Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
Relator: | TERESA FÉRIA | ||
Descritores: | HABEAS CORPUS PRESSUPOSTOS ROUBO TRÂNSITO EM JULGADO REJEIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 02/17/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | HABEAS CORPUS | ||
Decisão: | INDEFERIDO POR FALTA DE FUNDAMENTO | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em Audiência na 3ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, I AA requer que lhe seja concedida a providência de Habeas Corpus, nos termos do art.º 222º nº 2, alínea b) do C.P.P., por entender como ilegal a pena de prisão aplicada.
II Na sua Petição expõe o que segue: I – Introito:
No pretérito dia 27/01/2021, o Recluso ora Requerente, foi detido e conduzido ao Estabelecimento Prisional ....., em cumprimento de mandado de detenção e condução a estabelecimento prisional emitido nos presentes autos; Aí permanecendo, em Reclusão, desde o predito dia 27/01/2021 e à ordem dos autos de processo identificados supra.
II – Fundamentando: A – Marcha processual Relevante. Em 29/05/2014, o Recluso foi condenado numa pena única de 3 (três) anos de prisão efetiva. Inconformado, o Recluso interpôs recurso a subir aos Venerados Srs. Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação ........., o qual foi julgado integralmente improcedente. Inconformado, em 17/01/2020, o Arguido interpôs recurso a subir ao Supremo Tribunal de Justiça; Recurso que não fora admitido e sobre qual decisão de indeferimento, fora interposta reclamação ao Exmo. Sr. Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça; Tendo o mesmo julgado aquela reclamação improcedente. De novo inconformado, em 12/06/2020, o Arguido interpôs recurso a subir ao Tribunal Constitucional; Tendo sido proferida decisão singular para conhecimento do mérito daquele recurso, em 05/11/2020. Por fim, conquanto permanecesse inconformado com a douta decisão sumária proferida, o Arguido, em 19/11/2020, ofereceu reclamação, tendo peticionado o julgamento do Recurso em Conferência, nos termos do artigo 78º / 3 da Lei do Tribunal Constitucional.
B – Ilegalidade da prisão. Conforme se infere do teor dos factos vertidos na calátide que antecede, aquando da emissão dos mandados de detenção, ainda não se encontrava transitada em julgado a douta decisão proferida em primeira instância. Consabido é que, o cumprimento efetivo de pena de prisão pressupõe o trânsito em julgado da decisão de condenação; Trânsito em julgado que, reitere-se, ainda não ocorreu, porquanto: Como se deixou dito, tendo sido proferida decisão sumária, pelos Venerados Srs. Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, fora requerido o julgamento do requerimento de Recurso oportunamente interposto, em conferência, nos termos do artigo 78º / 3 da Lei do Tribunal Constitucional; O que o ora Requerente fez no dia 19/11/2020; Julgamento em conferência que, até à presente data, ainda não ocorreu. Assim, a omissão do conhecimento daquele requerimento de julgamento em conferência, haverá de desaguar na imposição da indefesa do arguido, i. é.: A dita omissão cerceará, ao arguido, o direito de defesa e recurso que lhe é conferido. Retomando a alegação que antecede, cumpre evidenciar que a decisão sobre a qual fora emitido mandado de detenção e condução a estabelecimento prisional, ainda não se encontra transitada em julgado; Com o que, faltara um pressuposto indispensável à execução da decisão penal aqui em evidência, conforme previsto e estatuído pelo artigo 467º / 1 do Código de Processo Penal, porquanto: Reitere-se, o trânsito em julgado apenas ocorrerá quando a decisão penal que determine a execução de pena de prisão efetiva não seja suscetível de recurso; O que ainda não ocorreu; Em face do que, enfermam o mandado de detenção e condução a estabelecimento prisional e subsequente reclusão efetiva do arguido, de ostensiva e manifesta ilegalidade.
III – Peticionando: Conforme se evidenciou na calátide que antecede, a reclusão do arguido, ora requerente, encontra-se eivada de manifesta e ostensiva ilegalidade; Resultando a predita ilegalidade da omissão de julgamento em conferência, da competente secção do Tribunal Constitucional. Bem sabemos que, não cabe ao Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito da providência requerida, pronunciar-se sobre nulidades ou irregularidades processuais ocorridas nos autos onde foi aplicada a pena de prisão. Porém, in casu, a invalidade ou irregularidade ocorrida (omissão de julgamento em conferência), constitui erro grosseiro ou erro grave na aplicação do direito que torna patente a ilegalidade da prisão, para os efeitos da alínea b) do artigo 222º / 2, do CPP; Constituindo o predito erro, em nosso entendimento, a causa e o fundamento da ilegalidade da presente prisão; Não podendo o presente tribunal, por consequência, omitir-se ao seu conhecimento; Outrossim e em nosso entendimento, deverá julgar verificados os pressupostos a que alude o predito artigo 222º / 2, alínea b), do CPP; Devendo, por consequência, ser concedido provimento à presente petição da conceção de providência de habeas corpus. Nestes termos e nos mais de Direito, deve a presente petição da conceção de providência de habeas corpus ser julgada procedente, por provada, e em consequência, deve ser ordenada a imediata libertação do ora Requerente.
III O Despacho proferido nos termos do artigo 223º nº 1 do CPP dá por integralmente reproduzida a promoção de 12.02.2021 a qual informa que: Assim, veio o arguido AA, encontrando-se detido à ordem destes autos em cumprimento da pena de prisão em que foi condenado nestes autos desde 27.01.2021, mediante requerimento dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, peticionar a providência de habeas corpus, com os fundamentos aí aduzidos. Como assim, nos termos do disposto no artigo 223.º n.º 1 do Código de Processo Penal passamos a prestar informação acerca das condições em que foi efetuada e se mantém a privação da liberdade do requerente. Nestes autos, após a realização de diligências de investigação, por despacho datado de 25.08.2016, foi proferido despacho de acusação pelo Ministério Público, no qual se imputava a prática ao arguido AA, em autoria material e na forma consumada, em co-autoria material, na forma consumada, um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.º 1 e 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, agravado pelo artigo 86.º, n.º 3, da Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro.- vide despacho de acusação constante da referencia ……43 datada de 13.07.2016. Entretanto, após a realização de Audiência de Discussão e Julgamento, foi proferido douto acórdão condenatório, na data de 16.12.2017, tendo o arguido AA sido condenado pela prática de um crime de roubo simples, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 210. °, n.º1, do C. Penal, na pena de 3(três) anos de prisão efetiva - vide referência 79400750. Nessa sequência, o arguido não se conformando com a decisão condenatória interpôs para o Venerando Tribunal da Relação de ......., tendo sido proferida decisão de admissão do recurso - vide referências ……62 de 24.03.2017 e ……99 de 16.05.2017. Posteriormente o Venerando Tribunal da Relação ........., por acórdão datado de 29.11.2017, anulou a decisão recorrida e ordenou o reenvio total do processo para novo julgamento - vide referência ……46 de 29.11.2017. Nessa sequência, entretanto, após a realização de Audiência de Discussão e Julgamento, foi proferido douto acórdão condenatório, na data de 28.03.2019, tendo o arguido AA sido condenado como co-autor material pela prática de um crime de roubo simples, previsto e punido pelos artigos 210º n.º 1 do Código Penal (para o qual se convolou o crime de roubo agravado), na pena de 3 (três) anos de prisão efectiva - vide referência …..76 de 28.03.2019. Nessa sequência, de novo, o arguido não se conformando com a decisão condenatória interpôs para o Venerando Tribunal da Relação ......, tendo sido proferida decisão de admissão do recurso - vide referências …….95 de 07.05.2019 e ……24 de 22.05.2019. Posteriormente o Venerando Tribunal da Relação ........, por acórdão datado de 27.11.2019, julgou totalmente improcedente o recurso interposto pelo arguido AA, negando provimento ao recurso e mantendo a decisão recorrida - vide referência ……77 de 27.11.2019. Nessa sequência, o arguido não se conformando com o teor do douto acórdão condenatório interpôs recurso para o Supremo Venerando Tribunal de Justiça - vide referências ……56 de 17.01.2020. Posteriormente, pelo Venerando Tribunal da Relação .......... foi proferida decisão datada de 14.02.2020, de não admissão do recurso interposto, por ser irrecorrível a decisão, na medida em que, nos termos do disposto no art. 400º, nº 1, f) do C. Processo Penal, não é admissível recurso dos acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão da 1ª instância e apliquem pena de prisão não superior a oito anos, sendo que era o caso dos autos - vide referência …….93, de 13.02.2020. Nessa sequência, o arguido não se conformado com o teor da decisão proferida, na data de 02.03.2020, veio aos autos oferecer reclamação contra o indeferimento do recurso apresentado, a subir ao Exmo. Sr. Dr. Juiz Presidente do Supremo Tribunal de Justiça - vide referência …..59 de 02.03.2020. Posteriormente, por decisão proferida na data de 18.03.2020, foi indeferida a reclamação deduzida pelo arguido AA - vide referência ……18 de 18.03.2020. De novo inconformado com o teor da decisão proferida, dela interpôs recurso para os Venerandos Senhores Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional - vide referência …68 de 15.06.2020. Nessa sequência, o Tribunal Constitucional proferiu decisão sumária na data de 05.11.2020, decidindo não conhecer do recurso interposto nestes autos pelo arguido AA - vide referência ……15 de 05.11.2020. Entretanto, o Venerando Tribunal Constitucional certifica documentalmente o trânsito em julgado da sua decisão de 05.11.2020 no dia 26 de novembro de 2020, retroagindo à data de 19 de novembro de 2020 - vide referências …..57 de 03.12.2020 - fls. 879. Sendo que na data de 03.12.2020, ocorreu a remessa dos presentes autos para o Supremo Tribunal de Justiça - vide referência ….57 de 03.02.2020. Posteriormente, em 14.12.2020, ocorreu a baixa definitiva dos presentes autos para o venerando Tribunal da Relação .......... - vide referência …….63 de 14.12.2020. E, na data de 06.01.2021, ocorreu a baixa definitiva dos presentes autos para a 1ª Instância. E na medida em que se dava conta de que tinha ocorrido o trânsito em julgado do douto acórdão condenatório proferido nestes autos na data de 28.03.2019, e cujo trânsito ocorreu na data de 19.11.2020 (sendo que é o Venerando Tribunal Constitucional que, documentalmente, certifica o trânsito em julgado da sua decisão no dia 26 de novembro de 2020, retroagindo à data de 19 de novembro de 2020) - cfr. fls. 879 e referência …..57 de 03.12.2020, e nada constando nos autos que fizesse duvidar dessa certificação, nessa sequência, de modo a dar cumprimento ao nele ordenado, na data de 21.01.2021 foram emitidos os competentes mandados de detenção do arguido para cumprimento da pena de prisão em que foi condenado nestes autos (pena 3 anos) - vide referência …….93. Entretanto, na data de 27 de janeiro de 2021, pelas 11h50, procedeu-se à detenção do arguido AA, tendo este sido conduzido para o estabelecimento prisional regional ............, onde deu entrada pelas 14h56 desse mesmo dia - vide referência ……24 de 27.01.2021 e …….75 de 11.02.2021. Posteriormente à entrada da petição de habeas corpus e que deu origem a este apenso, e levando em conta que é argumentado ter o arguido AA apresentado no Tribunal Constitucional uma reclamação da decisão para a conferência e que não foi apreciado e por essa razão não ocorreu ainda o trânsito em julgado da decisão condenatória proferida nos autos, foi o arguido notificado para juntar aos autos, comprovativo de ter dado entrada do recurso que diz ter interposto e que ainda, segundo afirma, não foi apreciado pelo Tribunal Constitucional - vide referência ……79 de 04.02.2021. Nessa sequência, veio o arguido AA, através da sua ilustre mandatária do arguido (com substabelecimento sem reserva datado de 03.02.2021 e comunicado a estes autos nessa mesma data), juntar documento comprovativo do envio de reclamação para a conferência na data de 19 de novembro de 2020 23:51 através de mensagem pelo endereço de correio eletrónico “............@adv.oa.pt” - vide referência …….83 de 03.02.2021. E, tendo sido também nestes autos solicitado ao Venerando Tribunal Constitucional, no sentido de informar se o arguido deu entrada de algum recurso relativo aos presentes autos, tendo em conta a certidão por si emitida em 26 de novembro de 2020 e se, sim, em que estado se encontra a sua apreciação, veio esse Venerando Tribunal informar que: a) Não foi recebido nos serviços do Tribunal Constitucional qualquer mensagem contendo reclamação para a conferência; b) Tal mensagem não passou nos servidores da Ordem dos Advogados; c) O mandatário do recorrente foi notificado da conta de custas por carta de 03.12.2020, sendo que no rosto da notificação seguia a menção expressa de que os autos seriam remetidos ao Supremo Tribunal de Justiça nessa mesma data. Mais se fez constar que se das circunstâncias relatadas em a) e b) resulta que não é possível demonstrar que a mensagem foi enviada e recebida, o que se mostra decisivo, e decorre de c), é que o recorrente tomou conhecimento do termo do processo no Tribunal Constitucional, pelo menos, no início de dezembro, não tendo o arguido qualquer nulidade decorrente da omissão da apreciação da reclamação, o que podia e devia ter feito em tempo. Consignou-se ainda que, essa possibilidade encontra-se agora precludida, pelo que nenhum elemento transmitido é apto a afastar o trânsito em julgado da Decisão Sumária n.º 620/2020 em 19.11.2020 - vide referência ……57 de 03.12.2020. * Neste quadro, tendo em conta que a decisão condenatória transitou em julgado, segundo o que certificou o Tribunal Constitucional e que posteriormente veio a reafirmar na informação prestada com a informação de que nenhum elemento transmitido é apto a afastar o trânsito em julgado da Decisão Sumária n.º 620/2020 em 19.11.2020, e permanecendo a mesma nos exatos termos em que foi proferida até ao momento, não vemos razão para alterar a situação do arguido AA que se encontra em situação de cumprimento de pena de prisão em que foi condenado. IV Da consulta dos Autos constata-se que este se encontra instruído com certidão das seguintes peças: 1. Acusação pública, datada de 25.08.2016; 2. Acórdão, proferido nestes Autos pelo Juízo Central Criminal ........ - .. - datado de 16.02.2017, que condenou o Arguido pela prática de um crime de roubo simples na pena de 3 anos de prisão; 3. Recurso ordinário interposto pelo Arguido datado de 24.03.2017; 4. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação .... datado de 29.11.2017, determinando o reenvio do processo para novo julgamento, relativamente à totalidade do seu objeto; 5. Acórdão, proferido nestes Autos pelo Juízo Central Criminal ....... - .. - datado de 28.03.2019, que condenou o Arguido pela prática de um crime de roubo simples na pena de 3 anos de prisão; 6. Recurso ordinário interposto pelo Arguido datado de 07.05.2019; 7. Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação ..... datado de 27.11.2019, confirmando a condenação do Arguido pela prática de um crime de roubo simples na pena de 3 anos de prisão; 8. Recurso ordinário interposto pelo Arguido datado de 17.01.20; 9. - Despacho de Não admissão de recurso para o STJ, proferido a 14.02.20, pelo Tribunal da Relação ..........; 10. Reclamação contra a Não admissão de recurso para o STJ; 11. Decisão de indeferimento da Reclamação proferida pela Vice-Presidente do STJ datada de 18.03.20; 12. Recurso para o Tribunal Constitucional, de 12.06.20 13. Despacho do Relator no Tribunal Constitucional de 09.10.20, convidando o Arguido a corrigir lapso de escrita; 14. Notificação ao Arguido do Despacho referido em 12; 15. Decisão Sumária proferida pelo Tribunal Constitucional datada de 05.11.2020, decidindo não conhecer o recurso interposto pelo Arguido; 16. Notificação ao Arguido da Decisão Sumária referida em 14, datada de 06.11.20; 17. Certidão da data de trânsito em julgado - 19.11.20 - da Decisão Sumária referida em 14; 18. Conta de Custas no TC, datada de 02.12.20; 19. Notificação do Tribunal Constitucional ao Mandatário do Arguido, datada de 03.12.20, para reclamação da conta de custas; 20. Mandado de detenção do Arguido, datado de 21.01.21; 21. Comunicação da detenção do Arguido pela GNR, datada de 27.01.21; e expediente reportado ao cumprimento do mandado de detenção do Arguido para cumprimento e entrada no EP .... 22. Requerimento do Arguido, datado de 05.02.21, dirigido ao Juiz de Direito do Juízo Central Criminal ......., alegando não ter sido proferida decisão em Conferência do recurso por si interposto no Tribunal Constitucional, de acordo com o peticionado em 19.11.20 23. Ofício do Tribunal Constitucional dirigido ao Juízo Central Criminal ......., datado de 05.02.21, informando não haver sido recebida naquele Tribunal qualquer Reclamação para a Conferência da Decisão Sumária referida em 15; 24. Mensagem de e-mail, datada de 04.02.21, do Tribunal Constitucional, indicando não haver registo do recebimento no TC de qualquer mensagem proveniente do endereço de mail do Advogado do Arguido; 25. Mensagem de e-mail, datada de 05.02.21, do Departamento Informático do Conselho Geral da Ordem dos Advogados, indicando não haver, nos respetivos sistemas, registo de qualquer e-mail remetido pelo Advogado do Arguido para o Tribunal Constitucional.
V Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 223º nº 1 a 3 do CPP. Realizada a Audiência, cumpre apreciar e decidir: Nestes Autos, o peticionante fundamenta o seu pedido de concessão da providência de Habeas Corpus na invocação da ilegalidade da pena de prisão pela qual foi detido por, em seu entender, a decisão judicial que a aplicou não haver ainda transitado em julgado A consagração constitucional da providência de Habeas Corpus configura-se como um meio de garantia de defesa do direito individual à liberdade, reconhecido pela Lei Fundamental no seu artigo 27º, mormente em virtude de prisão ou detenção ilegal. Nessa conformidade, a lei processual penal elenca os fundamentos e o procedimento de tal providência, dispondo-se no artigo 222º nº 2 do CPP, poder ser invocado como fundamento da ilegalidade da prisão contra a qual se pretende reagir: a) Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente; b) Ser motivada por facto pelo qual a lei não permite; ou c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial. Alegando não ter ainda transitado em julgado a decisão judicial que o condenou numa pena de 3 anos de prisão, o peticionante entende ser ilegal a sua detenção e consequente cumprimento daquela pena, e como tal suscetível de ser objeto da providência de Habeas Corpus. Todavia, esta sua alegação carece do necessário suporte legal. Pois, como se estatui claramente no Acórdão deste Supremo Tribunal firmado no processo nº 1257-12.0jflsb-C.S1-3ª, e relatado pelo Ex.mo Conselheiro Pires da Graça, “o habeas corpus não se destina a formular juízos de mérito sobre as decisões judiciais determinantes da privação de liberdade, ou a sindicar nulidades ou irregularidades nessas decisões – para isso servem os recursos ordinários - mas tão só a verificar, de forma expedita, se os pressupostos de qualquer prisão constituem patologia desviante (abuso de poder ou, erro grosseiro) enquadrável no disposto das três alíneas do nº 2 do artº 222º do CPP., Um acto processual destinado a produzir efeitos jurídicos no processo, sem prejuízo da discussão e decisão que aí possa suscitar e, do direito ao recurso, quando admissível, só pode, porém, desencadear a providência, excepcional, de habeas corpus, se gerar consequência que integre um dos pressupostos constantes do artigo 222º nº 2 do Código de Processo Penal. Isto significa que o habeas corpus também não é o meio próprio de impugnação da oportuna liquidação da pena, que sendo definida e decidida em despacho judicial, somente poderá ser impugnável por via do recurso ordinário.” Da consulta dos Autos constata-se que o recorrente foi condenado, pelo Juízo Central Criminal......., numa pena de 3 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo simples. Condenação esta posteriormente confirmada pelo Tribunal da Relação .... . Inconformado com esta decisão, o peticionante veio a interpor recurso ordinário para o STJ. Como este recurso não foi admitido, por força do disposto no artigo 400º nº 1 al. f) do CPP, o ora requerente apresentou uma Reclamação para o presidente do STJ, cujo indeferimento determinou a apresentação de um recurso para o Tribunal Constitucional. Por Decisão Sumária o Tribunal Constitucional decidiu não conhecer do recurso, tendo procedido à legal notificação desta decisão, a qual veio a transitar em 19.11.20. Nesta conformidade veio a ser executado em 27.01.21 o mandado de detenção do peticionante para cumprimento da pena de 3 anos de prisão em que havia sido condenado. Da análise dos Autos constata-se, ainda, que posteriormente àquela data veio a ser remetida a conta de custas dos Autos ao peticionante e ainda que em 05.02.21, o peticionante alega haver apresentado no Tribunal Constitucional uma Reclamação para a Conferência da Decisão Suméria acima mencionada. Reclamação essa, porém, cujo registo de entrada se mostra não haver sido recebida naquele Tribunal, inexistindo registo informático seja do recebimento no Tribunal Constitucional de qualquer mensagem proveniente do endereço de mail do Advogado do peticionante, seja da sua expedição no sistema informático gerido pelo Departamento Informático do Conselho Geral da Ordem dos Advogados. De todo o exposto resulta, assim, que não podendo ser considerado ou tida em conta um requerimento de Reclamação para a Conferência que se mostra inexistente, por não haver qualquer registo da sua expedição ou do seu recebimento, é forçoso concluir que foram esgotados todos os meios jurisdicionais de impugnação da decisão condenatória em causa nestes Autos, pelo que esta se mostra devida e legalmente transitada. Assim sendo outra conclusão se não impõe que não seja a de entender que o peticionante se encontra em cumprimento de uma pena de prisão que lhe foi imposta por força de um Acórdão condenatório já transitada em julgado. Assim, a pena que o peticionante se encontra a cumprir foi ordenada pela entidade competente, o Tribunal de condenação, foi motivada pela prática de um crime, o previsto no artigo 210º do Código Penal, e não atingiu ainda o seu termo. Inexistem assim quaisquer factos que possam preencher algum dos pressupostos que a lei elenca no artigo 222º nº 2 do CPP como sendo os adequados a aferir a ilegalidade de uma privação da liberdade. Na verdade, e como é Jurisprudência constante deste Supremo Tribunal “no âmbito da providência de habeas corpus o Supremo Tribunal de Justiça apenas pode e deve verificar se a prisão resultou de uma decisão judicial, se a privação da liberdade foi motivada pela prática de um facto que a admite e se estão respeitados os respectivos limites de tempo fixados na lei ou em decisão judicial. Isto sem prejuízo de, nos limites da decisão no âmbito da providência de habeas corpus, não condicionada pela via ordinária de recurso, se poder efectivar o controlo de situações graves ou grosseiras, imediatamente identificáveis e “clamorosamente ilegais” (na expressão do acórdão deste Tribunal de 3.7.2001, Colectânea, Acórdãos do STJ, II, p. 327), de violação do direito à liberdade.”([1]) Nesta conformidade, forçoso é julgar ser improcedente o peticionado por ausência de fundamento legal.
VI Termos em que se acorda em indeferir a requerida concessão da providência de Habeas Corpus por falta de fundamento bastante, nos termos do disposto no artigo 223º nº 4 al. a) do CPP. Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 1UC, nos termos do artigo 8º nº 9 da Tabela III do Regulamento das Custas Processuais. Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 15º-A do Dec-Lei nº 20/2020 de 1 de maio, consigno que o presente Acórdão tem voto de conformidade do Ex.mo Adjunto, Juiz Conselheiro Sénio dos Reis Alves.
Feito em Lisboa, aos 17 de fevereiro de 2021.
Maria Teresa Féria de Almeida (Relatora)
António Pires da Graça (Presidente) _______ [1] Ac. de 10.04.2019 , proc. nº503/14.0PBVLG-I.S1, Relator Conselheiro Lopes da Mota |