho, já cumprida;
- processo 938/10…, transito em 15.11.2018, crime de burla informática e crime de furto simples, pena de 22 meses de prisão suspensa por igual período.
(…)
30. Do relatório social relativamente à arguida BB consta:
“À data dos fatos, BB residia na atual morada com o marido, a filha (de 35 anos) e os dois netos (de 7 e 11 anos), numa habitação de atribuição camarária. O casal tem ainda um filho de 36 anos, ue se autonomizou e encontra-se emigrado em ... A dinâmica relacional afigurava-se positiva e alicerçada em laços de afetividade e solidariedade, surgindo a arguida como figura parental de referência para as netas. Ainda que a arguida se encontrasse desempregada, o agregado beneficiava de uma condição financeira confortável decorrente dos rendimentos das atividades laborais do companheiro e da filha.
BB cresceu inserida num meio comunitário desfavorecido, associado a problemáticas delinquenciais. Oriunda de uma família numerosa, composta pelos progenitores e sete descendentes, residiam numa habitação de autoconstrução, com condições de habitabilidade precária, situação que apenas se alterou quando foram realojados, tendo-lhes sido atribuída uma habitação camarária. A dinâmica familiar era disfuncional, decorrente do quadro aditivo de álcool do progenitor, que adotava comportamentos violentos, sobretudo relativamente à companheira.
Após a separação dos pais, BB e os irmãos mantiveram-se aos cuidados da mãe, revelando-se falhas no modelo de supervisão parental, com registo de episódios de negligência e desproteção, bem como do recurso à mendicidade como forma de colmatar as dificuldades económicas.
Tal contexto prejudicou o seu percurso formativo, não tendo frequentado qualquer estabelecimento escolar e apresentando iliteracia, bem como determinou a sua institucionalização durante cerca de dois anos.
Ao nível da sociabilização, estabeleceu ligações privilegiadas com grupo de pares conotados com práticas pró-criminais, que terão favorecido contactos com o sistema de justiça, bem como prejudicado o seu percurso formativo e laboral. Neste sentido, apresenta um trajeto profissional inconsistente, desempenhando funções indiferenciadas e pontuais na área das limpezas e da venda ambulante.
Segundo a arguida, o facto de padecer de várias patologias clínicas, nomeadamente do foro cardíaco, vascular e psíquico (dificuldades acrescidas ao nível da gestão da ansiedade), aliado aos constrangimentos da pandemia COVID 19, condicionaram a sua inserção laboral nos últimos anos.
Após um período inicial em que esteve presa preventivamente à ordem do presente processo, em 27-mar-2021 foi aplicada a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, manifestando a arguida capacidade de adaptação a esse contexto. A arguida beneficia do apoio do marido e dos filhos, que lhe fornecem o suporte de que necessita. Contudo, do ponto de vista da relação, verificaram-se constrangimentos após a eclosão do presente processo, uma vez que a família não aceita nem consegue enquadrar o envolvimento da arguida em atos ilícitos.
BB regista contactos anteriores com o sistema de justiça, que se traduziram em várias absolvições e nas seguintes decisões condenatórias:
- uma pena de prisão de 22 meses, suspensa por igual período com regime de prova, transitada em julgado em 15-nov-20218, à ordem do processo 938/10…, do Juízo Central Criminal ... – Juiz ..., por crimes de furto e burla informática, em que a irmã, VV, é sua coarguida;
- multa, substituída por 79 horas de prestação de trabalho comunitário, à ordem do processo 206/15…, do Juízo Local Criminal ... - Juiz ..., pelo crime de furto.
O presente processo teve um impacto significativo no quotidiano da arguida, que manifesta intimidação relativamente à aplicação de medidas privativas de liberdade. Para além disso, a arguida revela sentimentos de vergonha face ao impacto que o processo teve na sua família, que desconhecia os anteriores contactos com o sistema de justiça, aparentando permeabilidade relativamente à pressão que aquela tem exercido para que altere a sua conduta de forma a evitar novos contactos com o sistema de justiça.
O processo de desenvolvimento de BB surge marcado por vários fatores destruturantes, que estiveram na base da construção da sua personalidade. Destacam-se as condições precárias ao nível habitacional e económico, a inserção em meios degradados e conotados com a prática de ilícitos, a desinserção escolar e a fraca supervisão parental, que contribuíram para que estabelecesse sociabilidade de cariz marginal, bem como para um percurso laboral inconsistente. Nos últimos anos tem-se mantido inativa devido a problemas de saúde física, mas também psíquica, evidenciando fragilidades ao nível da gestão da ansiedade.
A arguida beneficia de um enquadramento familiar estruturado, em que são patentes os laços afetivos e de interajuda, bem como uma condição económica confortável, que parece não ter sido suficiente para conter os seus impulsos desviantes. Acresce ainda uma fraca interiorização das condenações anteriores, relativamente às quais manifesta dificuldades ao nível do pensamento crítico, bem como a manutenção de sociabilidades ligadas à prática de ilícitos, nomeadamente a irmã, sua coarguida.
Face ao exposto, em caso de condenação, considera-se que a arguida beneficiaria com uma medida contentora e de supervisão intensiva, sugerindo-se que, caso a medida concreta da pena o permita, fosse equacionada a aplicação de uma pena de prisão em regime de permanência na habitação (PPH), vinculada às seguintes obrigações:
? elaboração de um projeto de inserção laboral, adequado às suas condicionantes de saúde;
? sujeição a avaliação psicológica e a eventual intervenção psicológica ao nível das fragilidades que apresenta de controlo da ansiedade;
? promoção de comportamentos consonantes com os normativos sociais vigentes;
? manter-se afastada de elementos da rede social com práticas criminais.”
31. Do relatório social elaborado em relação à arguida AA consta:
“À data dos factos, AA mantinha o atual enquadramento habitacional e familiar, residindo com o filho na morada constante nos autos. Trata-se de um apartamento próprio do filho, adquirido com recurso a empréstimo bancário, sito numa zona residencial do concelho .... A arguida mantém com o filho uma relação funcional e de apoio mútuo, beneficiando de um ambiente familiar harmonioso e afetivo. A subsistência do agregado era assegurada pelas atividades laborais de ambos, num registo equilibrado. O filho, profissionalmente ativo em funções de segurança no aeroporto ..., aufere cerca de €800,00, que eram complementados pelo vencimento da arguida, de 270,00, que exercia funções a tempo parcial na empresa “C.…, Lda”, na área das limpezas. A
arguida mantinha em simultânea a venda ambulante nos mercados de B.… e ..., o que lhe permitia obter rendimentos extra.
A arguida é proveniente de uma família numerosa, constituída pelos pais e os sete filhos, tendo-se desenvolvido num contexto socioeconómico precário. Viviam dos rendimentos do trabalho do pai, operário da construção civil, e da mãe, vendedora ambulante. A dinâmica familiar era disfuncional, decorrente do quadro aditivo de álcool do progenitor, que adotava comportamentos violentos, sobretudo relativamente à companheira.
Após a separação dos pais, AA e os irmãos mantiveram-se aos cuidados da mãe, revelando-se falhas no modelo de supervisão parental, com registo de episódios de negligência e desproteção, bem como do recurso à mendicidade como forma de colmatar as dificuldades económicas. Desde cedo a arguida começou a acompanhar a mãe na venda ambulante em detrimento da sua formação escolar, apresentando iliteracia. Entre os 14 e os 17anos viveu institucionalizada, no âmbito de um processo de proteção, não tendo a sua permanência nas instituições contribuído para a aquisição de competências escolares. Durante este período de tempo engravidou, tendo mais tarde contraído matrimónio com o pai da criança, com o qual teve mais um filho. Este relacionamento, que durou cerca de 11 anos, caraterizou-se pela disfuncionalidade, decorrente dos comportamentos violentos do
companheiro relativamente à arguida, tendo culminado na separação do casal. Sozinha com os filhos, trabalhava para assegurar a subsistência da família na venda ambulante e trabalhos pontuais de limpezas, numa situação de precariedade económica e em contextos sócio residenciais problemáticas do concelho ....
Aos 40 anos estabeleceu uma nova relação afetiva, que durou cerca de 7 anos e cuja rutura ocorreu quando o companheiro iniciou o cumprimento de uma pena de prisão, que se encontra ainda em curso.
Segundo a arguida, foi durante esta relação que surgiram os primeiros contactos com o sistema dejustiça, tendo o casal sido constituído arguido em vários processos em comum, por crimes contra a propriedade.
A arguida regista as seguintes condenações:
- uma pena de dois anos de prisão efetiva, pela prática dos crimes de furto e burla informática, à ordem do processo 955/06…;
- uma pena de prisão de 22 meses, suspensa por igual período com regime de prova, transitada em julgado em 15-nov-20218, à ordem do processo 938/10…, do Juízo Central Criminal ... – Juiz ..., por crimes de furto e burla informática, em que a irmã é coarguida;
- uma pena de prisão de seis meses, em regime de permanência na habitação, no âmbito do processo 332/17…, do Juízo Local de Pequena Criminalidade ... – Juiz ..., cuja execução decorreu entre 12 janeiro a 11 de julho do 2018.
Encontra-se ainda a decorrer o processo 48/14…, do Juízo Central Criminal de Lisboa - Juiz ..., em que está acusada, em coautoria, de crimes contra a propriedade, cuja leitura do acórdão está agendada para 26-nov-2021.
A arguida revela fraca capacidade de autocensura e de descentração, focando-se nas dificuldades vivenciadas durante a sua infância e juventude, e mais tarde enquanto vítima de violência doméstica, que, a par da relação que estabeleceu com o último companheiro, utiliza como justificações para os comportamentos ilícitos pelos quais já foi condenada.
Após um período inicial em que esteve presa preventivamente à ordem do presente processo, em 27-mar-2021 foi aplicada a medida de coação de obrigação de permanência na habitação. A arguida tem evidenciado capacidade para cumprir as regras e obrigações a que está sujeita, beneficiando do apoio afetivo e material do filho, que garante a subsistência de ambos.
Atualmente, a arguida adota um discurso de responsabilização, sentindo-se intimidada com as consequências do presente processo para a família, nomeadamente para os filhos, que não aceitam a sua conduta criminal.
Da análise da informação recolhida, aferimos que o processo de desenvolvimento da arguida pautou-se pela sua integração numa família numerosa e disfuncional, tendo sido exposta a modelos de violência intrafamiliar, bem como à precaridade económica e fraca supervisão
parental. Foi neste contexto cresceu, acentuando-se as vulnerabilidades com relação conjugal que estabeleceu no início da vida adulta e em que foi vítima de violência doméstica. Estes contextos prejudicaram o seu percurso escolar e laboral, apresentando a arguida fracas competências a esses níveis, e, consequentemente, dificuldades na obtenção de uma condição económica equilibrada.
AA apresenta fatores de risco internos, nomeadamente ao nível do pensamento crítico e consequencial, bem como da autocensura e reflexão crítica face ao seu percurso criminal, recorrendo a estratégias atribuição externa e minimização da conduta desviante, que ainda não conseguiu inverter.
Acresce ainda a manutenção de sociabilidades de cariz marginal, nomeadamente a sua irmã, sua coarguida no presente processo.
Em caso de condenação, estas fragilidades, poderão ser entendidas como necessidades a ser objeto de intervenção em termos de reinserção social.”
(…)
B) FACTOS NÃO PROVADOS
Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa”.

            B - Do Direito

O objecto do recurso e os limites cognitivos deste Supremo Tribunal são delimitados pelas conclusões que os recorrentes extraem da respectiva motivação, nas quais os mesmos sintetizam as razões de discordância com o decidido, e resumem o pedido por si formulado (art. 412º, nº 1, do Cod. Proc. Penal)[4], sem prejuízo da pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso.

Os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça restringem-se ao reexame da matéria de direito (art. 434.º do Cod. Proc. Penal), sem prejuízo do conhecimento dos vícios enunciados no art. 410º, nº 2, e nº 3, do Cod. Proc. Penal, face à redacção da Lei nº 94/2021, de 21/12[5].

Posto isto, consideramos este Supremo Tribunal competente para o conhecimento de todas as questões enunciadas nos recursos ora apresentados[6].

Enquadramento do recurso da arguida AA

A arguida AA coloca as seguintes questões, que se ordenam conforme as conclusões apresentadas, sintetizadas nos seguintes termos:
1. A qualificação jurídica dos factos que entende não integrarem a qualificativa da al. h), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal;
2. A medida das penas parcelares aplicadas;
3. A medida da pena única aplicada.

Enquadramento do recurso da arguida BB  

A arguida BB coloca as seguintes questões, que se ordenam conforme as conclusões apresentadas, sintetizadas nos seguintes termos:
1. A violação do princípio in dúbio pro reo por terem sido utilizadas imagens CCTV, que não podem servir como meio de prova, por incumprimento do nº 5, do art. 147º do Cod. Proc. Penal;
2. A qualificação jurídica dos factos que entende não integrarem as qualificativas das als. d), e h), do nº 1, e da al. g), do nº 2, do art. 204º do Cod. Penal;
3. A medida das penas parcelares aplicadas;
4. A medida da pena única aplicada.

Conforme se constata através da análise das conclusões dos recursos apresentados, a arguida AA considera que a sua conduta não integra a qualificativa agravante da al. h), do nº 1, do art. 204º do Código Penal (fazendo da prática dos furtos modo de vida), e a arguida BB considera que a sua conduta também não integra esta qualificativa agravante, nem as qualificativas agravantes da al. d), do nº 1, (a exploração da situação de especial debilidade da vítima), e da al. g), do nº 2 (actuando como membro de um bando) do art. 204º do Cod. Penal, pondo previamente em causa a valoração como meio de prova das imagens de CCTV, que entende não poderiam ter sido utilizadas por não ter sido dado cumprimento ao nº 5, do art. 147º do Cod. Proc. Penal.

As arguidas AA e BB questionam igualmente a medida das penas parcelares que lhes foram aplicadas, bem como a medida da pena única, pugnando pela sua diminuição e pela aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução.

Uma vez que as arguidas AA e BB foram condenadas pela prática de todos os furtos qualificados em co-autoria entende-se que se deve previamente analisar da validade dos meios de prova utilizados, de seguida examinar se o acórdão recorrido procedeu a uma correcta qualificação jurídica dos factos, e por fim ajuizar da justeza ou não da medida das penas parcelares aplicadas e da medida da pena única, uma vez que a procedência de alguma daquelas pretensões poderá ter efeito na apreciação das demais questões suscitadas.

Colocada esta introdução, apreciemos:

1. Da violação do princípio in dúbio pro reo e da utilização de meios de prova não permitidos para sustentar a condenação.

A arguida BB pugna pela sua absolvição, por força do princípio in dubio pro reo, que entende dever ser aplicado por ter sido incriminada com base em elementos de prova que não deveriam ter sido admitidos, nem valorados.

Parte-se do princípio de que a arguida BB não pretendeu proceder a uma impugnação da decisão sobre a matéria de facto, suscitando a sua revisão alargada, uma vez que não deu cumprimento ao disposto no art. 412°, nº 3, al. b), e, nº 4, do Cod. Proc. Penal, onde se prevê e exige a especificação das concretas provas que impunham decisão diversa, com transcrição, quanto à prova oral, das passagens/excertos das declarações ou depoimentos, em que se funda a impugnação.

Desta forma, a sua alusão ao princípio do in dubio pro reo, enquanto princípio do direito probatório, não poderá traduzir-se nem se poderá consubstanciar num factor a seu favor quanto à apreciação dessas mesmas provas.

Com efeito, a dúvida que não pode ser resolvida contra a arguida BB não é aquela que ela tem ou que ela entende que o acórdão recorrido, não tendo, deveria ter tido. É, isso sim, aquela dúvida que se coloca ao Tribunal no processo de formação da sua convicção.

Ora, o fundamento de recurso para este Supremo Tribunal, por violação do princípio in dubio pro reo, ocorre quando resulta do texto da decisão recorrida que o Tribunal decidiu contra o arguido, perante uma situação de dúvida, ou “quando a conclusão probatória levada pelo Tribunal recorrido se materializa numa decisão contra o arguido, insuficientemente suportada (de modo a não deixar dúvidas irremovíveis quanto ao seu sentido) pelos elementos probatórios em que (explicita e pontualmente) assentou a convicção” – cfr. o Ac. STJ de 04/06/2020[7].

Entende-se que nenhuma destas situações resulta do texto da decisão recorrida, sendo manifesto que o acórdão recorrido não se quedou numa situação de dúvida inultrapassável, muito pelo contrário.

Com efeito, e de acordo com a análise que iremos fazer[8] considera-se que a fundamentação da decisão recorrida, em matéria de facto, não violou o princípio da legalidade das provas, e da sua livre apreciação, tendo-se estribado em provas legalmente válidas, tendo-as valorado de forma racional, lógica, e objectiva, não podendo concluir-se que a prova produzida tenha gerado factos incertos, que implicassem uma dúvida razoável, que tivesse a virtualidade de afastar a valoração efectuada, de forma a alterar a decisão de facto.

Ora, a arguida BB alega, para além do mais, ter sido condenada com base em meios de prova proibidos uma vez que foi reconhecida através de imagens obtidas por CCTV (Closed-Circuit Television), que não podiam servir como meio de prova, por não ter sido cumprido o nº 5, do art. 147º do Cod. Proc. Penal.

Vejamos:

O acórdão recorrido enunciou os meios de prova que serviram para a condenação de ambas as arguidas AA e BB, tendo feito constar que[9]
“C) MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal fundou a sua convicção na apreciação crítica do conjunto da prova produzida, devidamente analisada à luz do prudente arbítrio e das regras de experiência, nos termos do art. 127º do C.P. Penal.
Refira-se que liberdade de apreciação não se confunde com apreciação arbitrária da prova, nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova, exigindo-se antes, uma apreciação crítica e racional das provas, fundada nas regras da experiência, da lógica e da ciência.
Dispõem os artigos 374º, n.º 2 e 379º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Penal que a sentença deve conter, para além da enumeração dos factos provados e não provados, a indicação das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal, e uma exposição, tando quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção.
Logo, para apurar a factualidade assente, não basta enumerar os meios de prova, antes se impondo que se expresse o modo como se alcançou essa convicção, descrevendo o processo racional seguido e objetivando a análise e ponderação criticamente comparativa das diversas provas produzidas, para que se conheça a motivação que fundamentou a opção por certo meio de prova em detrimento de outro, ou sobre qual o peso que determinados tiveram no processo decisório, ou proceder à explanação do percurso lógico do Tribunal até chegar à decisão fática, para permitir aos destinatários da decisão e aos cidadãos em geral, um controle externo e democrático sobre o exercício da justiça (cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 8 de novembro de 2006, proferido no âmbito do processo n.º 5/14.4GMLSB deste Juízo Central Criminal de Lisboa).
Em sede de 1º interrogatório os arguidos não prestaram declarações sobre os factos, tendo apenas os arguidos esclarecido sobre as condições pessoais, tendo mantido igual postura em sede de audiência de julgamento.
A factualidade dada como provada assim resultou da conjugação da prova testemunhal com a extensa prova documental, a saber:
1. OO, chefe de PSP, coordenador da equipa e agente visionador, que elabora os autos de visionamento. Relatou o que visualizou relativamente à actuação dos arguidos, no primeiro palco na ..., nos comboios de longo curso, depois noutro palco já nos centros comerciais e supermercados ou também em terminais de ATM de agências bancárias, escolhendo sempre vítimas de maior idade. Por fim explicou que começaram a investigação com a análise de imagens de videovigilância e terminaram com a detenção em flagrante delito na última situação.
2. PP, comissário da PSP, já conhecia os arguidos de outras investigações, e no dia 08.03.2021, detectou as arguidas numa viatura ... no ... de ..., presenciou a abordagem das arguidas, de forma a rodear a vítima KK, e depois do afastamento destas aproximou-se da vítima e perguntou à mesma se tinha tudo, tendo a ofendida dado por falta dos €250 que tinha acabado de levantar. Nessa sequência a testemunha deu indicações via rádio para intercepção das arguidas, que acabou por acontecer no .... Referiu a existência de imagens da abordagem à vítima que foram visualizadas previamente pelo agente QQ. A viatura das arguidas foi apreendida e a testemunha foi quem fez o respectivo exame.
3. QQ, agente da PSP, que já conhecia arguida BB de outras investigações, foi quem organizou o inquérito, visualizou as imagens recolhidas, elaborou os autos de visualização das imagens de videoconferência e extraiu fotogramas, que confirmou, concretamente a ultima situação de 08.03.2021 em que descreveu a aproximação da lesada por parte das duas arguidas desde o ATM até ao interior da loja, onde a arguida BB atira qualquer coisa para o chão e a arguida AA vai ao bolso do casaco da vitima e depois ambas se afastam. Referiu ainda que há situações nos autos em que o arguido CC assume posição de vigia, salientando que tudo se passa com muita rapidez. Também pesquisou sobre a ficha biográfica e condições profissionais dos arguidos e recordou que o arguido CC tem actividade de onde recebe rendimentos. Confirmou o auto de reconhecimento pessoal de fls. 45 e 46 do nuipc 1021/19 (ofendido LL). Relativamente ao nuipc 16/21, assinalou no auto a diferenciação de horários das várias camaras que registaram o local.
4. RR, agente da PSP, já conhecia as arguidas de outras investigações, e participou na detenção no dia 08.03.2021, fez o seguimento da viatura entre o ... e o ... e interceptou as arguidas, tendo a arguida BB entregue os €250 que se encontravam no porta luvas do ..., que foi apreendido.
5. SS, agente da PSP, já conhecendo a arguida BB de outra investigação, procedeu ao visionamento no ... de ..., e lavrou o respectivo auto: chegada do carro ..., ambas saem, seguem a vitima e entram no ... e cercam a vitima, não se vê a retirada dos bens, fez extracção de fotogramas; participou no seguimento entre o ... e a ..., concretamente até ao centro comercial ..., depois os agentes policiais encontraram a viatura estacionada e foram abordadas ambas as arguidas sendo que a arguida BB deu o dinheiro, que estava no interior da viatura no porta luvas.
6. TT, agente da PSP, só os conhece de outras investigações, não teve intervenção em qualquer diligencia.
7. UU, agente da PSP, no ... de ..., explicou que a lesada NN foi ter consigo dando conta do desaparecimento do seu dinheiro que tinha levantado momentos antes nos CTT, e nesse seguimento pediu as imagens de videovigilância do ... onde observou que as arguidas chegam de carro, seguem a lesada já no interior do estabelecimento, depois andam “aos encostos”, até se afastarem. Esclareceu que após visualização das imagens pesquisou os dados do veículo utilizado pelas arguidas através da aplicação ..., e apurou que o cartão de cidadão da lesada também tinha sido subtraído e foi encontrado numa prateleira do .... Após estas diligências, contactou de imediato a arguida AA através do contacto de telemóvel e esta disse que ia devolver o dinheiro e foi o que fez, restituindo à ofendida os €315. Referiu ainda que nas imagens visualizadas por si, havia o condutor, mas não viu nenhuma característica que o pudesse identificar. A arguida AA disse estar arrependida e corrigiu o valor (€315), porque a ofendida havia referido apenas €300. Finalmente, a testemunha salientou que as suspeitas, ora arguidas tinham características muito semelhantes, ambas usavam óculos, cabelo comprido não muito grande.
7. DD, assistente administrativo, explicou que à saída da agência bancária, uma das senhoras impediu-lhe a saída e a que estava atrás abriu-lhe a pasta que trazia ao ombro. Confrontado com as imagens de fls. 14 e ss. do nuipc 547/19, a fls. 17 reconheceu-se e às duas senhoras, também assim a fls. 29 e 30 como sendo o momento antes de lhe retirarem o dinheiro, tendo confirmado o levantamento que havia efectuado momentos antes.
8. LL, explicou que na loja do Centro Comercial ..., foi rodeado, duas senhoras, uma de cada lado, e por um homem baixo, com óculos, tendo-se reconhecido bem como aos três intervenientes nos fotogramas impressos a partir das imagens de videovigilância. Mais, confirmou os autos de reconhecimento e esclareceu que recebeu €350, conforme declaração de fls. 736, explicitando que se sente compensado e no caso de possibilidade de desistir do procedimento criminal quer desistir do mesmo reportando-se ao NUIPC 1021/19….
9. EE, confirmou os factos relativos ao NUIPC 415/20…, confirmando que lhe retiraram o dinheiro que se encontrava num envelope dentro de um saco que trazia num braço.
10. MM, confirmou os factos relativos ao NUIPC 282/20…, explicando ainda que também foi retirado o cartão de cidadão que depois apareceu no envelope que continha o dinheiro. Declarou ainda que em virtude de ter recebido de volta os €400 por parte das arguidas, pretendeu desistir da queixa.
11. FF, confirmou tudo relativamente ao nuipc 1534/20 e relatou que se apercebeu de duas senhoras, uma com “fatinho de malha clarinho” e cabelo alourado e outra vestida de escuro, muito próximas de si nos CTT e depois no B.... Mais, confirmou fotogramas de fls. 20 a 32, reconhecendo-se a fls. 25, 26, vendo uma das senhoras a fls. 27, 29, não tendo a certeza relativamente a fls. 32. Revelou ainda que para além do valor de €450, também lhe retiraram o cartão de cidadão.
12. GG, contou que foi às compras, levantou 100€, que colocou numa mala pequena, meia aberta, e à saída do P.…, foi rodeada por duas mulheres, uma de cada lado e também por um homem, e como vinha com dois sacos para arranjar cá fora logo se apercebeu que lhe tinham retirado a carteira com cartão bancário e outros cartões das lojas bem como €250 (e não €225). Reconheceu-se a fls. 20 e ss. do nuipc 740/20….
13. HH, contou que duas senhoras se aproximaram de si a certa altura quando estava no interior da loja no Largo ... e quando chegou a caixa se apercebeu já não tinha dinheiro referindo que começou logo a chorar. Mais, reconheceu-se a fls. 10, fls. 20 a 22 do nuipc 1778/20….
14. II, relatou os factos integrantes do nuipc 884/20…, descrevendo a sua ida do ... para o BCP, com o levantamento de €2500 e com a aproximação e actuação de duas senhoras que inclusivamente bloquearam a entrada da sua mãe que a acompanhava e que à saída se terão apropriado do envelope que continha €2500 em fracções de segundos.
15. JJ, descreveu os factos integrantes do nuipc 14/21…, confirmando a actuação das arguidas na agência bancária no sentido da retirada de €350 e do seu cartão de cidadão.
16. NN, relatou os factos do nuipc 32/21…, descrevendo a actuação das arguidas no ... e a recuperação dos €315 (valor informado pela própria arguida) após intervenção do agente policial e por vontade da arguida que regressou ao local para o fazer, entregando ainda o cartão de cidadão.
Relativamente à testemunha KK, em virtude do que resultou apurado quanto ao seu estado actual de saúde, cfr. fls. 831 e ss., procedeu-se à leitura das suas declarações prestadas no âmbito do processo apenso com o NUIPC 16/21…, nas quais esclareceu sobre a dinâmica dos factos. (…)
Quanto à prova documental, foram relevantes os seguintes documentos, cruciais para complementar a prova testemunhal, principalmente os depoimentos dos agentes policiais e das lesadas e dos lesados, que de forma credível e objectiva esclareceram sobre a dinâmica de cada um dos recortes de vida (…)
- Informação prestada pela ..., fls. 230 a 234, relativa a câmbios de moeda estrangeira efectuados por cada um dos arguidos nos anos de 2019 e 2020, nos totais de: a) arguida AA - €5695,11; b) BB - €2394,86; (…) acrescendo ainda valores quanto às arguidas relativamente a outros anos conforme documento de fls. 233 e 234 mas já na ...;
(…)
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 13 a 23, 28 a 32, onde são visíveis e identificáveis as arguidas no interior da agência bancária efectuando a aproximação ao lesado;
- DVD com as imagens de videovigilância da CGD de B.…, fls. 48;
- Comprovativo do levantamento de numerário pelo ofendido DD, fls. 52; NUIPC 1021/19.... (…)
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 19 a 25, 37 a 42, onde é possível observar a aproximação dos três arguidos ao lesado no interior da loja de vestuário, rodeando-o e tentando uma das arguidas colocar a mão no interior da bolsa trazida pelo ofendido (vide fotograma 5), acabando por conseguir fazê-lo numa segunda tentativa (fotograma 7);
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 36 (…);
- Auto de reconhecimento pessoal negativo da arguida AA, fls. 47 e 48; - Auto de reconhecimento pessoal positivo da arguida BB, fls. 49 e 50; NUIPC 282/20.... (…):
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 29 a 37, onde são visíveis e identificáveis quer a lesada quer as arguidas nos CTT, estas esperando no exterior e depois fazendo o seguimento da vítima;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 40; NUIPC 1534/20.... (…)
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 18 a 32, onde é possível visualizar a aproximação e seguimento das arguidas à vítima entre os CTT e a loja, onde finalmente abordam a lesada;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 37;
- Auto de reconhecimento pessoal negativo da arguida AA, fls. 40 e 41; - Auto de reconhecimento pessoal negativo da arguida BB, fls. 38 e 39; NUIPC 740/20.... (…):
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 20 a 26, onde é possível visualizar e identificar os três arguidos a abordarem a vítima junto à caixa de supermercado;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 29; NUIPC 1778/20.... (…):
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 8 a 14, 18 a 22, onde são visíveis a vítima e as arguidas, estas a aproximarem-se daquela na loja, tendo uns momentos antes a vítima entrado na agencia bancária sob a vigilância do arguido CC;
- ‘Pen’ e DVD com as imagens de videovigilância, fls. 17 e 23;
- Auto de reconhecimento pessoal negativo da arguida BB, fls. 24 e 25; - Auto de reconhecimento pessoal positivo da arguida AA, fls. 26 e 27; NUIPC 884/20....: (…)
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 45 a 49, onde são visualizáveis e identificáveis quer a lesada quer as duas arguidas, actuando no sentido de restringirem os movimentos daquela de forma a aproximarem-se e a retirarem o envelope com dinheiro;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 50;
- Comprovativo do levantamento de numerário pela ofendida II, fls. 52 e senha para atendimento de fls. 35 (…)
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 16 a 22 onde é visível a entrada da vitima na agencia bancária, enquanto é primeiro observada pelas arguidas e depois “ensanduichada” pelas mesmas;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 23;
- Fotograma, fls. 24 relativo à viatura utilizada pelas arguidas no dia dos factos;
- Comprovativo do levantamento de numerário pela ofendida JJ, fls. 26; NUIPC 32/21.... (…):
- Auto de apreensão, fls. 12 e 13, relativo ao valor apreendido na posse da arguida na WW, depois do seguimento policial e Termo de entrega, fls. 15 e 16 relativo à entrega de €315 à ofendida NN;
- Consulta de base de dados do IMT, fls. 14, relativa à licença de condução da arguida AA;
- Fotografia relativas ao local do ... onde foi deixado o cartão de cidadão da ofendida, após a abordagem das arguidas, fls. 21 e ss.;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 39;
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 42 a 47, 72 a 76, onde é possível observar a chegada ao ... das arguidas no veículo no qual se faziam transportar e o seguimento e aproximação à ofendida no interior deste estabelecimento, e momentos antes a escolha da vitima nos CTT e a vigilância da mesma pelas arguidas;
- Auto de notícia por detenção, fls. 1 a 3, datado de 08.03.2021, relativamente à detenção das arguidas AA e BB pelo agente SS (…);
- Auto de apreensão, fls. 11 a 14, relativo aos €250 apreendidos à arguida BB e ao veículo ... apreendido à arguida AA;
- Auto de exame e avaliação do veículo, fls. 15 (entregue a fiel depositário, cfr. fls. 37); - Termo de entrega do dinheiro apreendido à ofendida KK, fls. 16;
- Talão de levantamento do dia 08.03.2021, fls. 17;
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 18 a 22, onde se observa a chegada das arguidas ao ... de ... e posteriormente a abordagem da vítima no interior do estabelecimento;
- DVD com as imagens de videovigilância, fls. 36, que se encontra danificado e não é possível visualizar (…).
- Auto de visionamento de imagens de videovigilância, fls. 19 a 33, onde se observa a chegada da vítima aos CTT, logo seguida da arguida BB e depois da saída, deslocação até ao ... onde ambas as arguidas seguem a vítima e acabam por rodeá-la, retirando-lhe o envelope, que acabam por abandonar num expositor, bem assim deixando o cesto das suas compras no corredor;
- Autos de reconhecimento pessoal negativos das arguidas, fls. 48 a 51; - DVD com as imagens de videovigilância, fls. 43”.

O acórdão recorrido fez constar que a prova produzida foi bastante para compreender as circunstâncias de tempo e lugar da actuação das arguidas AA e BB, tendo sido determinantes as imagens recolhidas dos sistemas de videovigilância, as quais permitiram sem margem para quaisquer dúvidas a identificação de ambas e a intervenção de cada uma[10] sendo que tais imagens foram apreciadas e valoradas conjugadamente com o depoimento das vitimas, demais testemunhas, e dos agentes da PSP, permitindo reconstituir a dinâmica dos factos.

Desta forma, a identificação das arguidas AA e BB ocorreu através dos depoimentos que as vítimas, e os agentes da PSP prestaram, nos quais referiram reconhecê-las, na sequência da visualização das imagens de videovigilância operada em audiência de julgamento, tendo estes depoimentos sido completados pela demais prova documental produzida e acima referenciada.

Ora, para apreciar da legalidade da prova recolhida através do visionamento das imagens obtidas por videovigilância invocamos desde logo o princípio da legalidade da prova enunciado no art. 125º do Cod. Proc. Penal, que considera que: “São admissíveis as provas que não forem proibidas por lei.”

Em processo penal não existe um verdadeiro ónus da prova em sentido formal, vigorando o princípio da aquisição da prova ligado ao princípio da investigação, do qual resulta que são boas as provas validamente trazidas ao processo, sem importar a sua origem, devendo o tribunal, em último caso, investigar e esclarecer os factos na procura da verdade material[11].

Assim, constitui um dos princípios gerais da produção da prova que o tribunal possa e deva ordenar a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade, e à boa decisão da causa, desde que respeite o princípio do contraditório (artº 340º, nº 1, e nº 2, do Cod. Proc. Penal).

O Código de Processo Penal não enumera taxativamente quais as provas que são proibidas, mas aponta limites à produção de provas e à sua valoração, enunciando o seu art. 126º os métodos proibidos de prova, constando do seu nº 1, que:” São nulas, não podendo ser utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coacção ou, em geral, ofensa da integridade física ou moral das pessoas”.

Por seu lado, dispõe o art. 127º do Cod. Proc. Penal que: “Salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente.”

E, quanto à proibição de valoração de provas, consta do art. 355º do Cod. Proc. Penal que não valem em julgamento, nomeadamente para efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência, excepto as provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização, ou audição em audiência, sejam permitidas.

O Tribunal Constitucional já considerou que “é claramente lesivo do direito de defesa do arguido, consagrado no nº 1 do artigo 32º da Constituição, interpretar o artigo 127º do Código de Processo Penal no sentido de que o princípio da livre apreciação da prova permite valorar, em julgamento, um acto de reconhecimento realizado sem a observância de nenhuma das regras previstas no artigo 147º do mesmo diploma.”, tendo decidido “Julgar inconstitucional, por violação das garantias de defesa do arguido, consagradas no nº 1 do artigo 32º da Constituição, a norma constante do artigo 127º do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de admitir que o princípio da livre apreciação da prova permite a valoração, em julgamento, de um reconhecimento do arguido realizado sem a observância de nenhuma das regras definidas pelo artigo 147º do Código de Processo Penal[12]

Contudo, entende-se não ter sido esta a situação que se verificou no caso concreto.

Com efeito, a identificação das arguidas AA e BB através das imagens de videovigilância foi feita de acordo com as normas processuais aplicáveis (art. 147º do Cod. Proc. Penal) já que foi registada em auto e passou a constituir prova documental, e caso as mesmas pretendessem invocar a nulidade deste meio de prova, deveriam ter accionado o regime legal de arguição de nulidades dentro do prazo legal para esse efeito, sendo que o único argumento que apresentam para pôr em causa esta prova é que o reconhecimento através do visionamento das imagens de vídeo não obedeceu ao disposto no nº 5, do art. 147º do Cod. Proc. Penal.

Este Supremo Tribunal tem considerado que as regras de reconhecimento pessoal prescritas pelo artº 147º do Cod. Proc. Penal não se aplicam em julgamento, mas antes à fase de inquérito e de instrução. O reconhecimento feito em audiência integra-se num conjunto probatório que lhe retira não só autonomia como meio de prova especificamente previsto no citado art. 147º, como lhe dá um cariz de instrumento para avaliar a credibilidade de determinado depoimento, inserindo-se assim numa estrutura de verificação do discurso produzido pela testemunha. Nesta perspectiva, tal reconhecimento feito em audiência, a avaliar segundo as regras próprias do artº 127º do Cod. Proc. Penal, não carece para ser válido, de ser precedido do reconhecimento propriamente dito realizado na fase de investigação, seja em sede de inquérito, seja em sede de instrução[13].

No caso, não se verifica uma relação causal necessária da eficácia do depoimento das testemunhas, após o visionamento das imagens de videovigilância, com o próprio visionamento, sendo que as imagens visionadas não foram indicadas probatoriamente como reconhecimento, sendo somente nesta hipótese que seria de aplicar o disposto no nº 5 do artº 147º do Cod. Proc. Penal, que refere que: “O reconhecimento por fotografia, filme ou gravação realizado no âmbito da investigação criminal só pode valer como meio de prova quando for seguido de reconhecimento efectuado nos termos do n.º 2”.

Assim, a identificação das arguidas AA e BB efectuada em audiência de julgamento pelas diversas testemunhas (vítimas e elementos da PSP) não configura um estrito acto de reconhecimento, mas sim um meio de prova que deve ser encarado como integrante do respectivo depoimento testemunhal[14], e que foi submetido ao princípio do contraditório (art. 327º, nº 2, do Cod. Proc. Penal), tratando-se de uma prova não proibida, a valorar nos termos do art. 355º do Cod. Proc. Penal[15].

Desta forma, e também como decidiu o Tribunal Constitucional no Ac. nº 425/2005, de 25/08/2005[16] esta interpretação do art. 147º do Cod. Proc. Penal não viola o princípio das garantias de defesa consagrado no art. 32º, nº 1, da Constituição da República, ou qualquer outra norma constitucional.

Daí que o tribunal recorrido não estivesse inibido de valorar as identificações que foram efectuadas em audiência de julgamento pelas testemunhas (vítimas e elementos da PSP), na sequência dos respectivos depoimentos, sujeitando-os ao princípio da livre valoração da prova e respeitando o princípio do contraditório, de forma a não prejudicar o direito de defesa das arguidas AA e BB.

Entende-se que a situação dos autos em que se solicitou aos elementos da PSP e às vítimas em audiência de julgamento para confirmar se as arguidas AA e BB aí presentes eram ou não as autoras dos crimes de furto qualificado em causa, não configura um acto processual que consubstancie um reconhecimento pessoal, sendo que a confirmação da identidade das arguidas apenas poderá ser encarado como integrante do respectivo depoimento testemunhal, não podendo assim confundir-se uma prova por reconhecimento com uma prova testemunhal.

Assim, todos os reportes testemunhais feitos em audiência de julgamento consubstanciados na afirmação de que as arguidas AA e BB foram as autoras dos factos pelos quais vieram a ser condenadas e que integram a prática de crimes de furto qualificado concretiza-se no conceito de prova testemunhal e não de prova por reconhecimento.

Dito isto, considera-se que não foram assim violados os arts. 147º, nº 5, do Cod. Proc. Penal nem o art. 32º da Constituição da República[17].


Pelo que o recurso interposto pela arguida BB improcede nesta parte.

2. Da verificação das qualificativas das als. d) e h), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal

Para a integração da conduta de ambas as arguidas AA e BB nas qualificativas das als. d) e h), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal, o acórdão recorrido fez constar que:[18]
“Relativamente aos crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelos artigos 203.º e 204º do Código Penal:
Dispõe o art. 203º, n.º 1, do Código Penal que "quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair coisa móvel alheia, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa."
São elementos deste tipo legal de ilícito:
- a ilegítima intenção de apropriação, enquanto vontade intencional de o agente se comportar em relação a determinada coisa, como seu proprietário, querendo desta forma integrá-la na sua esfera patrimonial, manifestando assim, uma intenção de desapropriar terceiro;
- a subtracção de coisa móvel alheia, a traduzir um desapossamento logo seguido de outro apossamento, em virtude de uma conduta que faz com que a coisa saia do domínio de facto do precedente possuidor ou detentor, implicando desta forma a eliminação do domínio de facto que outrem detinha sobre a coisa;
- para que se verifique o preenchimento do tipo é ainda necessário que haja uma conduta dolosa por parte do agente.
Quanto à ilegítima intenção de apropriação, trata-se de um elemento subjectivo do tipo de ilícito que faz do crime de furto, quer na forma simples quer na forma qualificada, um crime intencional. "O elemento intenção de apropriação (...) deve ser visto e valorado como a vontade intencional do agente de se comportar relativamente a coisa móvel, que sabe não ser sua, como seu proprietário, querendo assim integrá-la na sua esfera patrimonial ou na de outrem, manifestando, assim, em primeiro lugar uma intenção de (des) apropriar terceiro", para mais desenvolvimentos, José de Faria Costa, Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo II, pg. 33 e ss., Coimbra Editora.
E quanto ao artigo 204.º que prevê o crime de Furto qualificado:
“1 - Quem furtar coisa móvel ou animal alheios:
a) De valor elevado;
b) Colocada ou transportada em veículo ou colocada em lugar destinado ao depósito de objectos ou transportada por passageiros utentes de transporte colectivo, mesmo que a subtracção tenha lugar na estação, gare ou cais;
c) Afecta ao culto religioso ou à veneração da memória dos mortos e que se encontre em lugar destinado ao culto ou em cemitério;
d) Explorando situação de especial debilidade da vítima, de desastre, acidente, calamidade pública ou perigo comum;
e) Fechada em gaveta, cofre ou outro receptáculo equipados com fechadura ou outro dispositivo especialmente destinado à sua segurança;
f) Introduzindo-se ilegitimamente em habitação, ainda que móvel, estabelecimento comercial ou industrial ou espaço fechado, ou aí permanecendo escondido com intenção de furtar;
g) Com usurpação de título, uniforme ou insígnia de empregado público, civil ou militar, ou alegando falsa ordem de autoridade pública;
h) Fazendo da prática de furtos modo de vida; ou
i) Deixando a vítima em difícil situação económica;
j) Impedindo ou perturbando, por qualquer forma, a exploração de serviços de comunicações ou de fornecimento ao público de água, luz, energia, calor, óleo, gasolina ou gás;
é punido com pena de prisão até cinco anos ou com pena de multa até 600 dias.
2 - Quem furtar coisa móvel ou animal alheios:
a) De valor consideravelmente elevado;
b) Que possua significado importante para o desenvolvimento tecnológico ou económico;
c) Que por sua natureza seja altamente perigosa;
d) Que possua importante valor científico, artístico ou histórico e se encontre em colecção ou exposição públicas ou acessíveis ao público;
e) Penetrando em habitação, ainda que móvel, estabelecimento comercial ou industrial ou outro espaço fechado, por arrombamento, escalamento ou chaves falsas;
f) Trazendo, no momento do crime, arma aparente ou oculta; ou
g) Como membro de bando destinado à prática reiterada de crimes contra o património, com a colaboração de pelo menos outro membro do bando;
é punido com pena de prisão de dois a oito anos.
3 - Se na mesma conduta concorrerem mais do que um dos requisitos referidos nos números anteriores, só é considerado para efeito de determinação da pena aplicável o que tiver efeito agravante mais forte, sendo o outro ou outros valorados na medida da pena.
4 - Não há lugar à qualificação se a coisa ou o animal, furtados forem de diminuto valor.”
Quanto à alínea d) não restam dúvidas que nas situações sub iudice dos nuipc 415/20 (vítima EE), 282/2.... (vítima MM), 1534/20.... (vítima FF), 740/20.... (vítima GG), 1778/20.... (vítima HH), 14/21.... (vítima JJ), 16/21.... (vítima KK), as vitimas têm todas mais de setenta anos e apresentam as debilidades inerentes à terceira idade, não obstante a lucidez e clareza que apresentaram nos respectivos depoimentos, tanto assim que ainda recorrem ao levantamento em dinheiro das suas reformas (em vez de preferirem a utilização de cartões bancários) e apresentaram alguma lentidão de movimentos. Pelo que, nestes recortes, não restam dúvidas quanto ao preenchimento desta subsunção legal, - o mesmo já não sucede quanto aos niupc 547/19... (vítima DD), 1021/19.... (vítima LL), 884/20.... (vítima II), 32/21.... (vítima NN), em que as vitimas se apresentaram sem quaisquer debilidades ou fragilidades próprias da idade ou de outras causas.
Quanto à alínea “h) fazendo da prática de furtos modo de vida”, dir-se-á que o conceito de modo de vida pressupõe a prática de uma pluralidade de crimes e parte do princípio de que o agente satisfaz as suas necessidades quotidianas através de proventos obtidos na prática de actividades ilícitas, afectando, pois, à satisfação dos seus gastos do dia-a-dia os quantitativos recolhidos das condutas criminosas em que participa.
Tal como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Setembro de 2012, disponível em www.dgsi.pt, processo n.º 101/11.0PAVNO.S1: “A qualificar o crime concorre, ainda, a agravante prevista na al h) , do n.º 1 do art.º 204, do CP , na exacta medida em que os arguidos fizeram das subtracções fraudulentas modo de vida, ou seja actividade de que o agente do crime se sustenta, não se identificando com a mera habitualidade, associada mais, e do qual se aproxima, ao exercício profissional de uma actividade, incluindo uma pluralidade de acções com a intenção de obtenção de meios de subsistência através delas e a disponibilidade para realizar acções do mesmo tipo, - cfr. ainda, Ac. do STJ , 7.12.2000 , SASTJ , 46 , 73 e Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código Penal , pág. 560”).
Verificando-se que as arguidas participaram em inúmeros actos, entre outubro de 2019 e março de 2021, sem que as arguidas tenham assumido qualquer outro projecto de vida, sem actividade profissional remunerada declarada ou conhecida, sendo certo que actuavam naquilo que é considerado o horário normal de trabalho, entre as 9h00 e as 17h00 dos dias úteis, tem de concluir-se com segurança que, não mantendo actividade laboral da qual proviesse qualquer rendimento, era desta actividade criminosa que obtinham proventos para o seu sustento, ainda para mais atendendo ao facto de se apropriarem de dinheiro em espécie, o que lhes permitia uma liquidez imediata e permanente com facilidade no acesso directo à compra de bens.
Assim, conclui-se que está também preenchida esta qualificativa do modo de vida quanto à conduta das arguidas em todos os nuipc integrados nestes autos, mesmo aqueles em que não havia operado a qualificativa prevista na alínea d) do n.º 1 do art. 204º do C.Penal relativa à especial debilidade das vitimas”.

Vejamos:

2.1 – Do preenchimento da qualificativa agravante da al. d), do nº 1, do art. 204 do Cod. Penal

A arguida BB alega que o acórdão recorrido apenas identifica, para a verificação da situação de especial debilidade das vítimas, o facto de todas elas terem mais de setenta anos de idade e apresentarem alguma lentidão de movimentos, o que por si só não é suficiente para concluir pela existência de uma especial vulnerabilidade para o preenchimento da qualificativa enunciada na al. d), do nº 1 do, art. 204º do Cod. Penal.

Mas sem qualquer razão.

Na verdade, com respeito à agravação do crime de furto prevista na citada al. d), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal, identifica-se a especial debilidade da vítima com a situação da pessoa particularmente indefesa, prevista na al. c), do nº 2, do art. 132º do Cod. Penal [19], no âmbito da qual cabem as situações em que a especial debilidade das vítimas se prende com o facto de os actos terem sido praticados contra pessoas particularmente indefesas em razão da sua idade.

Relativamente a esta questão do preenchimento da agravante enunciada na al. d), do nº 1 do, art. 204º do Cod. Penal, o acórdão recorrido fez constar que[20]:”Quanto à alínea d) não restam dúvidas que nas situações sub iudice dos nuipc 415/20 (vitima EE), 282/2.... (vítima MM), 1534/20.... (vítima FF), 740/20.... (vítima GG), 1778/20.... (vítima HH), 14/21.... (vítima JJ), 16/21.... (vítima KK), as vítimas têm todas mais de setenta anos e apresentam as debilidades inerentes à terceira idade, não obstante a lucidez e clareza que apresentaram nos respectivos depoimentos, tanto assim que ainda recorrem ao levantamento em dinheiro das suas reformas (em vez de preferirem a utilização de cartões bancários) e apresentaram alguma lentidão de movimentos. Pelo que, nestes recortes, não restam dúvidas quanto ao preenchimento desta subsunção legal, - o mesmo já não sucede quanto aos niupc 547/19... (vítima DD), 1021/19.... (vítima LL), 884/20.... (vítima II), 32/21.... (vítima NN), em que as vitimas se apresentaram sem quaisquer debilidades ou fragilidades próprias da idade ou de outras causas”.

Ponderando toda a matéria de facto dada como provada, em especial a constante dos pontos 1 a 17, não restarão dúvidas que a arguida BB conjuntamente com a co-arguida AA sua irmã, ao actuarem do modo ali descrito, preencheram esta qualificativa.

Com efeito, resulta de toda a factualidade dada como provada que ambas as arguidas, entre o mês de Outubro de 2019 e o mês de Março de 2021, retiraram dinheiro a vítimas maioritariamente do sexo feminino, entre os 70 e os 91 anos de idade[21], a quem previamente montaram vigilância, seguindo-as de seguida, e quando estas estavam distraídas e/ou preocupadas com alguma actividade (a efectuar alguma compra num estabelecimento comercial, ou após saírem de uma instituição bancária onde tinham acabado de levantar dinheiro) uma abordava a vitima já anteriormente sinalizada (colocando-se propositadamente na sua frente ou rodeando-a), enquanto a outra lhe retirava a carteira do interior da mala.

Posto isto, dúvidas não restam que os crimes de furto praticados pelas arguidas preenchem a qualificativa enunciada na al. d), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal.

Termos em que improcede nesta parte o recurso.

2.2 - Do preenchimento da qualificativa agravante da al. h), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal

A arguida AA alega que à data dos factos auferia rendimentos lícitos, com os quais provia à subsistência do seu agregado familiar, os quais tinham origem na sua actividade laboral e do seu filho, “num registo equilibrado” sendo que o valor médio mensal dos proventos líquidos resultantes da actividade criminosa provada nos autos não podia ser contabilizado como sendo significativo para o seu sustento, daí que a sua conduta não possa ser subsumida à qualificativa da al. h), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal.

Por seu lado, a arguida BB alega, no que respeita ao preenchimento da sua conduta nesta qualificativa da al. h), do nº 1, do artº 204 do Cod. Penal, que se vivesse destas actividades “muita fome passaria”, face ao valor de todos os furtos ocorridos num período de cerca de 18 meses, o qual seria insuficiente para a mesma se sustentar, estando-se perante a prática de diversos furtos que não se diluíram num curto espaço de tempo, antes de diluindo ao longo do tempo.

Mas também sem qualquer razão.

Começaremos por proceder à definição da qualificativa da al. h), do nº 1, do art. 204º do Cod. Penal, com recurso à citação de diversa doutrina enunciada no Ac. STJ de 13/01/2022[22], e que aqui tem toda a sua pertinência.

Assim, Victor de Sá Pereira e Alexandre Lafayette[23], salientam que “não tem de ser o furto perpetrado por quem ainda nada mais faz do que furtar. O agente pode ter e pôr em prática uma profissão socialmente reconhecida como normal, visível e adequada – por vezes até se serve dela para melhor levar a cabo actividades ilícitas, como a de se apropriar do alheio – que nem por isso deixará de incorrer nesta qualificativa, se a série de furtos a seu cargo for de tal ordem que nela se reconheça um processo (ainda que subterrâneo) de realizar proventos destinados à sustentação da sua vida em comunidade.”

Também, Paulo Pinto de Albuquerque[24], a propósito desta qualificativa, defende que “O modo de vida é a atividade com que o agente se sustenta. Não é necessário que se trate de uma ocupação exclusiva, nem contínua, podendo até ser intermitente ou esporádica, desde que ela contribua significativamente para o sustento do agente (…). O conceito de modo de vida pode ser aproximado ao de exercício “profissional” de uma atividade (…), que inclui a pluralidade de ações, a intenção de aquisição de meios de subsistência através dessas ações e a disponibilidade para realizar outras ações do mesmo tipo”.

Por seu lado, José de Faria Costa[25], refere que esta alínea se prende com uma ideia de pluralidade de infracções, “(…) Ou seja: o pressuposto fundamental para que se verifique a circunstância-elemento reside na prática -obviamente que anterior - de vários furtos. Mas, mesmo que tal pressuposto tenha lugar, estamos ainda longe de haver o preenchimento do texto-norma em apreço. Exige-se ainda de maneira insofismável que essa prática corresponda a um modo de vida. E, mais à frente explica, “a prática de furtos deve ser vista como uma série mínima de furtos, em uma intencionalidade que possa dar substância, em termos de apreciação pelo comum dos cidadãos, a um modo de vida. Modo de vida é a maneira - em uma ótica estritamente objetiva, isto é, sem qualquer espécie de valoração sobre o sentido lícito ou ilícito do comportamento assumido no quotidiano - pela qual quem quer que seja consegue os proventos necessários à própria vida em comunidade (…). As pessoas tendem a fazer vários coisas ao mesmo tempo, e isso é o seu modo de vida. Ora, se isto é assim em uma chamada vida normal não temos a menor dúvida em considerar que o mesmo se passa quando alguém se lança na carreira criminosa da prática de furtos. Quer isto significar de forma muito clara que não é absolutamente preciso que o delinquente se dedique, de jeito exclusivo, aos furtos para que se possa dizer que dessa prática faz um modo de vida. Bem pode ter uma profissão socialmente visível – o que não poucas vezes até facilita a atividade ilícita que se realiza às ocultas – e, mesmo assim, poder considerar-se que a série de furtos que pratica seja factor determinante para que se possa concluir que ele disso – isto é, desse pedaço da vida – faça também um modo de vida”. E, mais à frente afasta a ligação entre “modo de vida” e “habitualidade”, escrevendo: “Na verdade, se é certo que as duas noções que ora se confrontam têm, formalmente, um elemento comum, qual seja, uma série reiterada de modelos de comportamento, é evidente que as representações sociais que se ligam ao modo de vida e à habitualidade são radicalmente diversas. Para o modo de vida temos uma representação de estabilidade ligada, sem margem para dúvidas, a um comportamento que, em princípio se traduz em benefício pessoal e social enquanto a habitualidade se cristaliza, nas representações sociais, como uma conduta reiterada tout court. Forma de conduta que, desde sempre, foi valorada pelo direito penal. Neste sentido, a habitualidade é uma categoria dogmático-penal conexionada com a perigosidade criminal sobretudo enquanto contraponto a uma criminalidade meramente ocasional (Eduardo Correia II 272). Ou seja: a habitualidade afirma-se como uma categoria não neutral de um ponto de vista normativo. Como uma categoria a que vai irremediavelmente colada uma imagem de perigosidade. Um delinquente habitual é, ipso facto, um delinquente perigoso. Ora, uma tal correspondência não existe, nem de longe nem de perto, quando operamos com o conceito “modo de vida”. O modo de vida do delinquente pode ser a prática de furtos, mas isso não faz dele um delinquente perigoso. A única coisa que determina é uma qualificação do furto”[26].

Tendo por base as considerações doutrinárias supra-referidas, o acórdão recorrido relativamente a esta questão fez constar que:[27] “Verificando-se que as arguidas participaram em inúmeros actos, entre outubro de 2019 e março de 2021, sem que as arguidas tenham assumido qualquer outro projecto de vida, sem actividade profissional remunerada declarada ou conhecida, sendo certo que actuavam naquilo que é considerado o horário normal de trabalho, entre as 9h00 e as 17h00 dos dias úteis, tem de concluir-se com segurança que, não mantendo actividade laboral da qual proviesse qualquer rendimento, era desta actividade criminosa que obtinham proventos para o seu sustento, ainda para mais atendendo ao facto de se apropriarem de dinheiro em espécie, o que lhes permitia uma liquidez imediata e permanente com facilidade no acesso directo à compra de bens”.

Ora, face à matéria de facto dada como provada nos pontos 1 a 17, temos que ambas as arguidas AA e BB, entre os meses de Outubro de 2019 e de Março de 2021, em períodos de dias úteis entre as 9H00 e as 17H00, apropriaram-se de quantias de dinheiro em espécie, que ascenderam pelo menos a € 6.215,00, que lhe permitiram uma liquidez imediata e permanente com facilidade no acesso directo à compra de bens, ou seja, naquele período de tempo as arguidas utilizaram o dinheiro de que se apropriaram através da prática dos furtos para fazer face a despesas diárias, tendo tal prática passado a constituir um seu modo de vida, que poderia ser conciliado com uma outra ocupação[28].

Dito isto, entende-se ter sido correcta a subsunção da conduta das arguidas na previsão da al. h), do art. 204º, nº 1, do Cod. Penal.

Termos em que improcede nesta parte o recurso.

2.3. - Do preenchimento da qualificativa agravante da al. g), do nº 2, do art. 204º do Cod. Penal (bando)

A arguida BB entende que a sua conduta não pode integrar a qualificativa enunciada na al. g), do nº 2, do art. 204º do Cod. Penal, uma vez que “(…) apesar de bastarem dois elementos do bando para a prática do crime de furto (sendo isso pacifico na jurisprudência), se atentarmos à letra da lei parece que o espírito do legislador impõe que para a existência de bando tenha de haver mais de 2 membros desse bando (ainda que depois bastem dois membros para a qualificação).

Mas também sem qualquer razão.

Esta figura penal surgiu com a revisão do Código Penal, operada pelo Dec. Lei nº 48/95, de 15/03, tendo a al. g), do nº 2, do art. 204º do Cod. Penal (furto qualificado) eliminado a anterior referência à prática do crime de furto cometido por duas ou mais pessoas, passando a qualificação do furto a fazer referência a quem actuar “como membro de bando destinado à prática reiterada de crimes contra o património, com a colaboração de pelo menos outro membro do bando”.

Taipa de Carvalho[29], define bando como “uma cooperação duradoura entre várias pessoas. É um conceito menos exigente que o de associação criminosa (cf. art. 299º), pois que, diferentemente desta, não pressupõe uma estrutura organizacional. Mas também não se basta com uma mera associação conjuntural (ocasional) de pessoas” – caso em que estaríamos perante uma simples co-autoria, definida nos arts. 26º e 28º do Cod. Penal.

Paulo Pinto de Albuquerque[30] refere que o conceito de bando tem as seguintes características cumulativas: é um grupo de duas ou mais pessoas que se juntam para praticar um número indeterminado de crimes contra o património (no que se distingue da co-autoria), podendo não ter cometido previamente outros crimes contra o património e destinar-se a praticar um só tipo de crimes; não é suficiente um plano para a execução de vários crimes numa só ocasião, mas é suficiente um plano para a execução de um número incerto de crimes num período certo de tempo; é um grupo de pessoas que não tem um líder, uma estrutura de comando; e tem um processo de formação de vontade colectiva (no que se distingue da associação criminosa).

Vária jurisprudência se pronunciou pela possibilidade e pelo pressuposto que os membros do bando se teriam que agregar em redor de um líder[31], contudo este entendimento não é consensual.

Assim, veja-se o conceito de bando definido no Ac. STJ de 26-09-2012[32], em cujo sumário se lê que: “IV - O conceito de bando abarca uma pluralidade de pessoas, duas ou pelo menos duas, actuando de forma voluntária e concertada, com uma incipiente estruturação de funções que, embora mais grave do que a simples co-autoria e menos que a associação criminosa, se apresenta sem uma hierarquia de comando, divisão de tarefas e estruturação de funções.
V - Constitui um grupo inorgânico, desarticulado, gozando os seus membros de alguma liberdade de acção, com vista à prática reiterada de infracções contra o património, como o caracterizam os Acs. do STJ de 01-10-1997, Proc. n.º 627/97 - 3.ª, de 24-02-1999, Proc. n.º 1136/99 - 3.ª, de 04-06-2002, Proc. n.º 1218/02 - 3.ª, e de 12-09-2007, Proc. n.º 07P2605”

Também, o Ac. STJ de 27/05/2010, citando Miguel Pedrosa Machado, refere que o “conceito de bando assenta numa designação de cariz criminológico, que pretende traduzir uma situação em que haja, simultaneamente, e em razão da existência de um líder, algo menos do que na associação e algo diferente da coautoria; algo próximo, mais do que o «concurso de pessoas» (incluindo a coautoria, espécie mais relevante ou forte de tal «concurso»), mas menos do que a «associação».[33]

Aplicando estas noções, o acórdão recorrido relativamente a esta questão fez constar que[34]:
Resta ainda verificar da subsunção das condutas à forma hiperqualificada do crime de furto previsto no n.º 2 alínea g), tendo em vista a actuação em bando, é consabido que o conceito de bando há-de buscar-se algures entre o de «associação criminosa» e o de simples co-autoria, sendo certo que há-de ficar aquém daquele e algo além deste. “A situação do bando visa abarcar aquelas situações de pluralidade de agentes, actuando de uma forma voluntária e concertada, com uma incipiente estruturação de funções que, embora mais graves do que a co-autoria e menos do que a associação criminosa, por nelas inexistir uma organização estruturada, sem níveis de hierarquias de comando, de divisão de tarefas, ou estruturação de funções; o bando é um grupo inorgânico destinado à prática reiterada de delitos”, cfr. Acórdão do STJ de 01-10-1997, Proc. n.º 627/97, 3.ªsecção, isto é, um grupo
desarticulado, em que os seus membros gozam de relativa autonomia, mas visando a prática de crimes em comum, sem líder, distribuição de tarefas nem especialização.
No bando, sendo muito mais do que uma mera comparticipação entre arguidos, na verdade, existe um grupo, de duas ou mais pessoas, que se juntam para praticar um número indeterminado de crimes contra o património, sendo suficiente o plano para a execução de um número incerto de crimes, num período certo de tempo, que não tem um líder, uma estrutura de comando e um processo de formação da vontade colectiva.
A qualificativa de “bando” representa uma co-autoria em forma especial, porque ultrapassa os pressupostos da co-autoria, nos termos do art.º 26.º do C.P, uma vez que a prática dos furtos se inscreveu no desígnio criminoso formado pelo grupo, constituído, no caso, para a prática de referidos ilícitos, pela zona metropolitana de Lisboa, de forma sistemática e minimamente estruturada, tal como resulta da matéria de facto dada como assente, da qual se expõe que as arguidas planearam retirar valores monetários dos lesados, e tal plano era executado pela escolha das vitimas junto às agencias bancárias ou dos CTT, observando os levantamentos em numerário, com entrada posterior nos estabelecimentos comerciais para onde se deslocavam as vitimas, ou ainda nas entradas de tais agências, algumas vezes fazendo seguimento em viatura, saindo do estabelecimento de forma concertada, utilizando os valores obtidos para meio de subsistência”, termos em que é indubitável que se mostra verificada a agravante do “bando”, e não a mera co-autoria, pois que as co-arguidas AA e BB revelavam uma forma de actuação concertada e organizada para além da simples autoria, bastando a existência de duas pessoas e nada impedindo tal subsunção a existência de laço de parentesco entre as arguidas, que são irmãs. Quanto a estas arguidas e verificando-se o múltiplo preenchimento de circunstâncias qualificativas, serão as mesmas condenadas pela mais grave, que é precisamente a que deriva da actuação em bando, prevista no n.º 2 do art. 204 do C. Penal”.

Ora, ficou provado que a arguida BB conjuntamente com a co-arguida AA, sua irmã, entre o mês de Outubro de 2019 e o mês de Março de 2021, dedicaram-se com regularidade a retirar dinheiro às vitimas, maioritariamente do sexo feminino, entre os 70 e os 91 anos de idade[35], que entretanto tinham previamente vigiado, escolhendo datas definidas para o efeito, coincidentes em algumas situações com o recebimento das suas reformas[36], aguardando em locais estratégicos que estas procedessem ao levantamento em numerário das respectivas quantias (entre os €300,00 e os €450,000) seguindo-as de seguida, e quando estas estavam distraídas e/ou preocupadas com alguma actividade (a efectuar alguma compra num estabelecimento comercial, ou após saírem de uma instituição bancária onde tinham acabado de levantar dinheiro) uma das arguidas abordava a vitima (colocando-se propositadamente na sua frente ou rodeando-a, enquanto a outra lhe retirava do interior da mala a carteira.

Assim, as arguidas AA e BB sinalizavam previamente as vitimas de idade já avançada, vigiavam-nas, abordavam-nas quando estas saíam da instituição bancária, ou quando estavam nalgum estabelecimento comercial, aproveitavam-se do facto de estarem distraídas e/ou ocupadas para levar a cabo as subtracções de dinheiro, existindo assim uma concreta a associação de vontades de ambas e que preenche os elementos de um bando, sendo que ambas comparticiparam em todos os furtos qualificados pelos quais vieram a ser condenadas, e actuaram sempre em conjugação de esforços e de intentos, e em obediência a um plano querido e que traçaram anteriormente (factos provados 1 a 17).

Posto isto, entende-se ter sido correcto o enquadramento jurídico operado no acórdão recorrido ao subsumir a sua conduta das arguidas na previsão da al. g), do nº 2, do art. 204º do Cod. Penal.

E, uma vez que se considera que a conduta de ambas as arguidas AA e BB preenche as qualificativas enunciadas nas als. d), e h), do nº 1, e da al. g), do nº 2, do art. 204 do Cod. Penal, a apreciação das desistências de queixa apresentadas no Proc. NUIPC 1021/19... (lesado LL) e no Proc. NUIPC (lesada MM) fica prejudicada[37].

Termos em que improcede também nesta parte o recurso apresentado.

Passamos agora a apreciar da justeza da medida das penas parcelares aplicadas, que ambas pugnam pela sua redução, e da medida da pena única aplicada, que ambas entendem não dever ser superior a 5 anos de prisão suspensa na sua execução.

3. Da medida das penas parcelares

Para a determinação da medida concreta das penas parcelares aplicadas às arguidas AA e BB, por cada um dos crimes de furto qualificado pelos quais foram condenadas, em co-autoria material, o acórdão recorrido fez constar que[38]:
O Tribunal reger-se-á, desde logo, pelo artigo 40º do Código Penal, nos termos do qual se preceitua que a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (n.º 1), não podendo, em caso algum, a pena ultrapassar a medida da culpa (n.º 2).
Já de acordo como disposto no artigo 71º, n.º 1, do C. Penal, «a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção».
A determinação da pena concreta fixar-se-á, portanto, em função:
- da culpa do agente, que constituirá o limite máximo, por respeito do princípio político-criminal da necessidade da pena, e do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana;
- das exigências de prevenção geral, que constituirão o limite mínimo, sob pena de ser posta em risco a função tutelar do direito e as expectativas comunitárias na validade da norma violada;
- e de prevenção especial de socialização, sendo elas que irão fixar o quantum da pena dentro daqueles limites (vide Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Lisboa, 1993, pág. 213 e seguintes).
Relativamente às exigências de prevenção geral, na ponderação da dosimetria da pena deste tipo de ilícitos criminais têm de tecer-se diversas considerações, sempre sem perder de vista que uma das finalidades das penas é a protecção dos bens jurídicos (arts.50, nº. 1 in fine e 40, n.º 1, ambos do C. Penal): a pequena criminalidade patrimonial exige adequada punição, atenta a frequência com que ocorre e o alarme social que suscita junto dos cidadãos e da perturbação que causa na sua vida quotidiana. Efectivamente, as exigência de prevenção neste campo são acentuadas quer em termos gerais, face à quantidade de crimes de furto e roubo que ocorrem todos os dias e de que dão ecos os meios de comunicação social, com o consequente alarme e sentimentos de insegurança, fundados, que geram, e a que há que por cobro, de modo a que o homem não seja visto pelo outro homem como objecto de agressão, mas antes de convívio, procurando todos e cada um o bem comum e não o mal de alguns, sempre tendo presente que essas exigências assumem um relevo acentuadíssimo nos tempos
que correm pois, no cometimento destes crimes, são abundantes as noticias da sua prática não apenas na rua ou em estabelecimentos comerciais, como também em habitações, acabando por relevar o facto de maior parte das vitimas se tratarem de idosos, “presas fáceis” para o carteirista, significando prejuízo para a segurança do país.
Quanto às exigências de prevenção especial, na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente, ou contra ele, nomeadamente as referidas nas alíneas do n.º 2 do artigo 71º do C. Penal: o grau de ilicitude do facto, o modo de execução, a gravidade das consequências bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; a intensidade do dolo ou da negligência; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica; a conduta anterior e posterior; a falta de preparação para manter uma conduta lícita manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.
Os crimes de furto em que incorreram as arguidas é o de furto qualificado pelo concurso das circunstâncias já apontadas, pelo que o limiar mínimo das penas parcelares não permite a lei que se situe em 1 ano e 2 meses por cada, como seria em caso de furto simples, como pretende” (…).
Desde logo, - e numa primeira operação de escolha da pena tem desde logo de atender-se ao art. 70º do Código Penal, que fornece ao julgador o critério de orientação para a escolha da pena, quando ao crime são aplicáveis pena privativa e pena não privativa da liberdade, traduzindo o pensamento legislativo da preferência pelas sanções não detentivas, sempre que as exigências de prevenção geral e especial se possam realizar por essa via, em virtude da consideração da pena de prisão como ultima ratio do sistema punitivo (…)
Quanto às coarguidas, uma vez que o crime hiperqualificado do n.º 2 do art. 204º nem sequer admite a pena de multa, aplicar-se-á pena de prisão.
Assim escolhidas as penas de prisão, tomar-se-á em consideração o seguinte conjunto de circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de ilícito, depõem contra ou a favor dos arguidos e considerando as seguintes molduras penais:
- para os crimes hiperqualificados do n.º 2, pena de prisão de dois a oito anos;
- para os dois crimes hiperqualificados do n.º 2 que exigem atenuação especial da pena, pena de um mês até cinco anos e quatro meses;
- para o crime qualificado do n.º 1, pena de prisão entre um mês e até cinco anos”.

E, relativamente ao quantum de cada uma das penas parcelares aplicadas à arguida AA, o acórdão recorrido fez constar que:[39]
“- no caso em apreço, o grau de ilicitude é elevado, tendo em conta o período de tempo em que foram praticados os ilícitos, relembre-se entre outubro de 2019 e março de 2021 e a frequência com que os ilícitos eram praticados, e o facto de escolher vítimas de uma certa idade, deixando-as numa situação algo aflitiva, pois tratavam-se na maior parte de reformas de velhice de baixo valor;
- o dolo da arguida foi directo, pois que esta tinha plena consciência de que actuava contra vontade das vítimas, tendo, mesmo assim, persistido nas suas condutas criminosa, utilizando o mesmo modus operandi para concretizar os ilícitos;
- contra a arguida está a circunstância de a mesma apresentar vários antecedentes criminais relacionados com este tipo de criminalidade e outros, tendo inclusivamente já cumprido pena de prisão efectiva;
- tem ainda de considerar-se o facto de a arguida não ter actividade profissional regular e não ter demonstrado assunção pela gravidade do seu comportamento;
- em seu favor o facto de se encontrar familiar e socialmente integrada tal como resulta do relatório social.
Tudo ponderado, e não menosprezando o enfoque das razões de prevenção geral, uma vez que este tipo de criminalidade suscita alarme razoável na comunidade e que um comportamento de execução múltipla como foi o da arguida não pode passar impune, entende o Tribunal serem de aplicar à arguida as seguintes penas:
- por cada um dos oito crimes de furto hiperqualificado, previsto e punido pelos artigos, 203º n.º 1 e 204º n.º 2, ambos do Código Penal, aplica-se a pena de três anos de prisão;
- por cada um dois crimes de furto hiperqualificados, previstos e punidos pelo artigo 204.º, n.º 2, mas em que houve restituição nos termos do art. 206º e 73 do Código Penal, aplica-se a pena de um ano e três meses de prisão”.

A arguida AA alega que perante os factos dados como provados e o disposto no art. 71º, nº 1, e nº 2, do Cod. Penal impõe-se uma redução das penas parcelares aplicadas, para um quantum próximo dos seus mínimos, porquanto a mesma beneficia de atenuantes da sua conduta que não foram ponderadas na determinação da medida destas penas.

Relativamente ao quantum de cada uma das penas parcelares aplicadas à arguida BB, o acórdão recorrido fez constar que:[40]
“- no caso em apreço, o grau de ilicitude é elevado, tendo em conta o período de tempo em que foram praticados os ilícitos, relembre-se entre outubro de 2019 e março de 2021 e a frequência com que os ilícitos eram praticados, e o facto de escolher vítimas de uma certa idade, deixando-as numa situação algo aflitiva, pois tratavam-se na maior parte de reformas de velhice de baixo valor;
- o dolo da arguida foi directo, pois que esta tinha plena consciência de que actuava contra vontade das vítimas, tendo, mesmo assim, persistido nas suas condutas criminosa, utilizando o mesmo modus operandi para concretizar os ilícitos;
- contra a arguida está a circunstância de a mesma apresentar antecedentes criminais relacionados com este tipo de criminalidade, não tendo cumprido pena de prisão efectiva;
- tem ainda de considerar-se o facto de a arguida não ter actividade profissional regular e não ter demonstrado assunção pela gravidade do seu comportamento;
- em seu favor o facto de se encontrar familiar e socialmente integrada tal como resulta do relatório social e das testemunhas de defesa.
Tudo ponderado, e não menosprezando o enfoque das razões de prevenção geral, uma vez que este tipo de criminalidade suscita alarme razoável na comunidade e que um comportamento de execução múltipla como foi o da arguida não pode passar impune, entende o Tribunal serem de aplicar à arguida as seguintes penas:
- por cada um dos oito crimes de furto hiperqualificado, previsto e punido pelos artigos, 203º n.º 1 e 204º n.º 2, ambos do Código Penal, aplica-se a pena de dois anos e nove meses de prisão;
- por cada um dois crimes de furto hiperqualificado, previstos e punidos pelo artigo 204.º, n.º 2, mas em que houve restituição nos termos do art. 206º e 73 do Código Penal, aplica-se a pena de um ano de prisão”.

A arguida BB invoca como circunstâncias a atender na medida das penas parcelares a aplicar a sua idade, a sua condição social, económica, e cultural, a sua modesta formação, os seus fracos recursos económicos, sem perder de vista o seu grau de culpa e o grau de ilicitude dos factos por si cometidos (art.º 40º nº 1, e nº 2 e art. 71º, nº 1, ambos do Cód. Penal), e conclui que, face às necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir, e procedendo-se à formulação de um juízo de equidade, deverá ser condenada em penas parcelares que não devem ultrapassar o seu limite mínimo legal.

Apreciemos:

O art. 204º, nº 1, als. d) e h), e nº 2, al. g), do Cod. Penal estipula que ao crime de furto qualificado corresponde a pena abstracta de 2 a 8 anos de prisão.

A aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º, nº 1, do Cod. Penal), sendo que as exigências de prevenção geral constituem uma finalidade de primordial importância nos casos dos crimes de homicídio.

A determinação da medida da pena, dentro dos limites fixados na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, sendo que, em caso algum, a pena pode ultrapassar a medida da culpa, sendo esta vista enquanto juízo de censura em face do desvalor da acção praticada (arts. 40º e 71º, ambos do Código Penal).

Na determinação concreta da medida da pena, como impõe o art. 71º, nº 2, do Código Penal, o tribunal tem de atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depõem a favor do agente ou contra ele, designadamente as que a título exemplificativo estão enumeradas naquele preceito, bem como as exigências de prevenção que, no caso, se façam sentir, incluindo-se tanto as exigências de prevenção geral como as exigências de prevenção especial.

E, enquanto as exigências de prevenção geral se cingem ao restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime e que deverão corresponder ao indispensável para a estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, as exigências de prevenção especial visam a reintegração do arguido na sociedade (prevenção especial positiva) e dissuadi-lo da prática de futuros crimes (prevenção especial negativa), daí que a medida das necessidades da sua socialização deva ser, em princípio, o critério decisivo para efeito de medida da pena a aplicar.

Conforme salienta o Prof. Figueiredo Dias [41], a propósito do critério da prevenção geral positiva, “A necessidade de tutela dos bens jurídicos – cuja medida ótima, relembre-se, não tem de coincidir sempre com a medida culpa – não é dada como um ponto exato da pena, mas como uma espécie de «moldura de prevenção»; a moldura cujo máximo é constituído pelo ponto mais alto consentido pela culpa do caso e cujo mínimo resulta do «quantum» da pena imprescindível, também no caso concreto, à tutela dos bens jurídicos e das expectativas comunitárias. É esta medida mínima da moldura de prevenção que merece o nome de defesa do ordenamento jurídico. Uma tal medida em nada pode ser influenciada por considerações, seja de culpa, seja de prevenção especial. Decisivo só pode ser o quantum da pena indispensável para se não ponham irremediavelmente em causa a crença da comunidade na validade de uma norma e, por essa via, os sentimentos de confiança e de segurança dos cidadãos nas instituições jurídico-penal”.

E, relativamente ao critério da prevenção especial, escreve o Prof. Figueiredo Dias que: “Dentro da «moldura de prevenção acabada de referir atuam irrestritamente as finalidades de prevenção especial. Isto significa que devem aqui ser valorados todos os fatores de medida da pena relevantes para qualquer uma das funções que o pensamento da prevenção especial realiza, seja a função primordial de socialização, seja qualquer uma das funções subordinadas de advertência individual ou de segurança ou inocuização[42] .

No caso, estamos perante a prática de 13 crimes de furto qualificado, que incidiram sobre pessoas idosas e vulneráveis, alguma delas que ficaram sem as suas reformas de montantes entre os € 300,00 e os € 450,00, sendo que a frequência deste tipo de criminalidade (sobretudo nos centros urbanos onde muita da população envelhecida vive sozinha e cresce a cada ano) e o alarme que gera junto da população, demanda elevadas necessidades de prevenção geral.

Com efeito, a necessidade comunitária de afirmação das normas jurídicas violadas, dando corpo à vertente da protecção de bens jurídicos (finalidade primeira da punição), faz-se especialmente sentir neste tipo de crimes que justificam uma resposta punitiva, dada a perturbação que causam na vida quotidiana dos cidadãos, com os consequentes sentimentos de insegurança que geram, sendo abundantes as noticias da sua prática, não apenas na rua como também em estabelecimentos comerciais, sendo a maior parte das vitimas pessoas idosas que face à sua vulnerabilidade acabam por ser um alvo fácil para os carteiristas, que com a sua actuação põem em causa a segurança do país.

Também as necessidades de prevenção especial são elevadas, tendo as arguidas AA e BB, agido sempre com dolo directo e intenso em todos os crimes de furto cometidos, demonstraram uma acentuada insensibilidade e desrespeito para com a idade e a vulnerabilidade das vitimas, não revelaram qualquer tipo de arrependimento e de consciência critica perante este seu comportamento, que se prolongou entre os meses de Outubro de 2019 a Março de 2021, e do qual fizeram um modo de vida, apropriando-se de montantes em numerário que ascenderam pelo menos a € 6.215,00, que utilizaram para a compra de bens.

Ora, os factos cometidos pelas arguidas AA e BB, e todas as atitudes assumidas determinam um especial grau de culpa determinante para o quantum da pena a aplicar por cada um dos furtos cometidos.

Com efeito, os factos praticados pelas arguidas AA e BB, demonstram um comportamento ilícito grave, com completa indiferença perante a pessoa das vítimas, sendo que os seus comportamentos demandam fortes exigências de prevenção especial.

O modo de actuação das arguidas AA e BB, ao sinalizar previamente as vítimas esperando-as à saída das instituições bancárias, algumas delas que tinham acabado de levantar as suas reformas, ou seguindo-as para posteriormente lhes retirarem a carteira aproveitando os momentos em que as mesmas estavam distraídas ou rodeando-as de forma a limitar os seus movimentos para melhor lograr obter os seus intentos, revela da parte destas uma total insensibilidade para com pessoas frágeis e indefesas.

No caso, estamos perante a prática de 8 crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, punidos com pena de prisão de 2 a 8 anos, e perante a prática de 3 crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, mas em que houve restituição (arts. 206º, nº 2, e 73º do Cod. Penal), punidos com pena de prisão de 1 mês até 5 anos e 4 meses.

A arguida AA foi condenada pela prática em concurso real, e na forma consumada, de 8 crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, na pena de 3 anos de prisão, por cada um dos crimes, e foi condenada pela prática de 3 crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, mas em que houve restituição (arts. 206º, nº 2, e 73º do Cod. Penal), na pena de 1 ano e 3 meses de prisão.

Por seu lado, a arguida BB foi condenada pela prática em concurso real, e na forma consumada de 8 crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, na pena de 2 anos e 9 meses de prisão, por cada um dos crimes, e foi condenada pela prática de 3 crimes de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, als. d), e h), e nº 2, al. g), ambos do Cod. Penal, mas em que houve restituição (arts. 206º, nº 2, e 73º do Cod. Penal), na pena de 1 ano de prisão por cada um dos crimes.

Ora, a natureza dos factos praticados pelas arguidas AA e BB, demanda já acentuadas necessidades de prevenção especial de ressocialização, sublinhando-se as atitudes desvaliosas das suas condutas ao nível da culpa, cometeram furtos visando pessoas com poucas posses, algumas delas que acabavam de levantar as suas reformas, entre os € 300,00 e os € 450,00, obtendo dinheiro de um modo fácil e rápido para a satisfação das suas necessidades, numa total ausência de valores, denotando uma audácia e ousadia e uma absoluta insensibilidade para com o património alheio, factores que não podem deixar de interferir na medida das penas parcelares.

Assim, tendo em conta a moldura penal aplicável a cada um dos 13 crimes de furto cometidos pelas arguidas AA e BB, entende-se que as penas parcelares que lhes foram aplicadas mostram-se justas e adequadas, sendo que a sua redução iria comprometer a crença da comunidade na validade das normas jurídicas violadas, não sendo comunitariamente suportável aplicar penas inferiores àquelas que foram impostas pela 1ª Instância.

Termos em que os recursos interpostos pelas arguidas AA e BB, também improcedem nesta parte

4. Da medida da pena única e da suspensão da sua execução.

Relativamente à medida da pena única aplicada à arguida AA, o acórdão recorrido fez constar que[43]:
Encontradas as diversas penas parcelares, cumpre de imediato proceder à determinação da pena única atendendo aos factos e à personalidade do agente e considerando os limites do n.º 2 do art. 77º do C. Penal.
Considerando os limites do art. 77º, n.º 2 do Código Penal, e tendo em conta a necessidade de fixar uma pena única, cfr. art. n.º 1 do mesmo preceito legal, encontrada em função das exigências gerais de culpa e prevenção, deve considerar-se a conduta global da arguida AA, à sua desinserção profissional, ao desconhecimento de projecto de vida, à não assunção dos factos e das respectivas consequências e consciência crítica do seu comportamento, à existência de antecedentes criminais, e fundamentalmente às prementes razões de prevenção geral inerentes aos crimes patrimoniais praticados, que são muito intensas atento o alarme social que desencadeiam e a frequência com que ocorrem.
Assim, na moldura de conjunto entre três anos (limite mínimo) e vinte e cinco anos, (limite máximo que decorre dos art. 41º, n.º 2 e 77º, n.º 2 ambos do C. Penal) considera-se justa, adequada e proporcional a pena única de seis anos de prisão”.

E, relativamente à medida da pena única aplicada à arguida BB, o acórdão recorrido fez constar que:
Encontradas as penas parcelares, e na moldura de conjunto entre dois anos e nove meses (limite mínimo) e vinte e cinco anos, (limite máximo que decorre dos art. 41º, n.º 2 e 77º, n.º 2 ambos do C. Penal) considera-se justa, adequada e proporcional a pena única de cinco anos e seis meses de prisão”.

A arguida AA alega que deverá ser condenada numa pena única que nunca deverá exceder os 5 anos de prisão, por este quantum se mostrar suficiente para assegurar as exigências de prevenção geral e especial, e ser suspensa na sua execução.

A arguida BB também alega que a pena única aplicada em cúmulo jurídico não deverá exceder os 5 anos de prisão e também deverá ser suspensa na sua execução.

Apreciemos:

O Ac. STJ de 27/01/2016[44], diz-nos, que “(…) fundamental na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação «desse bocado de vida criminosa com a personalidade». A pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares. Para a determinação da dimensão da pena conjunta o decisivo é que, antes do mais, se obtenha uma visão conjunta dos factos pois que a relação dos diversos factos entre si em especial o seu contexto; a maior ou menor autonomia a frequência da comissão dos delitos; a diversidade ou igualdade dos bens jurídicos protegidos violados e a forma de comissão bem como o peso conjunto das circunstâncias de facto sujeitas a julgamento mas também a recetividade à pena pelo agente deve ser objeto de nova discussão perante o concurso ou seja a sua culpa com referência ao acontecer conjunto da mesma forma que circunstâncias pessoais, como por exemplo uma eventual possível tendência criminosa (…)”.

E, o Ac. STJ de 14/09/2016[45], refere no seu sumário que: “II - A determinação da pena do concurso exige um exame crítico de ponderação conjunta sobre a conexão e interligação entre todos os factos praticados e a personalidade do seu autor, em ordem a adequar a medida da pena à personalidade que se revelou em toda a factualidade.
III - Na elaboração da pena conjunta impõe-se fazer uma nova reflexão sobre os factos em concurso e em conjunto com a personalidade do arguido, em ordem a adequar a medida da pena à personalidade que nos factos se revelou, às suas actuais condições pessoais, familiares e sociais na ponderação das exigências de prevenção especial de socialização que se fazem sentir (…)”.

Assim, os factos relevantes para a determinação da pena conjunta deverão resultar de uma visão global sobre as circunstâncias que determinaram a actividade criminosa, traçando-se um quadro de interconexão entre os diversos ilícitos cometidos, e a personalidade de quem os cometeu, de forma a apurar se existe uma propensão para o crime, ou se estamos perante um conjunto de eventos criminosos episódicos.

Na determinação da medida da pena única há que ponderar todo o circunstancialismo concreto apurado nos autos, designadamente o período de tempo em que decorreu a actividade criminosa das arguidas, o valor das quantias apropriadas, a idade e a vulnerabilidade das vitimas, e recorrer ao princípio da proporcionalidade, de modo a não aplicar uma pena única superior àquela que é exigida para reafirmar a estabilização dos bens jurídicos ofendidos, face à culpa suportada, à medida da sua vontade, à persistência e gravidade da sua conduta global e à personalidade algo frágil que evidencia.

No caso, no que toca à imagem global dos factos cometidos pelas arguidas AA e BB, estamos perante uma conduta consubstanciada pela prática de 13 crimes de furto, entre os meses de Outubro de 2019 a Março de 2021, tendo as arguidas feito da mesma um modo de vida, agindo em bando organizado para o efeito, tendo como alvo pessoas idosas, entre os 70 e os 92 anos de idade, retirando de algumas delas reformas entre os € 300,00 e os € 450,00[46], e obtendo de um modo fácil e rápido dinheiro para a satisfação das suas necessidades, que ascendeu pelo menos a € 6.215,00, tendo ambas já sofrido condenações pela prática de crimes contra o património[47].

As arguidas AA e BB também não assumiram a responsabilização pelos factos cometidos e usaram de condutas desvaliosas (aproveitaram a idade avançada das vítimas, abordaram-nas à saída das instituições bancárias ou em estabelecimentos comerciais, quando estas se encontravam distraídas ou ocupadas a fazer alguma compra) para lhes retirarem de uma forma fácil a carteira sabendo de antemão que estas tinham ido levantar as suas reformas.

Todas estas circunstâncias terão de ser atendidas para a determinação da pena única a aplicar às arguidas AA e BB, não se verificando a existência de uma qualquer circunstância atenuante, e considerando-se até que a globalidade de toda a sua conduta já revela uma inclinação para a prática de crimes (cometeram 13 crimes de furto entre os meses de Outubro de 2019 a Março de 2021, tendo como vitimas pessoas idosas que tinham acabado de levantar dinheiro, ou seja, cometeram em média um crime de furto por mês, organizando-se de forma a que esta sua actividade constituísse um seu modo de vida, contando com os valores monetários que conseguiam arranjar para comprar bens), uma vez que não se mostra provado documentalmente que as mesmas desenvolvessem alguma actividade profissional.

A censurabilidade ético-jurídica global é elevada, tendo as arguidas sempre agido com dolo directo e persistente, indiferentes à situação em que colocaram as vítimas, o que demanda a aplicação de uma pena única que respeite os limites traçados pela prevenção geral de integração e pela culpa, e que seja suficiente e adequada a adverti-las séria e fortemente, instando-as a reflectir sobre o seu comportamento futuro, permitindo-lhes ao mesmo tempo a sua reintegração na comunidade, podendo afirmar-se que caso não tivessem sido detidas certamente continuariam a praticar crimes, dada a ausência de quaisquer hábitos de trabalho sublinhando-se também que as suas condenações anteriores não foram suficientes para as afastarem da prática de novos crimes.

A moldura penal abstracta dos crimes em concurso, decorrente dos arts. 41º, nº 2, e 77º, nº 2, ambos do Cod. Penal, situa-se entre os 3 anos (limite mínimo) e 25 anos (limite máximo) para a arguida AA, tendo-lhe sido aplicada a pena única de 6 anos de prisão, e entre os 2 anos e 9 meses (limite mínimo) e os 25 anos, (limite máximo), para a arguida BB, tendo-lhe sido aplicada a pena única de 5 anos e 6 meses de prisão.

Posto isto, face à natureza dos ilícitos cometidos, à intensidade do dolo, às elevadas necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir (crimes que geram instabilidade social cometidos contra pessoas especialmente vulneráveis praticados por quem evidenciou ter sérias dificuldades em pautar a sua conduta segundo os valores jurídicos), e à moldura penal abstracta do concurso dos crimes entende-se justas e adequadas as penas únicas de prisão aplicadas, as quais não afrontam os princípios da necessidade, da proibição do excesso, e da proporcionalidade das penas, nem ultrapassam a medida das suas culpas, revelando-se equilibradas e proporcionais à defesa do ordenamento jurídico.

Caberá por último apurar se se verificam os pressupostos da suspensão da execução das penas únicas aplicadas às arguidas AA e BB.

Os pressupostos da suspensão da execução da pena vêm enunciados no art. 50º, nº 1, do Cod. Penal que refere que “O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

Assim, o pressuposto formal de aplicação da suspensão da execução da prisão determina que a medida concreta da pena aplicada não possa ser superior a 5 anos. O pressuposto material da suspensão da execução da pena de prisão determina que o Tribunal conclua por um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da prisão possam realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

No caso, o pressuposto da suspensão das penas de prisão pretendida por ambas as arguidas AA e BB, era a redução das penas de prisão em que foram condenadas para medida não superior a 5 anos.

Atendendo a que as arguidas AA e BB foram condenadas em penas únicas de prisão superiores a 5 anos não se mostra verificado o pressuposto formal de aplicação da suspensão da execução da prisão, ficando assim prejudicada a necessidade de apuramento de existência do pressuposto material desta pena de substituição não detentiva.

Pelo que não procedem igualmente nesta parte os recursos apresentados pelas arguidas AA e BB.

III - Decisão

Pelo exposto, acordam na 5ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:

- Negar provimento aos recursos interpostos pelas arguidas AA e BB.
- Condenar as arguidas AA e BB em custas, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC´s para cada uma delas.


Supremo Tribunal de Justiça, 19 de Maio de 2022
(Processado em computador e revisto pela relatora (art. 94º, nº 2, do Cod. Proc. Penal)


Adelaide Sequeira (Relatora)

Maria do Carmo Silva Dias

Eduardo Loureiro


__________________________________________________


[1] Que foi condenado pela prática de um crime de furto qualificado, p. p. pelos arts. 203º, nº 1, e 204º, nº 1, al. d), ambos do Cod. Penal, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova (arts. 50º e 53º do Cod. Penal), com obrigação de pagar o valor de €250,00 à lesada GG (art. 51º, nº 1 al. a) do Cod. Penal.
[2] Transcrição sem negritos nem sublinhados
[3] Transcrição do texto sem negritos nem sublinhados.
[4] Cfr. Ac. STJ de 09/10/2019, in Proc. nº 3145/17.4JAPRT.S1, Relator Cons. Raúl Borges
[5] Não contendo esta Lei nº 94/2021, qualquer norma transitória que contemple a sua aplicação no tempo, as questões relativas às regras de interposição de recurso interposto de decisão proferida pélo tribunal colectivo em 1.ª Instância para o STJ, devem ser resolvidas à luz do disposto no art. 5º do Cod. Proc. Penal, que regula a aplicação da lei processual penal no tempo, e que refere que a nova lei não é de aplicação imediata nos processos iniciados anteriormente à sua vigência se daí resultar um agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido ou uma quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo.
[6] O Sr. Procurator-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal de Justiça questionou da eventual competência deste Supremo Tribunal para o conhecimento dos recursos, na medida em que as arguidas invocam certos vícios para impugnarem a matéria de facto considerada provada. Contudo, à luz da actual redacção do art. 434º do Cod. Proc. Penal, iremos apreciar esta questão suscitada pela arguida BB.
[7] Proc. nº 658/17.1PZLSB.L1.S1.
[8] Tendo presente que o princípio in dubio pro reo é um princípio jurídico atinente à avaliação e à valoração dos meios de prova utilizados para fundamentar uma incriminação.

[9] Transcrição pag. 18 a 28 do acórdão recorrido.
[10] À excepção da situação do Proc. nº 16/21 onde não foi possível aceder às imagens em audiência de julgamento, face à danificação do suporte informático, mas foi suficiente o depoimento do agente policial que interveio após a situação delituosa conseguindo recuperar o valor retirado à vitima KK após intercepção das duas arguidas.
[11] Ac. STJ, de 23/07/1999, Proc. nº 650/98, acessível em SASTJ, nº 32, 87.
[12] Cfr. Ac. TC nº 137/2001 de 28 de Março
[13] Cfr. entre outros, o Ac. STJ de 16/06/2005, Proc. nº 553/05-5ª. SASTJ, nº 92, 114, e mais recentemente, o Ac. STJ de 06/11/2019, Proc. nº 868/16.9PRPRT.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[14] Neste sentido Ac. STJ de 03/03/2010, onde se entende que o reconhecimento de um arguido na audiência de julgamento constitui prova testemunhal e não prova por reconhecimento. Também o Ac. TC nº425/2005, Proc. 425/05, distingue o reconhecimento propriamente dito, do impropriamente designado reconhecimento, que não passa de “uma atribuição dos factos expostos no depoimento da testemunha a certa pessoa ou pessoas” e submete este às regras de apreciação da prova testemunhal e aquele à disciplina do art. 147 do Cod. Proc. Penal.
[15] Crf. Ac. STJ de 06/11/2019, Proc. nº 868/16.9PRPRT.P1.S1, e comentário ao art. 355 do Cod. Proc. Penal, in Código de Processo Penal Comentado 3ª Edição Revista, Almedina, pag. 1089, onde se lê que: “1. A redacção dada ao nº 2 foi alterada pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, sendo agora valorável, para além da prova resultante de actos processuais cuja leitura é permitida nos termos dos artigos 356º e 357º, a prova resultante de actos processuais cuja visualização ou audição também é permitida nos termos daqueles preceitos”
[16] Proc. nº 452/05, in DR nº 195, II Série, de 11/10/2005, pp. 14574 a 14579.
[17] Refira-se que as proibições de prova dão lugar a provas nulas, face ao disposto no art. 32º, nº 8, da Constituição.
[18] Transcrição pag. 29, 30, 31, e 32 sem negritos nem sublinhados.
[19] Paulo Pinto de Albuquerque, “Comentário do Código Penal”, 3.ª edição actualizada, 2015, em anotação ao art. 204º, 11, pág. 803.
[20] Cfr. 2º § pag. 31.
[21] À excepção da ofendida NN que tinha 68 anos de idade- NUIPC 32/21... (ponto 15 dos factos provados).
[22] Proc. nº 90/17.7GBFND.C2.S1, 5ª Secção Criminal, acessível em www.dgsi.pt
[23] Código Penal Anotado e Comentado, Legislação Conexa e Complementar, Quid Juris, Sociedade Editora, Lisboa, 2008, p. 543.
[24] Comentário do Código Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2008, p. 560,
[25] Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo II, Coimbra Editora, 1999, pp. 70 e ss, em anotação ao art. 204.º, n.º 1, al. h), do Cod. Penal.
[26] Cfr. o já citado Ac. STJ de 13/01/2022, Proc. nº 90/17.7GBFND.C2.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[27] Cfr. 3º § pag. 32.
[28] Consta do relatório social da arguida AA que esta se dedicava à venda ambulante nos mercados de ... e de ..., e que exercia funções de limpeza a tempo parcial na empresa “C..., Lda.” onde auferia a quantia mensal de € 270,00 – cfr. ponto 31 da fundamentação do acórdão recorrido.
[29] In, Comentário Conimbricense ao Código Penal, II, pág. 353.
[30] In Comentário do Código Penal, 3ª ed., pág. 807 e citado no Ac. STJ de 14/07/2021, Proc. nº 4171/17.9T9CBR.C1.S1 acessível em www.dgsi.pt.
[31] Cfr. o já citado Ac. do STJ de 27/05/2010, que indica, neste sentido, os Acs. do STJ de 11/12/2003 (relatado pelo Cons. Carmona da Mota), de 04/06/2002 (relatado pelo Cons. Lourenço Martins), e de 06/11/2003 (relatado pelo Cons. Pereira Madeira), onde se define “bando” como “uma atuação plural e voluntária com vista à prática de crime ou crimes, em que cada agente não tem consciência e (ou) intenção de pertença a um ente coletivo com personalidade distinta da sua e objetivos próprios – o que permite afastar a figura da associação criminosa típica – mas em que os diversos «colaboradores», inseridos numa orgânica ainda incipiente, reconhecem, todavia, a existência de uma liderança de facto a que se subordinam – o que permite, por seu lado, distinguir a figura da simples coautoria” (in www.dgsi.pt).
[32] Proc. nº 101/11.0PAVNO.S1 acessível em www.dgsi.pt
[33] Neste sentido, também o Ac. STJ de 14-07-2021, Proc. nº 4171/17.9T9CBR.C1.S1 acessível em www.dgsi.pt
[34] Transcrição da pag. 33 e 1º § da pag. 34.
[35] À excepção da ofendida NN que tinha 68 anos de idade- NUIPC 32/21... (ponto 15 dos factos provados).
[36] Cfr. circunstâncias ocorridas em 09/10/2020, 14/10/2020, 08/01/2021 e 14/01/2021.
[37] A desistência de queixa só é admitida perante a prática de um crime de furto simples- cfr. art. 203º, nº 3, do Cod. Penal.
[38] Transcrição pags. 37, 38, e 42 do acórdão recorrido.
[39] Trancrição pag. 43 do acórdão recorrido.
[40] Transcrição pag. 44 do acórdão recorrido
[41] Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Ed. Notícias, pág., 241-244.
[42] Também citado e referenciado no Ac. STJ de 20/05/2020, in Proc. nº 404/17.0GBMFR.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[43] Transcrição pag. 43 do acórdão recorido
[44] Proc. nº 178/12.0PAPBL.S2, acessível em www.dgsi.pt.
[45] Proc. nº 3/12.2GAAMT-D.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[46] Cfr. NUIPC 282/20..., NUIPC 1534/20…, NUIPC 14/21…, NUIPC 32/21….
[47] A arguida AA foi condenada: na pena de 2 anos de prisão efectiva, pela prática de crimes de furto e de burla informática - Proc. nº 955/06…; na pena de 22 meses prisão, suspensa por igual período com regime de prova, - Proc. nº 938/10…., por crimes de furto e burla informática, em que a irmã é coarguida; na pena de 6 meses de prisão, em regime de permanência na habitação - Proc. nº 332/17…, e também foi acusada Proc. nº 48/14…, em coautoria, de crimes contra a propriedade.
A arguida BB foi condenada na pena de 22 meses de prisão, suspensa por igual período com regime de prova, - Proc. nº 938/10.., por crimes de furto e burla informática, em que a irmã, AA, é sua coarguida, e também foi condenada em pena de multa substituída por 79 horas de prestação de trabalho comunitário no Proc. nº 206/15…, pela prática de um crime de furto.