Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANTÓNIO MAGALHÃES | ||
Descritores: | ADVOGADO AÇÃO DE HONORÁRIOS USOS EQUIDADE DETERMINAÇÃO DO VALOR CONTRATO DE MANDATO FALTA DE CONTESTAÇÃO ARGUIÇÃO DE NULIDADES FALTA DE ADVOGADO APOIO JUDICIÁRIO EXTINÇÃO DO PODER JURISDICIONAL NULIDADE PROCESSUAL ANULAÇÃO DE DESPACHO JUROS DE MORA FATURA | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 05/15/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I. A decisão judicial pode ser revogada em consequência da arguição procedente de nulidade de um acto ou omissão anteriores à decisão, de que dependa absolutamente por força do artigo 195º, nº 2, primeira parte, do CPC; II. O crédito de honorários só se torna líquido com a sentença judicial que fixe o respectivo montante e exigível se for apresentada factura (da qual consta o IVA reclamado); III. Consequentemente, os juros de mora só são devidos a partir da data em que, depois do trânsito em julgado da sentença, a factura for apresentada. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: |
Acordam os Juízes da 1ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça: * AA, advogado, com domicílio profissional na Rua ..., interpôs acção declarativa de condenação, com processo comum, contra BB, divorciada, com residência na Travessa ..., pedindo a condenação da Ré a pagar a quantia global de € 36.736,20 acrescida de juros vincendos, até efectivo e integral pagamento. Em síntese, alegou que no exercício da sua actividade de advogado celebrou com a Requerida contrato de mandato e representou a mesma em diversos processos judiciais, desde 2008 até Setembro de 2015, altura em que a R. fez cessar os mandatos conferidos, prestando-lhe, assim,. inúmeros serviços jurídicos à Ré, os quais estão discriminados na nota de honorários, no valor total de € 71.782,21. Mais refere que a R. foi pagando provisões, estando, ainda, em dívida a quantia de € 36.746,20 cujo pagamento agora reclama, acrescido de juros. Citada, a ré não contestou, o que mereceu o despacho de 9.4.2018, do seguinte teor: “Fls. 49: Considerando que no prazo legal para apresentação da contestação não foi junto aos autos pelo Sr. Dr. CC qualquer comprovativo de apresentação de pedido de escusa (cfr. artigo 34º nºs 2 e 3 da Lei nº 34/2004 de 29 de Julho), encontra-se já decorrido o prazo para apresentação de contestação. Deste modo, perante a falta de contestação, considero confessados os factos articulados pelo Autor na petição inicial (cfr. artigo 567º nº 2 do CPC). Cumpra-se então o determinado no nº 2 do artigo 567º do CPC, concedendo-se para alegações escritas o prazo de 10 dias.” Seguidamente, em 16.5.2018., foi proferida sentença que concluiu assim: “Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente, por provada, e, em consequência condeno a Ré BB a pagar ao Autor AA a quantia de € 36.736,20 (trinta e seis mil, setecentos e trinta e seis euros e vinte cêntimos), devidos a título de capital e bem assim os juros de mora vencidos e vincendos desde 02/09/2015, calculados à taxa civil, até efectivo e integral pagamento, que nesta data se computam em € 3.977,57 (três mil, novecentos e setenta e sete euros e cinquenta e sete cêntimos), absolvendo a Ré do demais peticionado. Porém, em 11.12.2018,,foi proferido o seguinte despacho: “Da falta de notificação à ré da nomeação de patrono Nos presentes autos, após ter sido proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente e a condenar a Ré no pedido, tendo-se declarado confessados os factos alegados na PI em face da falta de contestação, nos termos do disposto no artigo 567º nº 2 do CPC, veio a Ré a fls. 70, referir que não foi notificada da nomeação de patrono que lhe foi efectuada em 09/02/2018, a fls. 47. Devidamente notificado para se pronunciar, veio o Advogado nomeado informar que nunca teve qualquer contacto com a Ré, sendo que posteriormente à prolação da sentença foi notificado pela Ordem dos Advogados informando-o de que aquela havia requerido a substituição do patrono nomeado, tendo o mesmo referido que nada tinha a opor. O certo é que, apesar disso, o Ilustre Advogado manteve-se nomeado não tendo apresentado qualquer escusa nos autos e nem a Ordem dos Advogados ou a Ré informou o processo de tal processo de substituição do advogado nomeado pelo que o processo culminou com a prolação de sentença. Por sua vez, a fls. 79 veio a Ordem dos Advogados informar que a nomeação à Ré do Advogado Sr. Dr. CC lhe foi comunicada, através do envio de carta simples, expedida em 09/02/2018, para a morada para onde a Ordem havia remetido anteriores comunicações à Ré, sendo que a carta não veio devolvida. Notificada desta informação remetida aos autos pela Ordem dos Advogados, a Ré veio reiterar que não recebeu qualquer carta e não teve conhecimento da nomeação de patrono nestes autos. Vejamos então. Sobre a notificação da nomeação de patrono a este e ao Requerente, rege o artigo 31º, da Lei de Apoio Judiciário(LAJ) – Lei nº 34/2004 de 29 de Julho – estabelecendo o seguinte: «1. A nomeação de patrono é notificada pela Ordem dos Advogados ao requerente e ao patrono nomeado e, nos casos previstos no n.º 4 do artigo 26.º, para além de ser feita com a expressa advertência do início do prazo judicial, é igualmente comunicada ao tribunal. 2. A notificação da decisão de nomeação do patrono é feita com a menção expressa, quanto ao requerente, do nome e escritório do patrono bem como do dever de lhe dar colaboração, sob pena de o apoio judiciário lhe ser retirado». No caso de pedido de escusa do patrono, o artigo 34º nº 2 manda aplicar o disposto no artigo 24º nº 5 da LAJ, segundo o qual “O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos: a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação; b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono”. Da referida norma parece resultar que basta a notificação ao patrono da referida nomeação para se iniciar a contagem do referido prazo. Não podemos concordar que este entendimento seja de igual modo aplicável aos casos em que apenas está demonstrado que a notificação foi efectuada ao patrono, mas não se encontra provado que o Requerente tenha igualmente sido notificado da nomeação do patrono, com as menções legais acima assinaladas. De facto, a conformidade constitucional da interpretação de algumas das disposições legais ínsitas na Lei do Apoio Judiciário tem sido objecto de repetida análise pelo Tribunal Constitucional sendo relevante para o caso em apreço ter presente que aquele Tribunal julgou inconstitucional, por violação do artigo 20.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa, a norma do artigo 24.º, n.º 5, alínea a) da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, interpretada com o sentido de que o prazo interrompido por aplicação do n.º 4 daquele preceito se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário ainda não tenha sido notificado dessa mesma designação (Vide Acórdão do TC nº 567/2018, processo 604/18 de 07/11/2018). É entendimento do TC que com tal interpretação «persiste o risco, incompatível com o respeito pelo processo equitativo, na dimensão de igualdade substantiva entre as partes e de proibição da indefesa (artigo 20.º, n.º 4, da Constituição), de o interessado economicamente carenciado não poder defender os seus direitos e interesses legalmente protegidos, quer porque o prazo se poderá esgotar, quer porque disporá de um prazo inferior ao estabelecido na lei para prática do ato ao qual o prazo está funcionalizado. No caso dos autos, a Ré veio referir que não foi notificada da nomeação do patrono e por isso não teve qualquer contacto com o mesmo. Pelo patrono foi efectivamente confirmado que a Ré nunca o contactou, nem este tentou o contacto com aquela. Por sua vez, a Ordem dos Advogados refere que procedeu á notificação da nomeação à Ré, por carta simples remetida em 09/02/2018 a qual não veio devolvida. Resulta de fls. 47 que o patrono foi notificado desta nomeação em 09/02/2018. Temos que a notificação da Ordem dos Advogados à Ré deveria ter operada por carta registada. Como refere Salvador da Costa, O Apoio Judiciário, 9.ª edição actualizada e ampliada, Almedina 2013, pág. 189, se é certo que a Lei do Apoio Judiciário não contém actualmente qualquer formalidade específica quanto à efectivação da notificação, por ter sido revogado pela alínea a) do n.º 5 da Lei n.º 47/2007, de 28 de Agosto, o n.º 4 do artigo 31.º da LAJ, não é menos correcto que a eliminação de formalidades específicas quanto à notificação da decisão referente ao pedido de apoio judiciário, apenas significa que não se justificam desvios nesta sede relativamente ao «regime geral de comunicação de actos no âmbito do processo civil e do procedimento administrativo». Ora, mesmo que se considere não ser aplicável aquele preceito à notificação efectuada pela Ordem dos Advogados à Ré, sempre lhe seria aplicável o disposto nos artigos 112.º, n.º 1, alínea a) e 113.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo DL n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, que regulam a forma e a perfeição das notificações, e que no caso dos autos não foram cumpridos, porque se referem à carta registada e não à carta simples. Deste modo, em face do disposto nestes preceitos legais, da não devolução da carta simples expedida pela Ordem dos Advogados para a Ré da nomeação de patrono, não pode extrair-se a presunção do seu efectivo recebimento, porquanto a base da mesma assenta no envio da carta registada, formalidade que não teve lugar. Numa interpretação da Lei do Apoio Judiciário conforme à Constituição, «o procedimento de concessão de apoio não pode onerar o requerente com uma diminuição das suas garantias de defesa», e ainda que «quando o pedido de apoio visa a nomeação de patrono, uma vez que desacompanhada de mandatário forense, a parte não dispõe de meios para, no processo defender (ou defender adequadamente) os seus direitos e interesses». Cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra Editora, 2005, págs. 181 e 182. Cremos pois que a omissão de notificação à Ré da nomeação por carta registada como o impunham os artigos 112.º, n.º 1, alínea a) e 113.º, n.º 1, do Código do Procedimento Administrativo consubstancia nulidade com clara influência na decisão da causa, tendo a mesma sido arguida pela Ré na primeira intervenção que teve nos autos em 11/09/2018, a fls. 70 (cfr. artigos 195º, 199º e 200º do CPC). Consigna-se que não se procedeu à audição prévia do A. nos termos do disposto no artigo 201º do CPC, por se entender ser claramente desnecessária, uma vez que o A. nenhuma intervenção teve na formação da referida nulidade. Pelo exposto, tendo a Ordem dos Advogados remetido carta simples para notificação da Ré da nomeação de patrono, e tendo esta alegado que a não recebeu, não funciona a presunção legal de ocorrência da notificação no 3.º dia posterior ao do registo ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja, pelo que devemos considerar que a Ré não foi efectivamente notificada daquela nomeação e como tal não dispunha de meios para se defender no processo, pelo que declaro a nulidade do despacho de 09/04/2018 a fls. 50 e de todo o processado posterior àquele despacho, incluindo a sentença proferida nestes autos. Notifique as partes do teor deste despacho, incluindo a Ordem dos Advogados, devendo a referida entidade proceder a nova nomeação de patrono à Ré a fim de substituir o Sr. Dr. CC, estando ainda interrompido o prazo para apresentação de contestação, devendo a OA informar os autos da data da notificação ao novo patrono da sua nomeação e bem assim da notificação à Ré da referida nomeação, notificação essa que deve operar por carta registada nos termos supra expostos.“ Desse despacho o autor interpôs recurso nos termos do art. 644º, nº 2, al. a) do CPC mas a Relação decidiu não conhecer do objecto do mesmo, por entender que do despacho não cabia recurso autónomo de apelação mas impugnação nos termos do art. 644, nº 3 do CPC. Na sequência deste despacho, a ré veio a apresentar contestação na qual referiu, além do mais, já ter pago a totalidade dos serviços prestados pelo A. sendo certo que apenas teve conhecimento da nota de honorários com a citação para a presente acção. Mais alegou a R. que o A. lhe está a cobrar a si, na totalidade, serviços que também prestou em alguns processos ao seu filho DD e que o A. foi negligente na defesa dos seus interesses em diversos processos. Alegou ainda que o A. a representou na venda de um terreno e se apossou de quantias que lhe pertencem, não lhe tendo prestado contas. Foi proferido despacho saneador e procedeu-se à selecção dos temas de prova. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu nos seguintes termos: “Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência: a) Condeno a Ré BB no pagamento ao A. AA, da quantia total de € 27.795,6 (vinte e sete mil, setecentos e noventa e cinco euros e seis cêntimos) – sendo € 17.965,4 (dezassete mil, novecentos e sessenta e cinco euros e quatro cêntimos) de capital em dívida e € 9.830,2 (nove mil, oitocentos e trinta euros e dois cêntimos) relativos ao IVA sobre a totalidade dos honorários, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data em que, depois do trânsito em julgado desta sentença a factura for apresentada, e até integral e efectivo pagamento. b) Condiciono a referida condenação da R. à apresentação pelo A. da correspondente factura no valor de € 42.740,00 (€ 46.740,00 - € 4.000,00) mais IVA. absolvendo a R. do restante pedido. c) Absolvo o Autor do pedido de condenação de litigância de má fé formulado pela Ré. “ Inconformados com esta decisão, dela interpuseram recurso o A. e a R., pugnando o primeiro pela revogação do despacho proferido pelo Tribunal a quo que “declarou a nulidade do despacho de 9/4/2018 a fls. 50 e de todo o processado posterior àquele despacho, incluindo a sentença proferida nestes autos” ou, caso assim não se entenda, pela alteração da sentença na parte dos juros de mora que devem ser contabilizados desde 15 de Setembro de 2015, pugnando a segunda pela redução da condenação para o montante de 4.563,95 €. Porém, as apelações foram julgadas improcedentes e confirmada a sentença, deliberação que contou, no entanto, com o seguinte Voto de vencido: “Entendo que é inadmissível a reapreciação do despacho 9.4.2018, nos termos efectuados pela decisão de 11.12.2018, proferido mais de seis meses depois proferida a sentença de 16.5.2018, sem que em relação a esta tenha sido interposta qualquer impugnação no prazo legalmente previsto e sem que tenha sido devidamente justificada a ausência do exercício do direito ao contraditório pela parte contrária, na sequência de requerimento formulado pela parte, sem o devido patrocínio obrigatório e sem que o patrono nomeado alguma vez tivesse reagido a alguma das decisões proferidas, como era seu ónus e dever profissional. Sem prejuízo disso, sempre, em nosso entender estava vedado ao Tribunal, em violação, v.g., do disposto nos arts. 613º e 619º, do C.P.C., colocar em causa com esse expediente o trânsito em julgado da sentença proferida, admitindo que o incidente suscitado pela Ré tivesse um relevo superior àquela que se confere, v.g., à falta de citação e admitindo, por essa via, uma verdadeira revisão da sentença que, em rigor, só poderia ocorrer nos termos previstos no art. 696º, e ss., do Código de Processo Civil, por via de recurso de revisão. Por isso, teria considerado que ocorreu, além do mais que acima se refere, violação de caso julgado (de conhecimento oficioso) que imporia a manutenção do decido em 16.52018 (art. 625º, do C.P.C.), com prejuízo para tudo que depois disso se admitiu e decidiu e agora argumentava no recurso em apreço.” Apresenta-se agora o autor/apelante a interpor recurso de revista, que remata com as seguintes conclusões: “A) O Venerando Tribunal da Relação de Guimarães considerou: a) não verificada e procedente a violação grosseira do trânsito em julgado da sentença proferida em 16/05/2018; b) e que apenas são devidos juros de mora após o trânsito em julgado da decisão condenatória. B) A decisão proferida viola o disposto nos artigos 613.ª e 619.º do Código de Processo Civil e 804º e 805º do Código Civil. C) Nos presentes Autos verificou-se que: a] foi apresentada petição inicial, pelo A./Recorrente; b) a R./Recorrida foi devidamente citada - não se verificando falta ou nulidade de citação; c] a Recorrida foi notificada pelo Tribunal da suspensão do prazo processual para apresentação de contestação, em virtude do pedido de apoio judiciário formulado; d) foi proferida sentença final em 16/05/2018; e) esta mesma sentença foi notificada em 17/05/2018 ao patrono da R./Recorrida (ref.ª ...33) e também à própria R./Recorrida (ref.ª ...32); f) o Tribunal a quo, por despacho, declara a recorrida regularmente notificada da sentença proferida; g) a R./Recorrida, tendo ao seu dispor os mecanismos legais e ordinários de reagir à sentença nada fez; h) a sentença proferida transitou em julgado em 20/06/2018. D) De forma convicta e assertiva o Venerando Juiz Desembargador Dr. José Flores no seu voto de vencido resume o entendimento que tem expressão na lei, na doutrina e na jurisprudência: (…) E) Reitera-se, é incompreensível e inadmissível que, esgotado o seu poder jurisdicional, o Tribunal de 1- Instância venha a proferir uma decisão que anula uma sentença por si ditada e, mais, transitada em julgado e que, acto continuo o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães acompanhe tal decisão. F) 0 princípio da inviolabilidade e imutabilidade da sentença transitada em julgado, bem como o esgotamento do poder jurisdicional retira-se de múltipla jurisprudência, de que se destaca o Ac. TRE, de 20/04/1989: BMJ, 386.2-531 e Ac. TRP, de 12/12/1990: BMJ: 402.^-676. G) Mas, surpreendentemente, foi isso que não aconteceu nos presentes Autos pois, existindo uma sentença condenatória proferida, transitada em julgado, sentença essa que constituía título executivo em processo de execução em curso, sem mais, sem procedimento apropriado, sem sequer representação judiciária, sem qualquer pedido fundamentado, o mesmo juiz, fazendo tábua rasa do caso julgado e do esgotamento do poder jurisdicional, tomou (nova) decisão, lateral ao objeto do processo, que determinou a sum completa anulação e, em consequência, anulou a sentença, por si já proferida e transitada em julgado. H) Não está correcto, juridicamente não era possível e admissível. (Ac. STJ de 22/6/2017, proc. 2226/14.0...). "O despacho proferido depois de esgotado o poder jurisdicional é nulo" - cfr. Ac. TRG, de 18/5/2019, proc. 878/12.6TBGMR - F.G1, mas também no Ac. TRL, de 9/3/2021, proc. 23822/17.9T8LSB - H - LI - 7, que "de acordo com o princípio do esgotamento do poder jurisdicional (art. 613.- do Cód. proc. Civil), proferida a decisão fica extinto o poder jurisdicional relativamente Às questões sobre que incidiu a decisão, ficando preterido que o juiz - por iniciativa própria ou mediante requerimento da parte - altere ou modifique a decisão proferida, sob pena da inexistência da segunda decisão". I) O recorrente defende que a destruição da figura e da inatacabilidade do caso julgado não pode sucumbir perante falhas ou até irregularidades que se configuram laterais. K) A tese agora acolhida pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães permitirá, com o raciocínio que expõe, abalar toda e qualquer sentença e/ou acórdão proferido pela justiça dos nossos tribunais. L) Sendo também incompreensível que o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães refira que "na situação a decisão recorrida transitou em julgado, mas tal não obsta à reforma da decisão", uma vez que tal posição não está sustentada de nenhuma forma. M) Toda a argumentação e sustentação exposta pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães vai de encontro à explanação doutrinária e jurisprudencial da imutabilidade da decisão transitada em julgado e ao esgotamento do poder jurisdicional, porém, equivocadamente, extrai conclusão absolutamente errada e sem que se consiga alcançar a sustentação legal efetuada. N) De tudo quanto consta referido tem-se claro que por um expediente incidental, inapropriado, extemporâneo, o Tribunal a quo afrontou e feriu "de morte" a Certeza e Segurança Jurídicas, que se retiravam da existência de uma sentença transitada em julgado. O) Pelo que deverá este Venerando Supremo Tribunal de Justiça revogar o Acórdão proferido, declarando nulo e inexistente o despacho proferido pelo M. Juiz de 1- Instância em que, ignorando a Sentença Transitada em Julgado, declarou a nulidade dos atos após a citação da R./Recorrida. P) Assim, o Recorrente entende haver fundamento e requer a este Tribunal ad quem que dê provimento ao presente recurso e, em consequência, determine que seja revogado o despacho proferido pelo Tribunal a quo que "declarou a nulidade do despacho de 9/4/2018 a fls. 50 e de todo o processado posterior àquele despacho, incluindo a sentença proferida nestes autos". Q) Em consequência deverão ser revogados todos os actos posteriormente praticados, mantendo-se a decisão/sentença proferida nos autos em 09/04/2018 e já transitada em julgado. Por fim, R) Entendeu, erradamente o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, que apenas são devidos juros de mora após o trânsito em julgado da decisão condenatória. S) Estão dados como provados nos autos os seguintes factos: "13. A R., apesar de interpelada, não pagou a restante quantia em dívida ao aqui demandante. 17. Igualmente, nesse dia (2 de Setembro de 2015), a pedido, procedeu à entrega de original da Nota de Despesas e Honorários referida. 18. Não tendo havido pagamento por parte da R., o A. reforçou o envio e comunicação da referida "Nota", por carta remetida à R. no dia 3 de Novembro de 2015. 19. A nota de honorários foi apresentada e entregue à R., pela mandatária referida em 15, em dia não concretamente apurado mas nunca depois de 15 de Setembro de 2015". T) Para os advogados, a Nota de Despesas e Honorários constitui a designada "fatura", usada no giro comercial, veja-se como vem descrito no art. 105.-, n.° 2 do EOA "na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o advogado apresenta ao cliente a respetiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados". U) Tendo finalizado o patrocínio forense à recorrida o Recorrente cumpriu com a sua obrigação de emitir a "Conta de Honorários" - "fatura" - que a entregou à Recorrida. V) É obrigação da Recorrida, desde que interpelada, proceder ao respetivo pagamento, o que, como vem provado, não fez. [Cfr. Ac. TRL, de 9/2/2017, proc. 2440/11.0..., Ac. do STJ de 16/09/2008, 08A1438, Ac. do TRL de 19/06/2012, 2344/09.7..., Ac. do TRP de 23/05/2002, 0230655, Ac. do STJ de 17/02/2005, proc. 04B3048, Ac. do STJ de 27/04/2006, CJ.II, págs. 59 a 62). X) Pelo que, a Recorrida ao recusar o pagamento incorreu em mora, a qual tem que ser fixada na data de 15 de Setembro de 2015, conforme foi dado como provado no ponto 19 dos factos provados. Y) Como vem sendo defendido na mais variada jurisprudência dos nossos tribunais superiores, e de forma acertada, o facto de o devedor contestar os honorários liquidados pelo credor, isso não significa a transformação de um crédito líquido num crédito ilíquido. Z) Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo ignorou que: - o Recorrente liquidou os honorários - emitiu a Conta de Honorários; - a Recorrida foi interpelada para o pagamento - sabendo-se devedora, pelo menos, desde 15 de Setembro de 2015; - a Recorrida de forma culposa nada pagou. AA) A Recorrida sai beneficiada da sua falta, prejudicando-se o Recorrente ao não lhe conferir direito aos juros de mora devidos pelo seu trabalho, desde a data em que aquela foi interpelada e, com tal entendimento, o Tribunal a quo faz uma interpretação e aplicação errada do preceituado nos arts. 804.Q e 805.e do Cód. Civil. AB) Devendo este Venerando Supremo Tribunal de Justiça revogar a decisão a quo, decidindo que ao crédito fixado do Recorrente devem acrescer juros de mora legais, desde a interpelação feita à Recorrida, que aconteceu "nunca depois de 15 de Setembro de 2015". A Ré contra-alegou oferecendo as seguintes conclusões: “1- O recorrente fundamenta do seu recurso na violação do transito em julgado de sentença, por violação dos art.º 613 e 619 do CPC, uma vez que, segundo ele, o poder jurisdicional já estava esgotado e o tribunal não podia ter proferido a nulidade de despacho de 09/04/2018, anterior à sentença de 16/05/2018. 2- Não lhe assiste qualquer razão. 3- No caso em apreço, o que está em causa é a falta de notificação à recorrida da nomeação de patrono para efeitos de contestação, prévia àquela decisão. 4- A recorrida solicitou apoio judiciário na modalidade de nomeação e patrono, tendo sucedido vários patronos que apresentaram escusa. 5- Deste modo, a recorrida não teve conhecimento da nomeação do último patrono e por isso não apresentou contestação, tendo a Meritíssima Juiz a quo proferido despacho de 9/04/2018 considerando confessados os factos da PI, e consequentemente é proferida a sentença de 16/05/2018. 6- Ora, segundo o nosso modesto parecer, tal despacho não podia ter sido proferido porque a recorrida não tinha sido notificada da nomeação de patrono e por isso não se podia defender no processo. 7- Já que é entendimento constitucional que o procedimento de concessão de apoio não pode onerar o requerente com uma diminuição das suas garantias de defesa, e ainda que quando o pedido de apoio visa a nomeação de patrono, uma vez que desacompanhada de mandatário forense, a parte não dispõe de meios para, no processo defender (ou defender adequadamente) os seus direitos e interesses. 8- Tendo-se o Tribunal Constitucional pronunciado quanto a esta questão julgando inconstitucional, por violação do artigo 20, n.ºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa, a norma do artigo 24.º, n.º 5, alínea a) da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, interpretada com o sentido de que o prazo interrompido por aplicação do n.º 4 daquele preceito se inicia com a notificação ao patrono nomeado da sua designação, quando o requerente do apoio judiciário ainda não tenha sido notificado dessa mesma designação (Vide Acórdãos do TC nº 461/16, 298/18, 567/2018, 515/20). 9- Explicando o TC que com tal interpretação «persiste o risco, incompatível com o respeito pelo processo equitativo, na dimensão de igualdade substantiva entre as partes e de proibição da indefesa (artigo 20.º, n.º 4, da Constituição), de o interessado economicamente carenciado não poder defender os seus direitos e interesses legalmente protegidos, quer porque o prazo se poderá esgotar, quer porque disporá de um prazo inferior ao estabelecido na lei para prática do ato a qual o prazo está funcionalizado. 10-Assim, nesta matéria, a notificação da nomeação de patrono ao beneficiário é que reinicia a contagem do prazo para defesa, e essa notificação tem que ser feita por carta registada, por força dos art.º 37 da Lei do Acesso ao Direito e 112 e 113 do Código do Procedimento Administrativo (Ac. TRE 11/05/2021; Ac. TRG 27/05/2019, in dgsi.pt). 11-Ora, no caso dos autos, a dita notificação operou-se por carta simples, conforme informação da própria Ordem dos Advogados (AO). 12-Deste modo, a notificação da nomeação efectuada por carta simples é ilegal por violação da lei, e assim não produz qualquer efeito, sendo nula. 13-Assim, bem andou a Meritíssima Juiz a quo ao declarar a nulidade do despacho de 09/04/2018, logo que disso teve conhecimento. 14-Até porque a Sentença de maio de 2018 não foi, ao contrário do alegado pelo recorrente, notificada a recorrida, conforme consta dos autos-18/05/2018 - a notificação veio devolvida ao tribunal e também não foi notificada pessoalmente, ao contrário do que ali se diz. 15-Só em setembro de 2018, quando a recorrida dá nota ao processo que ainda não teve conhecimento da nomeação do patrono é que o Tribunal manda notificar a recorrida da sentença (despacho de 17/09/2018) dando esta conhecimento que até então não tinha sido notificada dessa sentença, contestando e arguindo essas nulidades. 16-Desconhecendo a nomeação e a identidade do patrono, o beneficiário do apoio não dispõe de informação que lhe permita prestar a colaboração necessária à apresentação de articulado de defesa, mormente no plano dos factos, além de que não tem meios de apurar por si mesmo que o prazo interrompido voltara a correr, em clara violação dos preceitos constitucionais do acesso ao direito e do direito a um processo equitativo plasmados no art.º 20 n.º 1 e 4 da CRP. 17-Sendo uma questão objectiva, verificação ou não da regularidade da notificação, esta tem uma clara influência na decisão da causa. 18-O recorrente assenta a sua fundamentação na sentença então proferida, na sequência do despacho de 09/04/2018 pelo qual se consideraram confessados os factos, e que o recorrente diz que transitou em julgado, não podendo mais a Juiz tomar posição sobre esta. 19-Ora, não foi aquela sentença que foi objecto de declaração de nulidade, mas sim, como se disse, o despacho anterior, pelo que não faz sentido falar de esgotamento do poder jurisdicional relativamente a essa sentença quando não foi essa decisão que foi objecto da nulidade. 20-Resulta da lei e da jurisprudência constitucional e dos tribunais superiores, que a notificação da nomeação de patrono deve ser feita por carta registada e não o sendo não produz qualquer efeito, sendo, por isso, objectivamente nula. 21-Basta, pois, a prova que a mesma foi efectuada por carta simples, como resulta dos autos, e da própria AO, para que a dita notificação seja considerada ilegal. 22-A recorrida deu nota da sua falta de notificação da dita nomeação na primeira intervenção, conforme consta de despacho, já que só em setembro de 2018 é que tomou conhecimento da existência da dita sentença, não sendo, por isso, extemporânea a sua intervenção. 23-Não está aqui em causa qualquer esgotamento do poder jurisdicional ou violação do caso julgado relativamente àquela sentença, pelo que deverá naufragar a alegação do recorrente nesta matéria. 24-Assim, bem andaram os Venerandos Desembargadores do Tribunal da Relação ao manterem a decisão que proferiu a nulidade do despacho de 9/04/2018, anulando todo o processado posteriormente, incluindo a sentença de 18/05/2018. 25-Quanto aos juros, não assiste razão ao recorrente. 26-Bem esteve o Tribunal da Relação ao manter a decisão de primeira instância. 27-Para que haja mora é ainda necessário que a obrigação seja certa, líquida e exigível. 28-Com todo o respeito, à data da nota de honorários, 15/09/2015, a dita obrigação não preenchia os requisitos acima mencionados. 29-Por outro lado, como pode o recorrente exigir o pagamento de honorários, IVA e juros, sem ter passado qualquer factura para o efeito. 30-Ora, a este respeito, entende a jurisprudência que a emissão de factura é não só condição de exigibilidade legal do valor do imposto e da condenação no seu pagamento, mas também condição legal (cfr. art. 270. º do C. Civil), que, enquanto não preenchida, determina não poder considerar-se vencida e exigível a obrigação (Ac. Ac. TRC 16/12/2015; STJ 22/04/2004, TRL 07/01/2020). 31-Diga-se, também, em forma de desabafo, que o recorrente confessou ter recebido cerca de 35 mil euros, e apenas passou um único recibo de mil euros, e pretende agora que a recorrida pague os juros desde a apresentação da nota de honorários. 32-Por isso, bem andou o Tribunal ao condicionar a condenação à apresentação da factura, e a contabilizar os juros a partir da emissão dessa mesma factura. 33-Não foram violadas, entre outras, as normas dos art.º 191º, 195º, 200º, 613º, 619º todos do CPC e dos art.º 804 e 805 do Código Civil.” Foi, ainda, proferido despacho do seguinte teor: “Verifico que o despacho de 11.12.2018 foi notificado ao mandatário do autor, que dele não interpôs recurso ( cfr. art. 644, nº 2, al. g) do CPC). Ora, nos termos desse despacho ficou definido que a ré arguiu tempestivamente a nulidade por omissão de notificação em 11.9.2018 a fls. 70, o que levou o Sr. Juiz, na procedência de tal arguição, a declarar a nulidade do despacho de 9.4.2018 e a anular todo o processado posterior àquele despacho, incluindo a sentença. Pode, assim, entender-se que, com a nulidade do despacho de 9.4.2018 declarada pelo despacho de 11.12.2018 transitado em julgado, ficou prejudicado não apenas o princípio do esgotamento do poder jurisdicional (na medida em que, com a arguição da nulidade, não se estava a pôr em causa o mérito da causa) como o trânsito em julgado da sentença (que foi anulada). Como assim, notifique as partes para, em 10 dias, se pronunciarem sobre a enunciada perspectiva jurídica, relacionado com o trânsito em julgado do despacho de 11.12.2018.” Em resposta, o A. veio alegar que, notificado do despacho de 11.12.2018, dele recorreu ao abrigo do art. 644º, nº 2, al. g) mas que a Relação, em despacho singular, não conheceu do objecto do recurso, com o fundamento de que lhe cabia impugnar o referido despacho com a decisão que viesse a ser tomada, ao abrigo do art. 644º, nº 3 do CPC. Juntou documentos comprovativo do alegado, o que se considera, também, como facto assente. Cumpre decidir, tendo por base as ocorrências processuais que constam do relatório e que se mostram assentes. Estão provados, ainda, os seguintes factos: “ 1. No ano de 2008, a R. contactou o A., no seu escritório, solicitando a prestação dos seus serviços como advogado. 2. Tendo em vista várias situações a resolver, de natureza criminal e cível, que implicavam o recurso ao tribunal. 3. Serviços esses que se prolongaram até final de Agosto de 2015, altura em que a R. entendeu fazer cessar os mandatos conferidos. 4. Tendo o A. aceite os mandatos, a R. conferiu ao mesmo, em procuração bastante, os precisos poderes para a representar em juízo nas várias acções que correram e nas várias questões e assuntos a resolver. 5. O A. prestou os seus serviços, como advogado, nos seguintes processos: a) Processo n.º 288/08.9... – Comarca ... – natureza criminal – figurando a R. como denunciante; b) Processo n.º 535/08.7... – Comarca ... – natureza cível – figurando a R. como autora; c) Processo n.º 858/09.8... – Comarca ... – natureza cível – figurando a R. como arguida; d) Processo n.º 415/12.1... – Comarca ... – natureza criminal – figurando a R. como arguida; e) Processo n.º 432/12.0... – Comarca ... – natureza cível – figurando a R. como autora; f) Processo n.º 1441/12.6... – Comarca ... – natureza cível – figurando a R. como autora; g) Processo n.º 467/09.1... (ao qual foi apenso o processo n.º 152/10.1...) – Comarca ... – natureza criminal – figurando a R. como arguida; h) Processo n.º 305/09.5... – Comarca ... – natureza criminal – figurando a R. como arguida; i) Processo n.º 210/10.2... – Comarca ... – natureza criminal – figurando a R. como arguida; j) Processo n.º 502/09.3... – Comarca ... – natureza criminal – figurando a R. como arguida; l) Processo n.º 10266/07.0... – Comarca ... – natureza cível – figurando a R. como executada. 6. O A, na sequência dos poderes que lhe foram atribuídos, após variadíssimas reuniões e contactos com a R., desenvolveu e executou os seguintes trabalhos: - acompanhamento a inquirições e interrogatórios; - requerimentos de queixa; - requerimentos vários, nomeadamente para indicação de prova, intervenção de superior hierárquico; - elaboração de petições iniciais; - requerimentos de interdição provisória; - acompanhamento e discussão de exames periciais; - requerimentos de ampliação de base instrutória; - acompanhamento em sessões de audiência e discussão de julgamento; - requerimentos probatórios; - incidentes; - requerimentos de abertura de instrução; - requerimentos de produção antecipada de prova; - contestações em processos de natureza criminal; - acompanhamento em debates instrutórios - apresentação de recursos junto do Tribunal da Relação do Porto e respectiva audição de gravações e elaboração de alegações; - apresentação de recursos junto do Supremo Tribunal de Justiça e elaboração de alegações; - reclamações e requerimentos de invocação de nulidades; - elaboração de réplicas; - acompanhamento a audiências preliminares; - entre outros… 7. A dimensão do trabalho do A., ao longo dos mais de 7 anos, traduziu-se, nomeadamente, na necessidade de acompanhamento e deslocação ao Tribunal de ... e ..., perfazendo diversas deslocações de mais de 300Km. 8. Deslocações essas, quase todas, para acompanhamento e presença em sessões de instrução ou audiências de discussão e julgamento. 9. O A. acompanhou os processos praticamente desde os seus começos, tendo dado início a alguns deles. 10. No exercício do patrocínio foram acumuladas variadas despesas, necessárias ao exercício do mandato, nomeadamente as relativas às dezenas de deslocações necessárias aos tribunais. 11. No desempenho do mandato conferido pela R., o A. prestou vários serviços e fez as despesas constantes da Nota de Despesas e Honorários junta aos autos sob doc. nº 1 com a PI cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais, com excepção dos descritos em a), b) e 24. 12. Ao longo do tempo, a R. entregou ao A., em dinheiro, diversas provisões por conta de despesas e honorários nos valores de € 4.500,00 (em entregas parcelares) e € 30.536,01 (em três entregas ocorridas em Maio/Junho de 2015), conforme resulta discriminado naquela nota de honorários. 13. A R., apesar de interpelada, não pagou a restante quantia em dívida ao aqui demandante. 14. Na verdade, permanecendo ainda em curso alguns dos processos, a R., em finais de Agosto de 2015, entendeu fazer cessar os mandatos conferidos. 15. Solicitando ao A., em 1 de Setembro de 2015, que substabelecesse em nova mandatária – a Ex.ma Colega Dra. EE. 16. O que o A. fez no dia 2 de Setembro de 2015, em reunião mantida com a referida Colega, na qual procedeu à entrega dos vários processos confiados. 17. Igualmente, nesse dia, a pedido, procedeu à entrega de original da Nota de Despesas e Honorários referida. 18. Não tendo havido pagamento por parte da R., o A. reforçou o envio e comunicação da referida “Nota”, por carta remetida à R. no dia 3 de Novembro de 2015. 19. A nota de honorários foi apresentada e entregue à R., pela mandatária referida em 15, em dia não concretamente apurado mas nunca depois de 15 de Setembro de 2015. 20. O A prestou serviço em ..., na Av. ..., onde exercia a sua actividade, não em prática isolada, mas em economia comum com vários outros colegas, no escritório destes, nomeadamente do Dr. FF, GG e HH. 21. Durante quase 7 anos, das provisões recebidas e descritas em 12, o A. apenas entregou à R. em Junho de 2015, quatro recibos emitidos em 16/06/2015, quer pelo A, quer pelos colegas de escritório, no valor € 1.000,00 cada um, num total de 4.000,00 € mais IVA, sem qualquer referência de processos. 22. No processo 288/08.9..., na al. l) da nota de honorários, o acompanhamento da Ré na PSP de ... foi feito pelo Dr. HH. 23. No processo n.º 1441/12.6..., o A não elaborou a PI mas sim o Dr. GG que interveio igualmente em outras diligências. 24. Nos processos 858/09.8... e 210/10.2... onde se menciona em cada um (al. f) e al. c) respectivamente da nota de honorários) audiência de julgamento no mesmo dia 20/02/2012, estão contabilizadas duas deslocações. 25. A R era proprietária de um imóvel, na freguesia de ..., inscrito na matriz sob o art.º ...98, e descrito na conservatória do registo predial sob o n.º ...04, que estava à venda, tendo para tal celebrado contrato de mediação para a referida venda, no valor de 200.000,00 € e tendo passado procuração ao A para o efeito. 26. No entanto, o A em 2015, assinou, por conta da R, outro contrato de mediação para venda do referido imóvel no valor de 120.000,00 €. 27. É convicção da Ré que a venda foi efectivada pelo A. por valor superior a 120.000,00 €, mas escriturada por 80.000,00 €, tendo sido remetido ao A. dois cheques um no valor de 10.000,00 € (sinal) e outro de 70.000.00 €. 28. Assim que a R recebeu os papéis da referida venda, em Junho de 2015, solicitou explicações ao A, até porque o prédio vendido tinha a descrição predial 1424, quando passou procuração para o prédio com descrição 1404. 29. O A, em Junho de 2015, apenas entregou à R um cheque de 50.000,00 € que esta solicitou que fosse endossado ao seu filho II uma vez que não tinha conta bancária, e entregou ainda listagem das despesas pagas por este, com o dinheiro da venda, num total de 37.904,58. 30. Sobre estes factos a R, apresentou, em consequência, queixa-crime que corre termos actualmente pelo M.P. de ..., com o n.º 1094/15.0... estando o processo em fase de investigação. “ E não provados os seguintes: “a) O A. prestou os serviços discriminados na nota de honorários melhor descritos sob as epígrafes: “ Processo n.º …………... – Comarca de ... – natureza criminal – figurando a R. como arguida” no valor total de € 450,40 e “Regularização/liquidação de processos executivos levantamentos de penhoras” no valor total de € 430,40. b) Além do acompanhamento dos processos referidos em 5, o A. desenvolveu esforços no sentido da resolução de outras questões, como regularização e liquidação de processos executivos em curso, levantamento de penhoras, entre outros. c) No processo 288/08.9..., na al. f) contabiliza 3 horas e acompanhamento de inquirição e testemunhas, quando foi cerca de uma hora. d) No processo 535/08.7..., na al. h) contabiliza 400,00 € de elementos clínicos, quando a R tinha parecer médico legal e não necessitava deste. e) A Ré recebeu a carta remetida pelo A. com a nota de honorários e referida em 18. f) A R. sempre liquidou ao A. as quantias que este ia solicitando por conta dos processos, tendo sempre pago o que lhe era pedido, sem que o mesmo passasse os respectivos recibos, como era obrigado. g) A R. pagou, na integralidade, os serviços que o A. agora reclama. h) Nos processos 858/09.8..., 467/09.1..., 305/09.5..., 502/09.3..., 10266/07.0... o A. está a cobrar à R. na referida nota de honorários também as quantias devidas pelo filho daquela, o Sr. JJ, seu filho, sem ter havido para tal o acordo prévio das partes. i) No processo 467/09.1..., apesar da R. ter entregue provisões ao A. por conta do processo e este, por negligência, apesar de ter sido solicitado pela R, não ter apresentado recurso da decisão, com prejuízo efectivo para a R, o A mencionou que nada mais cobraria por esse processo. j) Nem todas as deslocações que o A menciona ao Tribunal de ... eram feitas em exclusivo da R e dos seus processos, mas era também para o mesmo tratar de assuntos de familiares da esposa, que depois contabilizava à R. sem qualquer razão. k) O A. assinou o contrato referido em 26 sem conhecimento e autorização da R. O Direito: Como se viu acima, em 9.4.2018 foi proferido despacho que, na sequência de falta da contestação da ré, que foi citada, declarou confessados os factos alegados pelo autor, a que se seguiu uma primeira sentença condenatória, em 16.5.2018, da qual a ré não interpôs recurso. Porém, volvidos alguns meses, por despacho de 11.12.2018, o tribunal considerou que a ré arguiu tempestivamente, em 11.9.2018, a nulidade por omissão de notificação da nomeação de patrono que lhe foi efectuada em 9.2.2018, declarou a nulidade do despacho de 9.4.2018 que tinha declarado confessados os factos alegados pelo autor e de todo o processado posterior àquele despacho, incluindo a sentença de 16.5.2018 proferida nestes autos, declarando, dessa forma, interrompido o prazo da contestação. Deste despacho de 11.12.2018 o autor ainda interpôs recurso, ao abrigo do art. 644º, nº 2, al g) mas a Relação não o admitiu, por entender que o mesmo podia ser impugnado com a sentença a proferir, ao abrigo do art. 644º, nº 3 do CPC. Apresentada a contestação, foi efectuado julgamento e proferida nova sentença. É desta sentença que o autor vem interpor recurso. Argumenta que a ré foi devidamente citada, tendo sido notificada pelo Tribunal da suspensão do prazo processual para apresentação de contestação, em virtude do pedido de apoio judiciário formulado, tendo sido proferida sentença final em 16.5.2018, que foi notificada em 17.5.2018 ao patrono da R./Recorrida e também à própria R./Recorrida, tendo o Tribunal a quo, por despacho, declarado a recorrida regularmente notificada da sentença proferida; e que não tendo a ré/recorrida reagido, se deve considerar que a sentença transitou em julgado em 20.6.2018. Assim, insurge-se contra o despacho de 11.12.2018, que, oficiosamente, anulou o despacho de 9.4.2018 e a sentença subsequente, que tinha já transitado em julgado, assim violando o princípio da inviolabilidade e imutabilidade da sentença transitada em julgado, bem como o esgotamento do poder jurisdicional, que decorrem dos art. 613º e 619º do CPC. Começando pelo princípio do esgotamento jurisdicional. Relativamente ao exercício do poder jurisdicional, rege o art. 613º do CPC que, no seu nº 1, estatui que “proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa”, Excepciona, porém, o nº 2 que é lícito ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes. Acrescentando o nº 3, que “ o disposto nos números anteriores (…) aplica-se, com as necessárias adaptações, aos despachos”. A lei consagra, pois, a regra do esgotamento jurisdicional do juiz, depois de proferida a sentença, regra essa que é determinada pelos “princípios da segurança jurídica e da imparcialidade” que interessa acautelar (Ruí Pinto, Os meios reclamatórios comuns da decisão civil (artigos 613º a 617º CPC), Julgar Online, Maio de 2020, pág. 2) e que não se confunde com o caso julgado (outro dos efeitos da sentença) que decorre do trânsito em julgado (Lebre de Freitas, CPC anotado, volume II, 3ª edição, págs. 728, 731 e 748). Escreve, porém Lebre de Freitas, in ob. cit. a pág. 730: “No quadro dos vícios específicos da sentença, de que tratam os arts. 614ª 617 não entram as invalidades decorrentes do seu proferimento em momento processual inadequado. Não se trata então de vício de um ato que devesse ter lugar mas da prática de um ato processual que não devia ter lugar no momento em que foi praticado. Assim, por exemplo, se o juiz proferir a sentença antes das alegações orais das partes (art. 604-3-e) ou baseado em questão de facto ou do direito de conhecimento oficioso que as partes não tiverem tido em conta nas suas alegações e que não tiver sido ainda considerada no processo(art. 3-3), a sentença é prematura ocorrendo anulabilidade nos termos do art.195-1 a arguir no prazo de 10 dias do art. 149-1. Assim também se um acto da sequência processual anterior à sentença estiver ferido de anulabilidade ( por exemplo iniciaram-se as alegações orais quando faltava ainda produzir determinado meio de prova) e esta tiver sido tempestivamente arguida a sentença será anulada em conformidade com o disposto no art. 195-2. Neste caso não é necessário o recurso da decisão final, com a finalidade de impedir o trânsito em julgado; este não se dá enquanto não for proferida a decisão sobre a nulidade (acs. do STJ de 16.12.69, Santos Carvalho Junior, BMJ 192, p. 218, tirado com um voto de vencido e do TRC de 3.10.89, Pereira da Silva, CJ 1989, V, p. 71) (…). Interessa, ao caso, o Ac. STJ de 16.12.69, que foi sintetizado da seguinte forma: “ I. Se apesar de não ter contestado, o réu, antes de designado dia para audiência de discussão e julgamento, constituiu mandatário judicial, produz nulidade a falta de notificação do mesmo réu para a referida audiência. II- Arguida a nulidade perante o tribunal da primeira instância é a esse tribunal que compete conhecer dela, sendo irrelevante o facto de a sentença já haver sido proferida. III- A procedência da referida nulidade tem como feito a anulação dos termos subsdequentes do processo incluindo a sentença. não sendo necessária para tal que dessa sentença tenha interpsto recurso”. Na mesma senda, escreveu Rui Pinto, ob. cit., pág. 32: “ Enfim, novamente, como qualquer outro ato processual, a decisão judicial pode ser revogada em consequência de arguição procedente de nulidade de um ato ou omissão anteriores à decisão, de que dependa absolutamente por força do artigo 195.º, nº 2, primeira parte (…) “ Revertendo ao caso sub judice, verifica-se, portanto, que a Sr.ª Juiz podia ter proferido o despacho de 11.12.2018, com o fundamento de que a ré arguiu tempestivamente a nulidade por omissão de notificação da nomeação de patrono que lhe foi efectuada em 9.2.2018 e, consequentemente, anular o despacho subsequente de 9.4.2018, que declarou confessados os factos e os termos posteriores, incluindo a sentença de 16.5.2018. É certo que o autor interpôs recurso autónomo do despacho de 11.12.2018, de cujo objecto a Relação não conheceu por entender que o mesmo devia ser impugnado nos termos termos do art. 644º, nº 3 do CPC Sucede, porém, que o recorrente não impugnou o despacho de 11.12.2018, no que se refere à existência de nulidade e à sua tempestividade. Apenas o contestou com fundamento na violação da regra do esgotamento do poder jurisdicional, mas isso, não impedia, como vimos, a prolação de tal despacho. Também o recorrente invocou a violação do caso julgado, decorreente do trânsito em julgado. No entanto, e como decorre do que acima ficou dito, temdo sido proferida decisão de anulação dos termos subsequentes ao despacho de 9.4.2018, incluindo a sentença, não chegou a verificar-se o trânsito em julgado desta sentença. Juros de mora: A sentença condenou a ré BB no pagamento ao autor AA, da quantia total de € 27.795,06 sendo € 17.965,04 de capital em dívida e € 9.830,02 relativos ao IVA sobre a totalidade dos honorários, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data em que, depois do trânsito em julgado desta sentença, a factura for apresentada, e até integral e efectivo pagamento; e condicionou a referida condenação da ré à apresentação pelo autor da correspondente factura no valor de € 42.740,00 (€ 46.740,00 - € 4.000,00) mais IVA. absolvendo a R. do restante pedido. Para tanto, entendeu que a emissão de factura é condição de exigibilidade legal do valor do imposto e da condenação no seu pagamento. Insurge-se o autor recorrente contra a condenação da ré em juros de mora a partir do trânsito em julgado da sentença, contra factura, pois, segundo sustenta, o facto de o devedor contestar os honorários liquidados pelo credor não implica a transformação de um crédito líquido num crédito ilíquido. Além disso, argumenta, em lugar da factura, o advogado deve apresentar, ao abrigo do 105º, n.° 2 do EOA, e na falta de convenção prévia reduzida a escrito, a respectiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados, o que fez pelo menos até 15 de Setembro de 2015, pelo que, considera, ao recusar o pagamento, a recorrida incorreu em mora, a qual tem de ser fixada nesta última data, conforme foi dado como provado no ponto 19 dos factos provados. Em seu abono, faz o recorrente apelo, entre outros, aos Acórdãos do STJ de 17.2.2005, proc. 04B3048, 27.4.2006, CJ II, págs. 59 a 62 e 16.9.2008, proc. 08ª1438. São dois os problemas que se suscitam: o da constituição em mora apenas com a interpelação do autor para o pagamento; e o da necessidade da factura, como condição de exigibilidade do pagamento dos juros. Relativamete à mora, sufragamos o úlitmo acórdão do Supremo de 11.5.2023, proc. 552/07.4TVPRT.P2, segundo o qual, e de acordo com o dispoto no art. 805º, nº 3 do CC ” o crédito por honorários só se torna líquido com a sentença judicial que fixe o respectivo montante, sendo a data da respectiva prolação condizente com o dies a quo atinente à contagem dos juros moratórios devidos.” Entende-se, nesse caso, que “embora o quantitativo referentes aos serviços prestados ao demandado se tenha tornado líquido para os demandantes, através da sua notificação àquele, tal liquidez não se comunica à retribuição do contrato de mandato já que se está perante um crédito determinado apenas pelos demandantes, podendo ser divergente o juízo do demandado sobre a forma de cálculo utilizada para a liquidação “. Neste sentido, pode ver-se o anterior acórdão de 1.6.2004, proc. 04A1526, que foi sumariado da seguinte forma: “I - Na responsabilidade contratual, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor. II - Diz-se ilíquida a obrigação cuja existência é certa, mas cujo montante não está ainda fixado. III - O simples facto de o credor pedir o pagamento de determinado montante não significa que a dívida se torne líquida com a petição, pois ela só se torna líquida com a decisão. IV- Se a obrigação é ilíquida, por não estar ainda apurado o montante da prestação, também a mora não se verifica, por não haver culpa do devedor no atraso do cumprimento. V- Em situação de iliquidez, os juros moratórios são devidos apenas desde a data da sentença em 1ª instância.”; e o acórdão do STJ de 27.4.2005, do mesmo relator (Azevedo Ramos), assim sintetizado: “I - Para haver mora, não basta a interpelação do devedor. II - Para que haja mora, além da culpa do devedor e, consequentemente da ilicitude do retardamento da prestação, é ainda necessário que esta seja certa, líquida e exigível. III - Não há culpa do devedor quando ele não cumpre apenas por não saber, nem ter o dever de saber qual o montante exacto da dívida. IV- Diz-se ilíquida a obrigação cuja existência é certa, mas cujo montante não está ainda fixado. V- No domínio da responsabilidade contratual, o simples facto do credor pedir quantia certa, avaliando os danos por sua conta e risco, não significa que a dívida se torne líquida com a petição inicial, pois só se tornará líquida com a decisão. VI - Líquido ou específico será apenas o pedido formulado, mas não a obrigação, pelo que os juros de mora apenas são devidos a partir da decisão judicial que fixe o montante da indemnização.” Assim, entendemos, na esteira dos acórdãos citados, que os juros nunca podiam ser devidos a partir da data da interpelação mas apenas depois da sentença, que procedeu à liquidação da dívida. Sucede, porém, que, para que haja mora, além da culpa do devedor e, consequentemente da ilicitude do retardamento da prestação, é ainda necessário que esta seja certa, líquida e exigível (cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª ed., pág. 115). Os juros só são devidos se a dívida liquidada for exigível. E ela só se torma exigível se for apresentada factura, da qual conste o IVA reclamado. De acordo com o recente Ac. STJ de 20.6.2023, Proc 5364/20.7T8MTS.P1.S1 “ (…) III- A emissão e apresentação de fatura respeitante a um serviço prestado, constitui uma obrigação legal imposta pelos arts. 29.º, n.º 1, al. b), e 36.º, n.º 1, do CIVA, mas é também condição de cuja verificação depende a exigibilidade do pagamento. IV - A emissão da fatura como condição legal (cfr. art. 270.º do CC), determina que enquanto não se verificar não pode considerar-se vencida e exigível a obrigação litigada, sendo nesse caso de aplicação o disposto no art. 610.º, n.º 1, e n.º 2, al. a), do CPC.” Tal acórdão segue, pois, o entendimento do acórdão da Relação de Coimbra de 16.12.2015, proc. 162/12.4TBMDA.C1. “(…) 4 - A emissão obrigatória duma factura, respeitante a um serviço prestado, funciona como uma condição que, enquanto não preenchida, determina não poder considerar-se vencida e exigível a obrigação – toda ela, remuneração efectiva do serviço e imposto IVA – não havendo assim lugar a juros e havendo, isso sim, lugar à aplicação do art. 610.º/1 e 2/a) do CPC (ou seja, ao pagamento da obrigação apenas e só contra a apresentação da competente factura).” Entemdimento que também é seguido no Ac. Relação do Porto de 17.5.2022, proc, 5631/18.0T8PRT.P1, assim sumariado: “II – O IVA não pode ser exigido sem prévia emissão e apresentação da respetiva fatura, de tal modo que a emissão obrigatória da fatura surge como condição de exigibilidade e vencimento de toda a dívida – remuneração do serviço prestado e IVA correspondente. III – Enquanto a fatura não for preenchida a obrigação não se pode considerar vencida e exigível e, por isso, não há lugar ao pagamento de juros, impondo-se, por outro lado, a aplicação do disposto no art. 610º, nº 1 do Cód. de Proc. Civil, donde decorre que o pagamento da obrigação se efetuará apenas contra a emissão e apresentação da competente fatura”. Antes, porém, já o Ac. STJ de 22.4.2004, proc. 04B837 tinha decidido o seguinte: “(…) V- Para além do IVA não pode ser exigido sem prévia emissão e apresentação de factura com os requisitos estabelecidos no nº 5 do art.35º CIVA, quando a emissão e apresentação duma tal factura for imposta por convenção das partes, estar-se-á perante condição da exigibilidade, e, assim, do vencimento, de toda a dívida - parte remuneratória e imposto -, e, assim, perante uma condição suspensiva, sem o preenchimento da qual, conforme art. 270º C.Civ., o pagamento não é exigível - caso em que há lugar à aplicação do disposto no art. 662º, nº1, CPC.” No sentido de que a emisão e apresentação de factura é condição de exigibilidade do pagamento decidiu, tambem, recentemente, o Ac. STJ de 22.2.2024, proc. 571/20.5T8LAG.E1.S1, em cujo sumário se pode ler: “A emissão e apresentação-entrega de factura (ou factura-recibo sem pagamento) junto do devedor da remuneração correspondente a contrato de prestação de serviços, sem prejuízo de ser uma obrigação legal imposta em sede do imposto IVA (arts. 1º, 1, a), 2º, 1, a), 4º, 1, 7º, 1, b), 8º, 1 e 2, 29º, 1, b), e 36º, 1 e 5, do CIVA), uma vez convencionada pelas partes (quanto ao momento da execução contratual), configura um ónus necessário (traduzido em “interpelação”) para o credor, com o significado de se assumir como uma condição de exigibilidade da (constituída e eficaz) obrigação negocial de pagamento do serviço, assim susceptível de vencimento, nos termos da vinculação a que respeitam os arts. 762º, 1, 763º, 1, 777º, 1 e 2, e 817º do CCiv.” Assim, tendo em conta toda esta jurisprudência citada, com a qual se concorda, os juros de mora só serão devidos a partir da data em que, depois do trânsito em julgado da sentença, a factura seja apresentada. Improcede, assim, o recurso, também nesta parte. Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção em negar a revista e confirmar o acórdão recorrido. Custas pelo recorrente. * Lisboa, 15 de Maio de 2024 António Magalhães (Relator) Nelson Borges Carneiro Manuel Aguiar Pereira |