Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | AZAMBUJA DA FONSECA | ||
Descritores: | CUSTAS RECONVENÇÃO INUTILIDADE SUPERVENIENTE DA LIDE SIMULAÇÃO CONTRATO DE TRABALHO REVOGAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO REVOGAÇÃO PENSÃO DE REFORMA PENSÃO COMPLEMENTAR DE REFORMA RENÚNCIA DO DIREITO A PENSÃO PRESCRIÇÃO | ||
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Nº do Documento: | SJ200310070017854 | ||
Data do Acordão: | 10/07/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T TRABALHO PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 278/02 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Sumário : | I - A responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade: paga as custas a parte que lhes deu causa, a parte que não foi atendida na sua pretensão, que não tem razão no pedido que deduziu. II - Tendo o autor com o seu pedido, que improcedeu, dado origem a que a ré formulasse um pedido reconvencional cuja apreciação, e decisão, se tornou inútil pela improcedência daquele, terá que ser o autor a suportar as custas de tal pedido reconvencional. III - São elementos integradores da simulação: a) intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração; b) acordo entre declarante e declaratário, não excluindo a possibilidade de simulação nos negócios unilaterais; c) intuito de enganar terceiros. IV - Não resultando do acordo de revogação do contrato de trabalho, que autor e ré celebraram, em que se mencionava que aquele produzia efeitos a partir de 31.12.96, o intuito das partes, ou pelo menos de uma delas, de enganar terceiros, não se pode considerar que foi celebrado um negócio simulado. V - Tendo o autor declarado no acordo de revogação do contrato de trabalho, e com a compensação pecuniária recebida, "nada mais lhe ser devido a qualquer título", desta declaração genérica não é possível concluir-se que tenha renunciado à pensão complementar de reforma. VI - O direito à pensão de reforma, ou complemento de reforma, é um direito "diferido", pois só se concretiza com o atingir de determinada idade, os 65 anos ou a invalidez, existindo anteriormente uma expectativa jurídica ao seu recebimento. VII - Embora tal direito derive de uma anterior relação de trabalho, uma vez cessada esta, o mesmo dela se autonomiza, nascendo uma nova relação jurídica, agora no âmbito da segurança social. VIII - Em matéria de prescrição de reforma, há que distinguir dois direitos: o direito à reforma, como direito unitário a receber as respectivas pensões vitalícias, e o direito às prestações periódicas em que a reforma se concretiza ao longo do tempo: enquanto a estas prestações, e respectivos juros legais, se aplica o prazo de prescrição de cinco anos, previsto no art.º 310, al. d) e g), do CC - sendo, assim, inaplicável o disposto no art.º 38, da LCT -, ao direito unitário à pensão aplica-se o prazo de prescrição de 20 anos previsto no art.º 309, do mesmo diploma legal. IX - Assim, tendo o autor sido reformado em 22.05.96, começou nessa data a vencer-se o direito à pensão de reforma e prestações periódicas e, tendo a ré sido citada para a acção em 26.09.02, encontram-se prescritas as prestações periódicas vencidas antes de 26.09.97. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório A (casado, reformado, residente na Rua ..., ... - 4200-099 Porto), intentou, em 15.07.02, no Tribunal do Trabalho do Porto, acção declarativa com processo comum, contra B - Refinarias de Açúcar Reunidas, S.A. (com sede na Rua ..., ..., Apartado 4101 Porto Codex), pedindo a condenação desta a: "a) reconhecer que o A. tem direito à compensação mensal de invalidez correspondente a 15% da remuneração base que auferia quando se verificou a sua passagem a reformado por invalidez (22.5.96) paga 13 vezes ao ano. b) pagar ao A. por complementos vencidos desde a concretização da invalidez até ao presente a quantia global de 6.555.000$00 - € 32.696, 20; c) pagar ao A. os complementos mensais de pensão de invalidez vincendos se e enquanto se recusar a conceder-lhe o referido direito; d) pagar os juros, à taxa legal, sobre estas importâncias desde a data da citação até efectivo pagamento". Alegou, para o efeito, e em síntese, ter sido reformado por invalidez, em 22.05.96, nunca a ré lhe tendo pago o complemento de reforma por invalidez igual a 15% da sua remuneração mensal ilíquida previsto no Fundo de Pensões instituído pela ré em fins de 1987, ao qual tinha direito por ter mais de 5 anos de serviço e porque a situação de invalidez que o atingiu é de incapacidade definitiva, impossibilitando-o de exercer a sua profissão habitual, bem como qualquer outra actividade similar própria da sua formação e conhecimento. Realizada infrutífera audiência de partes, contestou a ré pugnando pela improcedência da acção, por, em síntese, em 09.06.95, ter acordado com o autor a rescisão do contrato de trabalho entre ambos vigente, com efeitos a partir de 31.12.96, nesta data, em cumprimento do ponto 3 do "Acordo de Rescisão do Contrato de Trabalho", logo tendo pago ao autor a título de compensação pecuniária - que incluía a indemnização e os vencimentos que o autor iria auferir até 31.12.96 - a quantia de 17.791.670$00, na mesma altura lhe tendo entregue o respectivo impresso para o Fundo de Desemprego, completamente preenchido e com data de 31.12.96. E que o deferimento da eficácia extintiva do acordo revogatório para 31.12.96 e da consequente dilação da data do início da situação de desemprego, foi convencionado pelo facto de o autor alegar a importância para si de contar mais alguns meses de trabalho em ordem a beneficiar a contagem da sua antiguidade. Mais alegou que logo a seguir à data da outorga do acordo revogatório, em 12.06.95, o autor entrou de baixa médica, tendo começado a receber prestações contributivas da segurança social e , em 28.06.96, o autor requereu à ré uma licença. Acrescentou, ainda, em sua defesa, que mesmo a verificar-se o direito do autor à pensão, já estaria prescrito, face ao constante do art. 38º da LCT. Reconvencionalmente, pediu o pagamento pelo autor "...das importâncias pagas a título de vencimentos durante o período de baixa/licença sem vencimento, de 9 de Junho de 1995 a 31/12/96 no montante de € 63.098,00, com juros à taxa legal desde o seu pagamento, os quais ascendem, no momento a € 22.084,00. Em caso de procedência do pedido feito na acção deverá também ser julgado procedente, além do pedido reconvencional dos vencimentos recebidos na situação de baixa/licença sem vencimento, o pedido reconvencional do montante da indemnização paga ao A., de Esc. 5.141.670$00 (€25 646,54), acrescida de juros de mora à taxa legal desde o seu pagamento, os quais ascendem, no presente, a 8.796 euros." Respondeu o autor, mantendo ser-lhe devido o complemento de reforma pedido e defendendo não ser aplicável ao caso a prescrição de um ano por se tratar de prestações periodicamente renováveis, prescritíveis no prazo de cinco anos (art. 310.º do CC) e sustentando, quanto ao pedido reconvencional formulado pela ré, que os créditos não existiram e, caso existissem, se encontravam prescritos por ter decorrido mais de um ano entre a data da cessação do contrato de trabalho (23.05.96) e a data em que foi notificado de tal pedido. Finalmente alegou que ainda que da sua parte tivesse havido enriquecimento sem causa - o que não houve - também estaria prescrito o direito à respectiva restituição por terem decorrido mais de 3 anos entre a data em que a ré teve conhecimento da reforma do autor (24.08.96) e a da mesma notificação ao autor dos pedidos reconvencionais. Conclui, por isso, pela improcedência das excepções deduzidas pela ré e pela procedência das prescrições por si deduzidas quanto ao pedido reconvencional. Veio ainda a ré responder, concluindo como na contestação/reconvenção. Por despacho de fls. 65 foi dispensado o proferimento do despacho previsto no art. 61.º do CPT e da audiência preliminar prevista no art. 62.º, do mesmo diploma legal. Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, após o que, em 27.02.03, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu a ré dos pedidos contra ela deduzidos pelo autor. Inconformado, o autor recorre de revista, "per saltum", nos termos do art. 725.º do CPC, aplicável "ex vi" do art. 1.º, n.º 2, al. a) do CPT, tendo nas suas alegações apresentado as seguintes conclusões: 1º - A. e R., ao celebrarem em 9 de Junho de 1995, o acordo de revogação do contrato de trabalho, quiseram exclusivamente que tal revogação se operasse - só iniciasse a produção dos seus efeitos -, a partir de 31 de Dezembro de 1996. 2º - As recíprocas declarações do A. e R. neste sentido constam dos documentos de fls. 26 e 27 dos autos e são claras e inequívocas. 3° - E cumprindo-se no documento de fls. 27 as formalidades ad substantiam exigidas por lei - Art. 8° do DL 64-A/89 - passando a escrito o acordo de revogação e nele constando as datas de celebração do Acordo e a do início da produção dos seus efeitos. 4° - Em tal acordo revogatório A. e R. não tiveram a mais pequena intenção de declararem o que não era sua vontade. 5º - Ao A. só interessava a revogação do contrato de trabalho em 31.12.96, o que a R. aceitou com a condição de o A. não lhe prestar mais trabalho a partir da data da celebração do Acordo(9.6.95). Ora, 6° - Para se garantir o cumprimento desta condição criaram-se os mecanismos que o Meritíssimo Juiz a quo refere como os indícios de "simulação" por ele descoberta. Todavia, 7° - Estes apenas visavam e eram adequados para a criação da dita garantia e nada mais. Tanto que, 8° - O documento de fls. 29 - declaração passada pela R. para efeitos de Subsídio de Desemprego - referencia a real vontade das partes: ali consta a cessação do contrato de trabalho em 31.12.96. 9° - A estipulação de que o A. não prestaria mais trabalho à R. não equivale a qualquer cessação do contrato, mas antes a suspensão do mesmo, mantendo-se os direitos, deveres e garantias das partes e contando-se ainda o tempo de suspensão para efeitos de antiguidade - Art. 2° do DL 398/83 de 2 de Novembro. 10° - A intenção do A. tentar entrar de baixa médica decorreu de ele não se sentir com saúde, como o demonstra o facto de lhe ter sido concedida a mesma e ter até vindo a culminar com uma imprevista (pelo menos, em 9.6.95) reforma por invalidez, menos de um ano após o início da baixa (22.5.96). 11º - Os pedidos de licença sem vencimento e sua concessão destes nos documentos de fls. 30 e 31 (elaborados logo em 9.6.1995) visavam a garantia de se manter o contrato suspenso. 12º - E a caução, prestada pelo A., através de cheque (documento de fls. 46) à R. no valor correspondente aos descontos para Segurança Social e de IRS, que poderia ser necessário se o A. não conseguisse a baixa médica, tem o significado inequívoco de que o contrato de trabalho se mantinha em vigor depois de 9.6.95, sendo ainda de salientar neste procedimento o intuito de não prejudicar nem enganar a Segurança Social nem a Fazenda Nacional. 13° - A. e R. nada ficcionaram, tendo estabelecido um acordo revogatório como efectivamente ambos o queriam, correspondendo integralmente o teor do mesmo à vontade de ambos. 14° - Inexiste qualquer simulação. Acresce que, e sem prescindir, 15° - Quer nos autos, quer na sentença dada por provada não existem quaisquer factos que possam preencher o requisito de simulação "intuito de enganar Terceiro". 16° - Tivessem A. e R. pretendido a ficção que o Meritíssimo Juiz a quo diz ter encontrado - o que só por mera hipótese se coloca -, e não se encontraria nem entenderia a razão de ser de tal actuação. Em suma, 17° - A. e R. acordaram na cessação do contrato querendo exclusivamente que tal Acordo produzisse efeitos a partir de 31.12.96, coincidindo inteiramente a vontade real com a vontade por elas declarada. 18° - E não existindo qualquer simulação não pode ser declarado nulo o ponto n.º 2 do Acordo de Rescisão do contrato de trabalho celebrado entre A. e R., não se podendo, consequentemente, declarar que a data da produção dos efeitos da rescisão se reportou à data da celebração. E assim, 19° - O acordo revogatório do contrato de trabalho só produzia efeitos em 31.12.96, havendo ainda que ter em consideração que o A. ainda poderia posteriormente alterar a sua decisão nos termos do Art. 1° da Lei 38/96 de 31 de Agosto. No entanto, 20° - Tendo o A. sido reformado por invalidez em 22 de Maio de 1996, o contrato de trabalho caducou nesta data - Art. 4.º DL 64-A/89 -, e o acordo de revogação do contrato não se pôde concretizar. 21° - Mantendo o A. e R. até à data da caducidade (22.5.96) o contrato de trabalho em vigor, estando ainda o A. ao serviço da R., assiste a este o direito ao complemento de reforma correspondente a 15% do Salário Pensionável - Ponto 3 da Cl. VII do Fundo de Pensões. 22° - Procedem, pois, os pedidos formulados pelo A. na sua P.I., com a rectificação de que dos complementos vencidos desde a caducidade do contrato até à propositura da Acção, só se podem exigir os dos últimos 5 anos, por os demais estarem prescritos (Art. 310.º do C.C.), prescrição esta que a R. deduziu embora inadequada e baseando-se em preceito legal não aplicável ao caso. Pelo que, 23° - Haverá que reduzir o pedido inserto no Art. 7° da P.I. e na alínea b) da. conclusão desta peça, ao montante de 5 175.000$00 (15% de 575.000$00 x 60 Meses) - € 25 812,79, acrescido dos respectivos juros. Sem prescindir, 24° - Caso se entendesse que existia a simulação referida na sentença recorrida, esta teria então condenado o Autor em quantia superior à devida, sendo, por isso, nula - al. e) do n.º 1 do Art. 668.º do C.P.C.. Efectivamente, 25° - O A deu à acção o valor de € 32 696,29, mas a R. na Contestação, também reconveio, dando a esta o valor de € 114 400,00, ficando a acção com o novo valor de € 147 096,20. 26° - Não tendo a sentença recorrida julgado procedente a reconvenção, condenou, no entanto, o A. nas custas do processo. 27° - Havendo A. e R. ficado vencidos, as custas da acção teriam de ser repartidas por ambas as partes na proporção do vencimento - n.º 3 do art. 446.º do CPC. E assim, 28° - A sentença recorrida está ferida de nulidade. 29° - A sentença recorrida violou, por erro de interpretação e de aplicação, além de outros, o disposto nos Art.s 240.º do C.Civil, Art. 2° do DL 398/83 de 2 de Novembro e Art. 446.º, n.º 3 do C.P.C., e é nula, nos termos da alínea e) do n.º 1 do Art. 668.º do, C.P.C. 30° - Requer, nos termos do disposto no Art. 725.º do C.P.C, que,- dado o valor da causa e da sucumbência ser superior ao da alçada dos Tribunais Judiciais de 2.ª Instância, apenas se suscitarem questões de Direito e não haver agravos retidos, - o presente recurso interposto de decisão de mérito proferida na 1° instância, suba directamente ao Supremo Tribunal de Justiça. Nestes termos e nos que V.Ex.as muito doutamente suprirão Deve ser revogada a sentença recorrida, que deve ser substituída por outra que julgue a Acção procedente e provada, e condene a R. conforme o peticionado, mas reduzindo-se o pedido efectuado sob a alínea b) da Conclusão da P.I. para a importância ele 5.175.000$00, € 25 812,79 (Vinte e Cinco Mil, Oitocentos e Doze Euros e Setenta e Nove Cêntimos), com todos os efeitos decorrentes. Sem prescindir, E se assim se não entendesse - o que só por mera hipótese e dever de patrocínio se coloca -, sempre deveria julgar-se nula a sentença relativa à condenação do A - aqui recorrente - nas custas, substituindo tal decisão por outra que condenasse recorrente e recorrida na proporção no montante em que cada um saiu vencido. Contra-alegou a recorrida, pugnando pela improcedência do recurso. Neste Supremo Tribunal, O Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido da concessão parcial da revista, ao qual respondeu o recorrente procurando contrariar o mesmo. II. Enquadramento fáctico É a seguinte a factualidade dada por assente na 1.ª instância, que este STJ aceita, por não se vislumbrar fundamento legal para a sua alteração: a) - O A. entrou para o serviço da Ré - que se dedica ao fabrico e comercialização de Açúcares -, em 8.6.1970, e ali se manteve ininterruptamente sob as suas ordens, direcção, fiscalização e autoridade. b) - Desempenhando as funções correspondentes a Director Assistente da Administração, e como tal estava categorizado, auferindo ultimamente o vencimento base de 575.000$00 mensais. c) - Em 22.5.1996, o A. foi reformado por invalidez, conforme comunicação do Centro Nacional de Pensões datada de 24.8.96 e entrada nos serviços da Ré em 27.8.96. d) - Na Ré foi instituído em fins de 1987 um Fundo de Pensões, segundo cujo regulamento, o Autor por ter mais de 5 anos de serviço e a invalidez que o atingiu ter carácter de incapacidade definitiva, impossibilitando-o de exercer a sua profissão habitual bem como qualquer outra actividade similar própria da sua formação e conhecimentos tinha direito a receber um complemento de reforma por invalidez mensal igual a 15% da sua remuneração mensal ilíquida na data em que a mesma se verificou. e) - A Ré até ao presente nunca pagou ao Autor este complemento de reforma. f) - Em 9 de Junho de 1995 A. e R., na sequência da carta junta por cópia a fls. 26, acordaram na rescisão do contrato de trabalho entre ambos celebrado. g) - Logo nessa carta foi referido que o A. ficaria desvinculado da Ré a partir de 31 de Dezembro de 1996 e no ponto 2 do "ACORDO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO" junto aos autos a fls. 27 e 28 e celebrado em 9 de Junho de 1995, foi referido que "o início da produção de efeitos desta revogação por acordo das partes, do referido contrato de trabalho, será a partir de 31 de Dezembro de 1996...". h) - Mais foi referido no ponto 3 do referido acordo que "Como compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho nessa data, a Primeira Outorgante acorda em atribuir ao Segundo Outorgante a quantia de Esc. 17.791.670$00, cujo pagamento antecipado nesta data lhe faz, (subentende-se incluído nesta quantia os vencimento a auferir até 31/12/96), do qual o Segundo Outorgante aqui lhe dá plena quitação, reconhecendo nada mais lhe ser devido a qualquer título". i) - Na mesma data o Autor recebeu a viatura da Ré que utilizava ao seu serviço, pelo valor residual. j) - Aquando da celebração do acordo de rescisão referido foi entregue ao Autor o documento junto aos autos a fls. 29 e ficou estabelecido entre A. e R. que aquele não mais trabalharia para esta e que tentaria entrar de "baixa médica" durante o tempo que decorreria entre essa data e 31-12-1996 e, para o caso de o não conseguir, foi elaborado o documento de fls. 30 dos autos, subscrito pelo Autor e no qual este solicitava à Ré uma "licença sem retribuição" com início em 1.7.1996 e termo improrrogável em 31 de Dezembro de 1996, tendo a Ré na mesma data elaborado o documento de fls. 31 dos Autos, segundo o qual lhe era atribuída a referida licença sem retribuição. k) - Foi ainda na mesma data elaborado o documento junto aos autos a fls. 47 e entregue pelo Autor à Ré o cheque junto por cópia a fls. 46, passado à ordem do accionista maioritário da Ré destinado a caucionar o valor correspondente aos descontos para a Segurança Social e retenções de IRS a efectuar durante um ano e que teriam que verificar-se se o Autor não conseguisse obter "baixa médica". III. Enquadramento jurídico Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente - como resulta do disposto no art. 684.º, n.º 3 e 690.º do CPC - são as seguintes as questões essenciais a decidir: - Saber se o acordo revogatório do contrato de trabalho celebrado entre autor e ré produzia efeitos em 9 de Junho de 1995 ou em 31.12.96; - Se tal acordo de rescisão do contrato de trabalho, concretamente quanto ao seu ponto 2 é nulo, por o negócio ter sido simulado e, em função da resposta dada a estas questões, - Saber se ao autor tem direito ao complemento de reforma que peticiona. - Além destas questões, o autor coloca também a problemática da nulidade da sentença, por ter sido condenado em quantia superior ao pedido, pois não tendo aquela julgado procedente a reconvenção da ré, condenou o autor nas custas do processo. Vejamos, então, de per si, cada uma destas questões, começando, desde logo, numa sequência lógica, pela última questão equacionada. 1. Quanto à nulidade da sentença Nos termos do art. 668.º, n.º 1, e), do CPC, é nula a sentença quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. Constitui jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça, que quer o art.º 72, n.º 1, do CPT/81 quer o art. 77.º, n.º 1, do CPT/99, impõem que a arguição de nulidades das decisões judiciais recorridas seja feita, de forma expressa, concreta e separada no requerimento de interposição de recurso, e não em sede de alegações dirigidas ao Tribunal de recurso, mesmo que estas se sigam logo àquele (1). Tal imposição tem por fim habilitar o autor da decisão recorrida, a quem o requerimento é dirigido, a proceder ao seu eventual suprimento. Daí que a arguição de nulidade de sentença ou acórdão (face ao preceituado no art. 716.º, do CPC) efectuada fora deste enquadramento, designadamente em sede de alegações, tem de ser considerada extemporânea, importando o seu não conhecimento. No caso sub judice, o recorrente no requerimento de interposição do recurso de revista não arguiu a nulidade da sentença, só o fazendo nas alegações de recurso que se seguiram àquele, pelo que não seria de conhecer de tal nulidade. Contudo, importa atender que a questão suscitada se prende com a condenação em custas, e eventual reforma quanto às mesmas, não se configurando tal matéria como inserta em sede de nulidade de sentença. Na verdade, o que a parte alega é que houve erro de julgamento em matéria de custas, concretamente quanto ao pedido reconvencional. Tal alegado erro quanto a custas deve ser suprido nos termos previstos no art. 669.º, n.º 1 b), do CPC - de acordo com o qual pode qualquer das partes requerer ao tribunal que proferiu a sentença a sua reforma quanto a custas - ou através de recurso, como se verifica no caso. Na sentença de 1.ª instância escreveu-se: "Atento o que vem de decidir-se, fica prejudicada a apreciação das excepções da prescrição invocadas, bem como a apreciação do pedido reconvencional". E, na parte decisória: "Custas a cargo do Autor". As partes não recorrem da sentença por ter considerado prejudicada a apreciação do pedido reconvencional, pelo que não vamos, aqui e agora, apreciar da bondade de tal decisão. Importa, isso sim, é saber se prejudicada a apreciação do pedido reconvencional, as custas deverão ser suportadas pelo autor. É sabido que a responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade: paga as custas a parte que lhes deu causa, a parte que não foi atendida na sua pretensão, que não tem razão no pedido que deduziu (art. 446.º, do CPC). Por isso, improcedendo o pedido do autor, é ele que deve suportar o pagamento das custas. E, tendo o autor com a dedução do seu pedido, que improcedeu, dado origem a que a ré formulasse um pedido reconvencional cuja apreciação, e decisão, se tornou inútil pela improcedência daquele, terá que ser o autor a suportar as custas de tal pedido reconvencional. Diferentemente ocorreria se a impossibilidade ou inutilidade do pedido reconvencional não resultasse de facto imputável ao autor, situação em que as custas ficariam a cargo do réu (2). É o que decorre do disposto no art. 447.º do CPC: extinguindo-se a instância por impossibilidade ou inutilidade da lide, as custas ficam a cargo da parte que formulou o pedido respectivo, salvo se a impossibilidade ou inutilidade for imputável à parte contrária, que neste caso suportará as custas. Ora, regressando ao caso sub judice, tendo o pedido da ré ficado prejudicado, ou seja, tendo-se tornado inútil a sua apreciação, por facto imputável ao autor - improcedência do pedido deste - deve ser o mesmo autor a suportar as custas respectivas não só do pedido por si formulado na acção como do (s) pedido (s) formulado (s) pela ré em reconvenção. Assim, seriam de improceder nesta parte as conclusões do recorrente, sem prejuízo, porém, da decisão a proferir quanto ao mérito da acção e subsequente condenação em custas, o que se analisará infra. 2. Quanto à data de produção de efeitos do acordo revogatório do contrato de trabalho. Decorre da factualidade dada por assente que: - Em 9 de Junho de 1995, A. e R., na sequência da carta junta por cópia a fls. 26, acordaram na rescisão do contrato trabalho entre ambos celebrado (al. f). - Logo nessa carta foi referido que o A. ficaria desvinculado da Ré a partir de 31 de Dezembro de 1996 e no ponto 2 do "ACORDO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO" junto aos autos a fls. 27 e 28 e celebrado em 9 de Junho de 1995, foi referido que "o início da produção de efeitos desta revogação por acordo das partes, do referido contrato de trabalho, será a partir de 31 de Dezembro de 1996..." (al.g). - Mais foi referido no ponto 3 do referido acordo que "Como compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho nessa data, a Primeira Outorgante acorda em atribuir ao Segundo Outorgante a quantia de Esc. 17.791.670$00, cujo pagamento antecipado nesta data lhe faz, (subentende-se incluído nesta quantia os vencimento a auferir até 31/12/96), do qual o Segundo Outorgante aqui lhe dá plena quitação, reconhecendo nada mais lhe ser devido a qualquer título" (al. h). - Na mesma data o Autor recebeu a viatura da Ré que utilizava ao seu serviço, pelo valor residual (al. i). - Aquando da celebração do acordo de rescisão referido foi entregue ao Autor o documento junto aos autos a fls. 29 e ficou estabelecido entre A. e R. que aquele não mais trabalharia para esta e que tentaria entrar de "baixa médica" durante o tempo que decorreria entre essa data e 31-12-1996 e, para o caso de o não conseguir, foi elaborado o documento de fls. 30 dos autos, subscrito pelo Autor e no qual este solicitava à Ré uma "licença sem retribuição" com início em 1.7.1996 e termo improrrogável em 31 de Dezembro de 1996, tendo a Ré na mesma data elaborado o documento de fls. 31 dos Autos, segundo o qual lhe era atribuída a referida licença sem retribuição (al. j). - Foi ainda na mesma data elaborado o documento junto aos autos a fls. 47 e entregue pelo Autor à Ré o cheque junto por cópia a fls. 46, passado à ordem do accionista maioritário da Ré destinado a caucionar o valor correspondente aos descontos para a Segurança Social e retenções de IRS a efectuar durante um ano e que teriam que verificar-se se o Autor não conseguisse obter "baixa médica" (al. K). - Em 22.5.96, o autor foi reformado por invalidez (al. c). Analisando tal factualidade, escreveu-se na sentença recorrida: "(...) resultou provado que em 9 de Julho de 1995, na sequência da carta junta por cópia a fls. 26, o A. e a R. acordaram na rescisão por mútuo acordo do contrato de trabalho entre ambos celebrado, ficando desde logo referido na referida carta que o A. ficaria desvinculado da Ré a partir de 31 de Dezembro de 1996 e no ponto 2 do "ACORDO DE RESCISÃO DE CONTRATO DE TRABALHO" junto aos autos a fls. 27 e 28 e celebrado em 9 de Junho de 1995, foi referido que "o início da produção de efeitos desta revogação por acordo das partes, do referido contrato de trabalho, será a partir de 31 de Dezembro de 1996..." - cfr. as alíneas f) e g) dos factos provados. Contudo, resultou igualmente provado que na data da celebração do acordo de rescisão o Autor recebeu da Ré o documento de fls. 29 destinado a obter o subsídio de desemprego, constando do mesmo como motivo da rescisão "MUTUO ACORDO INTEGRADO NUM PROCESSO DE REDUÇÃO DE EFECTIVOS", tendo ficado também acordado que o A. não mais trabalharia para esta e que tentaria entrar de "baixa médica" durante o tempo que decorreria entre essa data e 31-12-1996 e, para o caso de o não conseguir, foi elaborado o documento de fls. 30 dos autos, subscrito pelo Autor e no qual este solicitava à Ré uma "licença sem retribuição" com início em 1.7.1996 e termo improrrogável em 31 de Dezembro de 1996, tendo a Ré na mesma data elaborado o documento de fls. 31 dos Autos, segundo o qual lhe era atribuída a referida licença sem retribuição - cfr. a alínea j) dos factos provados. Quer dizer, tendo embora as partes acordado na cessação do contrato de trabalho por mútuo acordo em 9 de Junho de 1995, ficcionaram como data da cessação do contrato 31-12-1996, tanto assim que, para o caso de o A. não vir a obter "baixa médica" até foram elaborados na mesma altura os documentos de fls. 30 e 31 pelo Autor a solicitar uma "licença sem retribuição" e pela Ré a conceder-lha e aquele caucionou através de um cheque o valor correspondente aos descontos para a Segurança Social e retenções de IRS a efectuar durante um ano e que teriam que verificar-se caso o Autor não conseguisse obter baixa médica - cfr. a alínea k) dos factos provados. Em suma: Autor e Ré acordaram na cessação do contrato de trabalho em 9 de Junho de 1995 e quiseram que tal acordo produzisse todos os efeitos a partir dessa data, mas declararam que a data da produção dos efeitos da cessação era 31.12.96." E mais adiante: "Estamos perante uma simulação relativa, a qual nos termos do artigo 241º, do mesmo Código não inquina de nulidade a parte não simulada do negócio ou seja, a rescisão do contrato de trabalho em si mesma, designadamente a indemnização acordada, mas apenas a data da produção dos efeitos da rescisão. Por força do estatuído no artigo 286º do Código Civil: «A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal». Face ao exposto, cumpre declarar nulo o ponto 2, do acordo de rescisão do contrato de trabalho celebrado entre a Ré e o A. e, consequentemente declarar que a data da produção dos efeitos da rescisão foi a da celebração do acordo, ou seja, 9 de Junho de 1995. Assim sendo, é imperioso concluir que na data de 22.5.96 em que foi reformado por invalidez pelo Centro Nacional de Pensões o Autor já não era trabalhador da Ré, por o contrato de trabalho que o vinculou ter cessado por mútuo acordo em 9 de Junho de 1995, pelo que, consequentemente lhe não assiste o invocado direito ao complemento de reforma." Insurge-se o autor contra tal interpretação por considerar que a vontade real das partes foi no sentido da cessação do contrato de trabalho se verificar em 31.12.96, inexistindo, assim, qualquer simulação. É sabido que às instâncias é lícito extrair ilações da matéria de facto, ou seja, intuir a existência de outros factos enquanto decorrentes, em termos de normalidade, e com o apoio nas regras da experiência (3). Porém, tal poder encontra-se limitado ao factualismo fixado, pelo que as ilações a retirar devem integrar o raciocínio lógico e, nesse sentido, as mesmas reconduzem-se a matéria de facto insindicável pelo STJ (4). Ora, pergunta-se, constituirá um raciocínio lógico e, por isso, lícito à 1.ª instância, perante a factualidade provada, concluir que as partes quiseram que o acordo de revogação do contrato de trabalho produzisse os efeitos a partir da sua celebração, ou seja, a partir de 9 de Junho de 1995? É inquestionável que no acordo se previa a produção de imediato, e produziu, alguns efeitos: compensação pecuniária, entrega da viatura ao autor, mediante o pagamento por este do valor residual. Certo é, também, que as partes acordaram que o autor não mais prestaria trabalho à ré. Ou seja, de facto as partes pretenderam que a relação de trabalho que existia cessasse a partir daquele acordo. Porém, tal situação de facto, diríamos, não significa que para todos os efeitos legais a relação cessasse naquela data: com efeito, basta pensar em situações de suspensão do contrato de trabalho (DL n.º 398/83, de 02.11) ou até de pré-reforma (DL n.º 261/91, de 25.07), em que, sem cuidarmos de analisar aqui os respectivos requisitos, o que é certo é que nelas se prevê a possibilidade de o trabalhador deixar de prestar a sua actividade, sem que o vínculo laboral se extinga. Daqui somos levados a concluir que, embora resultando do acordo celebrado que o autor não mais prestaria a sua actividade à ré, não é legitimo concluir que as partes pretenderam que a relação laboral que entre elas vigorava cessasse para todos e quaisquer efeitos a partir da celebração daquele. Daí que não se acompanhe a conclusão da 1.ª instância de que " Autor e Ré acordaram na cessação do contrato de trabalho em 9 de Junho de 1995 e quiseram que tal acordo produzisse todos os seus efeitos a partir dessa data...". Não obstante o que se deixa referido, ainda que se aceitasse esta última conclusão, seria de considerar o negócio nulo na parte em que declara que a revogação produziria efeitos a partir de 31.12.96? A resposta, adiante-se, é negativa, como se passa a analisar. 3. A 1.º instância considerou o ponto 2 do acordo nulo, por o mesmo configurar negócio simulado. De acordo com o disposto no art. 240.º, n.º 1, do CC, "Se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a declaração negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado", dispondo o n.º 2, do mesmo normativo que: «O negócio simulado é nulo». Como ensina o Prof. Mota Pinto (5), são elementos integradores da simulação: "a) Intencionalidade da divergência entre a vontade e a declaração; b) Acordo entre declarante e declaratário (acordo simulatório), o que, evidentemente, não exclui a possibilidade de simulação nos negócios unilaterais; c) Intuito de enganar terceiros". Admitindo, na situação equacionada e a que chegou a 1.ª instância, a verificação dos dois primeiros elementos, dúvidas se colocam quanto à verificação do pressuposto de "enganar terceiros", com o acordo revogatório do contrato celebrado, maxime o seu ponto2. Com efeito, da factualidade provada não é possível concluir com o mínimo de certeza e segurança jurídica que as partes tivessem consignado a cessação do contrato de trabalho com efeitos a partir de 31.12.96 com intuito de enganar terceiros. É certo que no art. 9.º da contestação (fls. 40), a ré afirma que " O diferimento da eficácia extintiva do Acordo revogatório para 31.12.96, foi pedida pelo A. à R., acautelando a possibilidade de poder vir a usufruir de uma reforma por velhice mais vantajosa". E também nas contra-alegações alega a este respeito (fls. 163): E, qual o motivo de toda esta documentação para tentar atirar a data da rescisão efectiva para o fim de 31/12/96? Apenas para contar mais um tempo de antiguidade para o A., de que este declarava precisar e porque a R. não viu motivo (pelos vistos mal) para não aceder a essa pretensão do A..". Mas, como bem salienta o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto no seu douto parecer, tal factualidade alegada não consta da matéria de facto dada por assente. E, repete-se, desta não resulta que com o acordo revogatório do contrato de trabalho, houvesse o intuito das partes, ou pelo menos de uma delas, de enganar terceiros. Não pode, por isso, concluir-se, como o fez a 1.ª instância, que as partes tenham celebrado um negócio simulado e, por consequência, com fundamento neste, o ponto 2 do acordo seja nulo. A revogação do contrato de trabalho constitui um negócio formal, uma vez que a lei exige que seja celebrada por documento escrito, assinado por ambas as partes (art. 8.º, n.º 1, do DL n.º 64-A/89, de 27.02) (6). E, tratando-se de declaração formal, faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao(s) seu(s) autor(es) (cfr. art.ºs 220.º e 376.º, n.º 1, do CC). Nesta sequência, urge concluir que face ao teor do acordo de revogação celebrado, o contrato de trabalho apenas cessaria a partir de 31.12.96. Procedem, por isso, nesta parte as conclusões das alegações do recorrente, no sentido da inexistência de simulação no acordo de revogação do contrato de trabalho. 4. Quanto ao direito do autor à pensão complementar de reforma. É inquestionável, como resulta da alínea d) dos factos provados, que o autor preenchia os requisitos para ter direito a uma pensão complementar de reforma igual a 15% da sua remuneração mensal ilíquida na data em que a mesma se verificou (7). A questão que agora se coloca consiste em saber, por um lado, se o autor renunciou a tal pensão complementar de reforma e, por outro, respondendo negativamente a essa questão, se há lugar à prescrição do direito. As partes acordaram no ponto 3 do acordo de rescisão do contrato de trabalho a que se vem fazendo referência, que "Como compensação pecuniária global pela cessação do contrato de trabalho nessa data, a primeira outorgante acorda em atribuir ao Segundo outorgante a quantia de 17.791.670$00, cujo pagamento antecipado nesta data lhe faz, (subentende-se incluído nesta quantia os vencimentos a auferir até 31/12/96), do qual o Segundo Outorgante aqui lhe dá plena quitação, reconhecendo nada mais lhe ser devido a qualquer título". Determina o art. 236, n.º 1, do CC que "A declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele". Acolhe este preceito a denominada doutrina objectivista da "teoria da impressão do destinatário": a declaração deve valer com o sentido que um destinatário razoável, colocado na posição concreta do real declaratário, lhe atribuiria; mas, de acordo com o n.º 2, do mesmo preceito legal, sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é esta que prevalece, ainda que haja divergência entre ela e a declarada, resultante da aplicação da teoria do destinatário (8). Como sublinham os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela (9), "A normalidade do declaratário, que a lei toma como padrão, exprime-se não só na capacidade para entender o texto ou conteúdo da declaração, mas também na diligência para recolher todos os elementos que, coadjuvando a declaração, auxiliem a descoberta da vontade real do declarante". Ou, no dizer do Prof. Mota Pinto (10), "Releva o sentido que seria considerado por uma pessoa normalmente diligente, sagaz e experiente em face dos termos da declaração e de todas as circunstâncias situadas dentro do horizonte concreto do destinatário, isto é, em face daquilo que o concreto destinatário da declaração conhecia e daquilo até onde ele podia conhecer". Regressando ao caso em litígio, no acordo de revogação do contrato de trabalho, ponto 3, consta a compensação pecuniária global a receber pelo autor e no mesmo seguimento a expressão "...reconhecendo nada mais lhe ser devido a qualquer título". O documento em causa tem como epígrafe "Acordo de rescisão de Contrato de Trabalho". E, da leitura do documento conclui-se que nos diversos pontos se regulam situações decorrentes da rescisão do contrato de trabalho, em caso algum mencionando, por exemplo, eventuais créditos futuros que o autor viesse a adquirir em consequência da cessação do contrato de trabalho. Ou seja, dos elementos literais constantes do documento não é possível concluir que as partes quisessem regular matéria referente à pensão complementar de reforma e, concretamente, que o documento constitua uma verdadeira declaração abdicativa do autor àquela. Além disso, como melhor se analisará infra, embora o direito à pensão de reforma derive de uma anterior relação de trabalho, dela se autonomiza uma vez cessada tal relação, nascendo então uma nova relação jurídica, no âmbito da segurança social (11). O direito à pensão de reforma, ou ao seu complemento é um direito "diferido", pois só se concretiza com o atingir de determinada idade, existindo anteriormente uma expectativa jurídica do seu recebimento (12). Ora, não constando do documento elaborado pelas partes qualquer referência a outros eventuais créditos futuros e atenta a especificidade do direito à pensão de reforma, ou seu complemento, não parece legítimo concluir a um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, que se possa extrair o sentido que o autor com aquela declaração se considerasse ressarcido de quaisquer direitos patrimoniais futuros decorrentes da extinção do contrato. É certo que o montante significativo da compensação recebida pelo autor - 17.791.670$00 - poderia, porventura, inculcar a ideia que as partes aí quiseram incluir quaisquer eventuais direitos futuros do autor: todavia, tenha-se presente que o autor era na ré um trabalhador qualificado, Director Assistente da Administração, auferia o vencimento base de 575.000$00, que o acordo foi efectuado em 09 de Junho de 1995 e que naquela compensação se incluíam os vencimentos a auferir até 31.12.96, data da cessação do contrato, o que pode justificar o montante da compensação. Diga-se ainda que, constituindo pressuposto da atribuição do direito ao complemento de reforma a situação do autor ser trabalhador da empresa ré, obrigada ao seu pagamento (13), tendo as partes estabelecido que o contrato de trabalho cessasse juridicamente os seu efeitos em 31.12.96, e ocorrendo a situação de reforma do autor anteriormente, ele mantinha-se trabalhador da ré e o contrato veio a cessar por caducidade por reforma. Conclui-se, por isso, que do "Acordo de Rescisão de Contrato de Trabalho", não resulta a renúncia do autor à pensão complementar de reforma (14). É, então, agora chegado o momento de responder à 2.ª questão equacionada, a qual consiste em saber se o direito do autor à pensão complementar de reforma se encontra prescrito. Já se deixou referido que na vigência do contrato de trabalho, o autor adquiriu a expectativa jurídica a uma pensão de reforma, e complemento (15), expectativa essa que se concretizaria com o atingir de determinada idade: ou seja, dito de outro modo, o direito à pensão de reforma só se adquire no momento em que se mostram integralmente verificados os respectivos pressupostos. Assim, em 22.05.96, quando o autor foi reformado por invalidez, concretizou-se a sua expectativa jurídica e, por conseguinte, ele adquiriu o direito à pensão complementar de reforma. Como este Supremo Tribunal tem decidido, a prescrição da pensão de reforma desdobra-se em dois regimes: o direito à reforma como direito unitário a receber as respectivas pensões vitalícias e o direito às prestações periódicas em que a reforma se concretiza ao longo do tempo. Enquanto o prazo do direito à pensão é o prazo ordinário de vinte anos previsto no art. 309.º do CC, o prazo de prescrição do direito às prestações, e respectivos juros legais, é de cinco anos, conforme previsto no art. 310.º, al. d) e g) do mesmo diploma legal (16). E, como se afirmou no mencionado Acórdão de 25.06.02, "(...) é entendimento jurisprudencial assente que à pensão de reforma é inaplicável o regime do art. 38.º do regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969 (...), embora o direito ao pagamento da pensão complementar de reforma derive de uma anterior relação de trabalho, tal direito desta se autonomiza, uma vez cessada tal relação, nascendo então uma nova relação jurídica, agora no âmbito da segurança social". Assim, no caso, tendo as prestações começado a vencer-se a partir de 22.05.96, e a ré citada para a acção em 26.09.02 (fls. 13), encontram-se prescritas as prestações vencidas antes de 26.09.97. Contudo, nas alegações de recurso o próprio autor/recorrente reduziu o montante para 5.175.000$00 (€ 25 812,79), correspondente aos últimos cinco anos. Procedem, por isso, as conclusões das alegações do recorrente, reduzindo-se, todavia, o pedido para o valor indicado. Sobre as prestações vencidas após a citação da ré, e vincendas, são devidos juros de mora, à taxa legal, desde o respectivo vencimento até integral pagamento (até 30 de Abril de 2003 à taxa legal de 7% e, actualmente, a partir de 01 de Maio de 2003 à taxa de 4% -art.s 805.º, n.º1 e 559.º, do CC e portarias n.º 263/99, de 12 de Abril e n.º 291/03, de 08 de Abril). Face a tal conclusão, e procedendo parcialmente o recurso, deixa de se considerar prejudicado o pedido reconvencional formulado pela ré, sendo de conhecer do mesmo. Porém, atento que os poderes do STJ se encontram circunscritos ao estabelecido no Código de Processo Civil (cfr. art. 87.º, n.º 2, do CPT), deverá o processo baixar à 1.ª instância a fim de aí se decidir o pedido reconvencional. IV. Decisão Termos em que se decide conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência: a) Declara-se o direito do autor à compensação mensal de invalidez correspondente a 15% da remuneração de base que auferia quando se verificou a sua passagem a reformado por invalidez (22.05.96), paga 13 meses ao ano; b) Condena-se a ré a pagar ao autor, por complementos mensais de invalidez, a quantia de € 25 812,79 (5.175.000$00) referente ao período de 26.09.97 a 26.09.02, bem como os complementos mensais vencidos e vincendos a partir desta data, acrescidos de juros de mora à taxa legal, desde o respectivo vencimento até integral pagamento. Custas da acção pela ré, tendo por base o valor do pedido de 5.175.000$00, sendo no restante suportadas pelo autor. Em relação ao pedido reconvencional formulado pela ré, determina-se a baixa do processo à 1.ª instância a fim de aí se decidir o mesmo. Lisboa, 7 de Outubro de 2003 Azambuja da Fonseca Vítor Mesquita Ferreira Neto ------------------------------- (1) Vide, entre muitos outros, e por todos, os acórdãos recentes do STJ de 01.02.2001 (Revista n.º 124/00), de 09.01.02 (Revista n.º 2542/01 ), de 30.01.02 (Revista n.º 1433/01), de 20.02.02 (Revista n.º 2164/01), de 10.04.02 (Revista n.º 1198/01) e de 04.07.02 (Revista n.º 1411/02), todos da 4ª Secção. (2) Neste sentido, pode ver-se o Ac. do STJ de 23.01.86, BMJ 353.º-429. (3) A determinação da intenção e vontade dos contraentes, integra matéria de facto cujo apuramento é da competência das instâncias (cfr., por todos, Ac. do STJ de 08.07.03, Revista n.º 4063/02). (4) Neste sentido, vejam-se, por todos, os acórdãos do STJ de 03-05-01 (Incidente n.º 2858/00), de 28-11-01 (Revista n.º 699/01), de 09-01-02 (Revista n.º 1970/01), de 22-05-02 (Revista n.º 4205/01), de 25-06-02 (Revista n.º 102/02) e de 12-03-03 (Revista n.º 2238/02), todos da 4.ª Secção. (5) Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Edição, Coimbra Editora, pág. 472. (6) Como sublinha Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, Almedina, 11.ª edição, pág. 506), "A forma é aqui exigida «ad substanciam», como resulta do silêncio da lei sobre o efeito da sua falta (vd. Art. 220.º Ccivil". (7) Refira-se que, como resulta das cláusulas 2 e 3 do contrato constitutivo do Fundo de Pensões da Ré, a pensão de reforma "...calculada é vitalícia, constante, pagável 13 vezes por ano..." (fls. 93 dos autos). (8) Cfr. acórdão do STJ de 11.11.92, BMJ 421-364. (9) Código Civil Anotado, Coimbra editora, Vol. I, 3.ª edição, pág. 223. (10) Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 3.ª edição, pág. 447-448. (11) Veja-se, neste sentido, Ac. do STJ de 25.06.02 (Revista n.º 882/02 - 4.ª Secção). (12) Vide, neste sentido, entre outros, os acórdãos do STJ de 20.01.2000 (Revista n.º 243/98), de 02.02.2000 (Revista n.º 351/98), de 08.02.2001 (Revista n.º 2859/00), e de 24.06.03 (Revista n.º 3384/02), todos da 4.ª Secção. (13) Cfr., neste sentido, e por todos, Ac. do STJ de 16.05.00 (Revista n.º 291/99 - 4.ª Secção). (14) Face a tal conclusão, torna-se inútil analisar se atento o disposto na Lei n.º 38/96, de 31 de Agosto, sempre o autor poderia revogar o acordo de cessação do contrato de trabalho. (15) Reconhecendo, embora, como se afirmou no Acórdão deste Tribunal de 16.05.00 (Revista n.º 291/99 - 4.ª Secção), que não obstante a natureza previdencial dos complementos de reforma, não têm total identidade com o direito à reforma (em termos de natureza dos direitos e respectivos regimes), desde logo, atenta a natureza essencialmente gratuita daqueles. Porém, o que releva no caso, e que importa deixar sublinhado, é que a extinção da relação laboral acabou por se verificar numa situação de caducidade por reforma do autor e, daí, que se verifique o pressuposto da atribuição do direito ao complemento de reforma. (16) Vide, entre outros, Ac. do STJ de 02 de Julho de 1997 (CJ, Ac. do STJ, Tomo II, Ano V, pág. 299-303), de 25 de Junho de 2002 (Revista n.º 882/02 - 4.ª Secção) e de 24 de Junho de 2003 (Revista n.º 3384/02 - 4.ª secção, já anteriormente referido). |