Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2378/11.1TBBRR.L1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: FÁTIMA GOMES
Descritores: ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
JUROS DE MORA
RESTITUIÇÃO
CONTRATO DE EMPREITADA
PRAZO
DONO DA OBRA
DESISTÊNCIA
DETERMINAÇÃO DO PREÇO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DOCUMENTO PARTICULAR
FORÇA PROBATÓRIA
PRESUNÇÕES JUDICIAIS
Data do Acordão: 02/03/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. A fixação unilateral, pelo dono de obra, de um prazo para a conclusão da construção, quando o empreiteiro ainda estava sujeito à obrigação de suspender os trabalhos até ser autorizada a sua conclusão pelas entidades competentes, que tutelam o património cultural, seguida de comunicação de resolução do contrato de empreitada por alegado incumprimento do empreiteiro do prazo concedido, mesmo que sem fundamento válido, equivale à desistência do contrato pelo dono da obra, nos termos do art.º 1229.º do C.C., na medida em que traduz a expressão da vontade de por termo à empreitada, por falta de interesse subjetivo na prestação da contraparte.

II. Tendo o dono de obra desistido da empreitada antes da conclusão da obra, como lhe era lícito fazer, nos termos do referido art.º 1229.º do C.C., o preço devido por aquele ao empreiteiro deverá ser determinado de acordo com o disposto no art.º 883.º e 884.º, ex vi art.º 1211.º n.º 1, todos do C.C.

III. A devolução dos valores recebidos em excesso tem uma justificação – o direito dos AA. a desistir da empreitada – pagando o valor da obra realizada pelo R. e não mais do que esse montante.

IV. A sua restituição sem qualquer juro de mora não se apresenta em conformidade com o direito, porquanto a devolução foi oportunamente solicitada e recusada, estando o valor no património da Ré a ser por ela usado – e eventualmente frutificado

V. Mesmo a aplicar-se aqui o regime do enriquecimento sem causa sempre haveria lugar ao pagamento de juros, a contar da citação, por força do art.º 480.º do CC.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I. RELATÓRIO

1. AA e BB intentaram a presente acção de condenação, em processo declarativo comum (inicialmente ao abrigo do disposto no Dec.Lei n.º 108/2006 de 08 de Junho), contra CC, Wolfeyes – Engenharia, Lda., DD, EE e M. S. Valente – Construções Unipessoal Lda., pedindo a condenação solidária dos R.R. a pagarem-lhes a quantia de €129.684,00, sendo €48.152,00 de devolução por excesso de pagamento em relação à obra executada; €41.382,00 relativo à penalização contratual; €6.300,00 referente ao pagamento das rendas pagas pelos A.A. referentes a casa sita na Rua..., ..., nos meses de Junho de 2010 a Julho de 2011; €30.000,00 a título de indemnização por danos morais; €3.850,00 de juros que os A.A. pagaram ao Banco Santander Totta, S.A. de Abril de 2010 a Fevereiro de 2011, quantia esta acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até efetivo e integral pagamento; e ainda a pagarem aos A.A. a diferença entre as condições contratuais estabelecidas entre o Banco Santander Totta, S.A. e os A.A., em 01 de Julho de 2008, e as que por via da prorrogação do empréstimo hipotecário vierem a incidir sobre o contrato nº ...60, a apurar a posteriori.

Sustentam estas pretensões na alegada celebração de um contrato de empreitada, que foi incumprido por causa imputável aos R.R., que não entregaram oportunamente a documentação necessária à renovação do alvará de licenciamento de construção e acabaram por abandonar a obra, o que motivou a resolução do contrato de empreitada pelos A.A., após incumprimento pelos R.R. da interpelação para resolução das situações que deixaram por concluir. Pretendem assim os A.A. exercer o direito a indemnização por incumprimento do contrato de empreitada, quer por danos patrimoniais, quer não patrimoniais, por si sofridos.

2. Regularmente citados, os R.R. contestaram, defendendo-se por excepção e impugnação, tendo o R. CC deduzido ainda um pedido reconvencional.

Os A.A. apresentaram réplica quanto às alegadas excepções e ao pedido reconvencional.

3. Findos os articulados, a reconvenção deduzida pelo R. CC não foi admitida, tendo no despacho saneador sido julgadas por procedentes as excepções de ilegitimidade passiva quanto aos R.R. EE e DD, que assim foram absolvidos da instância. Já a exceção de ilegitimidade passiva invocada pelo R. CC foi julgada improcedente. Nessa sequência, foram fixados o objeto do litígio e os temas da prova.

4. Admitida a prova requerida, veio a proceder-se à realização de audiência final, finda a qual foi proferida sentença que julgou a acção improcedente por não provada, absolvendo os R.R. de todos os pedidos contra eles formulados, tendo ainda decidido julgar improcedentes os incidentes de litigância de má-fé deduzidos no âmbito dos autos.

5. Vieram interpostos recurso de apelação da sentença pelo R. CC e pelos A.A., AA e BB, conhecidos pelo Tribunal da Relação ..., que identificou como questões a decidir:

a) A nulidade da sentença por omissão de pronúncia relativa ao pedido de condenação dos A.A. como litigantes de má-fé, tal como requerida pelo R. CC na sua contestação (indeferida);

b) A impugnação da matéria de facto (parcialmente procedente);

c) A verificação dos pressupostos da obrigação de indemnização por incumprimento do contrato de empreitada pelos R.R. (parcialmente procedente);

d) A litigância de má-fé do R. CC (indeferida); e

e) A litigância de má-fé dos A.A. (indeferida).

6. O TR veio a proferir acórdão com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, acorda-se em julgar as apelações apresentadas nos seguintes termos:

A) Julgamos totalmente improcedente, por não provada, a apelação apresentada pelo 1.º R., CC, não reconhecendo a existência da nulidade da sentença na parte que apreciou o pedido de condenação dos A.A. como litigantes de má-fé e mantendo a sentença recorrida, nessa parte, nos seus precisos termos;

B) Julgamos parcialmente procedente, por provada, a apelação apresentada pelos A.A., AA e BB, quer quanto à impugnação da matéria de facto, que é alterada nos termos constante do ponto 2.4 do presente acórdão, quer quanto ao mérito da causa, revogando a sentença recorrida apenas na parte em que absolveu a 2.ª R., Wolfeyes, Engenharia, Lda., do pedido de devolução por excesso de pagamento em relação à obra executada, que assim é substituída pela decisão de condenar essa R. a pagar aos A.A. o valor de €48.243,20, acrescido de juros de mora, à taxa legal de 4%, a contar da sua citação, ocorrida a 20/7/2011 (cfr. fls 326), e até integral pagamento (cfr. Art.s 804.º, 805.º n.º 1, 806.º, conjugados com o Art. 559.º do C.C. e Portaria n.º 291/2003 de 8/4).

Quanto ao mais, mantém-se a sentença recorrida nos seus precisos termos.

- Custas do recurso de apelação do 1.º R. pelo respetivo Apelante; e as

do recurso de apelação dos A.A., pelos Apelantes e pela apelada Wolfeyes, Engenharia, Lda, na proporção do respetivo decaimento (Art. 527.º do C.P.C.).

7. Inconformada a 2ª R. apresentou recurso de revista, onde formula as seguintes conclusões (transcrição):

1ª O douto acórdão recorrido, baseou-se num relatório de avaliação “encomendado” e pago pelos Autores/Recorridos e impugnado pela Recorrente, que não pode ter o valor probatório que o douto acórdão recorrido lhe confere no sentido de constituir prova bastante para proceder à alteração da matéria de facto nos termos considerados pelo douto acórdão recorrido.

2ª Trata-se de um parecer técnico, que não tem a virtualidade de constituir prova bastante no sentido propugnado pelo douto acórdão recorrido, sendo que os pareceres representam apenas a opinião dos técnicos que os subscrevem.

3ª. O artigo 607.º, n.º 4, do CPC, determina que “Na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, (…); o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela    lei ou por regras experiência.” E o n.º 5 acrescenta: “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange  os   factos para    cuja   prova    a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes.”.

4ª. Ao contrário da prova pericial, a prova documental de que o douto acórdão se socorreu para alterar a matéria de facto provada, mais não constitui do que um parecer técnico, que não constitui prova documental, nem pericial, sequer, para o efeito pretendido pelo douto acórdão recorrido, dado que não foi emitido em diligência judicial, mas sim em acto extra judicial avulso. Ora, apenas com base no parecer técnico em questão, não é possível proceder à alteração da matéria de facto, como fez o tribunal recorrido, dado que o parecer técnico não constitui prova documental com força probatória plena,

5ª. Aliás, apesar de o técnico que elaborou o referido parecer técnico ter prestado depoimento em tribunal, tal depoimento, como é referido na douta sentença da 1ª instância, apresentou-se confuso, errático e não esclarecedor, pelo que, como se pode ler na referida douta sentença “… O Tribunal considerou como não provados os factos constantes do ponto 10 atenta a apreciação critica e conjunta do teor do depoimento prestado pela testemunha FF,…” que elaborou o dito relatório.

6ª. Ora, perante este depoimento, dúvidas não podem subsistir de que o referido parecer técnico mais não é do que uma opinião emitida sob “encomenda”, já que tal opinião foi contratada pelos Autores/Recorrentes, e, daí, a falta de valor probatório pleno de tal opinião.

7ª Refira-se, aliás, que, para além desta opinião técnica, encontra-se junto aos autos um relatório de avaliação perpetrado pelo banco (entidade isenta, que apenas considerava haver obra feita, se efectivamente a mesma estivesse realizada, já que tal acontecia por forma a desbloquear as verbas do empréstimo para a construção em apreço, sendo que tal relatório refere encontrar-se construído o equivalente a € 174.185,00 de obra relativamente ao orçamento total, o que constituiria uma percentagem de 76,40% da obra total.

8ª. Ora, o douto acórdão recorrido parte da data de assinatura do relatório de avaliação e respectivas fotografias, (que não se sabe quando foram tiradas), para aferir ser a percentagem de obra realizada nele mencionado, a correcta, mas sem razão, sendo que para chegar a tal solução, o douto acórdão recorrido dá como provados factos, a partir de presunções judiciais e ao fazê-lo, age de forma ilógica, incorrendo em erro sobre a substância do juízo.

9ª. Na verdade, o douto acórdão recorrido parte do facto de a obra conter trabalhos não orçamentados para concluir que o relatório do banco contém estes trabalhos a mais e, daí, considerar ter a obra uma percentagem de realização de trabalho de 76.40%, ou seja, nesta percentagem, estariam incluídos os trabalhos a mais e não aceites pelos autores, que, como tal, não podiam contar para o cômputo da obra já construída, e daí, com base nas fotografias do relatório junto pelos autores/recorridos, considerar estar construída, apenas, a percentagem de 53,80%.

10ª. O douto acórdão recorrido acaba, assim, por, através de presunções, computar os trabalhos a mais em 22,60% da obra feita (76,40%-53,80%), embora sem especificar em que consistiriam tais obras e se eram ou não descortináveis no relatório e fotografias de que se socorreu para alterar a matéria de facto considerada provada e não provada, pelo que nos encontramos perante presunções utilizadas pelo douto acórdão recorrido que violam regras elementares de lógica e firmam factos desconhecidos a partir de outros que não estão provados no processo “sub judice”.

11ª. O douto acórdão recorrido socorre-se de fotografias, para, através de uma análise perfunctória das mesmas, dizer o que está e não está construído, e concluir por percentagens de “items” da obra concluídos ou não concluídos, sem se socorrer de qualquer meio de prova idóneo para tanto, mas apenas por recurso a umas fotografias, que, presumiu terem sido tiradas no dia 04/01/2010-

12ª. Aliás, o douto acórdão recorrido acaba por ser contraditório na fundamentação que aduz para chegar à conclusão a que chegou, pois refere que “…Não nos importa tanto a avaliação que aí foi feita da obra, … mais relevantes que estas conclusões, são as fotografias da obra, constantes do relatório de fls 274 a 276, …” para depois chegar à conclusão, como faz o dito relatório de avaliação, de que apenas estavam construídos 53,8% da obra, como refere o dito relatório.

13ª. Por outro lado, o douto acórdão recorrido refere que as fotografias ”… retratariam o estado da construção da moradia em janeiro de 2010 e que nós não vemos motivo algum para as deixar de ter como meio de prova fidedigno sobre o estado da obra deixado pela empreiteira à data da suspensão da construção, …”, discorrendo sobre os trabalhos efectuados e não efectuados, os montantes gastos e os montantes não gastos, tudo com base em meras presunções, sem qualquer rigor técnico, que se impunha, para concluir, erroneamente, que “ Em janeiro de 2010, do valor constante do “resumo do orçamento” de fls 107, relativo aos trabalhos a realizar pela “Wolfeyes – Engenharia, Lda.” para construção da moradia dos Autores, estavam apenas executados 53,8%».

14ª. Ora, atento o raciocínio exposto pelo douto acórdão recorrido, os valores a que chegou relativamente a obra feita e obra não feita, demandam conhecimentos especiais, (designadamente, se a obra feita tinha materiais incluídos e não visíveis a olho nu nas fotografias, não sendo possível apurar com o mínimo de rigor e sem prova pericial válida, a dimensão verdadeira da construção efectuada e do valor nela incorporado), sendo que a alteração da factualidade provada baseou-se em presunções, e tanto podiam ser uns valores, como outros, já que não se estribaram em nenhum meio de prova suficiente e idóneo para chegar a tal conclusão, tendo tais valores sido encontrados “a olho”, pelo que dúvidas não podem existir de que o douto acórdão recorrido violou, pelo menos, o disposto no artigo 662º do CPC, tendo incorrido, igualmente, em erro de valoração da prova documental, que não tem força probatória suficiente para a conclusão a que o douto acórdão recorrido chegou.

15ª. Como refere o douto acórdão do STJ, de 21/01/2021, proc.º n.º 844/18.7T8BNV.E1.S1, disponível em wwwdgsi.pt, o STJ pode sindicar a decisão da matéria de facto se for invocada uma violação das regras substantivas de direito probatório (artigo 674º, n.º 3, 2ª parte do CPC), como pode, também, apreciar a suficiência ou insuficiência da matéria facto provada e não provada em ordem a constituir base suficiente para a decisão de direito, bem como, aferir da existência de contradições na matéria de facto que inviabilizem a decisão jurídica do pleito (cfr. Art.º 682º, n.º 3, do CPC). Os poderes do STJ nesta matéria abarcam, ainda, o controlo da aplicação da lei adjectiva em qualquer das dimensões destinadas à fixação da matéria de facto provada e não provada (cfr. Artigo 674, nº 1, alínea b) do CPC).

16ª. O raciocínio silogístico do douto acórdão recorrido, para além de se ater a meios de prova inidóneos e insuficientes para a prova a produzir, acabou por dar como provados factos a partir de presunções judiciais, e, ao fazê-lo, agiu de forma ilógica e temerária, incorrendo em erro sobre a substância do juízo, pelo que violou os artigos 607º, 662º, 674º, 682º do CPC, e, ainda os artigos 342º, 349º e seguintes do C. Civil.

17ª. Por outro lado, o douto acórdão recorrido condenou a Recorrente no pagamento de juros de mora desde a citação até integral pagamento, mas sem razão.

18ª. Na verdade, perante a desistência do dono da obra à empreitada, a restituição por enriquecimento sem causa é o único meio que lhe resta de se ressarcir pelo empobrecimento resultante de haver pago, por conta do preço, quantias superiores às afinal devidas, já que a resolução do contrato e a redução do preço estão excluídas, por pressuporem que previamente se proporcione ao empreiteiro a eliminação dos defeitos.

19ª. O dono da obra que haja desistido da empreitada e pago, por conta do preço desta, mais do que aquilo que pelo art. 1229º CC era devido não tem outro meio ao seu alcance senão o de pedir a restituição daquilo que pagou a mais, dentro dos limites do enriquecimento sem causa, pois se tivesse algum cabimento a ideia de que, num primeiro momento, a existência dos meios dos arts. 1221º CC a 1225º CC afastava o direito à restituição por enriquecimento injustificado, teria sempre de se admitir que este direito surgiria quando, pelo acto da desistência, se extinguisse a possibilidade de recorrer a esses outros meios.

20ª. Deste modo, o douto acórdão recorrido violou os artigos 474º, 804º, 805º, 1221º a 1225º e 1229º, todos do C. Civil, já que como alegado, não são devidos quaisquer juros de mora.

21ª. Finalmente, deve referir-se que a interpretação conferida ao artigo 662º, n,º 1 do CPC, pelo douto acórdão recorrido, no sentido de conferir valor probatório pleno a um documento meramente particular e de valor probatório duvidoso, concluindo que o mesmo tinha a virtualidade de alterar a matéria de facto, é inconstitucional, por violação do artigo 20º, n.ºs 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa, pois atenta contra o princípio do direito a um processo equitativo e a obter a tutela jurisdicional efectiva.

Nestes termos e nos mais de direito, com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser considerado procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido, na parte em que condena a Recorrente, e substituí-lo por outro que absolva a Recorrente de todos os pedidos, com o que se fará a costumada e inteira JUSTIÇA!

8. Foram apresentadas contra-alegações, onde se conclui (transcrição):

i) O presente recurso de revista não deve proceder, por salvo o devido respeito, que é muito, contender com o juízo fáctico formulado pelo Tribunal da Relação ... no âmbito da decisão da matéria de facto impugnada pelos recorridos e deduzida no recurso de apelação.

ii) Dispõe o n.º 3, do art.º 674º do C.P.C., que: “O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista (...)” ex vi art.º 682º n.ºs 1 e 2 do C.P.C.

iii) In casu – salvo melhor opinião - está vedado ao Supremo Tribunal de Justiça pronúncia sobre o objeto do recurso da recorrente que se reporta aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido.

Sem conceder e, por dever de patrocínio, sempre se dirá:

iv) Os Recorridos invocam a seu favor os doutos fundamentos aduzidos no Douto Acórdão recorrido;

v) O Douto Acórdão recorrido analisou exaustivamente cada um dos argumentos invocados pelos recorridos para discordar, em parte, da Sentença da 1ª Instância;

vi) A recorrente, ao invés de indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, acaba por referir que “Ao contrário da prova pericial, a prova documental de que o douto acórdão se socorreu para alterar a matéria de facto provada mais não constitui do que um parecer técnico, que não constitui prova documental, nem pericial”.

vii) No entanto, o princípio da imediação  da prova foi escrupulosamente respeitado no que tange à decisão que entendeu por bem alterar o ponto 10 dos factos não provados na sentença da Primeira Instância, tendo aditado a alínea III aos factos assentes, com a seguinte redação:

“III – Em janeiro de 2010, do valor constante do “resumo do orçamento” de fls. 107, relativa aos trabalhos a realizar pela “Wolfeyes, Engenharia, Lda.” para construção da moradia dos Autores, estavam executados 53,8%”;

viii)      Nesse sentido o douto acórdão recorrido explicitou no ponto 2.4, a análise que fez ante si da prova produzida para concluir do modo como concluiu;

ix) A recorrente não merece qualquer proteção porque, não obstante os recorridos se terem conformado com a parte do acórdão recorrido que julgou improcedente o recurso por eles intentado relativamente aos pontos 1, 8, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e dos factos alegadamente omissos, da Sentença proferida na Primeira Instância, a verdade é que a recorrente – que tanto se lamenta – para além de dar corpo a uma falácia – surgimento de um poço - e abandonar a construção da moradia dos recorridos, ainda assim, se locupletou com o excesso de pagamento;

x) Porém, a recorrente insiste no estafado argumento, de que não abandonou a obra, todavia, confinando a questão simplesmente às consequências emergentes da desistência do dono da obra da empreitada e nesse sentido, descredibiliza o relatório pedido pelos recorridos à empresa G..., como se se tratasse de um mero documento particular inócuo e sem qualquer sentido;

xi) Argumentação que não tem qualquer consistência, face às responsabilidades assumidas pelo perito avaliador Eng. FF registado na CMVM com o n.º ...1, inscrito na APAE – Associação Portuguesa dos Avaliadores de Engenharia com o n.º 779 e na Ordem dos Avaliadores com o n.º 0201- descreve precisamente que, a avaliação – parecer técnico -reporta à data de 4 de janeiro de 2010 e que a visita ao imóvel foi efetuada no dia 29 de dezembro de 2009 (cf. 01`41”), e que o cliente queria saber o estado atual da evolução das obras (cf. 01`42”), explicitou ainda que a avaliação foi calculada com base nas tabelas da altura, que atribuía percentagens a determinados parâmetros da construção para chegar à conclusão, de uma percentagem global do estado das obras à data da avaliação (cf.01`43” e 01`47”):

xii)  Esclareceu o Eng. FF que no dia em que foi à obra, encontravam-se concluídos os pilares, vigas, paredes e alvenarias interiores correspondentes a 53,8% da percentagem da obra (cf. 01`45” até 01`46”);

xiii)   Daí que, não colhe a argumentação aduzida pela recorrente no ponto 14º das conclusões, que pretende descredibilizar as fotografias que são parte integrante do relatório pericial, esquecendo ou não, que não se trata de um mero documento particular, mas de um documento elaborado por Técnico credenciado pela CMVM, que obrigatoriamente se rege, segundo os parâmetros do Dec. Lei n.º 294/95, de 17 de novembro que define as regras técnicas sobre os avaliadores e respetivos critérios de avaliação;

xiv)  Atente-se ainda, na recusa do representante da recorrente DD em entregar o Livro de Obra aos recorridos, logo, resultaria da análise do Livro de Obra, a prova provada do vertido no relatório elaborado pelo Eng. FF;

xv)Basta atentar na parte da transcrição do depoimento de parte do representante da recorrente DD a esse propósito, no que é referido desde 00`22” a 00`27” da segunda parte da continuação de julgamento em 30.01.2020:

•         Sra. Juiz: A inexistência do livro de obra trouxe prejuízos e problemas, sabe disso?

•     DD: Sim, acredito que sim, por causa do processo camarário;

•      DD: Não me recordo porquê, porque é que não se entregou o livro de obra na altura;

• Advogada: Tem conhecimento que a obra tinha que continuar? E sem esse livro surgiram problemas;

•       DD: Sim. Sim. Acabei de dizer há bocado que sim.”;

xvi)  Por último, na 18ª conclusão, a recorrente volta a insistir também no estafado argumento, de que não abandonou a obra, confinando a questão simplesmente às consequências emergentes da desistência do dono da obra da empreitada;

xvii) Certo é que, a recorrente parece “esquecer” que não possuía alvará de construção, sendo a ré sociedade “M. S. Valente – Construções Unipessoal Lda, Lda.” - facto que foi do desconhecimento dos recorridos, até os serviços afetos à Câmara Municipal ... os informar – a detentora do alvará de construção;

xviii) Consequentemente, não sendo a recorrente detentora de alvará de construção, é bom de ver, que nunca poderia concluir a construção da moradia, uma vez que, veio a revelar-se não ser a recorrente detentora de qualquer classe de habilitação constantes nos alvarás das empresas da construção emitida pelo Instituto da Construção e do Imobiliário, I.P. (InCI, I.P.) entidade reguladora do sector da construção e do imobiliário;

xix)   Por   esse    facto,   a recorrente encontrava-se legalmente impossibilitada de dar continuidade aos trabalhos de construção da moradia que se encontravam por concluir;

xx) Ora, tendo em conta o valor de construção da moradia, orçamentada em 228.000€ + IVA, sendo para tal necessário a recorrente dispor de uma classe de habilitação 2, classe de alvará necessária para construir moradias com valores previstos de construção superiores a 160.000€, à data, conforme Portaria n.º 6/2008 de 2 de Janeiro;

xxi)  Porém, os recorridos só tiveram conhecimento dessa impossibilidade objetiva, através da Câmara Municipal ... que os informou que o alvará entregue para a realização da sua moradia correspondia à sociedade “M. S. Valente – Construções Unipessoal Lda.” de cuja existência desconheciam – cf, sobredito na alínea xiv) nunca tiveram acesso ao Livro de Obra - e com a qual não detinham, qualquer relação contratual, não podendo incorrer contra o que se encontra estabelecido no nº. 1 do art. 27º do Decreto-Lei n.º 12/2004, de 9 de Janeiro, após haverem obtido conhecimento;

xxii) De todo o modo, a fim de ser possível concluir a construção da moradia, nos termos do artigo 88.º do Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro - em vigor à data – foi pelos recorridos requerido a concessão de licença especial para a conclusão das obras inacabadas.

Termos em que, sempre com o douto suprimento de Vossa Excelências, se espera ver      negado provimento ao recurso interposto;

Para tanto, deve o Douto Acórdão recorrido ser mantido nos seus precisos termos, em virtude deste ter feito uma correta análise da questão, na parte que concerne ao excesso de pagamento em relação à obra executada pela recorrente.

V. Exªs, Venerandos Conselheiros, Decidindo, Farão JUSTIÇA...!

II. FUNDAMENTAÇÃO

DE FACTO

9. O tribunal julgou por provada a seguinte factualidade (com alterações introduzidas pelo TR a negrito):

A - Os A.A. são donos e legítimos proprietários de um lote de terreno destinado à construção sito na Quinta da ... em ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...20 e inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo ...9º.

B - Munidos do respetivo projeto de construção e pretendendo edificar uma moradia no referido lote de terreno, os A.A., desconhecendo o meio da construção civil, procuraram junto de amigos quem lhes indicasse uma ou várias pessoas/empresas habilitadas para construir a dita moradia.

C - Em 15 de Julho de 2007, veio o R. CC, apresentar aos requerentes uma proposta da empresa T... Lda., da qual é, entre outros, sócio-gerente, para construção da moradia, tipo “chave na mão”, pelo valor de €233.254,00 (duzentos e trinta e três mil, duzentos e cinquenta e quatro euros) acrescido de IVA à taxa em vigor.

D - Após discussão de materiais e condições, o R. CC, veio a apresentar uma outra proposta com o valor total de €228.000,00 (duzentos e vinte e oito mil euros), acrescido de IVA à taxa em vigor.

E – A.A. e R. Wolfeyes – Engenharia Lda. acordaram verbalmente que a esta R. procedia à construção da moradia no terreno constante da alínea A) dos factos admitidos por acordo.

F - Em 19 de Maio de 2008 o R. CC levantou a licença de construção junto da Câmara Municipal ..., a que corresponde o Alvará de Obras de Autorização nº ..., e que foi paga pelo R. CC.

G - O A. preencheu, assinou e entregou ao R. CC o cheque nº ...69, datado de 10 de maio de 2008, no valor de €3.600,00, que este recebeu.

H – O A. ou a A. preencheu, assinou e entregou os seguintes cheques:

a) Cheque nº Cheque nº ...61, datado de 16 de novembro de 2007, no valor de €6.000,00;

b) Cheque nº ...77, datado de 04 de agosto de 2008, no valor de €20.000,00;

c) Cheque nº ...78, datado de 17 de setembro de 2008, no valor de €20.000,00, emitido à ordem de “CC”.

d) Cheque nº ...81, datado de 06 de outubro de 2008, no valor de €15.000,00, emitido à ordem de “CC”, quantia que foi por este recebida;

e) Cheque nº ...87, datado de 31 de outubro de 2008, no valor de €47.120,00 emitido à ordem de W…Lda.;

f) Cheque nº ...89, datado de 29 de novembro de 2008, no valor de €15.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.;

g) Cheque nº ...92, datado de 13 de dezembro de 2008, no valor de €5.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.;

h) Cheque nº ...94, datado de 19 de dezembro de 2008, no valor de €30.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.;

i) Cheque nº ...96, datado de 22 de janeiro de 2009, no valor de €10.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.;

j) Cheque nº ...97, datado de 08 de março de 2009, no valor de €5.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.;

k) Cheque nº ...00, datado de 30 de março de 2009, no valor de €5.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.;

l) Em 18 de setembro de 2007 a quantia de €6.000,00, conforme documento junto a folhas 134 e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais e do qual consta a aposição da seguinte menção “Recebi DD”;

m) Cheque nº ...06, datado de 10 de agosto de 2009, no valor de €2.000,00, emitido à ordem de Wolfeyes – Engenharia, Lda.

I – Do documento junto a folhas 28, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta que o A., no dia 28 de Abril de 2009, transferiu a quantia de €5.000,00 da sua conta bancária para a conta nº 0046-03..., sendo titular desta a R. Wolfeyes – Engenharia, Lda. e do documento junto a folhas 135, cujo teor também se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, que foi ainda efetuada, em 09 de Julho de 2009, uma transferência bancária para a R. Wolfeyes – Engenharia, Lda no montante de €4.320,00.

J – A R. Wolfeyes – Engenharia, Lda. veio a emitir a favor da A. as seguintes faturas/recibos:

- fatura/recibo nº ...-1 em 31 de outubro de 2008, referente a adjudicação de 10% da empreitada contratada no valor de €17.000,00, acrescido de €3.400,00 de IVA à taxa de 20%, num total de €20.400,00;

- fatura/recibo nº ...-2 em 31 de outubro de 2008, referente a medição dos trabalhos realizados no mês de Outubro no valor de €24.740,74, com a dedução de 10% adiantamento no valor de €2.474,07, acrescido de €4.453,33 de IVA à taxa de 20%, num total de €26.720,00;

- fatura/recibo nº ...-3 em 28 de novembro de 2008, referente a medição dos trabalhos realizados no mês de novembro no valor de €13.888,89, com a dedução de 10% adiantamento no valor de €1.388,89, acrescido de €2.500,00 de IVA à taxa de 20%, num total de €15.000,00;

- fatura/recibo nº ...-4 em 15 de dezembro de 2008, referente a medição dos trabalhos realizados nesta data no valor de €32.407,41, com a dedução de 10% adiantamento no valor de €3.240,74, acrescido de €5.833,33 de IVA à taxa de 20%, num total de €35.000,00;

- fatura/recibo nº ...-5 em 28 de maio de 2009, referente a medição ao pró-rata de acordo com o contrato referente aos meses de janeiro, fevereiro e março no valor de €25.925,00, com a dedução de 10% adiantamento no valor de €2.593,00, acrescido de €4.666,40 de IVA à taxa de 20%, num total de €27.998,40;

- fatura/recibo nº ...-6 em 09 de junho de 2009, referente a medição ao pró-rata de acordo com o contrato referente ao mês de abril no valor de €40.000,00, com a dedução de 10% adiantamento no valor de €4.000,00, acrescido de €7.200,00 de IVA à taxa de 20%, num total de €43.200,00;

- fatura nº ...-7 em 09 de Junho de 2009, referente a medição ao pró-rata de acordo com o contrato referente ao mês de Maio no valor de €24.000,00, com a dedução de 10% adiantamento no valor de €2.400,00, acrescido de €4.320,00 de IVA à taxa de 20%, num total de €25.920,00.

L - Em 14 de Abril de 2009, vieram os A.A. a ser alertados pela EDP para o facto de que a licença de construção iria caducar a 12-05-2009, a qual deveria ser prorrogada de forma a não interromper o fornecimento de energia elétrica.

M – Os A.A. requereram a prorrogação da licença de construção junto da Câmara Municipal ..., pelo período de 6 meses.

N - Do documento junto a folhas 151 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta:

“De: CC [t...@netvisão.pt] Enviado: quarta-feira, 18 de Fevereiro de 2009 18:55 Para: `BB´

Assunto: Inspeção da C.M. ... Importância: Alta

Dra. BB,

Boa tarde,

Ontem fomos visitados pela Câmara Municipal ....

Esta deslocação teve como motivo uma queixa apresentada por um proprietário que tem uma quinta a jusante do seu terreno.

A fundamentação da queixa prendia-se com a perspetiva de que havíamos atulhado um poço.

Desconhecíamos tal existência.

Realmente, quando visitámos a cave, ontem, confirmei tal facto. Existe um poço na cave. Este poço faz parte de um sistema de condutas de água que, vulgo minas, canalizam as mesmas de pontos mais elevados, até às diversas quintas existentes na zona.

Tal não consta em nenhum dos projetos em meu poder. Este sistema é centenário.

A Câmara verificou que não existe nenhum atulhamento que tenha sido motivado por nós.

É necessário que nos encontremos para discutir este assunto. Tanto quanto possível, é a minha perspetiva, dever-se-á procurar resolver o problema existentes sem que a solução chegue ao .... A suceder corremos o risco de ser bloqueada a construção da vivenda.

Sobre a inspeção efetuada à vivenda foi aceite o trabalho aí desenvolvido, sem nenhuma anotação específica.

Com os meus estimados cumprimentos, CC”.

O – Do documento junto a folhas 152 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta:

“De: CC [t...@netvisão.pt] Enviado: sexta-feira, 6 de março de 2009 07:54 Para: `BB´

Assunto: Poço na cave Importância: Alta

Dra. BB, Bom dia,

Ontem, verificou-se mais uma deslocação da Câmara Municipal ... à obra. Estiveram presentes dois Eng. da Câmara e o Eng.º FF, este último é o queixoso.

A conclusão de todos os presentes é de que não é da nossa responsabilidade toda e qualquer falta de água no sistema detetado.

O Eng.º responsável, da Câmara, aceitou que o poço seja adaptado para que seja utilizado, no local.

Quanto à forma como se deverá efetuar a consolidação do chão da cave e do poço ficou acordado:

a) executar uma placa em toda a extensão da cave e no exterior

b) criar um Trop plein que garanta, em caso de grande chegada de água pelas galerias, o escoamento para a rede de pluviais

Estou a terminar o projeto e o orçamento, pelo que seria conveniente que nos encontrássemos, se possível, no Domingo de manhã.

Com os meus estimados cumprimentos, CC”.

P - Em 10 de abril de 2009 o R. CC remeteu aos A.A. orçamento para a resolução do problema do poço ao nível da cave da vivenda, num valor total de €39.100,00 (trinta e nove mil e cem euros), acrescido de IVA à taxa legal em vigor, conforme documento junto a folhas 153 a 160 dos autos principais e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos efeitos legais, no qual refere ainda que os trabalhos referidos nas alíneas a), b), c) e d) já foram efetuados (cfr. folhas 160).

Q - Em 21 de Abril de 2009, o GG, técnico responsável da obra, entregou junto da Câmara Municipal ... a solução preconizada, por si e pelos R.R. CC e Wolfeyes – Engenharia, Lda.., conforme documento junto a folhas 161 e 162 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

R – Do documento junto aos autos a folhas 587, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta:

“() Reunião de hoje

BB@sapo.pt< BB@sapo.pt> Para:

DD@gmai.com>HH@im...business.pt

Cc: LL@ma...pt; T...@netvisao.pt

Sr. DD,

O sr. HH trabalha na área financeira e foi chamado como amigo a intervir.

Quando lhe falei da necessidade manifestada por vocês para ele estar presente na reunião ele solicitou a informação relativa aos assuntos em causa.

Assim envio-lhe o vosso anexo de detalhe de pagamentos e outra informação tida por conveniente, abaixo transcrita.

Em 15 de Julho de 2007 foi apresentada aos donos da obra, pela empresa T... e assinado pelo sr. CC, uma “proposta para execução de trabalhos de C. Civil na vivenda sito Quinta da ..., ... ...” no valor de 233.254,00€.

A construção da moradia tem vindo a ser realizada pela Wolfeyes, Engenharia, Lda., sob um contrato verbal, redigido no rascunho de 20 de junho de 2008, tendo em conta as cláusulas previstas no contrato anterior exceto a colocação de painéis solares e fixando o orçamento do valor da empreitada chave na mão em 228.000,00€, “devido ao aumento de tudo” como dito nesse mesmo contrato.

Até ao passado dia 28 de abril de 2009 o Banco Santander – Totta, acompanhado pelo empreiteiro geral, avaliaram a obra em 174.185,01€, tendo até à mesma data sido entregue ao empreiteiro geral e ao sr. CC o valor de 183.120,00€.

Os valores à data de 16 de maio enviados em folha Excel pelo sr. CC referiam que foram faturados em quatro faturas...33,34€ mais IVA no valor de 16.186,66€, totalizando 97.120,00€. Logo ao valor entregue falta faturar 86.000,00€, sendo que num acordo verbal ficou combinado que não estaria sujeito a ...000,00€ do valor da obra. Na verdade, faltam faturar 28.000,00€ e pagar até conclusão da obra 78.880,00€.

Relativamente ao ponto de execução da obra nesse mesmo documento estava descriminado em sete capítulos num total de 173.199,99€.

Com os melhores cumprimentos AA”.

S) Do documento junto a ... dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta:

“BB

De: DD [DD@gmail.com] Enviado: domingo, 28 de junho de 2009 11:14 Para: BB

Cc: LL@ma...pt; HH@im...business,pt; CC

Assunto: ponto da situação Bom dia Dra BB

Infelizmente, problemas pessoais têm-me impedido de vos responder com a brevidade desejada.

Na Wolfeyes continuamos a acreditar que é possível ultrapassarmos esta situação de impasse, desde que ambas as partes tenham vontade de a ultrapassar, e é com esse espirito que me dirijo a vós.

(…)

Existe um contrato verbal entre nós, que estabelece os deveres e obrigações de cada parte. Como sabe, nenhum de nós considerou necessário, nessa data, passá-lo a escrito. É com base nesse contrato que se têm regulado as nossas relações desde o primeiro dia – da nossa parte, executando o trabalho para que fomos contratados; da vossa efetuando os pagamentos de acordo com as condições estabelecidas, ou seja, através dos autos de medição mensais, os quais dão suporte às faturas que emitimos e que V.Exas foram liquidando. Para além disso, foram-nos solicitados trabalhos inicialmente não contemplados no contrato.

Surgiu, entretanto, o desacordo relativamente à quantidade de trabalhos executados, faturados e pagos. Entre as nossas (a receber, cerca de 23.000 euros) e as vossas contas (a receber, cerca de 12.000 euros) existe um diferencial, importante, que importa esclarecer, ao qual voltarei um pouco mais à frente.

Em consequência deste desacordo, vêm V.Exas. manifestar a intenção de se assinar um contrato de empreitada, prévio à execução de quaisquer outros trabalhos. Por nós não há qualquer objeção, desde que tal contrato contemple os direitos e deveres das partes, tal como ficou estabelecido no nosso contrato verbal. Não podemos aceitar as alterações que V.Exas. nos propuseram, porque as mesmas vêm desvirtuar, drasticamente, o que tinha ficado inicialmente acordado. De qualquer modo, podemos sempre voltar a discutir o assunto, ponto por ponto, assessorados pelos respetivos advogados, a fim de chegar a um articulado que seja aceite por ambas as partes.

O nosso propósito esteve sempre focalizado no cumprimento do que, de boa fé, negociámos. Não vamos abandonar a construção que nos foi adjudicada, não pretendemos fugir às nossas responsabilidades, nem deixaremos de exigir os nossos direitos – são princípios que se respeitam na Wolfeyes e que aqui reiteramos.

Quanto à razão de todo o nosso desiderato, os pagamentos, continuamos a divergir.

Existem acertos de contas por efetuar e não nos entendemos quanto à avaliação da obra realizada. Esta situação tem que ser ultrapassada e a proposta que apresentei, há mais de duas semanas, permite fazê-lo.

Recordando os aspetos principais da nossa proposta:

1. Pagamento imediato de 15.000 euros, para solver compromissos pendentes, planificar e arrancar com novos trabalhos na vossa obra,

2. O contrato é por preço global pelo que somente existe a necessidade de indicar, admito, como 29-06-2009 anexo os sobrecustos devidos a terem escolhido outros equipamentos diferentes dos que havíamos acordado – o IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado) será devidamente evidenciado em todos os documentos, para uma compreensão clara de todas as contas.

3. Discussão e aprovação, pela vossa parte, dos valores a pagar relativos aos trabalhos a mais.

4. Elaboração de contrato escrito, como é vosso desejo, com um clausulado que seja aceite por ambas as partes.

5. Os pagamentos referentes à evolução posterior da obra serão realizados no final de cada mês, após reunião e acordo entre as partes, tendo como base o valor libertado pelo Banco. O montante a pagar corresponderia à obra efetivamente realizada nesse mês.

6. No final da obra, será fácil constatar qual a diferença entre o total orçamentado (valor global da obra) e o valor total dos pagamentos que nos tenham sido feitos, para se fazer o acerto de contas final.

Como se verifica, as principais vantagens da nossa proposta, são:

Não precisamos de continuar a discutir quem tem ou não razão nas contas apresentadas.

Quando chegarmos ao final da obra, a diferença entre o valor orçamentado e o valor pago indica o valor do acerto de contas, sem mais discussões.

O valor que pagam, de imediato, é sensivelmente igual àquele que V. Exas. reconhecem como em divida.

Ficarão perfeitamente claros todos os custos envolvidos com a vossa obra – inicial e trabalhos a mais – bem como o IVA que incide sobre os mesmos.

Retoma-se de imediato o andamento normal dos trabalhos, cuja paragem não é benéfica para ninguém.

(…)

Cordiais cumprimentos DD”.

T - Por ofício datado de 22 de Junho de 2009 e recebido pelos A.A. em 01 de Julho de 2009, veio a Câmara Municipal ... deferir a prorrogação da licença de construção pelo período de seis meses, na condição dos A.A. apresentarem a apólice do seguro de acidentes de trabalho da empresa construtora e o original do alvará de autorização de construção e veio ainda a Câmara Municipal ... a remeter um parecer sobre a informação técnica resultante das visitas dos serviços de fiscalização à obra, apontando os vícios e as ações a tomar para repor a obra de acordo com o projeto por esta aprovado, tudo conforme documento junto a folhas 163 a 167 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

U – O constante da alínea T) foi comunicado pelos A.A. à R. sociedade Wolfeyes, Lda., por carta datada de 3 de Julho de 2009, solicitando que atuasse de acordo com as indicações do município.

V – A R. sociedade Wolfeyes – Engenharia, Lda. recebeu a carta a que alude a alínea U) dos factos admitidos por acordo.

X - Os A.A. requereram ao município uma prorrogação do prazo para a sua entrega, por carta datada de 28 de julho de 2009, tendo requerido nova prorrogação em 18 de setembro de 2009 pelo período de 12 meses.

Z – Por carta datada de 02 de outubro de 2009 a Câmara Municipal veio esclarecer que a prorrogação da licença estava dependente da entrega do recibo de pagamento referente ao seguro de acidentes de trabalho (conforme documento junto a folhas 191 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

AA – Na sequência do constante da alínea Z) os A.A. enviaram à R. sociedade W…Lda a Lda. uma nova carta junta a folhas 192 a 220 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, e a qual foi recebida pela R..

BB - No decurso do mês de junho de 2009, perante a inexistência da prorrogação do alvará de construção, a EDP procedeu ao corte do fornecimento da eletricidade.

CC – Por carta datada de 23 de dezembro de 2009, junta a folhas 222 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido para todos os efeitos legais, a R. sociedade Wolfeyes, Lda, comunicou à A. o seguinte:

“Exma. Senhora

Dra. BB

Rua..., ..., ... - ...

... Data: 23/12/2009

Assunto: Obra no ... da Quinta da ... Em ... – Proc. nº 1/2007

Exma Senhora Dra.,

Na sequência da receção da sua carta de 18/12/2009, cabe-me referir que o livro de obra se encontra na posse da Wolfeyes, Engenharia, Lda., como é adequado e correto acontecer.

Entretanto, atendendo à solicitação referida na carta “sub judice”, há que relembrar, uma vez mais, que V.Exa. está em divida para com a Wolfeyes em avultados montantes, além de que não houve autorização das Entidades competentes para a resolução da questão “galerias/poço”, e que se traduz na defesa relevante do património cultural, sendo que tal tem inviabilizado a continuação das obras, para já não falar da deriva do contrato inicialmente acordado, por parte de V.Exa.

Aliás, mesmo que fosse devida a entrega do livro de obra em apreço, tal nunca seria possível na data referida na carta de V. Exa, pois o legal e único representante da Wolfeyes encontra-se ausente no período Natalício e de Ano Novo, regressando, apenas, em Janeiro de 2010.

Com os melhores cumprimentos (…)”.

DD – Por carta datada de 26 de fevereiro de 2010, recebida pela R. Wolfeyes Lda., os A.A. comunicaram-lhe o seguinte:

“()

Assunto: Suprimento dos incumprimentos

Obra Quinta da ..., .... Senhores,

A “Wolfeyes Engenharia, Lda.” contratualizou o período de 8 meses como prazo de execução da empreitada destinada à construção da moradia sita na Quinta da ..., .... Tendo a referida empreitada iniciado em agosto de 2008, o prazo estabelecido para a sua execução já se encontra largamente ultrapassado, por razões unicamente a esta imputáveis.

Por outro lado, V.Exas. acordaram que em caso de atraso na realização da empreitada imputado a vós, seria paga a quantia de 5% do valor total da obra, por cada mês de atraso até um valor máximo de 15%, o que também ainda não ocorreu. Estando V.Exas. em divida para com os proprietários da obra, conforme decorre do estabelecido contratualmente com a “T..., Lda.” e que foi assumido integralmente por V.Exas.

Por despacho de 8 de junho de 2009, proferido pelo Vereador do Pelouro do Urbanismo da Câmara Municipal ..., foi deferido por seis meses o prazo de prorrogação da licença de construção, uma vez ultrapassados os 12 meses inicialmente concedidos. Apesar de solicitado por carta registada pelos proprietários da obra, V.Exas. não procederam à entrega de toda a documentação solicitada pela Autarquia, de modo à mesma proceder ao aditamento da licença de construção, pelo período de seis meses referidos.

Assim, V. Exas. não cumpriram de modo a possibilitar o normal decurso da obra, não possibilitando com esta conduta a normal execução da empreitada.

Tendo em conta que já foram cumpridos pelos proprietários da obra os pagamentos no valor de 195.440€ (cento e noventa e cinco mil e quatrocentos e quarenta euros) até ao dia 10 de agosto de 2009, tal montante seria suficiente para que 71,4% da empreitada estivesse realizada. Contudo, e conforme relatório de avaliação elaborado pela empresa G..., em 4 de janeiro de 2010, apenas se encontram executados 53,8% da obra em referência. Existindo um défice de obra por realizar de 17,6% em prejuízo dos proprietários da obra, a que corresponderá ao valor de 48.153,60€ (quarenta e oito mil e cento e cinquenta e três euros e sessenta cêntimos). Assim, constata-se que V.Exas. não cumpriram com o estabelecido contratualmente, encontrando-se numa situação muito confortável para a execução da obra até à percentagem do valor que vos foi entregue monetariamente. Pelo contrário V. Exas. deixaram de executar trabalhos na obra desde meados de agosto de 2009 e seguintes, conforme estabelecido contratualmente. Por não presença de trabalhadores na obra e por vedação da mesma, sem que permitissem até a entrada dos proprietários, uma vez que nunca foi entregue as chaves do cadeado substituído por V.Exas..

Os factos descritos estabelecem que estão e estiveram reunidas as condições monetárias, para que V. Exas realizem a percentagem de obra em falta, ou que os respetivos reembolsos ocorram no valor de 48.153,60€ (quarenta e oito mil e cento e cinquenta e três euros e sessenta cêntimos).

Os proprietários da obra continuam a aguardar a entrega dos recibos e da fatura que lhes são devidos, que apesar de terem sido solicitados por diversas vezes ainda não foram entregues por V.Exas.. Bem como, ainda aguardam a entrega das descrições das medições ao pró-rata relativos a todos os recibos/faturas pagos, que apesar de insistentemente solicitados a V.Exas., num claro incumprimento das instruções da Autarquia.

O livro de obra que é um objeto pertença dos proprietários da obra e que deve permanecer na obra, durante a execução da mesma, encontra-se na posse de V.Exas. em local desconhecido. Esta conduta revela-se um claro incumprimento do estabelecido legalmente e que pode lesar os proprietários da obra, perante a autarquia de ... e os serviços de inspeção da mesma. Por este facto aguarda-se a entrega do livro de obra aos seus devidos proprietários de modo a permitir aos mesmos a sua colocação no interior da obra em referência.

Os proprietários da obra aguardam a reposição das alterações e trabalhos realizados na cave pela iniciativa de V.Exas., sem autorização e sem adjudicação do orçamento apresentado, à posteriori, assim como sem deferimento do projeto apresentado e autorização de execução pelos serviços competentes da Câmara Municipal ....

Os proprietários da obra deparam-se com contínuas e intermináveis prorrogações de prazo unilaterais, para a conclusão da empreitada.

Por conseguinte, atenta factualidade supra descrita e perante o consecutivo incumprimento por V. Exas. das obrigações que contratual e legalmente lhes cabem, os proprietários da obra solicitam a V. Exas. a execução da percentagem da obra em falta e já paga ou a devolução do valor não executado, bem como a supressão dos restantes incumprimentos descritos, no prazo de 30 dias.

Após o terminus do referido período, perante a inexecução de obra, pagamento ou correção dos diferentes incumprimentos, recorrer-se-ão aos meios judiciais competentes, entendendo-se pois que estão esgotadas as possibilidades de entendimento extrajudicial com V.Exas.

Com os melhores cumprimentos. ..., 26 de Fevereiro de 2010

(…).” (conforme documento junto a folhas 224 a 226 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

EE - Por carta datada de 05 de abril de 2010, recebida pela R. sociedade Wolfeyes, Lda., os A.A. comunicaram-lhe o seguinte:

“(…)

Assunto: Obra Quinta da ..., ...

Atendendo à falta de resposta de Vossas Excelências à nossa carta de 26 de março de 2010, bem como às anteriores, vimos por este meio informar que somos forçados a avançar com a rescisão do contrato estabelecido com a T..., Lda., a Wolfeyes, Lda. e o Sr. CC.

Apesar das nossas diversas iniciativas para que fosse cumprido o contrato anteriormente firmado, existem diversos incumprimentos, cometidos por Vs. Exas., e que estão documentadas na troca de correspondência realizada, que impedem a sua continuidade, entre os quais salientamos os seguintes incumprimentos:

O não cumprimento dos prazos de realização da obra;

A não entrega do recibo comprovativo do pagamento do seguro de trabalho da empresa para a renovação do alvará de construção por seis meses, tendo o prazo já expirado;

A falta de entrega dos recibos e da fatura, bem como a não realização da descrição das medições ao pró-rata de todos os que foram entregues, conforme solicitado a Vs. Exas.;

A não correção dos pontos identificados pela autarquia na Análise e Informação Técnica sobre a inspeção e fiscalização efetuada em 26 de maio de 2009;

A não permanência do Livro de Obra na obra em referência, conforme estabelecido legalmente e retenção do mesmo na vossa posse;

O abandono da obra desde meados de agosto de 2009, sem informação aos proprietários da obra, nem justificação deste facto;

A obstrução deliberada do acesso dos proprietários da obra à sua propriedade privada, desde o final do mês de julho de 2009, por não entrega da cópia das chaves do cadeado do portão da obra;

A realização de trabalhos na cave, por iniciativa própria, sem autorização dos donos da obra ou da Câmara Municipal ... e a não reposição dos mesmos ao anterior estado;

O não pagamento da indemnização contratualmente prevista para o atraso na execução da empreitada, por motivos imputáveis a Vs. Exas.;

A não restituição do capital já pago pelos proprietários da obra respeitante a trabalhos não executados por Vs. Exas.;

A não detenção de título para o exercício da atividade, impossibilitando a realização e conclusão da obra.

Atendendo às injúrias e ameaças públicas efetuadas pelo Sr. CC aos proprietários da obra, consideram os mesmos, que foi igualmente violado o seu direito de personalidade, em especial do seu bom-nome.

Assim, e atento o incumprimento do contrato por Vs. Exas, devem, pois, retirar os vossos equipamentos de construção (andaimes e a betoneira) do local da obra indicando com uma antecedência de cinco dias úteis, um dia do período decorrido entre 19 a 23 de Abril de 2010, bem como a indicação do horário para a realização desta ação, não se responsabilizando os donos da obra pelo eventual desaparecimento ou conservação dos materiais referidos. A não indicação do dia e horário, por Vs. Exas., para a realização da ação acima indicada será entendido, pelos proprietários da obra, como abandono dos materiais referidos na sua propriedade privada.

Nestes termos, tendo ocorrido o terminus do prazo previsto em missiva datada de 26 de março de 2010, remetida pelos donos da obra a Vs. Exas., sem lhe ter sido dada resposta, perante a inexistência de execução de obra, pagamento e correção dos defeitos decorrentes dos diversos incumprimentos, recorrer-se-ão aos meios judiciais competentes, entendendo-se, pois, que estão esgotadas as possibilidades de entendimento extrajudicial com Vs. Exas.

Com os melhores cumprimentos. ..., 5 de abril de 2010

().” (conforme documento junto a folhas 230 a 231 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

FF - Em 11 de março de 2010, veio a Câmara Municipal ... notificar os A.A. quanto a diversas vicissitudes da sua obra e às medidas a adotar, tudo conforme documento junto a folhas 235 a 237 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

GG – Tendo ainda a Câmara Municipal informado os A.A. que a empresa responsável pela construção junto da Câmara é a M... Unipessoal Lda..

HH - Por carta datada de 12 de abril de 2010, junta a folhas 243 a 245 dos autos a R. sociedade Wolfeyes, Lda. comunicou aos A.A. o seguinte:

“(…)

Assunto: Quinta da ..., ... Exmos. Senhores,

Acusamos recebida a V. carta de 5 de abril de 2010, à qual respondemos:

1. Como V.Exas. bem sabem foram constituídos Mandatários para que fosse encontrada uma solução extrajudicial para as nossas diferenças

2. O V. Mandatário está em falta na resposta à última missiva do nosso Mandatário, Dr. II, datada do ano passado

3. Ao contrário de uma relação normal, V. Exas. têm vindo sucessivamente a procurar conduzir este assunto à revelia de uma normal e sã relação comercial

4. Não se coíbem de enviar documentação para a empresa e, também, para colaboradores desta a quem V. Exas. não têm o direito de o fazer

5. Como está definido na lei em geral, as comunicações e demais relações somente podem ocorrer entre as partes, neste caso, V. Exas. e a Sociedade por vós contratada

6. Sobre o alegado atraso na execução da empreitada V. Exas. ignoram, como de resto têm sido vezeiros, o documento que Vos enviámos em março de 2009 notificando a ocorrência de “motivo de força maior”, condição bastante e suficiente, como de resto está consignado na lei, para que o prazo de execução se suspenda

7. Relembramos que nesta data a cave estava alagada com mais de 40 cm de lâmina de água

8. A partir desta data e a pedido de V. Exas., cumulativamente com outros trabalhos que mandam executar, o que fizemos em boa fé, por considerarmos que estávamos perante pessoas sérias, efetuámos trabalhos de sondagem para se determinar a razão dessa anormal inundação

9. Refira-se que o Projeto aprovado pela Câmara Municipal ... não tem qualquer mecanismo de prevenção e de resolução desta anormalidade

10. Nessa época, também, surgiu uma mina de água na cave da V. vivenda 11. Este assunto foi supervisionado pela Câmara Municipal ...

12. Ocorre, dizer, que esta obra de arte pertence a um Sistema de Abastecimento de Água que integra um Monumento Nacional

13. Assim sendo, desde logo, ficou claro que o Projetista e a Douta Câmara teriam de proceder à avaliação e à retificação do Projeto

14. Mas, à cautela, sempre vos suscitamos o parecer de que a aprovação do Projeto tem de ser efetuado pelas seguintes entidades:

a) IPPAR – por relação putativa com o Monumento Nacional

b) ... – pois esta obra de arte pertence a um Sistema Quinhentista e, pese embora esteja em zona urbana, encontra-se manifestamente, no perímetro do ...

c) Direção dos Recursos Hídricos – atenta a Lei da Água, pois estamos perante uma linha de água

15. Assim sendo, cumulativamente, com o citado no ponto 6, desta carta, não existem condições de se retomar a atividade construtiva na V. obra

16. Mas, ainda, V.Exas. não podem continuar a ignorar as V. responsabilidades pois falta proceder aos pagamentos em divida para com esta Sociedade

17. Por último, não esquecer que estamos arredados do acesso aos nossos equipamentos e materiais na medida em que V.Exas. forçaram e violaram a entrada na Obra, o que sobre este assunto já foi expedida diversa comunicação em documentos anteriormente enviados para Vós e pelo nosso Mandatário para o Vosso

Aguardando que V.Exas se dignem rever a V. posição, encontrando-se uma forma negociada de solvermos estes diferendos, subscrevemo-nos com cordialidade.

(…)”.

II - O Técnico Responsável pela Direção da Obra, o Engenheiro GG, em 15 de abril de 2010 elaborou o “Relatório Sintetizado de Acompanhamento Técnico de Direção de Obra” junto a folhas 246 a 248 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

JJ – Por carta datada de 18 de agosto de 2010, junta a folhas 250 a 251 dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, que foi recebida pela R. sociedade Wolfeyes, Lda., os A.A. comunicaram-lhe que:

“(…)

Assunto: Obra Quinta da ..., ...

Exmos. Srs.:

Serve a presente para reiterar a rescisão do contrato firmado com V. Exas., facto que, ademais, foi expresso na V/última carta, datada de 12 de Abril de 2010, o que se transcreve:

“não existem condições de se retomar a atividade construtiva na V. obra.” Nesta esteira, reiteramos igualmente o que havíamos escrito na carta de rescisão de contrato.

“devem Vs. Exas. retirar os vossos equipamentos (andaimes e betoneira) da nossa propriedade privada”.

Informa-se, inclusive, que o V/empregado, Encarregado Geral, Sr. JJ, já reivindicou, perante várias pessoas, que algum daquele material lhe pertence. Assim, devem Vs. Exas. indicar com uma antecedência de cinco dias úteis, o horário e um dia do período de 06 a 10 de Setembro de 2010 para retirarem esse material, sob pena de o considerarmos abandonado e termos que contactar terceiros para o retirar, imputando-lhes posteriormente os custos dessa remoção a Vs. Exas.

Relembra-se que os proprietários da obra não se responsabilizam pelo eventual desaparecimento ou conservação dos materiais referidos.

Acrescentamos ainda que os atos de difamação aos proprietários da obra em que V. Exas insistem através do envio de cartas para a Câmara Municipal ..., acusando-os de dívidas em “avultadas quantias”, são totalmente inaceitáveis e de manifesta má fé, uma vez que V.Exas. têm plena consciência da falsidade de tais acusações. Tanto assim é, que V. Exas nunca fundamentam essas ditas dívidas com valores discriminados ou com documentação, sendo do vosso total conhecimento que foram realizados pagamentos para os quais não existem faturas nem recibos.

(…)”.

LL - Por carta datada de 26 de setembro de 2010, junta a folhas 255 a 257 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzida, a R. sociedade Wolfeyes, Lda. comunicou aos A.A. o seguinte:

“(…)

Assunto: Quinta..., ...3.1/1/07

Caro Sr. AA,

Acusamos recebida a sua carta de 18/08/2010, a qual somente foi lida ontem, dia 25/09/2010, devido a ausência do escritório.

Desde logo espanta-nos a sua missiva, senão atendamos:

1) Há muito tempo que V.Exas. mandataram um Advogado para tratar connosco;

2) Diversas reuniões foram efetuadas, entre os nossos Advogados, contando igualmente com a presença simultânea de ambos os contentores, devido à nossa tentativa e boa vontade de sanearmos os nossos diferendos sem necessidade de recorrermos aos meios judiciais;

3) Aliás, é o V. causídico que está em falta pois desde finais de 2009 que não responde ao nosso Advogado.

4) Assim, continua incompreensível o facto de V.Exas. não manterem um comportamento linear e, de forma inexplicável, se dirigirem a nós, diretamente, com exigências e, nalguns casos, a roçar mais do que isso.

Por outro lado, em relação à empreitada que formalizámos por contrato verbal, há a considerar:

1) O desenrolar dos trabalhos está parado devido ao facto de ter sido encontrado uma obra de arte que faz parte de Monumento Nacional;

2) Falámos do poço que se manifestou a sua existência quando a obra já estava no patamar de execução atual (com a escavação feita; com as placas todas erigidas, etc.).

Esta descoberta, a qual nunca poderíamos suspeitar da sua existência, na medida em que a mesma não está referenciada em nenhum documento contratual que V. Exas. nos forneceram, veio impedir a continuidade dos Trabalhos.

Dado tratar-se de uma Obra de Arte que está inclusa num Monumento Nacional (afigura-se-nos), é necessário que a Câmara Municipal ..., após completas as diligências legais, que têm de ser cumpridas, emita uma autorização específica para podermos retomar os trabalhos.

Em relação aos equipamentos e materiais que estão em obra, torna-se necessário:

1) Que o V. Advogado contacte o nosso tendo em vista uma marcação de data e hora certa para que, em presença do nosso Mandatário, procedermos à receção de todos os nossos bens de equipamento e materiais aí existentes à data da violação do cadeado;

2) Por outro lado, como já anteriormente foi descrito por nós, o que desde já considerarmos aqui reproduzidas essas missivas, o Sr. AA violou o cadeado que fechava a obra, pelo que desde essa data que fomos impedidos de aceder à obra;

3) Mais, sublinha-se, já termos reclamado a posse dos equipamentos e materiais que estavam depositados em obra, os quais passaram a ser da responsabilidade única e exclusiva de V. Exas.

Em relação aos comunicados à Câmara tal somente foi e é necessário, pois V.Exas tentaram que a citada edilidade Vos passasse um 2º Livro de Obra quando bem sabiam que ele estava na nossa posse e alegaram, para o efeito, que o mesmo se tinha extraviado.

()”.

MM - Da certidão permanente referente à sociedade T..., Lda. consta que em 11 de Abril de 2008 se encontrava pendente procedimento administrativo de dissolução, em 30 de Setembro de 2008 ocorreu a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade e em 30 de Setembro de 2008 foi cancelada a matrícula, o que era do conhecimento do R. CC.

NN – O R. CC sabia que a sociedade T..., Lda. não tinha licença para construir, porque esta sociedade não tinha procedido ao aumento do capital social de 50.000$00 para € 5.000,00.

OO - M... Unipessoal Lda, Lda. possuía desde 31 de Março de 2009 contrato de seguro de acidentes de trabalho – trabalhadores por conta de outrem – celebrado com a Companhia de Seguros Fidelidade – Mundial, Lda.

PP – Por carta datada de 18 de agosto de 2010, remetida em 21 de agosto de 2010 e recebida pela R., Wolfeyes, Lda, os A.A. comunicaram-lhe que retirasse todo o equipamento e deixassem o estaleiro limpo, conforme documento junto a folhas 296 a 299 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

QQ - Em 10 de novembro de 2010 a R. Wolfeyes, Lda, através do Sr. KK, retirou os materiais e equipamento da obra (conforme documento junto a folhas 303 a 305 dos autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais).

RR - O “Alvará de Licença Especial para Obras Inacabadas” foi emitido em 02 de fevereiro de 2011, conforme documento junto a folhas 306 dos autos principais e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.

SS - DD e EE são sócios da Wolfeyes, Lda, desempenhando DD as funções de gerente.

TT - A intervenção do R. CC quanto ao constante das alíneas C) e D) dos factos admitidos por acordo foi como sócio gerente da sociedade T..., Lda., o que era do conhecimento da Wolfeyes, Lda

UU - O cheque a que alude G) dos factos admitidos por acordo foi entregue ao R. CC para pagamento do levantamento da licença de construção.

VV- Os cheques a que alude a alínea H, subalíneas a) a d), dos factos admitidos por acordo, foram entregues ao R. CC, que posteriormente transferiu as respetivas quantias para a R. Wolfeyes,, Lda., para liquidação de faturas que por esta vieram a ser emitidas, relativas aos trabalhos acordados e devidos pelos A.A. (TR)

XX - A R. Wolfeyes, Lda. teve conhecimento do constante das alíneas N), O), P) e Q).

ZZ - Os trabalhos já efetuados constantes da alínea P), no valor de €12.800,00, foram realizados sem o conhecimento e consentimento dos A.A., tendo o pagamento sido reclamado pelo R. CC e R. Wolfeyes, Lda – Engenharia Lda. o seu pagamento.

AAA - Os A.A. recusaram o orçamento a que alude a alínea P).

BBB - O R. CC não recebeu as cartas a que aludem as alíneas U), AA), DD), EE), JJ) e PP).

CCC - A existência da mina/galeria obrigou a R. Wolfeyes, Lda. a interromper e a suspender as obras de construção da moradia dos A.A. e enquanto os A.A. não possuíssem autorização das entidades competentes, por referência à mina/galeria de águas, a obra não podia prosseguir.

DDD - Em 4 de agosto de 2008, a R. Wolfeyes, Lda, deu início aos trabalhos para execução da obra.

EEE - No início do mês de agosto de 2009 a R. Wolfeyes, Lda suspendeu a execução de trabalhos na obra.

FFF - E também no início do mês de agosto de 2009 verificaram os A.A. que a R. Wolfeyes, Lda, havia substituído o cadeado que se encontrava no portão de acesso ao lote, sem que tenha facultado qualquer chave aos A.A., ficando estes impedidos de aceder à sua própria propriedade.

GGG - Bem como foi impedido o acesso ao avaliador do Banco Santander Totta, o que impossibilitou a realização do auto de medição referente ao mês de agosto e setembro de 2009.

HHH – A R. Wolfeyes, Lda. foi constituída em 31 de janeiro de 2008. DOC 577.

III – Entre A.A. e R. Wolfeyes – Engenharia Lda. foi ainda verbalmente acordado que a construção a que alude a alínea E) acenderia ao valor de €228.000,00 (duzentos e vinte e oito mil euros), acrescido de IVA à taxa em vigor, e com as mesmas condições apresentadas pela sociedade T..., Lda.

JJJ – Em 27 de maio de 2009 os A.A. apresentaram junto da Câmara Municipal ... uma nova proposta de resolução da autoria do Engenheiro LL.

LLL – O livro de obra encontra-se desde a suspensão da execução das obras por parte da R. Wolfeyes, Lda. na posse do legal representante desta sociedade.

MMM – As obras realizadas pela R. Wolfeyes, Lda. sem o consentimento dos A.A. não foram removidas por aquela.

NNN – Os A.A. entre junho de 2010 e julho de 2011, em virtude da moradia não se encontrar concluída, arrendaram um apartamento em ..., com a renda mensal de €450,00, deixando parte dos bens móveis em residências de amigos.

OOO – Em virtude da obra não se encontrar concluída os A.A. tiveram ainda de pedir ao Banco Santander Totta, S.A. prorrogação de prazo de construção (cont. nº ...), o que implicou uma alteração das condições inicialmente contratadas em 01/07/2008.

PPP - Do teor do relatório pericial de psicologia efetuado pelo INML, junto a folhas 1281 a 1284 verso dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta:

“(…)

Segundo se apurou com a avaliação instrumental, mais concretamente da avaliação psicológica realizada, a examinada apresenta uma organização da personalidade estável, adaptada e sem evidência de psicopatologia ou de perturbação da personalidade, embora subsista a dúvida de que possa ter tentado transmitir uma imagem favorável sobre si mesma.

No que concerne à avaliação psicopatológica BB não se observa sintomatologia depressiva ou ansiosa.

Reuniram-se evidências de que os contactos com o empreiteiro (e as memórias relacionadas com esses contactos) têm um impacto emocional negativo embora a examinanda, pelo recurso a estratégias de evitamento, consiga minimizar de forma eficaz os efeitos dessas experiências mantendo um funcionamento adequado ao nível das atividades laborais, de lazer e dos relacionamentos (quer familiares quer sociais).

(.)”.

QQQ - Do relatório pericial final elaborado pelo INML, junto a folhas 1293 a 1295, e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, consta:

“() Discussão

1. Os elementos disponíveis permitem admitir a existência de nexo de causalidade entre o traumatismo psicológico resultante dos problemas no contrato de empreitada (com início do acompanhamento psicológico regular em 01.11.2009) e o dano psicológico temporário desenvolvido (com fim do acompanhamento psicológico regular em 27 .04.2016).

()

4. Não se considera a existência de danos permanentes, conforme subtraído da Perícia de Psicologia.

Conclusões

- A data da cura das lesões é fixável em 27.04.2016.

- Período de Défice Funcional Temporário Parcial sendo assim fixável num período de 2370 dias.

- Quantum doloris fixável no grau 4/7. ().”

RRR – A sociedade T..., Lda. em 11 de abril de 2008 tinha pendente procedimento administrativo de dissolução. Certidão folhas 289 e 290.

III` - Em janeiro de 2010, do valor constante do “resumo do orçamento” de fls 107, relativo aos trabalhos a realizar pela Wolfeyes, Lda.” para construção da moradia dos Autores, estavam apenas executados 53,8%. (TR, vem dos factos não provados ponto 10).

10. O Tribunal deu por não provados os seguintes factos (com alterações introduzidas pelo TR a negrito):

1 - A intervenção do R. CC quanto ao constante das alíneas C) e D) dos factos admitidos por acordo foi como construtor civil.

2 - Os A.A. pretendiam não pagar a totalidade do IVA que a R. Wolfeyes, Lda, Lda. teria de liquidar com a emissão das faturas.

3 - O constante da alínea UU) era do conhecimento da R. Wolfeyes, Lda

4 - O R. CC ao agir conforme descrito na alínea F) dos factos admitidos por acordo fê-lo enquanto “mediador” entre os A.A. e a R. Wolfeyes, Lda, o que era do conhecimento desta R..

5 - O R. CC acompanhou a obra/trabalhos de construção da moradia a pedido dos A.A..

6 - O R. CC acompanhou a obra/trabalhos de construção da moradia como responsável técnico da obra.

7 - O R. CC acompanhou a obra/trabalhos de construção da moradia como consultor técnico não remunerado da R. Wolfeyes, Lda.

8 – O R. CC dirigiu os trabalhos, dando ordens aos trabalhadores e aos subcontratados, contactando com os fornecedores e recebendo dos A.A. os valores resultantes dos autos de medição.

9 - A mina/galeria de água encontrada na construção dos A.A. é um poço de respiração do Aqueduto de Águas Livres que abastece os fontanários a jusante, tratando-se assim de uma Galeria associada aos Fontanários de Azeitão, os quais estão considerados como Monumento Nacional e abastece a Fonte de Aldeia Rica/Chafariz de Aldeia Rica que está catalogada pelo IGESPAR.

10 – (passou a provado, em III’) (TR)

11 - No início do mês de agosto de 2009 a R. Wolfeyes, Lda abandonou a obra, cessando os trabalhos, sem qualquer justificação ou aviso prévio.

12 - Os A.A. apenas souberam da existência da sociedade R. M..., Lda. em 11 de Março de 2010 quando foram notificados pela Câmara Municipal ... do teor do documento junto a folhas 235 a 237 dos autos e ao qual alude a alínea FF).

13 - Os R.R. CC e Wolfeyes, Lda, não entregaram qualquer documento aos A.A. ou tomaram qualquer das iniciativas de que tinham conhecimento e que foram propostas pelo município.

14 – Os R.R. CC e Wolfeyes, Lda não deram qualquer resposta aos A.A., bem como não entregaram o referido recibo de pagamento referente ao seguro de acidentes de trabalho, inviabilizando a prorrogação da licença de construção pelo período de seis meses, anteriormente requerida pelos A.A.;

15 - A R. Wolfeyes, Lda. e M... Unipessoal Lda – Const. Unipessoal, Lda. agiram de comum acordo, com o desconhecimento dos A.A. de modo a retirarem proveitos.

16 - Os A.A. pagaram ao Banco Santander Totta, S.A. desde abril de 2010 a fevereiro de 2011 a título de juros o montante de €3.850,00.

De Direito

11. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso e devendo limitar-se a conhecer das questões e não das razões ou fundamentos que àquelas subjazam, conforme previsto no direito adjetivo civil - arts. 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.

12. As questões do recurso são assim:

1 - Modo como TR procedeu à alteração da matéria de facto, nomeadamente se o relatório de avaliação/ parecer técnico, que sustentou a alteração é meio de prova com força probatória suficiente para sustentar a modificação operada (conclusão 1 a 16) e se o tribunal usou presunções judiciais ilógicas.

2 - Data a partir da qual a R. deve ser condenada no pagamento de juros de mora – citação ou outra - e se os juros de mora são efectivamente devidos – sustentando que não (conclusão 17 a 20);

3 - Inconstitucionalidade da interpretação dada ao art.º 662º, n.º 1 do CPC, , no sentido de conferir valor probatório pleno a um documento meramente particular e de valor probatório duvidoso, por violação do artigo 20º, n.ºs 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa, atentatória  do princípio do direito a um processo equitativo e da tutela jurisdicional efectiva (conclusão 21).

13. Iniciando a análise das questões suscitadas pelo recorrente com a análise da decisão relativa à alteração da matéria de facto operada pelo tribunal recorrido, cumpre recordar que a alteração envolvida na questão se prende com a introdução de um novo ponto nos factos provados, proveniente do factos não provados na 1ª instância, a saber o ponto III`, que diz - Em janeiro de 2010, do valor constante do “resumo do orçamento” de fls 107, relativo aos trabalhos a realizar pela Wolfeyes, Lda.” para construção da moradia dos Autores, estavam apenas executados 53,8%. (TR, vem dos factos não provados ponto 10).

13.1. O recorrente entende que este ponto III não podia ser dado como provado, nos termos e com a justificação dada pelo tribunal recorrido, porquanto:

a) os pareceres representam apenas a opinião dos técnicos que os subscrevem;

b) não tem a virtualidade de constituir prova bastante;

c) trata-se de um relatório de avaliação “encomendado” e pago pelos Autores/Recorridos e impugnado pela Recorrente;

d)  a prova documental de que o douto acórdão se socorreu para alterar a matéria de facto provada, mais não constitui do que um parecer técnico, que não constitui prova documental, nem pericial, sequer, para o efeito pretendido pelo douto acórdão recorrido, dado que não foi emitido em diligência judicial, mas sim em acto extra judicial avulso;

e) apenas com base no parecer técnico em questão, não é possível proceder à alteração da matéria de facto, como fez o tribunal recorrido, dado que o parecer técnico não constitui prova documental com força probatória plena;

f) perante o depoimento do autor do relatório de avaliação – depoimento que se apresentou confuso, errático e não esclarecedor – dúvidas não podem subsistir de que o referido parecer técnico mais não é do que uma opinião emitida sob “encomenda”;

g) encontra-se junto aos autos um relatório de avaliação perpetrado pelo banco (entidade isenta, que apenas considerava haver obra feita, se efectivamente a mesma estivesse realizada) que não foi considerado;

h) o tribunal dá como provados factos, a partir de presunções judiciais e ao fazê-lo, age de forma ilógica, incorrendo em erro sobre a substância do juízo;

i) o acórdão recorrido acaba, assim, por, através de presunções, computar os trabalhos a mais em 22,60% da obra feita (76,40%-53,80%), embora sem especificar em que consistiriam tais obras e se eram ou não descortináveis no relatório e fotografias de que se socorreu para alterar a matéria de facto considerada provada e não provada, pelo que nos encontramos perante presunções utilizadas pelo douto acórdão recorrido que violam regras elementares de lógica e firmam factos desconhecidos a partir de outros que não estão provados no processo “sub judice;

j) o acórdão recorrido socorre-se de fotografias, para, através de uma análise perfunctória das mesmas, dizer o que está e não está construído, e concluir por percentagens de “items” da obra concluídos ou não concluídos, sem se socorrer de qualquer meio de prova idóneo para tanto, mas apenas por recurso a umas fotografias, que, presumiu terem sido tiradas no dia 04/01/2010;

k) os valores a que o tribunal chegou relativamente a obra feita e obra não feita, demandam conhecimentos especiais, mas o tribunal não usou de meios para os obter, socorrendo-se de presunções judiciais;

l) nessas presunções o tribunal chegou a valores sido encontrados “a olho”.

13.2. Em contra-alegação os AA. responderam a esta questão dizendo, em síntese, que “O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista (...)” ex vi art.º 682º n.ºs 1 e 2 do C.P.C.”, pelo que o STJ não devia conhecer da questão suscitada.

13.3. O Tribunal recorrido analisou e decidiu o ponto com as seguintes considerações:

“2.2.2. Dos factos não provados no ponto 10.

Os Recorrentes põem de seguida em causa o julgamento do ponto 10 dos factos não provados, que no seu entender deveria passar a constar da matéria provada. Aí ficou dado por não provado que: «Na obra apenas foram construídos o equivalente a 53,8% da obra.»

O Tribunal julgou esse facto por não provado com base na seguinte fundamentação:

«O Tribunal considerou como não provados os factos constantes do ponto 10 atenta a apreciação critica e conjunta do teor do depoimento prestado pela testemunha FF, do teor do documento junto a folhas 259 a 277 dos autos e dos factos que integram a alínea R).

«Esta testemunha começou por prestar um depoimento muito genérico e superficial, não se recordando sobre quais as razões que levaram à sua contratação. Depois quando confrontado com o documento junto a folhas 259 a 277 dos autos confirmou ser da sua autoria e esclareceu que quando elaborou o relatório não considerou o valor da obra acordado entre o dono da obra e a construtora, bem como não considerou os valores pagos pelo dono da obra e nem sequer sabia qual o prazo de execução da obra. A testemunha disse ainda que o que fez foi apurar o valor da obra, ou seja, qual o valor futuro do projeto concluído (sem considerar, até porque não sabia, qual o valor da obra). Como a obra em causa não estava concluída o que fez foi visualizar o que estava construído e perante o que observou socorreu-se de umas tabelas que contêm vários parâmetros e assim concluiu que apenas estava executada 53,8% da obra.

«Este depoimento demonstrou-se pouco consistente e pouco esclarecedor para o Tribunal, porquanto o relatório não teve em consideração o valor acordado para a realização da obra e o valor pago. Ora era exatamente esta questão que importava apurar, ou seja, perante o valor da obra acordado e o pago, qual era o valor construído.

«Por outro lado, é de notar que a obra estava a ser acompanhada pelo engenheiro do banco que se deslocava à obra para verificar o estado da obra, pois, de acordo com os autos de medição realizados, que no caso presente seriam mensais, assim, o banco ia libertando o dinheiro.

«Dos factos constantes da alínea R) consta que a Autora no email que envia à Ré Wolfeyes, Lda diz que o engenheiro do Banco Santander Totta, S.A. no dia 28 de Abril de 2009 avaliaram a obra em €174.185,00, ou seja, se excluirmos o valor devido a título de IVA e apenas tomarmos em consideração o valor de €174.185,00, estaria executada 76,40% da obra. Repare-se que o orçamento entregue no banco previa a realização de uma obra no valor de €228.000,00 acrescido de IVA à taxa legal (o banco era alheio ao acordo de não pagamento de IVA sobre €58.000,00).

«Socorrendo-nos de uma regra de “três simples”, e não considerando o valor devido a título de IVA, se 100% da obra corresponderia a €228.000,00 então o valor de €174.185,00 correspondia a 76,40% da obra (por arredondamento: [(174.185,00 x 100): €228.000,00]).

«Estranha-se que não tenha sido junto ao processo qualquer auto de medição, o que poderia ter ocorrido, pois para tanto bastava que os Autores tivessem solicitado à respetiva entidade bancária a última avaliação realizada, o que não ocorreu.

«Tudo visto, não ficou o Tribunal convicto que na obra apenas foram construídos o equivalente a 53,8% da obra, pelo que se teve tal factualidade como não provada.» (sublinhados nossos).

Os Recorrentes consideram que o depoimento da testemunha FF foi suficientemente preciso, conforme transcrição que fizeram nas alegações de recurso (gravação da sessão de 27/11/2019 aos minutos 1h:29m:38s), sendo que o mesmo, em conjugação com o relatório por si elaborado, permite concluir que apenas 53,8% da obra foi construída. De igual modo, realçam do depoimento do Eng.º MM, que foi diretor de obra para concluir a moradia depois da “Wolfeyes,” dela ter saído, que admitiu que a casa estava só a 35% ou 40%. Finalmente, o Eng.º LL, também referiu que lhe foi dado conhecimento do relatório de fls 259 e ss e quando lhe pediram para dar uma ordem de grandeza sobre a percentagem de execução da obra pelos R.R. disse: «sei que existia uma grande diferença. Não sei dizer, efetivamente, a percentagem. Mas sei que havia uma grande diferença entre aquilo que estava pago e aquilo que ainda estava por fazer». Entendem assim os Recorrentes que deveria ser dado por provado que os A.A. pagaram €195.440,00, correspondente a 71,4% do valor total da obra, quando apenas foi construído o equivalente a 53,8% da obra, tal como constava do tema de prova 15.º.

O Recorrido CC, nas suas contra-alegações, contrapõe o acerto da decisão recorrida, tendo por referência a avaliação da obra pelo Engenheiro do Banco Santander Totta e pelo empreiteiro geral em 28 de abril de 2009, quando a mesma foi avaliada em €174.185,01, o que corresponderia a 76,40% da obra. No mesmo sentido contra-alegou a Recorrida “Wolfeyes,”.

Apreciando, efetivamente temos de reconhecer que na alínea R) dos factos provados consta reproduzido um email com a menção de autoria do A. “AA”, onde o mesmo diz: «até ao passado dia 28 de abril de 2009 o Banco Santander – Totta, acompanhado pelo empreiteiro geral, avaliaram a obra em 174.185,01€, tendo até à mesma data sido entregue ao empreiteiro geral e ao sr. CC o valor de 183.120,00€». Ainda assim, a dúvida que o Tribunal a quo colocou sobre o relatório de avaliação de fls 259 e ss., também se pode colocar sobre essa alegada avaliação feita pelo banco. Nós não sabemos se a avaliação bancária teve em conta o valor da obra tal como efetivamente orçamentada pelo empreiteiro geral, ou se valorou unicamente a globalidade dos materiais incluídos na edificação para efeitos de libertar o necessário financiamento bancário, que se presume estar garantido por hipoteca incidente sobre o imóvel e tendo por referência valor da construção efetivamente realizada. A tal acresce que também está provado que a R. “Wolfeyes” realizou trabalhos a mais, embora sem o consentimento ou conhecimento dos A.A. (cfr. alínea ZZ dos factos provados), sendo que estes se recusam pagar por terem recusado o orçamento que lhes foi apresentado (cfr. alínea AAA dos factos provados). Pelo que, não será de excluir, portanto, que haja obra feita, para além do orçamentado, que aumenta o valor da construção, com relevância para efeitos da avaliação bancária, mas que não está diretamente relacionada com o orçamento inicial acordado entre os donos da obra e o empreiteiro.

Apesar do exposto, existem elementos de prova nos autos que nos permitem tirar algumas conclusões seguras sobre esta matéria.

Assim, nós sabemos que os trabalhos foram suspensos pela “Wolfeyes” em agosto de 2009 (facto provado EEE) e que o banco foi impedido de fazer a mediação da obra referente a agosto e setembro de 2009 (facto provado GGG). Por outro lado, de acordo com a própria versão dos R.R., que prestaram declarações em audiência final, apesar de não ter sido assinado o contrato de empreitada acordado entre os A.A. e o empreiteiro, o orçamento que foi adjudicado pelos A.A. é o que consta de fls 107 e ss., no valor de €228.000,00, mais I.V.A., o que corresponde no essencial ao que foi dado por provado na alínea III) dos factos provados. Acresce que, o contrato de empreitada foi rescindido pelos A.A. por carta de 5 de abril de 2010, conforme decorre da alínea EE) dos factos provados. Ora, o relatório de avaliação de fls 259 a 277, que acaba por ser o único elemento de prova fidedigno junto aos autos sobre esta matéria, mostra-se datado de 4 de janeiro de 2010 (cfr. fls 268) – antes, portanto, da rescisão do contrato de empreitada, mas posterior à suspensão dos trabalhos pela empreiteira “Wolfeyes” –, sendo que nele se faz menção a ter sido feita uma visita à obra em 29 de dezembro de 2009 (cfr. fls 261).

Efetivamente desse relatório consta a conclusão de que: «após visita ao imóvel e com base na estrutura de custos (em anexo), com o consequente tratamento de dados, concluímos que o estado de evolução atual da obra é de 53,80%» (cfr. fls 267). Para além disso consta uma tabela, onde se discriminam vários trabalhos e percentagens de execução (cfr. cit. doc. a fls 272). Não nos importa tanto a avaliação que aí foi feita da obra, porque temos de concordar com a sentença que o trabalho realizado pelo perito-avaliador não teve diretamente em consideração o orçamento apresentado pelos R.R. e adjudicado pelos A.A.. Mas, mais relevantes que estas conclusões, são as fotografias da obra, constantes do relatório de fls 274 a 276, que retratariam o estado da construção da moradia em janeiro de 2010 e que nós não vemos motivo algum para as deixar de ter como meio de prova fidedigno sobre o estado da obra deixado pela empreiteira à data da suspensão da construção.

Dessas fotografias resulta o adiantado estado da construção no que se refere à estrutura geral da moradia. As paredes exteriores e interiores estão concluídas, só com acabamento a cimento, havendo poucas paredes interiores onde ainda são visíveis os tijolos. O telhado está colocado e as pedras dos    parapeitos das janelas e soleiras das portas já estão no seu devido lugar, sendo certo que ainda não foram colocadas, nem janelas, nem portas. O chão das divisões ainda está a cimento e são visíveis algumas tubagens de eletricidade penduradas nas paredes.

Em face do exposto, há que comparar o estado de construção assim retratado nessas fotografias com o orçamento proposto pelos R.R., que no final foi o adjudicado pelos A.A. à construtora “Wolfeyes”.

Desse orçamento consta um resumo inicial, conforme se pode ver a fls 107. Daí resulta que o valor final orçamentado, de €228.000,00, corresponde à soma de 6 verbas, sendo elas:

1- €61.000,00 relativos a “Betão e tijolo”;

2- €50.000,00 relativos a “Reboco e Estuque”;

3- €44.000,00 relativos a “Especialidades”;

4- €30.000,00 relativos a “Telhado”;

5- €32.000,00 relativos a “Pintura e Ladrilhos”; e

6- €11.000,00 relativos a “Acabamentos finais”.

Ora, o que nós podemos concluir das fotografias juntas ao relatório de avaliação de fls 259 a 277, é que o “betão e o tijolo” e o “telhado” claramente que estão concluídos. O que equivale ao valor orçado de €91.000,00, correspondente à soma das verbas 1 e 4 (€61.000,00 + €30.000,00).

Quanto à verba 2, o “reboco” (barramento das paredes exteriores e interiores com cimento) está praticamente todo concluído, mas não foi colocado qualquer “estuque” nas paredes. Pelo que, apenas cerca de metade dos trabalhos correspondentes à verba 2, poderão ser contabilizados.

De igual modo, as especialidades previstas na verba 3 estão muito longe de ter sido feitas. Neste particular, há que ter em conta que as “especialidades” são descritas no anexo II, alínea C do orçamento, e elas compreendem a “eletricidade”, “águas e esgotos”, “drenagem de escorridos”, “telefones”, alumínios”, “portas”, “roupeiros”, “água do furo” e “sistema de segurança” (cfr. fls 110 a 111). Assim verificamos que existem algumas tubagens de fios de eletricidade pendentes nas paredes e admitimos que as tubagens dos esgotos já estivessem feitas no interior da construção, mas não está montado o sistema elétrico, nem de águas, não se evidencia a feitura de drenagem de escorridos, nem que tivessem sido instalados telefone, alumínios, portas, roupeiros, furo ou o sistema de segurança. Pelo que, só um valor muito exíguo dos €44.000,00 previstos na verba 3 poderá ser considerado feito pela empreiteira.

Quanto às “pinturas e ladrilhos”, previstos na verba 5, pura e simplesmente não existem. Logo, essa parte da obra estava claramente por fazer.

Finalmente, quanto aos “acabamentos finais” previsto na verba 6, como é evidente também não foram feitos, porque a moradia ainda estava apenas com a estrutura de cimento.

Em suma, temos por certo que são devidos €91.000,00 (verbas 1 e 4) e não são devidos €43.000,00 (verbas 5 e 6). Da verba 2, de €50.000,00, será devido um valor não inferior a €25.000,00. Já da verba 3, o estado da obra retratado nas fotografias não evidencia trabalhos executados de valor superior a €5.000,00.

Esta estimativa aproximada, fundada na constatação do estado da obra retratada nas fotos juntas aos autos por comparação com o orçamento que a empreiteira estava obrigada a cumprir, dá-nos uma perceção de que a obra concluída, por referência ao orçamento de fls 107 e ss., rondaria o valor de €121.000,00 (€61.000,00 (verba 1) + (+) €25.000,00 (verba 2) + (+) €5.000,00 (verba 3) + 30.000,00 (verba 4) = €121.000,00).

Portanto, num orçamento de €228.000,00, os trabalhos de executados seriam de pelo menos €121.000,00, corresponde a uma percentagem de execução do orçamentado de (+)53%. Assim sendo, quando o relatório de avaliação de fls 259 a 277 conclui que o estado de evolução da obra é de 53,80% parece-nos perfeitamente razoável em face do que se pode constatar das fotografias de fls 274 a 276, tendo por referência o valor orçamentado pelos R.R. para a feitura da obra, tal como consta do resumo de fls 107.

É tendo tudo isso em atenção que julgamos que a impugnação dos Recorrentes sobre a decisão da matéria de facto relativa ao ponto 10 dos factos não provados deve proceder, devendo esse facto ser eliminado dos factos não provados e passar a constar da matéria de facto provada uma alínea III` com a seguinte redação:

«III` - Em janeiro de 2010, do valor constante do “resumo do orçamento” de fls 107, relativo aos trabalhos a realizar pela “Wolfeyes,, Lda.” para construção da moradia dos Autores, estavam apenas executados 53,8%».

13.4. Analisando

Para alterar o ponto 10 dos factos não provados o tribunal teve em consideração a questão suscitada na apelação, que analisou, socorrendo-se de diversos meios de prova:

–  documental –

1. relatório de avaliação/ parecer técnico elaborado por FF, de fls 259;

2. relatório de avaliação da obra pelo Engenheiro do Banco Santander Totta

–  depoimento de testemunhas –

1. Eng. FF, - perito avaliador registado na CMVM com o n.º ...1, inscrito na APAE – Associação Portuguesa dos Avaliadores de Engenharia com o n.º 779 e na Ordem dos Avaliadores com o n.º 0201, autor do relatório de avaliação pedido pelos AA

2. Eng. NN, diretor de obra;

3. Eng. LL – autor dos projetos de especialidades.

– análise do Facto provado sob a alínea R) – onde consta reproduzido um email com a menção de autoria do A. “AA”, onde o mesmo diz: «até ao passado dia 28 de abril de 2009 o Banco Santander – Totta, acompanhado pelo empreiteiro geral, avaliaram a obra em 174.185,01€, tendo até à mesma data sido entregue ao empreiteiro geral e ao sr. CC o valor de 183.120,00€».

O Tribunal conjugou todos estes meios de prova e prova obtida e, na sua apreciação, concluiu que a decisão adoptada na sentença não havia sido bem tomada, porquanto:

1. “a dúvida que o Tribunal a quo - (1ª instância) - colocou sobre o relatório de avaliação de fls 259 e ss., também se pode colocar sobre essa alegada avaliação feita pelo banco”;

2. “não sabemos se a avaliação bancária teve em conta o valor da obra tal como efetivamente orçamentada pelo empreiteiro geral, ou se valorou unicamente a globalidade dos materiais incluídos na edificação para efeitos de libertar o necessário financiamento bancário, que se presume estar garantido por hipoteca incidente sobre o imóvel e tendo por referência valor da construção efetivamente realizada”

E porque lhe surgiram estas dúvidas, o tribunal socorreu-se de factos provados – “A tal acresce que também está provado que a R. “Wolfeyes” realizou trabalhos a mais, embora sem o consentimento ou conhecimento dos A.A. (cfr. alínea ZZ dos factos provados), sendo que estes se recusam pagar por terem recusado o orçamento que lhes foi apresentado (cfr. alínea AAA dos factos provados), e da conjugação dos factos provados com a dúvida que importaria solucionar socorreu-se de presunção judicial para concluir: “não será de excluir, portanto, que haja obra feita, para além do orçamentado, que aumenta o valor da construção, com relevância para efeitos da avaliação bancária, mas que não está diretamente relacionada com o orçamento inicial acordado entre os donos da obra e o empreiteiro.”

Com esta ilação o tribunal desmontou a argumentação dos RR no sentido de o afirmado no relatório do banco ser mais fidedigno do que o constante no relatório de avaliação elaborado por FF.

A análise efectuada pelo tribunal até a este ponto não nos suscita dúvidas de cumprimento das disposições legais relativas à definição da matéria de facto, quer em termos processuais, quer em termos de direito substantivo, por se estar perante meios de prova sujeitos a livre apreciação do tribunal – os dois relatórios constituem documentos cujo conteúdo não está dotado de qualquer força probatória previamente fixada pela lei, sendo sujeitos à livre apreciação pelo julgador; o mesmo sucede com os depoimentos em causa.

Assim, a primeira conclusão que importa referir quanto à questão suscitada é a seguinte: porque os documentos e os meios de prova indicados pelo recorrente não se integram na previsão normativa do art.º 674.º, n.º 4 e 682.º, n.º 2 do CPC, não pode este tribunal imiscuir-se na conclusão do tribunal recorrido, correspondente à sua livre convicção na fixação da matéria de facto.

Estariam em causa documentos particulares, depoimentos de testemunhas e presunções judiciais, sujeitos às seguintes regras: 373.º e ss (documentos particulares); 396.º (testemunhas); 349.º e ss (presunções), máxime 351.º CC.


Sucede ainda que, no caso, o tribunal recorrido não se ficou pela análise destes documentos e depoimentos testemunhais, indicando que, a seu ver, existiam “elementos de prova nos autos que nos permitem tirar algumas conclusões seguras sobre esta matéria” – quais sejam:

a) os trabalhos foram suspensos pela “Wolfeyes” em agosto de 2009 (facto provado EEE);

b) o banco foi impedido de fazer a mediação da obra referente a agosto e setembro de 2009 (facto provado GGG);

c) segundo a versão dos R.R., que prestaram declarações em audiência final, o orçamento que foi adjudicado pelos A.A. é o que consta de fls 107 e ss., no valor de €228.000,00, mais I.V.A., o que corresponde no essencial ao que foi dado por provado na alínea III) dos factos provados;

d) o contrato de empreitada foi rescindido pelos A.A. por carta de 5 de abril de 2010, conforme decorre da alínea EE) dos factos provados;

e) o relatório de avaliação de fls 259 a 277, que acaba por ser o único elemento de prova fidedigno junto aos autos sobre esta matéria, mostra-se datado de 4 de janeiro de 2010 (cfr. fls 268) – antes, portanto, da rescisão do contrato de empreitada, mas posterior à suspensão dos trabalhos pela empreiteira “Wolfeyes” –, sendo que nele se faz menção a ter sido feita uma visita à obra em 29 de dezembro de 2009 (cfr. fls 261).

f) Desse relatório consta a conclusão de que: «após visita ao imóvel e com base na estrutura de custos (em anexo), com o consequente tratamento de dados, concluímos que o estado de evolução atual da obra é de 53,80%» (cfr. fls 267).

O tribunal também explicita o porque de não considerar como decisivo o objectivo e foco do relatório que “não teve diretamente em consideração o orçamento apresentado pelos R.R. e adjudicado pelos A.A..”, dando relevância acrescida a fotografias da obra – que retratariam o estado da construção da moradia em janeiro de 2010. Da conjugação das fotografias – que retratariam o estado da obra – com “o orçamento proposto pelos R.R., que no final foi o adjudicado pelos A.A. à construtora “Wolfeyes”, resultaria assim – conforme explicação detalhada e comparativa entre fotografias e orçamento:

- que são devidos €91.000,00 (verbas 1 e 4) e não são devidos €43.000,00 (verbas 5 e 6). Da verba 2, de €50.000,00, será devido um valor não inferior a €25.000,00. Já da verba 3, o estado da obra retratado nas fotografias não evidencia trabalhos executados de valor superior a €5.000,00.

- a obra concluída, por referência ao orçamento de fls 107 e ss., rondaria o valor de €121.000,00 (€61.000,00 (verba 1) + (+) €25.000,00 (verba 2) + (+) €5.000,00 (verba 3) + 30.000,00 (verba 4) = €121.000,00).

- num orçamento de €228.000,00, os trabalhos de executados seriam de pelo menos €121.000,00, corresponde a uma percentagem de execução do orçamentado de (+)53%.

Ao assim proceder o tribunal está a fazer uma análise lógica e conjugada dos meios de prova existentes no processo com vista a apurar a probabilidade de o valor indicado no relatório elaborado por FF ter condições de objectividade lógica para formar a convicção do tribunal, sem que daí resulte, como sugere a recorrente que tenha sido usada uma presunção judicial.

Também por este motivo, porque os elementos probatórios tidos por relevantes pelo tribunal não estão sujeitos a força probatória tabelada, nos termos das já citadas disposições legais, não pode este STJ imiscuir-se na convicção do tribunal recorrido do dar por assente o facto III’.


Mesmo que se admitisse que o raciocínio do tribunal tinha envolvido a utilização de uma presunção judicial para afirmar um facto desconhecido a partir de outros assentes, os poderes do STJ só se alterariam se a alegada presunção estivesse eivada de ilogicidade manifesta, ou não fosse permitido o seu uso.

No caso concreto, pela análise efectuada, não se descortinou no raciocínio lógico dedutivo descrito qualquer ilogicidade ou proibição de uso de presunção, motivo que também redundaria na improcedência da questão suscitada pelo recorrente.


Pelos motivos expostos, não procede a questão suscitada pela recorrente.

14. Como segunda questão do recurso, diz a recorrente que – a manter-se a sua condenação – não deve ser condenada a pagar juros de mora e, se assim não se entendesse, esses juros nunca seriam devidos desde a citação.

14.1. Como principal argumento diz a recorrente que a sua condenação só poderia fundar-se no enriquecimento sem causa e que, por esse motivo, não haveria lugar a pagamento de juro de mora.

14.2. Sobre o ponto não se identificou nas contra-alegações uma pronúncia específica dos AA..

14.3. Contextualizando.

Na apelação os AA. procuraram justificar o recurso de direito indicando que havia facto ilícito e culposo que obrigaria ao pagamento de indemnização, porque os R.R. abandonaram a obra em agosto de 2009, sem qualquer justificação.

Os Recorridos sustentaram o contrário, defendendo que não se verificou qualquer ilícito contratual, porque a execução da obra foi suspensa por motivo de achado arqueológico. Por esse motivo, em respeito pelo disposto no Art. 78.º da Lei n.º 107/2001 de 8/9, e mesmo que a Câmara Municipal não tenha formalmente determinado a suspensão imediata dos trabalhos, era obrigação da empreiteira proceder desse modo, sendo que só com o parecer do Museu de ..., de 30 de março de 2010, é que a execução da obra poderia continuar. Ora, os 30 dias que os A.A. concederam à empreiteira para concluir a obra, através da sua interpelação admonitória, terminaram antes dessa data, pelo que a resolução do contrato a 5 de abril de 2010 mostra-se objetivamente injustificada.

O Tribunal da Relação considerou que dos autos resultou demonstrado que foi celebrado, “apenas entre os A.A. e a 2.ª R., “Wolfeyes”, um contrato de empreitada, que tinha por objeto a construção duma moradia no terreno dos A.A., mediante o pagamento do preço de €228.000,00, mais IVA (cfr. factos provados E e III)”, não reduzido a escrito, mas sem que a invalidade daí decorrente afectasse o contrato por não ter sido invocada pelo dono da obra (Art. 29.º n.º 2 e 4 do Dec.Lei n.º 12/2004 de 9/1, com redação do Art. 7.º do Dec.Lei n.º 18/2008 de 29/1); da celebração do contrato resultaria o dever da “2.ª R., no quadro deste contrato de empreitada, executar a obra, no prazo convencionado e sem vícios, ficando os A.A. obrigados a pagar o respetivo preço, nos termos acordados”;   “Sucede que a obra teve o seu início em 4 de agosto de 2008 (facto provado DDD), mas a R. não a concluiu, tendo suspendido os trabalhos no início do mês de agosto de 2009 (facto provado EEE), sendo que os A.A. vieram a interpelá-la para concluir a obra no prazo de 30 dias, por carta de 26 de fevereiro de 2010 (facto provado DD), tendo acabado por resolver o contrato de empreitada, por carta de 5 de abril de 2010, por alegado incumprimento da R. (facto provado EE).”;  que as partes interpretaram o incumprimento  em moldes diversos - para os A.A., o contrato foi incumprido por ter existido abandono da obra, sendo esse o motivo essencial que alegadamente justificou a resolução do contrato; para a 2.ª R., houve apenas suspensão dos trabalhos, motivada pelo achado dum poço, ou mina de água, que se suspeitava ter interesse arqueológico e que legalmente impediria a prossecução dos trabalhos - ; “o que decorre da prova documental junta aos autos, que de algum modo está refletida na matéria de facto provada, é que houve um proprietário de um prédio vizinho que, em 13 de janeiro de 2009, apresentou queixa na Câmara Municipal ... por motivo de a execução das obras de construção da cave da moradia no terreno dos A.A. ter implicado com o sistema de condutas de água de uma “mina centenária de grande interesse histórico” (cfr. doc. de fls 2033). Nessa sequência, verificou-se então a existência de um poço, ou mina de água, na cave em construção no prédio dos A.A., o que motivou uma ação inspetiva por parte da edilidade, da qual foi dada conta aos donos de obra pelo email de 18 de fevereiro de 2009 (cfr. doc. a fls 151 – facto provado N).”; “colocava-se a questão de a “mina de água”, descoberta na cave da construção, constituir um achado arqueológico e, nessa medida, importava suspender as obras e determinar as providências adequadas a salvaguardar o património cultural nacional”; os AA ficaram a saber da posição da edilidade, no sentido de por força do “Art. 78.º da Lei n.º 107/2001 (que afinal seria o diploma aplicável ao caso), acrescenta: «a obra não poderá prosseguir sem que estejam assegurados todos os procedimentos adequados e exigidos por lei» devendo exigir-se o «comprovativo da comunicação destes achados ao IGESPAR», «bem como a resposta daquela entidade acerca das “providências convenientes” legalmente consagradas»”;  e tanto sabia que o A., a 19 de maio de 2010, veio informar a Câmara Municipal ... que já havia dado conhecimento ao IGESPAR desse “achado arqueológico” (cfr. doc. de fls 2105); o Museu de ... deu o seu parecer, em 31 de março de 2010, no sentido de que não se opunha ao prosseguimento da obra dos A.A.; IGESPAR só homologou o relatório dos trabalhos arqueológicos em 4 de agosto de 2010 (cfr. doc. de fls 1144); “Portanto, em rigor, só em agosto de 2010, depois dessa homologação pelo IGESPAR, é que estavam reunidas todas as condições objetivas que permitiriam o prosseguimento da obra, mediante a aplicação das soluções técnicas que já haviam sido apresentadas pelos A.A. em abril de 2009”; É em função destas limitações objetivas, perfeitamente documentadas nos autos, que ficou provado que a existência da mina obrigou a R. a interromper e suspender as obras de construção da moradia dos A.A., enquanto estes não obtivessem autorização das entidades competentes para a obra prosseguir (facto provado CCC).”

Perante estas circunstâncias o Tribunal recorrido entendeu que as objecções levantadas pelos AA - relacionadas com o posterior corte do abastecimento a energia pela EDP (que aparentemente não inviabilizou a realização de trabalhos pela R. até agosto de 2009); omissão de entrega do recibo de pagamento do prémio de seguro de acidentes de trabalho (que, em abono da verdade, trata-se de exigência incompreensível em face da lei e da apresentação do documento de fls 295); ou da falta de apresentação do livro de obra (que era formalidade suprível, como a própria Câmara Municipal informou – cfr. ponto 3 do doc. a fls 237) – não relevavam e a exigência dos AA. no sentido de cumprimento da obrigação de conclusão da obra no prazo de 30 dias, por carta de 26 de fevereiro de 2010, num momento em que a R. estava legalmente impedida de dar prosseguimento dos trabalhos, não poderia ser justificativa do invocado incumprimento das obrigações assumidas no contrato pela empreiteira e, assim, “o alegado “incumprimento” da R. estava plenamente justificado, porque objetivamente não poderia, por mera manifestação da vontade dos A.A., executar obra que por lei e pareceres emanados da própria Câmara Municipal (que era a entidade competente para autorizar o licenciamento para prosseguimento da obra) não deveria ser feita sem terem sido reunidos todos os pareceres favoráveis das entidades legalmente competentes e envolvidas no caso”, devendo concluir-se que a interpelação admonitória para cumprimento do contrato foi intempestiva e a resolução do contrato de empreitada, por alegado incumprimento do contrato de empreitada por parte da R., infundada.

Mas o tribunal recorrido também tomou em consideração outra situação – a de os A.A. terem querido por termo ao contrato de empreitada, porque subjetivamente perderam interesse na prestação da R.

E sobre essa situação entendeu:

a) Que “O contrato de empreitada pode ser “revogado” em qualquer momento, por mera manifestação de vontade do dono de obra, na estrita medida em que o Art. 1229.º do C.C. estabelece que este pode desistir da empreitada, a todo o tempo, ainda que esta já tenha sido iniciada, desde que indemnize o empreiteiro «dos seus gastos e trabalho e do proveito que poderia tirar da obra»”;

b) Que se estaria “perante um poder discricionário do dono de obra, exercido unilateralmente e insuscetível de apreciação judicial, que não carece de aviso prévio ou de forma especial, traduzindo-se a desistência na mera manifestação de vontade dirigida à contraparte, extinguindo o contrato com efeitos para o futuro, sem necessidade de invocação de qualquer fundamento, operando mesmo no caso em que improceda o concreto fundamento invocado para a resolução do contrato de empreitada.”

c) Que na situação dos autos, “o contrato de empreitada (…) foi objetivamente extinto, por iniciativa unilateral dos donos de obra, independentemente da validade do fundamento que concretamente foi invocado para lhe por termo”;

d) Que os “A.A. agiram no exercício legítimo de um direito que a lei lhes confere, mas que tem como contrapartida que os mesmos teriam de indemnizar a R. pelos Prejuízos que com essa iniciativa lhe causaram”, ainda que esta situação não estivesse em causa na acção;

e) Que na presente acção estaria em causa uma questão diversa – a da responsabilidade civil dos R.R.., “da 2.ª R., “Wolfeyes”;

f) Que quanto a esta responsabilidade, “em face da extinção do contrato de empreitada a 5 de abril de 2010, por iniciativa dos donos de obra, sem que se verificasse (até então) verdadeiro fundamento para imputar-lhe um incumprimento do contrato, que se pudesse julgar por definitivo, só poderemos concluir, como a sentença recorrida fez, que não havia facto ilícito que a obrigasse a indemnizar os A.A., nos termos do Art. 798.º do C.C..”;

g) Que “as pequenas situações de alegados incumprimentos de prestações secundárias ou acessórias a cargo da R., que os A.A. também pretenderam relevar, são insuscetíveis de provocar os danos sofridos”, “nomeadamente, seriam inadequadas para causar os danos não patrimoniais provados nas alíneas PPP e QQQ, pois estes só se compreendem como decorrentes essencialmente da não conclusão da obra no prazo previsto”;

h) Que “Por outro lado, exatamente pela mesma razão, porque o atraso na conclusão da obra não é diretamente imputável à R.”;

Num terceiro momento o Tribunal recorrido passou a analisar o pedido de indemnização pelo valor de €48.152,00, devido por alegado excesso dos pagamentos realizados pelos A.A. por comparação com o valor da obra efetivamente executada.

Aqui, porque “relativamente ao decidido na sentença recorrida, alteraram-se os pressupostos de facto a ter em conta, em função da eliminação do ponto 10 dos factos não provados e do aditamento aos factos provados duma alínea III`, com a redação constante do ponto 2.4. do presente acórdão”, a solução jurídica seria diversa da acolhida na sentença.

Relevariam, em consequência, os seguintes aspectos:

a) estaria “assente que a R. suspendeu os trabalhos em agosto de 2009 (facto provado EEE), sendo que os A.A. puseram termo ao contrato de empreitada, por carta de 5 de abril de 2010 (facto provado EE), ainda que sem outro fundamento legal bastante que não fosse a sua mera vontade subjetiva, manifestada nesse sentido”;

b) “em janeiro de 2010, do valor do orçamento da obra acordado executar entre os A.A. e a 2.ª R., que consta do resumo junto aos autos a fls 107, a empreiteira havia apenas executado 53,8% dos trabalhos orçamentados (facto provado III`). Pelo que, não tendo a R. realizado qualquer trabalho desde a suspensão verificada em agosto de 2009, concluímos que, dos concretos trabalhos orçamentados, a R. só executou efetivamente em obra a percentagem de 53,8%.

c) “O valor dos trabalhos orçamentados e acordados entre A.A. e 1 2.ª R. era de €228.000,00, acrescidos de IVA (cfr. doc. de fls 107 – tendo por referência ainda os factos provados D, E e III), sendo que não releva para o caso, o orçamento de €39.100,00, apresentado em 10 de abril para a resolução do problema do poço (cfr. doc. de fls 153 a 160 – facto provado P), desde logo porque esse orçamento não foi sequer aceito pelos A.A. (cfr. facto provado AAA) e os poucos trabalhos realizados pela R. nesse quadro, foram executados sem o conhecimento ou o consentimento dos A.A. (cfr. facto provado ZZ), não oferecendo os autos elementos suficientes para podermos julgar, sem mais, que se referem a “alterações necessárias”, integráveis na previsão do disposto no n.º 1 do Art. 1215.º do C.C..”;

d) “está provado que os A.A. efetuaram diversos pagamentos, sendo uns entregues inicialmente o R. CC, e outros logo diretamente à R. W... (cfr. factos provados G, H e I). No entanto, o pagamento de €3.600,00, realizado pelos A.A. ao R. CC, constante da alínea G) dos factos provados, também não interessa para o caso, por se ter destinado ao reembolso do pagamento devido pelos A.A. pelo levantamento da licença de construção, como decorre do facto provado UU)”.

e) “os pagamentos constantes da alínea H) dos factos provados, subalíneas a) a d), realizados pelos A.A. ao R. CC, foram posteriormente transferidos para a R. “Wolfeyes”, para pagamento das quantias que os A.A. deviam a esta, conforme decorre do facto provado VV).”;

f) os A.A. pagaram à R., por conta desta obra o valor global de €195.440,00;

g) “dos €228.000,00 constantes do “resumo de orçamento” junto a fls 107, a 2.ª R. apenas executou trabalhos no valor correspondente a 53,8% (facto provado III` aditado no ponto 2.4 do presente acórdão). Logo, objetivamente a 2.ª R. realizou trabalhos no valor de €122,664,00 (228.000,00x53,8%=122.664,00), a que acresceria IVA à taxa de 20%. Pelo que, seriam apenas devido à R., a título de preço correspetivo, acrescido de IVA, o valor de €147.196,80 (€122.664,00x1,20=€147.196,80).”

h) O que levaria a concluir que “os A.A. pagaram em excesso o valor de €48.243,20 (€195.440,00-€147.196,80=€48.243,20)”;

E concluiu: “a 2.ª R. recebeu a título de preço, correspetivo do valor da obra por si realizada, uma quantia em excesso igual a €48.243,20, que deverá restituir aos A.A., por não lhe ser devida”, que justificou assim – “os donos de obra desistido da empreitada antes da sua conclusão, como lhe era lícito fazer nos termos do Art. 1229.º do C.C., o preço devido por aqueles ao empreiteiro não poderá corresponder ao orçamento inicial estabelecido para a realização integral e sem defeitos da moradia acordada construir. Como a prestação devida pela empreiteira foi apenas parcial, o preço devido pelo dono de obra deverá necessariamente ser determinado de acordo com o disposto no Art. 883.º, com recurso aos critérios estabelecidos no Art. 884.º, “ex vi” Art. 1211.º n.º 1, ambos do C.C., competindo ao tribunal estabelecer uma efetiva equivalência económica entre as contraprestações em causa.”; “considerando que houve mero lapso de cálculo na contabilização do excesso de pagamento do preço por parte dos A.A., sendo que o pedido de indemnização total formulado era muito superior aos €48.152,00 peticionados a este título, ou aos €48.243,20 por nós determinado ser o valor devido aos A.A. no caso concreto, julgamos que a 2.ª R. deverá ser condenada no pagamento do valor assim efetivamente devido, sem que com isso se violem os limites objetivos da condenação estabelecidos no Art. 609.º n.º 1 do C.P.C..”

14.4. Analisando

Do exposto resulta uma condenação da 2ª R na devolução de recebimentos para além do devido, em face do contrato celebrado, da prestação por si executada e do direito a desistir da continuação da obra pelos AA.

A devolução dos valores recebidos em excesso tem uma justificação – o direito dos AA. a desistir da empreitada – pagando o valor da obra realizada pelo R. e não mais do que esse montante.

Com a citação dos RR. para a acção os mesmos ficaram a saber que os AA. reclamavam o reembolso dos pagamentos efectuados em excesso, que contestaram, tendo acabado por não conseguir fazer prevalecer a sua posição.

Esses valores foram pagos e retidos até ao momento pela R. e têm de ser devolvidos, porque não justificados.

A sua restituição sem qualquer juro de mora não se apresenta em conformidade com o direito, porquanto a devolução foi oportunamente solicitada e recusada, estando o valor no património da Ré a ser por ela usado – e eventualmente frutificado.

Não é correcta, em consequência, a conclusão da Ré no sentido de, por se tratar de devolução por enriquecimento sem causa, não serem devidos juros de mora, uma vez que o motivo da condenação em juros se prende com a “compensação” por ter sido privado de algo que é seu.

Mesmo a aplicar-se aqui o regime do enriquecimento sem causa sempre haveria lugar ao pagamento de juros, a contar da citação, por força do art.º 480.º do CC, no qual se dispõe:

Artigo 480.º - (Agravamento da obrigação)

O enriquecido passa a responder também pelo perecimento ou deterioração culposa da coisa, pelos frutos que por sua culpa deixem, de ser percebidos e pelos juros legais das quantias a que o empobrecido tiver direito, depois de se verificar algumas das seguintes circunstâncias:

a) Ter sido o enriquecido citado judicialmente para a restituição;
b) Ter ele conhecimento da falta de causa do seu enriquecimento ou da falta do efeito que se pretendia obter com a prestação.”

São devidos os juros de mora constantes da condenação, que se contam da data de citação, confirmando-se a decisão recorrida.

15. Na terceira questão objecto do recurso, suscita a Ré um problema de inconstitucionalidade normativa: inconstitucionalidade da interpretação dada ao art.º 662º, n.º 1 do CPC, no sentido de conferir valor probatório pleno a um documento meramente particular e de valor probatório duvidoso, por violação do artigo 20º, n.ºs 4 e 5 da Constituição da República Portuguesa, atentatória  do princípio do direito a um processo equitativo e da tutela jurisdicional efectiva (conclusão 21).

Porém, a invocada inconstitucionalidade parte de um pressuposto que não conseguimos identificar nos autos: a de ter sido conferido valor probatório pleno a um documento meramente particular.

Na verdade, e voltando de novo a recordar a decisão do tribunal recorrido na questão da impugnação da matéria de facto, não se encontra referência a qualquer valor probatório pleno do relatório indicado, que foi sempre analisado como documento sujeito a livre apreciação do julgador, o que por si só afasta liminarmente a indicada possível inconstitucionalidade.

Improcede, igualmente, a questão suscitada neste ponto.

III. Decisão

Pelos fundamentos indicados, é negada a revista e confirmado o acórdão recorrido.

As custas do recurso serão suportadas pela 2ªR, recorrente, nos termos do art.º 527.º, n.º 1 do CPC.

Lisboa, 3 de Fevereiro de 2022

Fátima Gomes (relatora)

Oliveira Abreu

Nuno Pinto Oliveira