Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05B3713
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SALVADOR DA COSTA
Descritores: EXECUÇÃO
EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA
PENHORA
HERANÇA
QUINHÃO
PARTILHA DA HERANÇA
HERDEIRO
LEGITIMIDADE PARA RECORRER
TERCEIROS
Nº do Documento: SJ200511230037137
Data do Acordão: 11/23/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL LEIRIA
Processo no Tribunal Recurso: 2194/05
Data: 05/11/2005
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AGRAVO.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Sumário : 1. As pessoas directa e efectivamente prejudicadas a que se reporta o artigo 680º, nº 2, do Código de Processo Civil não são apenas os intervenientes processuais stricto sensu.
2. O prejuízo derivado da decisão a que alude o mencionado normativo é o directo ou imediato, actual e efectivo.
3. Não basta para garantir a legitimidade ad recursum de terceiros a sua titularidade de direitos incompatíveis com os reconhecidos às partes na decisão em causa.
4. Na acção executiva em que não são partes, os contitulares da herança, cujo quinhão hereditário do executado foi penhorado, não têm legitimidade para recorrer do despacho que lhes indeferiu o pedido repetição daquele acto por via da sua notificação naquela qualidade.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:


I
"A", B, C, D e E agravaram de dois despachos proferidos no tribunal da 1ª instância e apresentaram as respectivas alegações.
Na resposta alegatória, os recorridos F e G alegaram que o recurso de E não devia ser recebido por ofender os artigos 681º, nº 2, e 685º do Código de Processo Civil, em razão da sua extemporaneidade, e que o recurso interposto por A, B, C e D devia ser rejeitado por ilegitimidade.
Ouvido o executado E sobre a questão da rejeição do recurso, o relator da Relação não conheceu dos referidos recursos, quanto ao interposto pelo executado sob o fundamento de ele ter aceitado a decisão agravada, e quanto ao interposto por A, B, C e D sob o fundamento de carecerem de legitimidade para a sua interposição.
Os agravantes reclamaram para a conferência que, por acórdão proferido no dia 23 de Junho de 2005, indeferiu a reclamação.

"A", B, C e D agravaram para o Supremo Tribunal de Justiça do referido acórdão, na parte que lhes respeitava, formulando, em síntese, as seguintes conclusões de alegação:
- ordenada a penhora do direito do executado à herança indivisa, a questão de saber se a penhora se tem ou não por realizada sem que os restantes contitulares da herança, que não são parte na execução, se mostrem notificados, é do seu interesse directo, efectivo e actual, mormente quando a partilha da herança foi feita no seu desconhecimento da penhora;
- as recorrentes têm interesse directo, efectivo e actual na questão de saber se a penhora ordenada se considera ou não efectuada apesar de não terem sido notificadas do despacho que a ordenou;
- a legitimidade das recorrentes para suscitarem aquela questão e para recorrerem da decisão do tribunal de 1ª instância resulta do disposto no artigo 680º, nº 2, do Código de Processo Civil;
- ao declarar não conhecer do recurso interposto pelas reclamantes, a Relação infringiu o artigo 680º, nº 2, do Código de Processo Civil e incorreu em contradição com a posição assumida pelo relator no outro recurso;
- deve o acórdão recorrido ser substituído por outro que imponha à Relação o conhecimento do recurso de agravo interposto da decisão proferida no tribunal da 1ª instância.

Responderam os recorridos, em síntese de conclusão:
- as recorrentes não são partes no processo e não têm legitimidade para recorrer, porque não têm interesse directo, efectivo, actual, real e jurídico para o efeito;
- não é aplicável no caso o artigo 680º, nº 2, do Código de Processo Civil.

II
É a seguinte a dinâmica processual relevante no recurso:
1. Na acção executiva para pagamento de quantia certa, com processo ordinário, intentada no dia 5 de Janeiro de 1994 por F e G contra E e o cônjuge, estes não indicaram bens à penhora e aqueles nomearam para o efeito, entre outros, o direito e acção do executado à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de seu pai, H, falecido no dia 27 de Agosto de 1990, e requereram a notificação dos restantes herdeiros, as ora recorrentes.
2. O tribunal da 1ª instância notificou os exequentes, no dia 26 de Setembro de 1994, a fim de indicarem quem exerceria o cargo de cabeça de casal, e eles informaram o tribunal, no dia 20 de Outubro de 1994, dever exercê-lo I.
3. No dia 31 de Outubro de 1994, foi ordenada a penhora do direito e acção do executado à herança indivisa aberta por óbito de H por via da notificação da cabeça de casal, despacho que foi logo cumprido.
4. A, C e D, no dia 2 de Novembro de 1994, expuseram ao tribunal que o despacho mencionado sob 3 apenas fora notificado à cabeça de casal e ao executado, que não foi observado o disposto no artigo 862º, nº 1, do Código de Processo Civil, e requereram, em consequência, a sua realização de acordo com o referido artigo.
5. O referido requerimento foi indeferido por despacho proferido no dia 6 de Novembro de 1994, sob o fundamento de que enquanto a herança permanecer na indivisão, como universalidade, a penhora do direito do herdeiro é feita por via da mera notificação do cabeça de casal, e de que as requerentes careciam de legitimidade para suscitarem qualquer questão relacionada com a penhora ordenada, por não serem partes na execução.
6. O despacho mencionado sob 3 foi notificado aos executados por carta registada no correio no dia 2 de Março de 1995.
7. No dia 15 de Junho de 1998, no Cartório Notarial da Batalha, foi celebrada a escritura de partilha da herança mencionada sob 1 que compreendia, além de outros, dezenas de imóveis, na qual foram atribuídas ao executado dois depósitos bancários com o valor total de 85.049$40, e tornas, ali declaradas já recebidas, no montante de 5.621.326$77.
8. De seguida, a cabeça de casal informou na acção executiva mencionada sob 1 o teor da mencionada partilha, que, após a audição dos exequentes, foi julgada ineficaz em relação aos exequentes e mandada prosseguir a execução, de cujo despacho A, C e D interpuseram recurso.

III
A questão essencial decidenda é a de saber se as ora recorrentes têm ou não legitimidade para interpor o recurso do despacho mencionado sob II 5 proferido no tribunal da 1ª instância.
Tendo em conta o conteúdo do acórdão recorrido e das conclusões de alegação das recorrentes e dos recorridos, a resposta à referida questão pressupõe a análise da seguinte problemática.
- lei adjectiva aplicável na acção executiva em causa e nos recursos;
- delimitação negativa do objecto do recurso;
- síntese do quadro fáctico-jurídico que releva no recurso;
- regra geral e excepcional da titularidade do direito ao recurso;
- têm ou não as recorrentes o direito de recurso em causa?
- síntese da solução para o caso decorrente da dinâmica processual assente e da lei.
Vejamos, de per se, cada uma das referidas sub-questões.

1.
Comecemos pela determinação da lei adjectiva aplicável na acção executiva em causa e nos recursos.
Tendo em conta que a acção executiva em causa foi instaurada no dia 5 de Janeiro de 1994 e que a penhora do quinhão relativo à herança aberta por óbito de H, da titularidade do executado E, ocorreu no dia 7 de Dezembro de 1994, são-lhe aplicáveis as normas processuais anteriores às do Código de Processo Civil Revisto, que iniciou a sua vigência no dia 1 de Janeiro de 1997, salvo no que concerne a prazos, sem prejuízo do disposto no nº 3 do artigo 26º do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro (artigos 6º, 16º e 23º do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).
Como o despacho recorrido para a Relação foi proferido no tribunal da 1ª instância ocorreu no dia 6 de Novembro de 1994, ao recurso de agravo concernente é aplicável o pertinente regime anterior ao do Código de Processo Civil Revisto (artigo 25º, nº 1, do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).
Como o acórdão recorrido foi proferido no dia 23 de Junho de 2005, ao recurso de agravo para o Supremo Tribunal de Justiça em análise são aplicáveis as pertinentes normas do Código de Processo Civil Revisto (artigo 25º, nº 1, do Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).

2.
Atentemos, ora, na questão da delimitação negativa do objecto do recurso de agravo em causa.
Tendo em conta as conclusões de alegação do recorrente, importa delimitar negativamente o objecto do recurso.
Com efeito, o âmbito da decisão do recurso é limitado pelas questões colocadas nas respectivas conclusões (artigos 684º, nº 3 e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).
Tendo em linha de conta o âmbito das conclusões de alegação formuladas pelas recorrentes, só está em causa no recurso a sua ilegitimidade ou ilegitimidade ad recursum.
Consequentemente, não é objecto do recurso em apreciação a legitimidade ad causam das ora recorrentes para formularem na aludida acção executiva a pretensão que formularam nem o mérito ou demérito do despacho que sobre ela incidiu.
Tal não obsta, porém, se necessário para a decisão do objecto do recurso, que se analise a vertente do interesse do executado E envolvido pelo requerimento formulado pelas ora recorrentes na acção executiva sobre o qual incidiu o despacho recorrido para o tribunal da Relação.
Acresce que não assume qualquer relevo no recurso a circunstância de o acórdão recorrido divergir contrariar a posição assumida pelo relator noutro recurso, que aqui não está em análise.

3.
Vejamos agora a síntese da dinâmica processual que releva no recurso de agravo do acórdão da Relação.
As partes na acção executiva em causa são os recorridos, como exequentes, e E e o seu cônjuge, como executados, e nela foi penhorado o direito do executado a um património hereditário - em relação ao qual as recorrentes são contitulares -, por via da notificação à respectiva cabeça de casal.
As recorrentes A, C e D requereram na referida acção executiva - em que não eram exequentes nem executados - a penhora do mencionado direito fosse efectivamente realizada por via da notificação do administrador dos bens e outros contitulares daquele património hereditário, nos termos do artigo 862º, nº 1, do Código de Processo Civil.
O referido requerimento foi indeferido pelo tribunal sob o fundamento de que enquanto a herança permanecesse na indivisão, como universalidade, a penhora do direito do herdeiro sobre ela operava por via da mera notificação do cabeça de casal, e de que as requerentes careciam de legitimidade para formularem tal pretensão, por não serem partes na execução.
As referidas requerentes interpuseram recurso de agravo do mencionado despacho, que foi recebido no tribunal da 1ª instância, mas foi rejeitado pelo relator da Relação, rejeição essa confirmada por acórdão proferido pela Relação, agravado para o Supremo Tribunal de Justiça.

4.
Atentemos agora na regra geral e excepcional da titularidade do direito ao recurso.
Expressa a lei de processo, como regra, que os recursos, exceptuada a oposição de terceiro, só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencido (artigo 680º, nº 1, do Código de Processo Civil).
Tendo em conta, além do mais, a referência do nº 2 deste artigo, à parte acessória, o conceito de parte principal deve determinar-se no confronto de parte acessória, isto é, por exclusão.
E parte vencida, no quadro da legitimidade singular ad recursum, à luz de um critério material, é aquela para a qual o despacho, a sentença ou o acórdão tiver sido total ou parcialmente desfavorável.
Excepcionalmente, estabelece a referida lei que as pessoas directa e efectivamente prejudicadas pela decisão dela podem recorrer, ainda que não sejam parte na causa ou sejam apenas partes acessórias (artigo 680º, nº 2, do Código de Processo Civil).
Não tem sido uniforme a interpretação deste normativo no que concerne ao segmento pessoas directa e efectivamente prejudicadas pela decisão.
Na origem do referido normativo está o § único do artigo 204º do Decreto nº 21287, de 26 de Maio de 1932, segundo o qual nos incidentes levantados em qualquer causa são consideradas partes principais as pessoas ou entidades interessadas nesses incidentes.
Discutiu-se então a amplitude do referido conceito de incidente, ou seja, se só abrangia os que eram legalmente classificados como tais ou também os atípicos ou inominados.
O Projecto do Código de Processo Civil de 1939 inseriu a expressão: mas as pessoas directamente prejudicadas por uma decisão que tenham provocado podem recorrer dela, embora não sejam partes na causa ou sejam partes acessórias.
Na discussão que ocorreu na Comissão Revisora, sob o argumento da desnecessidade de que o despacho de que se pretendia recorrer tivesse indeferido algum requerimento, foi sugerida a eliminação da expressão que tenham provocado.
Foi a propósito observado que a expressão prejuízo directo se prestava a interpretação ampla e geradora de obstáculos à margem dos processos, mas que tal era preferível à solução de afectar ilegitimamente o interesse de quem não foi ouvido nem provocou a decisão.
O autor do projecto explicou que a referida frase poderia ser substituída por outra com o sentido a que tenham dado causa, e que lhe parecia necessário introduzir qualquer limite que obstasse a que uma pessoa inteiramente estranha ao processo, que nele não interviesse nem como parte, nem como funcionário, perito, testemunha, requerente, et cetera, nele viesse a intrometer-se para recorrer de uma decisão, alegando que a prejudicava, o que se traduziria em oposição de terceiro sem qualquer limite.
Ademais, foi considerado nessa discussão que o prejuízo directo excluía o prejuízo indirecto ou reflexo, que o relevante devia ser actual e positivo, o que excluiria o prejuízo eventual, incerto e longínquo.
Tudo ponderado, ficou a constar do artigo 680º do Código de Processo Civil de 1939 o seguinte: Os recursos, exceptuada a oposição de terceiro, só podem ser interpostos por quem, sendo parte principal na causa, tiver ficado vencido. Mas as pessoas directamente prejudicadas por uma decisão podem recorrer dela, embora não sejam partes na causa ou sejam partes acessórias.
Durante a vigência do Código de Processo Civil de 1939 houve quem interpretasse o referido normativo, designadamente o advogado Sá Carneiro, no sentido da sua aplicabilidade apenas a decisões proferidas contra os intervenientes acidentais no processo.
Essa interpretação tão restritiva foi contrariada pelo autor do projecto, considerando terem legitimidade ad recursum os terceiros, na sua perspectiva não intervenientes acidentais, em relação aos quais fosse ordenado judicialmente o exame da sua escrituração comercial, a entrega de algum documento, a requisição de informações, pareceres ou documentos (JOSÉ ALBERTO DOS REIS, "Código de Processo Civil Anotado", volume V, Coimbra, 1952, paginas 256 a 275).
Confrontando a redacção da segunda parte do artigo 680º do Código de Processo Civil de 1939 com o disposto no nº 2 do artigo 680º do actual Código de Processo Civil, verifica-se que a expressão pessoas directamente prejudicadas pela decisão constante do primeiro foi substituída, no segundo, pela expressão mais restritiva pessoas directa e efectivamente prejudicadas com a decisão.
A motivação da referida alteração foi justificada pela ideia de que não bastava a existência de um prejuízo directo para garantir, na espécie, a legitimidade ad recursum, por haver casos em que o prejuízo decorrente da decisão, embora fosse directo, no sentido de não ser meramente mediato ou reflexo, era eventual, longínquo, incerto, apenas provável ou possível, e insuficiente para legitimar a posição de recorrente (Boletim do Ministério da Justiça, nº 123, pág. 132).
Face à letra do nº 2 do artigo 680º do Código de Processo Civil, que não comporta a restrição a recursos interpostos por intervenientes acidentais, e o seu escopo finalístico, tendo em conta o elemento histórico a que se fez referência, a conclusão é no sentido de que outros terceiros, com o sentido de não serem partes na causa, são por ele abrangidos.
Todavia, o referido prejuízo derivado da decisão deve ser directo ou imediato e efectivo, não bastando para a determinação dos terceiros a quem a lei atribui legitimidade ad recursum a titularidade de direitos incompatíveis com os reconhecidos às partes na decisão em causa, certo que o caso julgado material decorrente daquela decisão é, em regra, insusceptível de os afectar (artigo 497º do Código de Processo Civil).

Assim, o núcleo essencial dos terceiros com legitimidade ad recursum, embora não se cinja apenas aos intervenientes acidentais stricto sensu, não vai muito para além deles, porque do que se trata é de uma legitimidade excepcional, insusceptível de se transformar, por via de recurso, em anómalo incidente de oposição ou de embargos de terceiro, à margem do regime a que se reportam, respectivamente, os artigos 342º a 350º, e 351º a 359º, todos do Código de Processo Civil.
E é irrelevante a circunstância de o terceiro haver intervindo na acção e formulado algum requerimento sobre o qual incidiu a decisão recorrida, ou de assim não ter acontecido, e o facto de a decisão recorrida haver sido provocada pelo requerimento do terceiro não obsta a que subsista a questão da sua legitimidade ad recursum.

5.
Tendo em conta as considerações de ordem jurídica acima expostas, vejamos agora se as recorrentes têm ou não legitimidade ad recursum.
Recorde-se que o despacho sob impugnação indeferiu o requerimento das recorrentes no sentido de o tribunal ordenar a penhora do quinhão hereditário do executado por via da notificação da cabeça de casal e delas próprias, como contitulares da herança.
As ora recorrentes basearam-se no disposto na primeira parte do artigo 862º, nº 1, do Código de Processo Civil, na redacção de então, segundo a qual, se a penhora tivesse por objecto o direito a bens indivisos, a diligência consistia unicamente na notificação do facto ao administrador dos bens, se o houvesse, e aos condóminos, com expressa advertência de que o direito do executado ficava à ordem do tribunal da execução.
A Relação fundou a sua decisão de inadmissibilidade do recurso interposto na ilegitimidade das recorrentes, por não haverem sido directa e efectivamente prejudicadas pelo despacho impugnado, dado o prejuízo que invocaram ser futuro, eventual ou incerto.
A ilegalidade do despacho determinativo da penhora dizia directamente respeito ao executado E, naturalmente porque foi o seu quinhão na herança aberta por óbito de H que por ele foi afectado, pelo que, nos termos do artigo 680º, nº 1, do Código de Processo Civil, tinha legitimidade ad causam para o impugnar, em termos de suscitar a sua anulação, revogação ou ineficácia.
O escopo finalístico do requerimento formulado pelas recorrentes, certo que pretendiam fosse proferido despacho determinativo da penhora do quinhão hereditário do executado E, era, naturalmente, o de provocar a ineficácia do que já havia sido proferido, sem impugnação daquele executado.
O deferimento da sua pretensão, formulada por via do mencionado requerimento, assumia vantagem patrimonial para o executado E e o seu indeferimento foi para ele directamente desvantajoso no referido plano patrimonial.
Elas afirmaram que o seu prejuízo actual, directo e efectivo resultante da decisão recorrida derivava do seu direito a que a partilha dos bens da herança fosse eficaz e oponível erga omnes.
A sua argumentação revela o seu interesse em que se não mantivesse o despacho do qual interpuseram recurso, mas não o seu prejuízo actual, real e efectivo dele imediatamente derivado.
Embora tenham sido as ora recorrentes quem provocou, por via do requerimento que formularam, a decisão recorrida, esta, em termos objectivos, dado o seu conteúdo, não lhes originou prejuízo directo e efectivo.
Admite-se, com efeito, a existência do seu interesse na eficácia e na oponibilidade erga omnes da partilha, mas isso não significa o seu prejuízo actual, directo e imediato derivado do despacho recorrido, que se limitou a negar a repetição do acto de penhora do direito hereditário em causa.
A conclusão, por isso, é no sentido de que as recorrentes não têm, no caso espécie, legitimidade ad recursum.

6.
Atentemos, finalmente, na síntese da solução para o caso decorrente da dinâmica processual assente e da lei.
As pessoas directa e efectivamente prejudicadas a que o referido normativo se reporta não são apenas os intervenientes processuais stricto sensu.

O prejuízo derivado da decisão a que se reporta o nº 2 do artigo 680 do Código de Processo Civil é o directo ou imediato e efectivo, e não basta para a determinação dos terceiros a quem a lei atribui legitimidade ad recursum a titularidade de direitos incompatíveis com os reconhecidos às partes na decisão em causa.
É claro que o saber se a penhora em causa se tem ou não por realizada sem que as recorrentes tenham sido notificadas, mormente se a partilha da herança foi feita no seu desconhecimento daquele acto não constituiu o interesse a que lei se reporta.
As recorrentes não foram actual, directa e efectivamente prejudicadas pelo despacho recorrido, pelo que, no caso vertente, não são dotadas de legitimidade ad recursum.

Improcede, por isso, o recurso.
Vencidas no recurso, são as recorrentes responsáveis pelo pagamento das custas respectivas (artigo 446º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).

IV
Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, e condenam-se as recorrentes no pagamento das custas respectivas.

Lisboa, 23 de Novembro de 2005.
Salvador da Costa,
Ferreira de Sousa,
Armindo Luís.