Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05P2106
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: PEREIRA MADEIRA
Descritores: PRISÃO
MULTA
MANIFESTA IMPROCEDÊNCIA
Nº do Documento: SJ200506230021065
Data do Acordão: 06/23/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL PORTO
Processo no Tribunal Recurso: 2348/04
Data: 06/29/2004
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: REJEITADO O RECURSO.
Sumário :
I - Se na pena única conjunta importa incluir necessariamente uma pena de prisão, impõe-se, na medida do possível, não aplicar pena de multa a um ou mais dos demais crimes em concurso, por também aí se verificarem os inconvenientes geralmente atribuídos às chamadas «penas mistas» de prisão e multa.
II - Se a pena aplicada na decisão recorrida já é portadora de uma larga dose de benevolência, para mais, não inteiramente merecida, o recurso que visa alcançar uma ainda maior benevolência, deve ser rejeitado por manifesta improcedência.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

PMSPS e HMMA, ambos devidamente identificados, foram pronunciados:
- o primeiro, como autor material de três crimes de falsificação de documento p. e p. pelo art. 256 nº1 al.b) e c), um crime de simulação de crime p. e p. pelo art. 366 nº1 e um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22, 23, 73, 217 nº1 e 218 nº2 al. a), todos do C.Penal.
- o segundo, como autor moral de dois crimes de falsificação de documento p. e p. pelo art. 256 nº1 al.b) e c) (e que por manifesto lapso material se refere al.c) e d), sendo que não existe al.d) no aludido preceito legal) e de um crime de simulação de crime p. e p. pelo art.366 nº1 e como co-autor material de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo art.256 nº1 al.b) e de um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos arts.22, 23, 73, 217 nº1 e 218 nº2 al.a), todos do C.Penal.
A assistente Companhia de Seguros ...., SA, antes denominada Companhia de Seguros ..., SA, aderiu à acusação deduzida pelo Ministério Público e deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos, pedindo a condenação deles a pagar-lhe a quantia de 748,20€, acrescida de juros legais vencidos, com fundamento em que na sequência do sinistro constante dos autos procedeu à abertura e instrução do processo de averiguação, para o que recorreu a peritos, tendo despendido aquela quantia.
Efectuado o julgamento veio a ser proferida sentença em que, além do mais, foi decidido:
Julgar a acção penal provada e procedente e em consequência:
- Condenar os arguidos PMSPS e HMMA, cada um deles, pela prática, em concurso real, de um crime de falsificação de documento p. e p. pelo art.256 nº1 al.b) do C.Penal, na pena de oito meses de prisão, de um crime de simulação de crime p. e p. pelo art.366 nº1 do C.Penal na pena de três meses de prisão e de um crime de burla qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos arts.217 nº1, 218 nº2 al.a), 22, 23 nº2 e 73 al.a) e b), todos do C.Penal, na pena de um ano e cinco meses de prisão.
- Em cúmulo jurídico, condenar cada um dos arguidos na «pena unitária» de um ano e nove meses de prisão.
- Nos termos do art. 50 do C.Penal, suspender pelo período de dois anos a execução da «pena unitária» aplicada a cada um dos arguidos.

Inconformado, recorre agora ao Supremo Tribunal de Justiça o arguido PMSPS que com este rol conclusivo delimita o objecto do recurso:
I - Tendo em conta as circunstâncias que resultam do processo, razão alguma existe para que, em relação aos crimes de falsificação de documento e se simulação de crime, não se aplique ao arguido a pena de multa prevista e cabível na respectiva moldura penal.
II - Esta sanção realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, satisfazendo quer as necessidades de prevenção geral e, simultaneamente, de prevenção especial, impostas pelo caso concreto.
III - Mas ainda que o arguido houvesse de ser condenado em penas de prisão - no que não se concede e se admite por mero raciocínio académico - sempre se dirá que a medida das penas aplicadas pelo Tribunal "a quo" resulta exagerada, como, e em consequência, resulta elevado e descontextuado o cúmulo jurídico efectuado.
IV - Nessa previsão, parecem perfeitamente adequadas as penas de 6 meses para o crime de burla qualificada na forma tentada, e de 1 mês para cada um dos crimes de falsificação de documento e simulação de crime, substituída por pena de multa, ou por outra pena não privativa de liberdade, aplicável, com igual repercussão no cúmulo jurídico final.
V - Em todo o caso, optando-se pela aplicação de uma pena detentiva, sempre a final deverá reformular-se o cúmulo jurídico, operando-se pelo limite mínimo, isto é, a pena parcelar mais elevada de 6 meses de prisão, ainda que se amplie o respectivo período de suspensão.
VI - A decisão recorrida viola, pois, o disposto nos artigos 70.º, 71.º e 44.º, todos do Código Penal, em cuja não observação se baseia o presente recurso.
Termina pedindo, no provimento do recurso, a revogação do acórdão recorrido em conformidade.

Respondeu o Ministério Público em defesa do julgado.

Subidos os autos, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta promoveu se designasse dia para julgamento.

Porém, o relator considerou que o recurso deveria ser rejeitado ante a sua manifesta improcedência.
Daí que os autos tenham vindo à conferência.

2. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Os factos provados
1 - No dia 1 de Dezembro de 1999, na Praça", em V.N.Gaia, junto à então residência do arguido PM, ocorreu um incêndio no veículo da marca BMW, modelo 320 I, cabriolet, de matrícula", propriedade daquele, que algum tempo antes o adquirira no estrangeiro, tendo pendente na Alfândega do Porto o respectivo processo de legalização em Portugal.
2 - No referido dia 1/12/99 o arguido PM não tinha contrato de seguro que cobrisse prejuízos causados no referido veículo"..
3 - Em virtude do aludido incêndio o". ficou destruído, concretamente o interior, motor, pneus e chapa.
4 - Após o referido incêndio, o arguido PM contactou o seu amigo ND, para saber se ele conhecia algum mediador de seguros, e este indicou o arguido H.
5 - O arguido PM contactou então o ora arguido H, tendo ambos engendrado um plano que tinha por finalidade o PM obter da Companhia de Seguros Mundial Confiança uma indemnização que não lhe era devida.
6 - Assim, no dia 2/12/99, estando já o veículo destruído nos termos supra referidos no ponto 3 e ocultando tal situação, o arguido PM solicitou na Alfândega do Porto, onde decorria o processo de legalização do referido veículo, a sua guia de circulação, a qual lhe foi entregue.
7 - Nessa mesma data o arguido H preencheu a proposta de contrato de seguro automóvel referente ao veículo de matrícula", segundo os elementos fornecidos pelo arguido PM, sendo tal proposta assinada por este.
8 - A referida proposta de contrato de seguro indicava como objecto de seguro o veículo de matrícula", marca BMW, modelo 320 I Cabriolet, encontrando-se cobertos, entre outros, os riscos de furto, roubo, incêndio, raio, explosão, pelo valor de 6.260.000$00.
9 - Em tal proposta de contrato de seguro, o arguido H fez constar uma declaração pelo seu próprio punho, onde referia que pelas 16 horas desse mesmo dia 2/12/99 inspeccionara o dito veículo, que estava a ser legalizado, propondo 30% de bónus e 20% de desconto.
10 - A proposta de seguro e a guia de circulação do veículo foram entregues nesse dia 2/12/99 nos escritórios da Companhia Mundial Confiança na cidade do Porto, onde, submetida a aprovação, se converteu em contrato de seguro a produzir efeitos a partir das 16 horas do mencionado dia.
11 - No dia 6/1/00, segundo o plano previamente traçado com o arguido H, o arguido PM dirigiu-se ao Posto da GNR de", V.N.Gaia, e aí formulou queixa contra desconhecidos, a quem imputava o facto de entre os dias 2 e 4 de Janeiro de 2000, a porta da garagem nº".da Rua".de"., em Valadares, ter sido entroncada e do seu interior levado o veículo de matrícula".., marca BMW, modelo 320 I Cabriolet, no valor de 7.000.000$00.
12 - A queixa referida no ponto anterior deu origem ao inquérito nº10/00.8GCVNG, que correu termos nos serviços do Ministério Público de V.N.Gaia.
13 - O arguido PM, assim que formulou a queixa à GNR solicitou que lhe fosse entregue certidão da mesma.
14 - Na posse da aludida certidão, que lhe foi entregue nesse dia 6/1/00, o arguido PM dirigiu-se aos escritórios da Companhia de Seguros Mundial Confiança, no Porto, e aí preencheu pelo seu próprio punho o documento pelo qual participou à seguradora o furto do", requerendo o pagamento da indemnização.
15 - Os arguidos PM e H agiram na sequência de plano prévio entre ambos traçado, para, em comunhão de esforços e através de engano provocado aos funcionários da Companhia de Seguros Mundial Confiança, levarem a mesma a aderir à proposta de contrato de seguro do". e a considerar coberto um furto que não ocorreu e dessa forma desembolsar em benefício do arguido PM uma indemnização no valor de 6.260.000$00 a que ele não tinha direito, só não tendo sido paga tal indemnização em virtude de um funcionário da Companhia de Seguros ter sido informado de que o veículo". tinha ardido no dia 1/12/99, ficando destruído.
16 - Os arguidos PM e H elaboraram a proposta de contrato de seguro bem sabendo que tinham aposto na mesma elementos falsos relativamente ao estado e valor do veículo.
17 - O arguido PM, segundo o plano prévio congeminado com o arguido H e actuando segundo as suas instruções, mediante a participação do furto do veículo de matrícula"., fez crer às autoridades policiais e judiciárias que desconhecidos tinham praticado um crime de furto, o que ambos os arguidos sabiam não ter ocorrido.
18 - O arguido PM, igualmente segundo o plano previamente engendrado com o arguido H e seguindo as suas indicações, entregou à Companhia de Seguros a participação de furto, acompanhada de certidão da participação apresentada junto da GNR, onde relatara factos que sabia não serem verdadeiros.
19 - Os arguidos sabiam que os seus comportamentos eram proibidos por lei.
20 - Na sequência da participação do sinistro no veículo"., a Companhia de Seguros .... procedeu à abertura e instrução do processo de averiguação, recorrendo para tanto a peritos.
21 - Os peritos da Companhia de Seguros que trabalharam no processo de averiguação do sinistro participado, efectuaram deslocações ao local, contactaram aí com pessoas e procederam à elaboração do relatório de peritagem.
22 - A demandante despendeu a quantia de 500€ com o processo de averiguação do sinistro.
23 - O arguido PM é oriundo de uma família com uma conjuntura favorável aos níveis afectivo e material.
- trabalhando a mãe como enfermeira anestesista e o pai como sócio-gerente de uma fábrica de plásticos, tinham o tempo condicionado de forma a prestar todos os cuidados ao arguido PM e à sua irmã, pelo que foram educados na infância por uma ama
- o PM tem como habilitações literárias o 10ºano de escolaridade.
- começou a trabalhar numa empresa onde era gerente o seu pai e cerca de ano e meio depois, passou a trabalhar como estafeta numa pizaria.
- após um acidente de moto em que interrompeu a actividade de estafeta, começou a colaborar com um amigo que tinha um stand de automóveis, tendo posteriormente optado por exercer tal actividade por conta própria.
- à data dos factos, o PM residia com o pai, a irmã e a avó paterna, sendo que a mãe se tinha separado um ano antes.
- o pai do arguido PM entretanto adoeceu gravemente, tendo vindo a falecer após uma fase terminal longa e exigente.
- o PM, ainda antes do falecimento do progenitor, passou a residir com um amigo em"., junto à orla marítima.
- o PM actualmente trabalha como vendedor de automóveis por conta própria, tendo uma garagem para recolha dos mesmos.
- na sua actividade profissional, aufere mensalmente, em média, 750€.
- o PM vive dos proventos do seu trabalho.
24 - No processo nº368/97.4TBPNF, do 1ºJuizo do T.J.Penafiel, o arguido PM foi condenado por sentença proferida em 17/1/00, transitada em julgado, pela prática, em 1/7/96, de um crime de falsificação de documento e de um crime de burla, na pena única de 800 dias de multa, à taxa diária de 600$00, tendo sido tal pena extinta pelo cumprimento.
25 - O arguido H pertence a um agregado de média condição sócio-económica.
- estudou até aos 19 anos de idade, altura em que frequentava o 11ºano de escolaridade, abandonando então os estudos na sequência do falecimento do pai.
- o H começou a trabalhar no ramo dos seguros, prosseguindo a trajectória profissional dos seus avô paterno e pai, continuando a trabalhar como mediador de seguros na qualidade de empresário em nome individual.
- O H reside com a mãe, não contribuindo para a economia doméstica.
- O arguido H despende 500€ mensais para amortização do leasing relativo à aquisição do veículo automóvel.
26 - O arguido H não tem antecedentes criminais.
Factos não provados
1 - O arguido H deslocou-se à Alfândega do Porto a requisitar a guia de circulação do"..
2 - A proposta de contrato de seguro foi elaborada em termos distintos dos referidos nos pontos 7 a 9 dos factos dados como provados.
3 - A Companhia de Seguros, com o processo de averiguação do sinistro participado, despendeu quantia superior à indicada no ponto 22 dos factos dados como provados
4 - No incêndio referido no ponto 1 dos factos dados como provados, apenas foram consumidos pelas chamas a capota de lona do veículo, os seus estofos, palas, quartela das portas, tapetes, painel e consola central.
5 - A mecânica do". bem como as rodas e pneus não sofreram danos no incêndio referido no ponto 1 dos factos dados como provados.
6 - No incêndio aludido no ponto 1 dos factos dados como provados, a chapa do veículo".. apenas sofreu alguns danos na pintura.
7 - O veículo". foi reparado após o incêndio mencionado no ponto 1 dos factos dados como provados.
8 - O arguido PM, após o incêndio, ordenou a remoção do". para a garagem "...", em V.N.Gaia, para ser reparada.
9 - Os arguidos H e PM e o amigo deste, ND combinaram encontrar-se na garagem "...".
10 - Na garagem"., o arguido H aceitou preencher a proposta de seguro mediante a condição de, no prazo de 15 dias, vistoriar o"., depois de reparado.
11 - A vistoria do". ocorreu vinte dias depois da sua reparação, por alturas do Natal, junto ao Hotel Meridien, estando presentes nessa ocasião, os arguidos PM, H e o ND.
12 - O despachante que estava a proceder à legalização do". veículo, foi a pessoa que requisitou a guia de circulação do referido veículo na Alfândega do Porto e a entregou ao arguido PM.
13 - O arguido PM é pessoa respeitada e respeitadora.
14 - Qualquer outro facto alegado na acusação, pedido de indemnização civil, contestações ou durante a discussão da causa pertinente para a decisão desta ou que se mostre prejudicado ou em oposição com os dados como provados.

Não vem posta em causa a qualificação jurídica dos factos nem se vê que a mesma deva ser objecto de censura.
Apenas a espécie de pena aplicada, que o recorrente, ainda insatisfeito com a inegável benevolência do tribunal recorrido de que já beneficiou, nomeadamente com o usufruto da pena de substituição - pena suspensa - pretende ainda ver aligeirada por pretender beneficiar de penas de multa quanto aos crimes de falsificação de documento e de simulação de crime.
Porém, sempre ficaria de fora desta pretensão reletiva à pena correspondente ao crime de burla, uma vez que a tal crime apenas corresponde pena de prisão - art.º 218.º, n.º 2, a), do Código Penal.
Como assim, e tal como decidiu este Supremo Tribunal no acórdão proferido no recurso n.º 1567/01-5 com o mesmo relator, «no domínio de vigência do Código Penal de 1982, embora houvesse divergências de entendimento jurisprudencial, a tese predominante era a de que «perante o disposto no n.º 1 do artigo 48.º do Código Penal [merece reparo] que seja ordenada a suspensão da execução da pena de prisão, sem se abranger com tal suspensão a pena de multa complementar da prisão aplicada».(1)
Era, de resto, o entendimento que emergia da doutrina expressa na acta da 22.ª sessão da Comissão Revisora(2) onde ficou a constar: "Em seguida a Comissão pronunciou-se, por unanimidade, no sentido de que quando coubesse ao crime prisão e multa a condenação condicional devia abranger ambas as formas de punição. Mas por maioria entendeu que não valia a pena explicitar tal doutrina".
Daí que, no domínio de vigência daquele diploma a questão posta não suscitasse problemas de maior de interpretação, sendo certo que, como se explicitava no artigo 48.º, n.º 1, nos casos em que coubesse pena autónoma de multa, a suspensão só poderia ser decretada se se provasse que o condenado «não tinha possibilidades de a pagar».
Porém, a voz autorizada do Prof. Figueiredo Dias, entre outros, desde há muito se manifestava contra o uso "liberal" da multa complementar já que, em seu entendimento, "por mais que esta espécie de pena possua sólida tradição no nosso direito, trata-se nela de uma solução político-criminalmente indefensável e contraditória com os pressupostos de que partiu o legislador de 1982".(3)
E mais adiante (4): "Uma tal pena «mista» é, numa palavra profundamente dessocializadora, além de contraditória com o sistema dos dias de multa: este quer colocar o condenado próximo do mínimo existencial adequado à sua situação económico-financeira e pessoal, retirando-lhe as possibilidades de consumo restantes, quando com a pena «mista» aquele já as perde na prisão! O desaparecimento da pena complementar de multa (e portanto da pena mista de prisão e multa) impõe-se, pois, numa futura revisão do CP, como forma de restituir à pena pecuniária o seu sentido político-criminal mais profundo e de aumentar a sua eficácia penal."
Mostrando-se sensível a esta apreciação crítica, o legislador deu-lhe guarida já que, segundo o preâmbulo do Dec-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, expressamente se aceitou «o abandono da indesejável prescrição cumulativa das penas de prisão e multa na parte especial».
Estas considerações que aqui se reeditam e reiteram são transponíveis, com as devidas cautelas, para situações como a dos autos em que ao arguido sempre será aplicável uma pena de prisão, substituível ou não por pena suspensa.
E têm sido acolhidas em arestos posteriores deste Alto Tribunal como se pode ver nomeadamente nos acórdãos de 5/2/04 e de 9/12/04, prolatados respectivamente nos recursos n.ºs 151/04-5 e 3969/04-5, também relatados por quem ora relata este.
Como assim, está fora de causa o recurso às penas de multa reclamado pelo recorrente.

Quanto à medida das penas objecto de impugnação subsidiária:
O tribunal recorrido discorreu a propósito:
«Nos termos do art.71 do C.Penal a medida da pena é determinada em função da culpa do agente e das exigências de prevenção de futuros crimes, tendo-se em atenção as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele.
É de ponderar o acentuado grau da ilicitude dos factos, atento o modo de actuação dos arguidos, e as suas consequências. Agiram os arguidos com dolo directo. Em benefício dos arguidos, a circunstância de serem delinquentes primários aquando dos factos, vindo posteriormente o arguido PM a sofrer uma condenação pelos crimes de falsificação de documento e burla, serem pessoas integradas socialmente e que desempenham as suas actividades profissionais. É de atender ainda às necessidades de prevenção geral, obrigando a que a pena escolhida, tendo sempre como limite a culpa do agente, seja moldada de forma a que a comunidade continue a acreditar na eficácia do ordenamento jurídico.
Tudo ponderado, é de optar por penas detentivas, mostrando-se adequadas, para cada um dos arguidos, as seguintes penas:
-oito meses de prisão, pelo crime de falsificação de documento.
-três meses de prisão, pelo crime de simulação de crime.
-um ano e cinco meses de prisão, pelo crime de burla qualificada, na forma tentada.
Nos termos do art.77 nº1 do C.Penal, em cúmulo jurídico, mostra-se adequada a condenação de cada um dos arguidos na pena única de um ano e nove meses de prisão.
Nos termos do art.50 nº1 do C.Penal, "o tribunal suspende a execução da pena de prisão em medida não superior a três anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".
O instituto da suspensão da execução da pena tem de entender-se como uma autêntica medida penal, susceptível de servir tão eficazmente quanto a efectividade das sanções aos desideratos da prevenção geral positiva, com a acrescida vantagem de, do mesmo passo, satisfazer aos da prevenção especial. (5)
Considerando que os arguidos aquando dos factos não tinham antecedentes criminais, têm os seus empregos, mostrando-se inseridos socialmente, nos termos do art.50 do Código Penal, afigura-se que a simples censura do facto e a ameaça da pena são adequadas a satisfazer as finalidades da punição, pelo que se decide suspender a execução da pena pelo período de dois anos.»

O doseamento das penas, quer parcelares, quer conjunta, mostra-se ponderado e, mesmo, benevolente, tendo em conta, não apenas as circunstâncias da ilicitude e culpa elevadas, como as demais circunstâncias do caso, nomeadamente com o recorrente na posição de motor de toda a maquinação criminosa, sem circunstâncias atenuantes de relevo para além das já valoradas pelo tribunal recorrido - sequer, o arrependimento ou a confissão dos factos, ou, mais comezinhamente, que seja, ao menos, ser «respeitado e respeitador» - que apontassem para uma benevolência ainda maior do que aquela que, sem grandes merecimentos, já lhe foi dispensada.
Não se mostra, assim, violada nenhuma das normas referidas na motivação de recurso, nomeadamente as dos artigos 44.º 70.º e º 71.º do Código Penal..

3. Termos em que, por manifesta improcedência, rejeitam o recurso.
O recorrente pagará pelo decaimento taxa de justiça que se fixa em 10 unidades de conta a que se somam outras cinco a título de sanção processual - art.º 420, n.º 4, do Código de Processo Penal.

Lisboa, 23 de Junho de 2005
Pereira Madeira,
Simas Santos,
Santos Carvalho.
_________________________
(1) Cfr. Ac STJ de 23 de Abril de 1987, BMJ n.º 366, págs. 299 e segs. No mesmo sentido, os acórdãos do mesmo Supremo Tribunal de 2 de Julho de 1986, 9 de Julho de 1986 (proc. n.º 38262), e, da mesma data (proc. n.º 38504), publicados no Boletim, n.º 359, págs. 348 e segs., 358 e segs., e 367 e segs., respectivamente e ainda o Ac. STJ de 7 de Maio de 1986, BMJ n.º 357, págs. 195 e, ao que parece, Victor Sá Pereira, Código Penal, págs. 100: "A suspensão da multa que não faça parte da pena mista fica condicionada à impossibilidade de subjectiva de pagar."
Já em sentido inverso, o voto de vencido no primeiro dos indicados arestos, e, entre outros, Maia Gonçalves, Código Penal Português, 4.ª edição, págs. 160
(2) Cfr., "Actas Parte Geral", vol. II, págs. 57.
(3) Direito Penal Português As Consequências Jurídicas do Crime, §138
(4) Ibidem § 192
(5) Neste sentido, Ac.STJ de 18/5/2000, consulta via internet, in www.cidadevirtual.pt.