Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00027245 | ||
Relator: | TORRES PAULO | ||
Descritores: | DANOS MORAIS RESSARCIMENTO DIREITO DAS OBRIGAÇÕES EXERCÍCIO DE DIREITO ABUSO DO DIREITO | ||
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Nº do Documento: | SJ199503210868351 | ||
Data do Acordão: | 03/21/1995 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | BMJ N445 ANO1995 PAG487 | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 6873/94 | ||
Data: | 09/22/1994 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Área Temática: | DIR CIV - DIR CONTRAT. | ||
Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 496 N1 ARTIGO 798 ARTIGO 804 N1. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ DE 1981/01/30 IN BMJ N313 PAG212. ACÓRDÃO STJ DE 1974/06/04 IN BMJ N238 PAG204. | ||
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Sumário : | I - É hoje princípio geral de direito comunitário a ressarcibilidade do dano não patrimonial em sede obrigacional. II - Será abusivo o comportamento que pretende ser exercício de um direito quando - não constituindo tal exercício, mesmo em abstracto, uma vantagem objectiva - se revela resultar dele, em concreto, uma desvantagem para terceiro. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1 - No 9. Juízo Criminal da Comarca de Lisboa, A e B accionaram Somundi - Sociedade Turística do Algarve, Limitada, atinente a obter a sua condenação no pagamento de indemnização de 2250000 escudos, por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescido de juros à taxa legal, pelos prejuízos emergentes de contrato de compra e venda de parcela de terreno não cumprido por culpa da Ré. A Ré, devidamente citada, contestou por excepção e por impugnação. A excepção foi julgada improcedente, no saneador. Por sentença folhas 138 a 140 a acção foi julgada improcedente. Em apelação o Acórdão da Relação de Lisboa folhas 170 a 176 revogando, parcialmente, a sentença, condenou a Ré a pagar aos Autores. a) A indemnização de 1000000 escudos por danos não patrimoniais, acrescidos de juros vincendos à taxa legal de 15 porcento. b) A indemnização por danos patrimoniais, que vier a apurar-se em execução de sentença. Daí a presente revista. 2 - A Ré recorrente nas suas alegações conclui: a) Os Autores não provaram os factos constitutivos do seu direito. b) Nomeadamente não provaram a delimitação temporal de situação lesiva. c) Desde 1984 até 1991 mantiveram-se inertes. d) Sendo que a inércia de direitos quando geradora de expectativas constitui abuso de direito - artigo 334 do Código Civil. e) A fixação dos danos não patrimoniais em 1000000 escudos sendo os padrões de equidade praticados. Pelo que deve o douto Acórdão recorrido ser revogado estabelecendo-se a sentença da 1. instância. Os Autores não contra-alegaram. 3 - Corridos os vistos, cumpre decidir. 4 - Está provado pela Relação: a) Por contrato-promessa celebrado em 1 de Junho de 1982, a Ré prometeu vender aos Autores, e estes prometeram comprar, uma parte de terreno no empreendimento turístico denominado "Vale da Telha", sito em Aljezur, Algarve, descrita na Conservatória do Registo Predial de Lagos sob o n. 3/33, folhas 180/verso do B8 e inscrita na respectiva matriz predial sob o n. 4346- Alínea A) da especificação. b) A aludida parcela tem o n. 15 do sector BL e área aproximada de 660 metros quadrados - Alínea B) da especificação. c) Por escritura pública celebrada no 22. Cartório Notarial de Lisboa, e em cumprimento do estipulado no contrato promessa, os Autores adquiriram, pelo preço de 561000 escudos a aludida parcela de terreno - Alínea C) da especificação. d) A Ré reafirma, quando de celebração da escritura em 8 de Março de 1984 que as "infraestruturas inerentes ao mesmo empreendimento seriam de integral responsabilidade da Ré" - resposta ao quesito 1. e) Ficou acordado que cabia à Ré a efectivação da rede de esgotos, luz e água, a abertura de acesso e demais infraestreturas inerentes ao empreendimento - resposta ao quesito 2. f) Os Autores haviam adquirido aquela parcela no intuito de ali poderem desfrutar de habitação durante os seus períodos de férias - resposta ao quesito 4. g) A realização por parte da Ré das alegadas infraestruturas constituiu para os Autores pressuposto determinante da compra e venda do terreno - resposta ao quesito 5. h) Os Autores deixaram de utilizar a habitação edificada na parcela de terreno que adquiriram à Ré, por falta de água, luz, electricidade e estrada de acesso - resposta ao quesito 3. i) Durante os períodos de férias, os Autores utilizaram, juntamente com as suas famílias, os serviços de unidades hoteleiras existentes na região - resposta ao quesito 6. j) Utilização que tem acarretado prejuízo - resposta ao quesito 7. l) Os Autores sentem preocupação e angústia por causa da inexistência das infraestruturas - resposta ao quesito 9. m) Pela mesma razão sentem os Autores também incómodo e desgosto - resposta ao quesito 10. n) O valor comercial da parcela adquirida pelos Autores diminuiu por inexistência das alegadas infraestruturas - resposta ao quesito 8. o) O plano de moradias previa a instalação, por parte dos proprietários das mesmas, de fossas assépticas individuais, apenas em zonas onde existiam furos artesianos - resposta ao quesito 11. p) O empreendimento possui fornecimento de água, e luz em cerca de 90 porcento do empreendimento, salvo nos sectores (1 ou 2 lotes) onde as vendas se encontram atrasadas - resposta ao quesito 12. q) O empreendimento possui, também, uma rede mínima de vias de circulação, 10 porcento das quais não estão ainda alcatroadas - resposta ao quesito 13. r) E 90 porcento dos restantes compradores ali têm vivido - resposta ao quesito 14. 5 - Na sentença da 1. instância concluiu-se, página 140 "vale isto dizer que a parcela adquirida pelos Autores possui água e luz". Só que a Relação, atentas as respostas dadas aos quesitos 3, 6, 7, 8, 9 e 10, considerando tal entendimento inaceitável, concluiu, a fls. 173/verso e 174 "inequivocamente que a parcela de terreno dos autores e na qual estes edificaram uma moradia não possui as infraestruturas atrás referidas e cuja afectivação era da responsabilidade da Ré". Assente, como está, definitivamente esta matéria, impõe-se concluir que os Autores provaram os factos constitutivos do seu direito, ao contrário da conclusão primeira da recorrente. 6 - Se dúvidas não há quanto aos danos patrimoniais, problemas já se levantam quanto aos danos não patrimoniais. A começar pela sua ressarcibilidade em sede de responsabilidade contratual - sobre os autores estrangeiros que mais recentemente se tem debruçado sobre o tema: Dr. Sinde Monteiro, Responsabilidade por Conselhos, Página 192, nota 46. A tese negativa subscrita pelo Professor A. Varela - Obrigações, volume I, 4. edição Página 531 e volume II, 3. edição, Página 103 e pelos Professor P. Lima e A. Varela, Anotado, I, Página 501, anotação 8, ao artigo 496, assenta nos seguintes argumentos: a) O artigo 760 do projecto do Professor Vaz Serra, que continha redacção idêntica ao actual artigo 496 n. 1, foi suprimido na revisão ministerial. b) Daí que à imagem do artigo 253 do Código Civil Alemão "Por causa de um dano não patrimonial, só pode exigir-se indemnização em dinheiro nos casos determinados por lei" e do artigo 2859 do Código Civil Italiano "o dano não patrimonial deve ser ressarcido apenas nos casos determinados por lei", tal deverá ser a melhor posição. c) Tudo para proteger a liberdade de comércio jurídico, que vê o incumprimento assim prévia e eficazmente fixado. Esta tese tem o contra de assentar no elemento histórico de interpretação - trabalhos preparatórios, na sequência de Saviguy, mas hoje - artigo 9 n. 1 do Código Civil - de reduzissima importância. A reversibilidade deste argumento assenta no facto de na revisão ministerial, ao suprimir-se o artigo do projecto, querer tão somente reportar-se para a doutrina ou jurisprudência a indicação de solução, se é que ela não estivesse já contida noutras disposições. Por outro lado há que convir que na própria Alemanha vários autores hoje propõem a sua ressarcibilidade, no âmbito da reforma do B.G.B. (Dr. Calvão da Silva, Responsabilidade civil do Produtor, Página 688, nota 2). Taxatividade que veria a sua rigidez atenuada para os casos em que houvesse "perda de alegria de viver" - Larenz - Direito Obg., volume I, Página 194 e volume II, Página 639 e 642. Mas muito principalmente segurança e certeza não são hoje os valores supremos do direito. A segurança será recebida pelo direito naquilo que se considerar justo e que sirva de garantia dos fins a uma sociedade em mutação. O direito só deve proporcionar, pois, a segurança no justo. Daí que a tese afirmativa tenha sufragado a grande maioria da doutrina nacional; P. Coelho, Obg. Página 158; Galvão Teles, obg. Página 383 e 384, A. Costa, Obg. Página 396; Vaz Serra, Rev. Leg. Jur. ano 108, Página 222, Calvão da Silva, obra citada e Sinde Monteiro, obra citada. No que é acompanhada pela jurisprudência, através da aplicação analógica da regra inserta no artigo 496 n. 1 - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Janeiro de 1981, Boletim 313 Página 212 ou sequer sem justificar - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 1974, Boletim 238, Página 204. O próprio Acórdão recorrido navega nestas águas, ondulação que o recorrente aceita pacificamente por não levantar qualquer problema. Dir-se-à, no entanto, que se nos afigura incorrecta a utilização do argumento por analogia pela simples razão de que existem disposições próprias: artigos 798 e 804 n. 1, onde se declara que o devedor é responsável pelos prejuízos ou danos causados, sem qualquer limitação, pelo que os não patrimoniais têm aí a sua protecção legal. Aquém de tudo isto a tradição impera: o direito romano consagrava a reparação do dano moral frente a uma inexecução do contrato e as Ordenações mandavam expressamente atender ao valor da afeição. Por isso, em face do estatuído no artigo 2833 do Código Civil de 1967, com excepção de Manuel de Andrade, a nossa doutrina ensinava pela pela voz de Professor Gomes da Silva, o dever de prestar o dever de indemnizar "significa aquela disposição da lei que o simples desgosto que acompanha na generalidade dos casos, qualquer violação do direito não é suficiente para constituir dano moral; se, todavia, a ofensa a um direito adquirido for cometida em circunstâncias de tal gravidade, que a própria personalidade moral seja atingida, está preenchida a condição exigida pelo código e existe, portanto, dano moral.". É sabido que o actual Código Civil, na esteira do Alemão, preferiu a expressão dano não patrimonial, corrente também em Itália, por ser mais rigorosa e abrangente, pois para além dos danos morais (expressão da literatura francesa e código napoleónico que influenciou o nosso Código Civil de 1967) propriamente ditos - ofensa de bens ou valores de ordem moral - abraça também os danos estéticos e sofrimentos físicos. Para além de tudo isto, é hoje princípio geral de direito comunitário a ressarcibilidade do dano não patrimonial em sede obrigacional. 7 - Só que, há que ponderar. Se por um lado a violação ilícita de um direito de personalidade - artigo 70 do Código Civil - gere sempre responsabilidade extracontratual, este dever genérico de "neminem laedere" é absorvido se tal ofensa ocorrer em execução de um contrato: aqui há violação de deveres acessórios ligados à finalidade do contrato que tocam na protecção e cuidado da outra parte. É, pois, indiscutível a sua ressarcibilidade. Por outro lado o incumprimento do contrato, por si só, não justifica a ressarcibilidade do dano não patrimonial. A sua reparação justificar-se-à "quando a especial natureza de prestação o exija, ou quando as circunstâncias que acompanham a violação do contrato contribuam decisivamente para uma grave lesão de bens ou valores não patrimoniais" - Dr. Pinto Monteiro - Cláusulas Limitativas ... Páginas 88 e 89, em nota n. 164. Na conformação do conteúdo contratual há uma complementação recíproca da lei e da vontade das partes - Larenz I, Página 80. Há que atentar no jogo recíproco de vários princípios ordenadores para surpreender o fundamento objectivo do negócio jurídico. Vimos que o da segurança do tráfico era endeusado para recusar a ressarcibilidade do dano não patrimonial em sede contratual. Corrigimo-lo impondo a sua recepção pelo direito, como proporcionando a segurança no justo. Na hierarquia axicológica, princípios de autodeterminação, de equivalência das prestações e da força ética da fidelidade ao contrato, são-lhe superiores. Ou, no dizer do Professor A. Varela - Obg. I Página 231 - autonomia privada, confiança e justiça comutativa. É este quadro que estará sempre presente na análise de cada situação concreta a ser submetida a julgamento. Quadro que se projecta no n. 1 do artigo 496: "na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito". Paralelamente o artigo 49 do Código de Obrigações Suíço "...... à titre de réparation morale lorsque celle-ci est justifiée par la gravité particuliére des préjudice suli et de la faut". Não terão, assim, grande eco as hesitações formuladas pelo Professor Rui Alarcão, Obg. Página 210 e pelo Dr. Ribeiro Faria, volume I, 1987, Página 493. É que "tendo em conta a tendência crescente para a unificação das duas espécies de responsabilidade, não descortinamos razões ponderosas para não considerar a ressarcibilidade do dano não patrimonial um princípio geral aplicável também à responsabilidade contratual" - Calvão da Silva, obra citada, Página 688, nota 2. Avança hoje a ideia de que a responsabilidade civil constitui um todo: em Portugal; Pedro Albuquerque - ROA, 49, de 1989, Páginas 793 a 837; Menezes Cordeiro obg. volume II, 1986, Páginas 275 e 276; Em Espanha; Beltrán de Heredia y Onis, Incumplimiento de las obligacions, Madrid, 1990, Página 22; Em Itália: Franzoni: colpa e responsabilitá del delitore, Padua, 1988, Páginas 404 a 409; em França: André Tuna: la responsabilité civile, 2. ed., Paris, 1989, Páginas 41 e seguintes. Ela até é uma realidade jurídica: Código Civil de Seabra, aprovado em 1967, artigo 118, onde se verifica a regulamentação das duas responsabilidades, apresentando no capítulo seguinte regimes particulares. 8 - Aqui chegados voltemos aos factos. Os Autores compraram uma parcela de terreno em empreendimento turístico, para construírem casa para habitação. E construíram-na. A Ré vendedora comprometeu-se a criar as infraestruturas necessárias e indispensáveis à habitabilidade: água, luz, electricidade e estradas de acesso. A inexistência destas infraestruturas, impossibilitando a utilização da casa para habitação, causou aos Autores: preocupação, angustia, incómodo e desgosto. A natureza de prestação não contende, efectivamente, essencialmente com valores de ordem não patrimonial. Mas a provada inexistência daquelas infraestruturas da responsabilidade total da Ré é pura e simplesmente determinante de os Autores não conseguirem utilizar a casa para fins habitacionais. É inconcebível a situação que a Ré lhes criou: toda ela em manifesta violação dos princípios atrás focados. Tudo contribui decisivamente para a grave lesão dos valores não patrimoniais provados. Há, pois, que ressarcir os Autores. 9 - A igual conclusão chegaríamos se seguíssemos outro caminho: frente à matéria fáctica provada verifica-se que houve violação do princípio da pontualidade. Houve desconformidade entre o "ser" e o "dever ser", entre a prestação devida e a que foi realizada. Estamos perante um incumprimento inexacto ou imperfeito, ou "mau cumprimento" na terminologia alemã, ou ainda "má prestação" - Larenz. Dela resultaram danos extra rem: danos pessoais sofridos pelos Autores credores, que são indemnizáveis. A prevalência das regras de responsabilidade contratual em detrimento das da delitual assentes em três pressupostos: a) O contrato estabelece, entre as partes, mútuos deveres de protecção, mais intensos do que em relação a terceiros. b) O princípio da autonomia implica que as partes afastaram as regras da responsabilidade extracontratual. c) O credor tem interesse em não recorrer às regras da responsabilidade aquiliana, dado que a responsabilidade contratual impõe um regime mais gravoso para o lesante-devedor. Não nos interessa aqui esta luta de prevalência - ver Dr. Pedro Romano Martinez, Cumprimento defeituoso, 1994, Páginas 271 a 288 - crítica e contra crítica. Parece-nos que a responsabilidade contratual só abrange os danos que se encontram no âmbito do sinalagma: "não abrange os danos extra sem, na medida em que eles estão para além do interesse no cumprimento" - P. Martiny, obra citada, Página 288. Seria uma solução pautada pela subsunção às regras de responsabilidade extracontratual ou contratual, conforme a prevalência a seguir, mas com as mesmas consequências das atrás focadas, como se começou por dizer. 10 - A Relação fixou a indemnização em 1000000 escudos, equitativamente. Nada há a censurar dentro dos critérios traçados pelo artigo 494. 11 - Dado que os Autores ficaram inertes de 1984 a 1991, na versão da recorrente, pretende agora ela ver nessa inércia desenhar-se a figura do abuso de direito. A palavra "direito" nesta figura tem de ser entendida em sentido muito amplo, abrangendo toda e qualquer prerrogativa jurídica subjectiva, os "poderes", as "faculdades" e as "liberdades". Direito subjectivo seria qualquer coisa que pertence ou "cabe" de direito ao indivíduo, que lhe permita participação nos bens da vida, em conformidade com a ordem jurídica. Interesse e direito subjectivo não são conceitos idênticos. O interesse constitui o "móbil" do direito subjectivo, mas não faz parte dele; não diz respeito à sua estrutura, apenas se refere à sua função: é uma função do direito subjectivo proteger o interesse. Aproximando-nos de Castanheira Neves e de Orlando de Carvalho, diremos que o problema do abuso de direito reside em saber se o uso do direito subjectivo obedece ou não aos limites do poder de autodeterminação, sendo, pois, um problema deste poder e não em si do direito subjectivo. Trata-se de um comportamento aparentemente lícito que viola ou não cumpre a intenção normativa, que materialmente fundamenta e constitui o direito invocado. O poder de autodeterminação existe apenas para se prosseguirem interesses e não para se sugarem interesses, tanto próprios, como alheios. Assim será abusivo o comportamento que se diz exercício de um direito quando - não constituindo tal exercício, mesmo em abstracto, uma vantagem objectiva - se revela resultar dele, em concreto, uma desvantagem para terceiro. Poderíamos, pois, dizer, seguindo Coutinho de Abreu, que há abuso de direito quando um comportamento, aparentando ser exercício de um direito, se traduz na não realização dos interesses pessoais de que esse direito é instrumento e na negação de interesses sensíveis de outrém. Ora os Autores exerceram o seu direito, que lhes assiste, na altura que entenderam, sem ofensa de valores protegidos. É, pois, impensável, aqui, a figura do abuso de direito. 12 - Termos em que, negando provimento ao recurso, se confirma o douto Acórdão recorrido. Custas pelo recorrente, tomando em consideração o apoio judiciário. Lisboa 21 de Março de 1995. Torres Paulo, Ramiro Vidigal, Cardona Ferreira. |