Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
168/97.1TBVRS.E2-B.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: LOPES DA MOTA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
ASSISTENTE
LEGITIMIDADE PARA RECORRER
ABSOLVIÇÃO CRIME
DESPACHO DE NÃO PRONÚNCIA
DESPACHO
APOIO JUDICIÁRIO
REJEIÇÃO DE RECURSO
INADMISSIBILIDADE
Data do Acordão: 07/03/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO DE REVISÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :
I. Nos termos do artigo 450.º, n.º 1, al. b), do CPP, a legitimidade do assistente para requerer a revisão de sentença está limitada à revisão de sentenças (decisões que conhecem do objeto do processo – artigos 97.º, n.º 1, al. a), do CPP) absolutórias (sentenças não condenatórias ou que aplicam medidas de segurança – artigos 375.º e 376.º do CPP) e de despachos de não pronúncia (despachos proferidos no final da instrução nos casos em que não são recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança – artigo 308.º, n.º 1, do CPP).

II. O recorrente tem a qualidade de assistente e a decisão que impugna é um acórdão do tribunal da Relação que mantém um despacho do juiz da 1.ª instância que recusou a passagem gratuita de uma certidão do processo para junção a outro processo, que o recorrente requereu com a alegação de que gozava de apoio judiciário.

III. A decisão que o recorrente pretende que seja revista não é, pois, nem uma sentença absolutória nem um despacho de não pronúncia e o fundamento invocado – da al. d) do n.º 1 do artigo 449.º do CPP – diz respeito à revisão de sentença condenatória («condenação», diz o preceito).

IV. Nem a decisão objeto do recurso constitui uma decisão recorrível em recurso extraordinário de revisão, nem o recorrente tem legitimidade para dela interpor recurso, pelo que se verificam dois fundamentos de inadmissibilidade do recurso, que determinam a sua rejeição, nos termos do disposto nos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, al. b), do CPP, aplicáveis por analogia ex vi artigo 4.º do CPP, havendo lugar à condenação na sanção prevista no n.º 3 do artigo 420.º do CPP.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:


I. Relatório

1. AA, assistente, com a identificação dos autos, vem, «ao abrigo do disposto no artigo 449.º, alínea d) do Código de Processo Penal (CPP)», interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão proferido em 25/05/2021 pelo Tribunal da Relação de Évora - 1ª Subsecção Criminal, que transitou em julgado em 03/03/2022, dizendo (transcrição):

«1.º O processo nº 168/97.1TBVRS iniciou-se com uma denúncia apresentada pelo ora Recorrente por crime de burla agravada, p. e p. pelos artigos 313º, n.º 1 e 314º, al. c), do CP de 1982.

2.º O procedimento criminal foi declarado extinto, por prescrição por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, em 24/06/2003 e o processo foi arquivado.

3.º Em 26/06/2019, o recorrente requereu a emissão de certidão de todo o processo, para juntar à ação a correr seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Comércio de ..., Juiz 2, sob o n.º 206/14.5... (Doc. 1)

4.º Requereu que a certidão fosse emitida de forma gratuita e juntou cópia do despacho proferido em 14/08/2014, pelo ISS - Centro Distrital de ..., no qual lhe foi concedido o benefício de apoio judiciário, na modalidade de «dispensa de taxa de justiça, encargos com o processo e nomeação e pagamento de compensação de patrono.

5.º A emissão da certidão de forma gratuita foi indeferida (Doc. 2).

6.º O recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação (Doc. 3), ao qual foi negado provimento por acórdão proferido em 25/05/2021 que transitou em julgado em 03/03/2022 e que constitui a decisão a rever (Doc. 4).

7.º Em 27/01/2022 o recorrente reiterou o pedido de certidão gratuita integral do processo, ao abrigo do benefício de apoio judiciário.

8.º O pedido foi indeferido e o Recorrente foi condenado nas custas do incidente.

9.º Em 09/05/2022, após ter sido notificado da conta de custas, o ora recorrente apresentou requerimento, alegando mais uma vez que beneficia de Apoio Judiciário e requereu a revogação da consta de custas (Doc. 5).

10.º O Tribunal proferiu despacho onde fez constar que o recorrente não beneficia de apoio judiciário (Doc. 6).

11.º Em 12/06/2022 o recorrente comunicou aos autos que no Apenso A juntou a decisão instrutória proferida nos autos principais onde consta que o apoio judiciário lhe foi concedido a fls. 303 (Docs. 7 e 8).

12.º O recorrente alegou que o Tribunal Constitucional considerou o mencionado documento como comprovativo da concessão de apoio judiciário na modalidade de isenção do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, isentando-o do pagamento de custas (Doc. 9).

13.º Sobre essa informação foi proferido despacho em 12/07/2022, o qual decidiu que "não há que considerar qualquer benefício de apoio judiciário" e "o que se possa passar noutros processos não tem qualquer interesse nestes autos", condenando o ora recorrente em custas, que fixou em 2 UC (Doc. 10).

14.º Foi interposto recurso dessa decisão para o Tribunal da Relação de Évora, onde o recorrente reiterou os motivos da sua discordância e pugnou pela revogação de todas as custas em que foi condenado (Doc. 11).

15.º Além do mais, defendeu que se verificou inconstitucionalidade, porquanto o Artigo 20º da Constituição da República Portuguesa determina que todos os cidadãos têm direito ao acesso à Justiça e sendo o benefício de Apoio Judiciário o mecanismo legal que garante esse acesso aos cidadãos que não dispõem de meios financeiros para tal, não pode esse acesso ser denegado.

16.º Considerou ainda que se não for cumprido o texto do legislador, deve o Tribunal fundamentar essa alteração ao sentido do espírito da lei, pois, de outra forma, haverá inconstitucionalidade. A colisão com o espírito normativo viola o disposto nos Artigos 2º, 147º, 161º, c), 202º, nº 1 e 2, e 20º, nºs. 1, 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

17.º Em 08/02/2023, a Exma. Juíza Relatora proferiu decisão que rejeitou o recurso por manifesta improcedência, nos termos do disposto nos artigos 417.º, n.º 6, al. b) e 420.º, n.º 1, al. a), ambos do CPP, por entender existir caso julgado formal, por considerar que a questão já tinha sido apreciada na decisão a rever (Acórdão do TRE, proferido em 25/05/2021, transitado em julgado a 03/03/2022) (Doc. 12).

18.º O recorrente reclamou para a conferência (Doc. 13), demonstrando a necessidade de que fosse verificada a concessão do benefício de apoio judiciário e alegando que a concessão por despacho judicial foi posteriormente reiterada pelo Instituto da Segurança Social, tendo indicado o nº do APJ ........88, ao abrigo do qual foi nomeado patrono no N.R nº ....91/2020 (conforme comprovativo que anteriormente tinha junto aos autos e que voltou a anexar).

19.º Mais uma vez pugnou pela inconstitucionalidade e má aplicação da lei, atendendo a que não pode deixar de ser respeitada a separação de poderes e não podem ser proferidas nos tribunais decisões nesta matéria que é da competência de entidade administrativa, mas o tribunal ignorou a proteção jurídica legalmente concedida.

20.º Invocou que o entendimento a seguir deverá ser o constante no Acórdão da Relação de Lisboa – 8.ª Secção no Processo: 13609/18.7T8LSB.L1 (Referência: 18539678) onde consta: "Tem sido entendido não ser ao tribunal de 1ª instância, a quem esteja atribuída a acção ou procedimento do requerente orientados para a salvaguarda de direitos ou interesses de importância substantiva, no sentido de diligenciar ou de se preocupar com um assunto - o da concessão ou remoção de protecção jurídica-, hoje eminentemente da esfera dos serviços da segurança social. A lei do apoio judiciário fixa o esquema que, nesta matéria, deve ser seguido; mesmo a declaração da caducidade do benefício da protecção jurídica, a que se refere o artigo 11º, nº 1, alínea b), que nos ocupa, compete ao respectivo órgão da segurança social; sendo a ele que se comete reconhecer os ajustados pressupostos e, depois, pronunciar-se em conformidade. Ao tribunal pode competir, se for caso, avaliar a impugnação judicial do que assim seja decidido; embora não, com toda a certeza, no contexto da instância (dos próprios autos) que corra em função da acção (principal) interposta a coberto da protecção concedida, e por não ser essa, minimamente, a sua vocação. Sendo, a este propósito, perfeitamente esclarecedoras as disposições dos artigos 12º, 27º e 28.º da LAJ.

Em suma:

I - Não são os autos da acção proposta a coberta do benefício de protecção jurídica os vocacionados para a declaração da caducidade de tal benefício.

II - Tal declaração compete à Segurança Social, com possibilidade de impugnação judicial da decisão que esta entidade profira. Cfr. Salvador da Costa, "O apoio judiciário", 7ª edição, página 88. Cfr. Ac. TRP de 27-9-2017 proferido no processo nº 1528/17.9T8VFR-A.P1 (relator Manuel Domingos Fernandes)."

E concluiu o douto Acórdão: "Concorda-se com este entendimento, devendo a instância seguir a sua tramitação normal mantendo-se, assim, a protecção jurídica concedida ao Autor (...)"

21.º Em 28/03/2023 foi proferido Acórdão pelo TRE que indeferiu a reclamação apresentada e decidiu rejeitar o recurso, onde consta: "Em conformidade com o decidido no acórdão proferido nestes autos, por esta Relação de Évora, em 25/05/2021, transitado em julgado em 03/03/2022, o apoio judiciário concedido ao recorrente, ora reclamante, pela Segurança Social, numa altura em que os autos há muito estavam findos, é absolutamente ineficaz em relação ao presente processo e, como tal, o recorrente não beneficia de tal apoio." (Doc. 14).

22.º O A. interpôs recurso para o STJ (Doc. 15) onde apresentou, entre outras motivações, as que passa a indicar, as quais constituem também fundamento para a presente revisão:

a) Não deverá considerar-se como transitada e definitiva a parte do Acórdão a rever que considerou que o Recorrente não beneficia de apoio judiciário nos presentes autos, na medida em que não era esse o objeto do recurso.

b) O recurso versava sobre a questão de não ter sido deferida a emissão da certidão requerida, defendendo que o deveria ser a título gratuito com base no apoio judiciário, mas não tinha sido equacionada anteriormente a tomada de posição de que o Recorrente não beneficiaria de apoio judiciário, como agora sucede.

c) São questões diversas decidir que não pode ser emitida a certidão de forma gratuita ao abrigo do benefício de apoio judiciário e decidir que o Recorrente não beneficia de apoio judiciário.

d) O Acórdão a rever considerou que o apoio judiciário foi admitido pelo Tribunal, mas nunca o deveria ter sido. Ora a questão que é essa admissão - também ela - transitou em julgado, antes do trânsito deste Acórdão, e teve consequências jurídicas, pelo que não poderia ter sido revogada.

e) O apoio judiciário concedido pela Segurança Social não pode ser ineficaz, porquanto é da competência da Segurança Social e não do Tribunal a decisão sobre a concessão, validade e manutenção do benefício de apoio judiciário.

f) Este entendimento contraria o entendimento constante no Acórdão da Relação de Lisboa proferido no Processo 8834/20.3T8LSB-A.L1-7 em 25/10/2022 e no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido no Processo nº 977/15.1T8VRL.G1 em 5-02-2018. 9. Este último Acórdão considerou que "o apoio concedido não pode sem mais ser desconsiderado, sem embargo de o tribunal poder comunicar à entidade que o concedeu os dados e factos que eventualmente este desconhecia e que teriam ou poderiam implicar uma decisão diversa, para reapreciação nos termos do artigo 10º da LAJ, designadamente ais. b)."

23.º É, pois, este o procedimento que o Recorrente entende que, nos termos da lei, deveria ter sido assumido pelo Tribunal. Não deve proceder o entendimento de que o apoio judiciário tivesse sido concedido quando os autos estavam findos, pois também essa questão deveria ter sido submetida ao entendimento do órgão competente que é o Instituto da Segurança Social.

24.º O Recorrente foi condenado em custas por pedir uma certidão a título gratuito e de cada vez que tentou demonstrar que beneficia de apoio judiciário.

25.º A certidão destinava-se a instruir processo no qual o Recorrente também beneficia de apoio judiciário, sendo que chegou a ser proferido despacho concedendo-lhe prazo para proceder à junção.

26.º Conforme entendimento constante do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 08/06/2017. "O pedido de emissão e entrega de certidão necessárias ao estudo, preparação e instauração de uma acção judicial, formulado por patrona oficiosa em nome de requerente que beneficie de dispensa total de pagamento de custas, não está dependente do prévio pagamento de emolumentos".

27º O entendimento do qual se recorre denega o acesso à Justiça. Além do mais, não foi cumprido o texto legal que determina que a competência para avaliar sobre a concessão, manutenção e retirada de apoio judiciário é do Instituto da Segurança Social.

28.º Qualquer decisão judicial que altere o disposto no texto legal apenas pode ser tomada se explanar a respetiva fundamentação para justificar essa alteração, o que, salvo o devido respeito por opinião diversa, não sucedeu in casu. Assim, verifica-se inconstitucionalidade, por referência aos artigos 2º, 147º, 161º, c), 202º, nº 1 e 2, e 20º, nºs. 1, 2 e 5 da Constituição da República Portuguesa.

29.º O recurso não foi admitido, tendo sido apresentada reclamação que, além de reiterar todos estes fundamentos, especificou que registaram-se três deferimentos de apoio judiciário nos autos, já que a concessão por despacho judicial a fls. 303 foi reiterada pelo Instituto da Segurança Social por ofício de 15/10/2009 (a fls. cujo numero se ignora) e novamente reiterado no Proc. nº ........88, ao abrigo do qual foi nomeado patrono em 12/05/2021, conforme comprovativos que juntou no qual consta, sem margem para dúvidas, o nº dos presentes autos (Doc 16).

30.º A Reclamação foi indeferida (Doc 17).

Em conclusão:

1. As supervenientes interpretações que recaíram sobre a decisão a rever suscitam novos factos que colocam graves dúvidas sobre a justiça dessa mesma decisão.

2. Não deverá considerar-se como transitada e definitiva a parte do Acórdão a rever que considerou que o Recorrente não beneficia de apoio judiciário nos presentes autos, na medida em que não era esse o objeto do recurso.

3. O recurso versava sobre a questão de não ter sido deferida a emissão da certidão requerida, defendendo que o deveria ser a título gratuito com base no apoio judiciário, mas não tinha sido equacionada anteriormente a tomada de posição de que o Recorrente não beneficiaria de apoio judiciário, como agora sucede.

4. São questões diversas decidir que não pode ser emitida a certidão de forma gratuita ao abrigo do benefício de apoio judiciário e decidir que o Recorrente não beneficia de apoio judiciário.

5. O Acórdão a rever considerou que o apoio judiciário foi admitido pelo Tribunal, mas nunca o deveria ter sido. Ora a questão que é essa admissão - também ela - transitou em julgado, antes do trânsito deste Acórdão, e teve consequências jurídicas, pelo que não poderia ter sido revogada.

6. O apoio judiciário concedido pela Segurança Social não pode ser ineficaz, porquanto é da competência da Segurança Social e não do Tribunal a decisão sobre a concessão, validade e manutenção do benefício de apoio judiciário.

7. Este entendimento contraria o entendimento constante no Acórdão da Relação de Lisboa proferido no Processo 8834/20.3T8LSB-AX1-7 em 25/10/2022 e no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido no Processo nº 977/15.1T8VRL.G1 em 5-02-2018. 9. Este último Acórdão considerou que "o apoio concedido não pode sem mais ser desconsiderado, sem embargo de o tribunal poder comunicar à entidade que o concedeu os dados e factos que eventualmente este desconhecia e que teriam ou poderiam implicar uma decisão diversa, para reapreciação nos termos do artigo 10º da LAJ, designadamente als. b)."

8. Conforme entendimento constante do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 08/06/2017, "O pedido de emissão e entrega de certidão necessárias ao estudo, preparação e instauração de uma ação judicial, formulado por patrona oficiosa em nome de requerente que beneficie de dispensa total de pagamento de custas, não está dependente do prévio pagamento de emolumentos".

9. Pelo exposto, e salvo o devido respeito por opinião diversa, o entendimento da decisão a rever denega o acesso à Justiça previsto no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa.

10. O benefício de apoio judiciário nos presentes autos foi concedido por despacho judicial a fls. 303 e reiterado pelo Instituto da Segurança Social por ofício de 15/10/2009 (a fls. cujo número se ignora) e novamente reiterado no Proc. nº ........88, ao abrigo do qual foi nomeado patrono em 12/05/2021.

Termos em que o Acórdão proferido em 25/05/2021 pelo Tribunal da Relação de Évora – 1ª Subsecção Criminal, que transitou em julgado em 03/03/2022 deve ser revisto e:

1. Deve ser reponderada a decisão de não emissão de certidão uma vez que se destinava a autos onde o Recorrente beneficia de apoio judiciário

2. A decisão a rever não deve considerar-se transitada em julgado na parte em que se considera que o Recorrente não beneficia de apoio judiciário, por não ser esse o objeto da decisão.

PROVA: 17 Documentos e comprovativo de nomeação de patrono. O Doc. 1 inclui comprovativo de concessão de apoio judiciário.»

2. Respondeu o Senhor Procurador-Geral Adjunto na Relação de Évora, dizendo, (transcrição):

«1- Atente-se, com as devidas adaptações:

a) No que se decidiu no Acórdão do STJ de 7/04/2021 no Processo nº921/12.8TAPTM-J.S1, in www.dgsi.pt/jst, assim sumariado:

I - O princípio da intangibilidade do caso julgado decorre de vários preceitos do texto constitucional (arts. 29.º, n.º 4 e 282.º, n.º 3) e é considerado como subprincípio inerente ao princípio do Estado de direito na sua dimensão de princípio garante da certeza jurídica. As exceções ao caso julgado deverão ter, por isso, um fundamento material inequívoco.

II - O instituto do caso julgado é orientado pela ideia de conseguir maior segurança e paz nas relações jurídicas, bem como maior prestígio e rendimento da atividade dos tribunais, evitando a contradição prática de decisões.

III - A favor do caso julgado em processo penal, invoca-se também o efeito nefasto da reabertura em relação ao coarguido e às vítimas, que seria potenciado pelas circunstâncias emergentes do distanciamento em relação ao material probatório derivado da passagem do tempo.

IV - O recurso extraordinário de revisão não visa a reapreciação da decisão judicial transitada, mas apenas obter um novo julgamento.

V - A revisão da decisão firme, qualquer que seja a sua génese, será sempre uma violação da segurança do caso julgado, admissível apenas nas situações taxativamente estabelecidas que possam justificar a reparação de patente e grave injustiça.

VI - O CPP não prevê a revisão da decisão judicial definitiva com fundamento em erro de julgamento, nem, fora dos casos expressamente previstos, em vícios do procedimento devido.

VII - A revisão de uma condenação com o fundamento previsto na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, exige que os novos factos ou meios de prova por si sós ou conjugados com os factos apurados no julgamento ou as provas aí apreciadas, demonstrem ou indiciem fortemente a inocência do condenado.

VIII - Novos serão «os factos e os meios de prova desconhecidos pelo recorrente ao tempo do julgamento».

b) E no que se decidiu no Acórdão do STJ de 22/06/2022, Processo nº 357/21.0PHLRS-A.S1, in www.gde.mj.pt/jstj, assim sumariado:

I - O recurso extraordinário de revisão tem consagração constitucional – art. 29.º, n.º 6, da CRP e encontra-se previsto no art. 449.º e ss. do CPP.

II - Tem uma larga tradição histórica, no nosso direito, encontrando já referenciado nas Ordenações Afonsinas.

III - É constituído por duas fases: a fase do juízo rescindente e a fase do juízo rescisório. A primeira abrange todos os termos que têm lugar desde a petição do recurso até à decisão do STJ; a segunda respeita ao conhecimento do mérito do próprio recurso, cabendo ao tribunal da primeira instância.

IV - No caso de descoberta de novos factos ou novos elementos de prova, que é um dos fundamentos mais frequentemente utilizados pelos recorrentes, a doutrina mais abalizada chama a atenção para a indicação ser em alternativa, o que só pode significar que se trata de coisas diferentes.

V - São novos os factos e meios de prova os que sobrevenham ou se revelem posteriormente à condenação e que “evidenciem a inocência”.

VI - O recurso de revisão não pode servir para obter efeitos que apenas poderiam ser alcançados por via do recurso ordinário.

2- Ora, tudo ponderado, tendo presente que, sendo a revisão um recurso extraordinário, com pressupostos limitados, não pode servir para obter efeitos que apenas poderiam, eventualmente, ser alcançados por via do recurso ordinário, e sendo que o fundamento de revisão previsto na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do C.P.P. importa a verificação de dois pressupostos, por um lado, a descoberta de novos factos ou meios de prova e, por outro, que tais factos ou meios de prova suscitem dúvidas sobre a justiça do decidido, os fundamentos do recurso, como se apresentam, não nos parecem consubstanciar novos factos ou meios de prova para o fim pretendido e, a ser assim, o recurso deverá improceder.

3- (…) Nesta conformidade, deve ser negado provimento ao presente recurso (…)».

3. A Senhora Juíza Desembargadora prestou a informação a que se refere o artigo 454.º do CPP, dela constando que (transcrição):

«O recorrente vem interpor recurso de revisão do acórdão proferido por este Tribunal da Relação em 25/05/2021, transitado em julgado a 03/03/2022.

Nesse acórdão decidiu este TRE, negar provimento ao recurso interposto pelo ora recorrente - do despacho que indeferiu o requerimento por si apresentado, de passagem de certidão de todo o processo, para juntar à ação a correr seus termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo de Comércio de ..., Juiz 2, sob o n.º 206/14.5... -, considerando-se não beneficiar o ora recorrente de apoio judiciário, estando os autos há muito arquivados e sendo ineficaz, nessa situação, no que a este processo diz respeito, a decisão do ISS de concessão de tal benefício e, consequentemente, não ter o ora recorrente direito a obter uma certidão gratuita de todo o processado, nem estando dispensado do pagamento de custas.

Atenta a questão que foi objeto de decisão no referenciado acórdão deste TRE, de que agora é interposto recurso de revisão, afigura-se-nos não estarmos perante qualquer dos casos em que o assistente – tendo o ora recorrente intervindo nos autos nessa qualidade – tenha legitimidade para requerer a revisão.

Com efeito, não está em causa uma sentença/acórdão absolutória(o) ou um despacho de não pronúncia, sendo que apenas nesses casos o assistente tem legitimidade para requerer a revisão (cf. artigo 450º, n.º 1, al. b), do CPP).

Acresce que o recorrente vem interpor o presente recurso de revisão, invocando o fundamento previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449º do CPP.

Dispõe o enunciado preceito legal que «A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando: Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação».

Ora afigura-se-nos isento de dúvida, não se verificar, in casu, o alegado fundamento de revisão, sendo que o mesmo tem de reportar-se a sentença/acórdão condenatória(o), o que não é o caso.

Donde, entendermos, não ser o recurso de revisão em apreço legalmente admissível.

Em face do exposto, afigura-se-nos que deverá o recurso de revisão ser liminarmente rejeitado.»

4. Recebido, foi o processo com vista ao Ministério Público, nos termos do artigo 455.º do CPP, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto, emitido parecer, igualmente no sentido da rejeição do recurso por ilegitimidade do recorrente (transcrição parcial):

«(…)

4 – O recurso de revisão é um meio extraordinário de reacção contra sentenças e/ou despachos a elas equiparados, transitados em julgado, nos casos em que «o caso julgado se formou em circunstâncias patológicas, susceptíveis de produzir injustiça clamorosa. Visa eliminar o escândalo dessa injustiça».

O caso julgado concede estabilidade à decisão, servindo por isso o valor da segurança na afirmação do direito que é um dos fins do processo penal.

Mas o fim do processo é também a realização da justiça. Por isso, não se confere valor absoluto ao caso julgado, que deve ceder em situações de gravíssima e comprovada injustiça, garantindo o artigo 29.º, n.º 6, da Constituição da República Portuguesa (C.R.P.) a revisão da sentença «nas condições que a lei prescrever». […]

Densificando o comando normativo ínsito no artigo 29.º, n.º 6 da C.R.P., a lei processual penal vigente, nos seus artigos 449.º e seguintes, elenca, de forma taxativa, os fundamentos da revisão. […]

5 – Na situação em apreço, coloca-se, desde logo, a questão da legitimidade do recorrente, tal como perspectivado na informação judicial a que se refere o artigo 454.º do C.P.P., acima transcrita.

Dispõe o artigo 450.º do C.P.P., sob a epígrafe Legitimidade, precisamente:

1 - Têm legitimidade para requerer a revisão:

a) O Ministério Público;

b) O assistente, relativamente a sentenças absolutórias ou a despachos de não pronúncia;

c) O condenado ou seu defensor, relativamente a sentenças condenatórias.

2 - Têm ainda legitimidade para requerer a revisão e para a continuar, quando o condenado tiver falecido, o cônjuge, os descendentes, adoptados, ascendentes, adoptantes, parentes ou afins até ao 4.º grau da linha colateral, os herdeiros que mostrem um interesse legítimo ou quem do condenado tiver recebido incumbência expressa.

Como já se referiu, o recorrente AA assumiu nos autos a qualidade de assistente, e, como tal, apenas relativamente a sentenças absolutórias ou a despachos de não pronúncia lhe assiste legitimidade para a interposição de recurso extraordinário de revisão.

Ora, a decisão de que vem interposto recurso de revisão não se insere em nenhuma daquelas categorias, não sendo senão confirmativa de um despacho que indeferiu o requerimento que o assistente havia apresentado em ordem à passagem, sem custo, de certidão de todo o processo para junção a uma outra acção judicial.

6 – Nestes termos, e pelo que antecede, entende-se dever ser rejeitado, por ilegitimidade do recorrente, o recurso de revisão apresentado pelo assistente AA.»

5. Colhidos os vistos foi o processo remetido à conferência para decisão (artigo 455.º, n.ºs 2 e 3, do CPP).

II. Fundamentação

6. Suscitam-se as questões prévias da recorribilidade da decisão (informação do artigo 454.º do CPP) e da legitimidade do recorrente – informação da Senhora Juíza Desembargadora (artigo 454.º do CPP) e parecer do Ministério Público (artigo 455.º do CPP).

7. O recurso tem por objeto o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 25 de maio de 2021, que transitou em julgado a 3 de março de 2022.

Como se extrai do acórdão recorrido, este foi proferido em recurso de um despacho do juiz da 1.ª instância, de 4.6.2020, exarado no processo então em fase de instrução, que indeferiu um requerimento do recorrente em que este pediu a «passagem de certidão de todo o processo para ser junta numa outra ação que aparentemente correrá termos num outro Tribunal», constituída por «todo o processado, sem que o requerente pague a mesma, devendo, pois, tal certidão ser emitida (e remetida para um outro Tribunal) ao abrigo de apoio judiciário de que o requerente beneficia».

Lê-se no acórdão recorrido:

a. Que o juiz da 1.ª instância proferiu despacho, em 4.6.2020, nos seguintes termos (extrato):

«(…) ainda em sede de inquérito foi concedido ao requerente da passagem de certidão, o benefício do apoio judiciário, em 10/11/1997 (ainda eram os Tribunais que instruíam e decidiam da concessão, ou não, de tal benefício), na modalidade de dispensa total do pagamento de preparos e custas.

Corria o ano de 2003 e o Tribunal da Relação de Évora veio a declarar, em 24/06, a prescrição do procedimento criminal, decisão essa que transitou em julgado e, concomitantemente, findou com o processo.

Estranhamente, em 26/10/2009 este Tribunal aceitou a junção aos autos de uma nova concessão de apoio judiciário, concessão por decisão administrativa de 15/10/2009, na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos, bem como nomeação e patrono pagamento de honorários. E dizemos estranhamente porquanto é por demais óbvio que jamais deveria ter sido deferida a junção desse apoio judiciário porquanto os autos estavam findos.

O apoio judiciário deve ser requerido como preliminar a uma acção ou a uma contestação, ou assim que, no decurso da acção, se torne patente que as condições económicas do requerente se tornaram insuficientes para fazer face aos normais encargos do processo, mas jamais, repetimos, jamais depois de transitada em julgado a decisão que põe termo ao processo.

Ora, como se disse já, estes autos estavam há muito findos quando se veio juntar (e o Tribunal admitiu-o) a apoio judiciário; porém, nunca tal deveria ter sido admitido. Aliás, nem sequer se compreende qual a razão para a nomeação de patrono e pagamento dos respectivos honorários quando estes autos estavam findos!

A decisão da Segurança Social, visando expressamente uma intervenção nestes autos, é absolutamente ineficaz em relação do presente processo. Certidões depois de findos os autos correm por conta de quem as pede e não por conta do apoio judiciário, uma vez que extravasam por completo aquilo que é finalidade normal do instituto.

O instituto, como decorrência do preceituado no art.º 20.º da Constituição da Republica Portuguesa, visa impedir que alguém, por insuficiência económica, fique privado de exercer os seus direitos, seja intentando acção, seja defendendo-se numa acção contra si intentada. E isto pressupõe obviamente que haja uma acção iminente ou uma acção em curso. Não uma acção que já acabou.

A propósito daquilo que é o âmbito do apoio judiciário e em que medida deve o mesmo ser admitido, veja-se, a título de exemplo, o Ac. RE de 09/10/2014

Portanto, e concluindo, a secretaria apenas passará e entregará a requerida certidão desde que observados os requisitos legais em sede de Regulamento de Custas Processuais.»

b. Que o acórdão da Relação, que constitui o acórdão recorrido, decidiu nos seguintes termos:

«(…) muito embora a questão posta à consideração do Tribunal, qual seja, a obtenção de certidão gratuita de todo o processado de um processo crime findo por prescrição do procedimento criminal por alguém a que foi concedido o apoio judiciário, na modalidade de dispensa do pagamento de custas e nomeação de defensor oficioso, depois de findo o processo, já tenha sido objeto de decisão no despacho proferido a 05-06-2020, limitando-se o despacho de 06-07-2020 a referir isso mesmo, com a correspondente condenação em custas pelo incidente anómalo, já que requerido algo sobre o qual já pendia decisão, o que tornaria o presente recurso extemporâneo, como a insistência no requerido é mais extensa, muito embora o conteúdo substantivo da matéria a decidir se mantenha, passar-se-á a conhecer da causa.

E assim sendo, não pode deixar de se dar razão ao Mmº Juiz a quo.

Com efeito, não se compreende como pode beneficiar-se de apoio judiciário num processo findo e há muito arquivado, e no qual foi decidido declarar extinto o procedimento criminal por efeito do decurso do respetivo prazo prescricional.

E muito menos que essa certidão sirva para instruir um processo de falência, sem que se diga porquê.

Chegando-se ao ponto de requerer, neste processo já findo, a apensação do processo crime (findo por prescrição) ao processo de falência, ao que se diz em curso, e no qual o requerente também beneficiará de apoio judiciário.

Ora, se o Tribunal da falência entender ser necessária a certidão em causa, requisitá-la-á, bem como a aludida apensação, não tendo sequer o juiz de um processo findo de se pronunciar sobre questões a este respeito, por serem totalmente alheias ao seu processo, pelo que, na prática, se teriam de considerar como não escritas e daí não ter existido qualquer nulidade, por omissão de pronúncia – cfr. artigo 97º do Código de Processo Penal.

De qualquer forma, e na senda da jurisprudência citada pelo Ministério Público, entende-se que não pode qualquer beneficiário do apoio judiciário vir requerer as certidões que entender, de qualquer processo, sem referir os fins a que as destina e a necessidade das mesmas para a prossecução desses fins.

Como tal, bem andou o Tribunal a quo ao decidir da forma por que o fez.

Assim, e pelo exposto, acordam os Juízes que constituem a secção criminal do Tribunal da Relação de Évora, em negar provimento ao recurso, mantendo, na íntegra, o despacho recorrido.»

8. A revisão de sentença condenatória tem consagração, como direito fundamental, no artigo 29.º, n.º 6, da Constituição, o qual dispõe que “[o]s cidadãos injustamente condenados têm direito, nas condições que a lei prescrever, à revisão da sentença e à indemnização pelos danos sofridos.”

Os artigos 449.º e seguintes do Código de Processo Penal (CPP), admitindo a revisão pro reo e pro societate, estabelecem as «condições» da revisão, por via de recurso extraordinário que a autorize, com realização de novo julgamento, possibilitando a quebra do caso julgado, em homenagem às finalidades do processo – a realização da justiça do caso concreto, no respeito pelos direitos fundamentais –, desta forma se operando o desejável equilíbrio entre a segurança jurídica da definitividade da sentença e a justiça material do caso.

9. A lei enumera os fundamentos e dispõe sobre admissibilidade da revisão no artigo 499.º do CPP. Nos seguintes termos:

«1 - A revisão de sentença transitada em julgado é admissível quando:

a) Uma outra sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão;

b) Uma outra sentença transitada em julgado tiver dado como provado crime cometido por juiz ou jurado e relacionado com o exercício da sua função no processo;

c) Os factos que servirem de fundamento à condenação forem inconciliáveis com os dados como provados noutra sentença e da oposição resultarem graves dúvidas sobre a justiça da condenação;

d) Se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação.

e) Se descobrir que serviram de fundamento à condenação provas proibidas nos termos dos n.ºs 1 a 3 do artigo 126.º;

f) Seja declarada, pelo Tribunal Constitucional, a inconstitucionalidade com força obrigatória geral de norma de conteúdo menos favorável ao arguido que tenha servido de fundamento à condenação;

g) Uma sentença vinculativa do Estado Português, proferida por uma instância internacional, for inconciliável com a condenação ou suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça.

2 - Para o efeito do disposto no número anterior, à sentença é equiparado despacho que tiver posto fim ao processo.

3 - Com fundamento na alínea d) do n.º 1, não é admissível revisão com o único fim de corrigir a medida concreta da sanção aplicada.

4 - A revisão é admissível ainda que o procedimento se encontre extinto ou a pena prescrita ou cumprida.»

A alínea d) do n.º 1 requer a convocação do artigo 453.º («Produção de prova»), que dispõe:

«1 - Se o fundamento da revisão for o previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 449.º, o juiz procede às diligências que considerar indispensáveis para a descoberta da verdade, mandando documentar, por redução a escrito ou por qualquer meio de reprodução integral, as declarações prestadas.

2 - O requerente não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não ser justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor

10. O fundamento da alínea d), convocado pelo recorrente, pressupõe que tenha sido proferida uma sentença condenatória, isto é, uma decisão que, conhecendo do objeto do processo (artigo 97.º, n.º 1, al. a), do CPP), encerrada a audiência de julgamento, se pronuncia pela culpabilidade do arguido (nos termos do artigo 368.º do CPP) e pela aplicação e determinação da pena (nos termos do artigo 369.º do CPP), com respeito pelos requisitos impostos pelos artigos 374.º e 375.º do CPP.

11. Dispõe o artigo 450.º do CPP, sobre a legitimidade para requerer a revisão.

«1 - Têm legitimidade para requerer a revisão:

a) O Ministério Público;

b) O assistente, relativamente a sentenças absolutórias ou a despachos de não pronúncia;

c) O condenado ou seu defensor, relativamente a sentenças condenatórias.

2 - Têm ainda legitimidade para requerer a revisão e para a continuar, quando o condenado tiver falecido, o cônjuge, os descendentes, adoptados, ascendentes, adoptantes, parentes ou afins até ao 4.º grau da linha colateral, os herdeiros que mostrem um interesse legítimo ou quem do condenado tiver recebido incumbência expressa

12. Em síntese, na perspetiva do que agora interessa à decisão, sem necessidade de aprofundamento do exame dos exigentes requisitos e condições constitucional e legalmente impostos, pode concluir-se que: (a) é admissível a revisão de sentenças, condenatórias e, em certos casos, absolutórias (artigo 499.º, n.º 1, e 450.º, n.º 1, al. b), do CPP), isto é, de decisões que conhecem do objeto do processo (artigos 97.º, n.º 1, al. a), do CPP), e de despachos que tiverem posto fim ao processo, por equiparação à sentença (artigo 499.º, n.º 2); (b) a legitimidade do assistente para requerer a revisão está limitada à revisão de sentenças absolutórias – sentenças não condenatórias ou que aplicam medidas de segurança (artigos 375.º e 376.º do CPP) – e de despachos de não pronúncia – despachos proferidos no final da instrução nos casos em que não são recolhidos indícios suficientes de se terem verificado os pressupostos de que depende a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança (artigo 308.º, n.º 1, do CPP), nos termos do artigo 450.º, n.º 1, al. b), do CPP.

13. O recorrente tem a qualidade de assistente, como vem esclarecido na informação a que se refere o artigo 454.º do CPP, e a decisão que impugna é um acórdão do tribunal da Relação que mantém um despacho do juiz da 1.ª instância que recusou a passagem gratuita de uma certidão do processo para junção a outro processo, que o recorrente requereu com a alegação de que gozava de apoio judiciário.

A decisão que o recorrente pretende que seja revista não é, pois, nem uma sentença absolutória nem um despacho de não pronúncia e o fundamento invocado – da al. d) do n.º 1 do artigo 449.º do CPP – diz respeito à revisão de sentença condenatória («condenação», diz o preceito).

Assim sendo se impõe concluir que nem a decisão objeto do recurso constitui uma decisão recorrível em recurso extraordinário de revisão, nem o recorrente tem legitimidade para dela interpor recurso.

14. Verificam-se, assim, dois fundamentos de inadmissibilidade do recurso, que determinam a sua rejeição, nos termos do disposto nos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, al. b), do CPP, aplicáveis por analogia ex vi artigo 4.º do CPP, havendo lugar à condenação na sanção prevista no n.º 3 do artigo 420.º do CPP.

III. Decisão

15. Pelo exposto, acorda-se na secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça em rejeitar o requerimento de recurso de revisão apresentado por AA.

Condena-se o recorrente em custas, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC (artigo 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e respetiva Tabela III, em anexo).

Nos termos do artigo 420.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, condena-se o recorrente ao pagamento da importância de 5 UC.

Supremo Tribunal de Justiça, 3 de julho de 2024.

José Luís Lopes da Mota (Relator)

Eucária Maria Martins Vieira (Adjunta)

Pedro Manuel Branquinho Dias (Adjunto)

Nuno António Gonçalves (Presidente da Secção)