Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2ª SECÇÃO | ||
Relator: | FERNANDO BENTO | ||
Descritores: | DIREITO DE PROPRIEDADE PRIVAÇÃO DO USO OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAR DANO EMERGENTE LUCROS CESSANTES ÓNUS DA PROVA BEM IMÓVEL ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO EQUIDADE ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA HERDEIRO JUROS DE MORA SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA CONHECIMENTO OFICIOSO | ||
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Data do Acordão: | 10/03/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA EM PARTE A REVISTA | ||
Área Temática: | DIREITO CIVIL - RELAÇÕES JURÍDICAS / PROVAS - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / MODALIDADES DAS OBRIGAÇÕES / OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO / NÃO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES / REALIZAÇÃO COACTIVA DA PRESTAÇÃO - DIREITOS REAIS / DIREITO DE PROPRIEDADE / USO E HABITAÇÃO - DIREITO DAS SUCESSÕES / ENCARGOS DA HERANÇA. | ||
Doutrina: | - Abrantes Geraldes, Temas da Responsabilidade Civil, vol. I, Indemnização do dano da privação do uso, 2007, p. 13. - Almeida Costa, Direito das Obrigações, 8ª ed., 2000, pp. 461-462. - Antunes Varela, Direito das Obrigações, vol. I, 10ª ed., pp.473 e 479, 481, 491-493. - Calvão da Silva, “Sanção Pecuniária Compulsória”, BMJ, 359-101. - Karl Larenz, Derecho de Obligaciones, vol. II, p. 553. - Menezes Leitão, Direito das Obrigações, vol. I, 2000, pp. 297, 413; Direito das Obrigações, vol. II, 2002, p. 276. - Paulo Mota Pinto, Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, vol. I, 2008, pp. 591, 594-596. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 342.º, N.º1, 483.º, N.º1, 562.º, 563.º, 564.º, N.º2, 566.º, N.ºS2 E 3, 829.º-A, N.ºS 1 E 4, 1305.º, 1484.º, N.º1, 2068.º, 2071.º, N.ºS 1 E 2. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 378.º, N.º2, 473.º, N.ºS 1 E 2, 474.º, N.º1, 479.º, N.º1, 496.º, N.º1, 661.º, N.ºS 1 E 2, 684.º-A, N.º1, 722.º, N.º2, 729.º, N.º1. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 23-03-1999, PROC. Nº 147/99, C J/ STJ, 1999, TOMO I, P. 172 E SEGS.; -DE 06-12-2006, PROC. Nº 3483/06; -DE 08-05-2007, PROC 07A1066; -DE 14-07-2009, PROC. Nº 630-A/1996.S1; -DE 03-09-2009, PROC Nº 20/03.3TYLSB.S1; -DE 28-10-2010, DA 7.ª SECÇÃO; -DE 10-01-2012, REVISTA N.º 189/04.0TBMAI.P1.S1 - 6.ª SECÇÃO; -DE 12-01-2012, PROC Nº 1875/06.5TBVNO.C1.S1; -DE 10-07-2012, PROC. N.º 3482/06.3TVLSB.L1.S1 - 1.ª SECÇÃO; -DE 20-11-2012, 176/06.3TBMTJ.L1.S2; -DE 22-01-2013, PROC. Nº 3313/09.2TBOER.L1.S1 – 6ª SECÇÃO; -DE 08-05-2013, PROC. Nº 3036/04.9TBVLG.P1.S1 – 7ª SECÇÃO; -DE 04-07-2013, PROC. Nº 5031/07.7TVLSB.L1.S1, 2.ª SECÇÃO. | ||
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Sumário : | I - A privação do direito de uso e fruição integrado no direito de propriedade configura, por si só, uma desvantagem económica que se reflecte necessariamente no valor do mesmo. II - Em decorrência da teoria da diferença consagrada no n.º 2 do art. 566.º do CC, tal dano – normativo e meramente abstracto – não é autonomamente ressarcível, só o sendo quando se reconduz a dano emergente ou lucro cessante. III - O ónus de alegação e prova de tais danos incumbe ao lesante. IV - A fixação equitativa da indemnização supõe a existência de limites quantitativos provados. V - Se na pendência de uma acção de reivindicação os autores não logram provar os danos emergentes (impossibilidade de habitar e fazer obras no prédio) e lucros cessantes (frustração efectiva do arrendamento do imóvel) por si invocados, fica inviabilizado o recurso à equidade para determinação da indemnização pela privação do uso. VI - Sem embargo do referido em II e V, a ocupação do prédio pelos réus, beneficiando das vantagens de um bem alheio, sem título que o legitimasse, durante os quase nove anos em que, por via dos sucessivos recursos por si interpostos, esteve pendente a acção, legitima o reconhecimento de um crédito aos autores com fundamento no enriquecimento sem causa. VII - São pressupostos do enriquecimento sem causa: a) a existência de um enriquecimento; b) a obtenção desse enriquecimento à custa de outrem; c) a ausência de causa justificativa para o enriquecimento. VIII - À custa de outrem não significa necessariamente que o credor da restituição seja empobrecido, mas apenas que o valor que entra no património do enriquecido corresponde ao que foi obtido com meios ou instrumentos pertencentes ao credor da restituição. IX - Nos casos de enriquecimento sem causa fundado na utilização de bens alheios o valor da restituição é o valor de exploração, aferido pelo critério do valor objectivo dos bens. X - Se as partes reconhecem um valor locativo ao prédio cujo valor concreto não se apurou, nada impede a condenação das rés a restituir aquele que se venha a provar em incidente de liquidação. XI - Se os réus são demandados na qualidade de sucessores do lesante – e não por responsabilidade decorrente de danos próprios – a sua responsabilidade está limitada às forças da herança (arts. 2068.º e 2071.º, n.ºs 1 e 2, do CC). XII - O âmbito de aplicação da sanção pecuniária compulsória prevista no art. 829.º-A, n.º 4, do CC, é constituído por todas as obrigações pecuniárias de soma ou quantidade, contratuais ou extracontratuais e visa pressionar o devedor e não indemnizar o credor,, distinguindo-se em tal função dos juros de mora. XIII - A sua aplicação é oficiosa, não carecendo de ser pedida na acção declarativa. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:
RELATÓRIO O prédio misto sito no Sítio da Igreja, freguesia do Pechão concelho de Olhão, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 100 - secção D (anterior artigo 1849) e na matriz predial urbana sob os artigos 470 e 471, descrito na Conservatória do Registo Predial de Olhão sob o n° 1569/990331 esteve ocupado sem qualquer título jurídico que tal legitimasse por AA e mulher, BB. Para obter o reconhecimento do seu direito de propriedade e a restituição de tal prédio intentou a respectiva dona, CC que também usa e é conhecida por CC , em 28-10-1998,acção de reivindicação contra os referidos AA e BB. Tal acção veio a ser julgada integralmente procedente na 1ª instância, por sentença de 15-08-2006, confirmada por acórdão da Relação de Évora de 01-02-2007, este, por sua vez, confirmado por acórdão do STJ de 13-09-2007, sempre em recursos interpostos pelos RR.
Em 26-11-2007, intentaram CC e DD , a favor de quem tal prédio estava inscrito sem determinação de parte ou direito, acção de processo ordinário contra BB, EE e FF, aquela por si e também conjuntamente com estes na qualidade de sucessores de AA, com vista à condenação solidária dos demandados no pagamento de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais assim discriminados: a) dano da privação do uso do prédio misto - € 21.500,00 euros; b) outros danos patrimoniais - € 1.500,00 euros; c) danos morais sofridos pela Autora, CC - € 1.500,00 euros; d) danos morais sofridos pelo Autor DD - € 500,00 euros.
Subsidiariamente, para o caso de, por qualquer motivo não proceder o pedido de indemnização relativamente à privação do direito de uso do prédio (calculado em € 21.500,00 euros), pediram a condenação dos RR a: a) pagar aos AA a quantia de € 1.500,00 euros de indemnização pelos restantes danos materiais; b) pagar à Autora CC a quantia de € 1.500,00 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais; c) pagar ao Autor DD a quantia de € 500,00 euros, a título de indemnização pr danos não patrimoniais; d) entregar aos AA a quantia de € 21.500,00 euros, a título de restituição por enriquecimento sem causa (pelo enriquecimento decorrente do uso ilegítimo do prédio).
Em qualquer dos casos, pediram também juros de mora, à taxa legal até integral pagamento, bem como juros compulsórios, à taxa de 5% ao ano, nos termos do art. 829º-A nº4 CC, desde a data do trânsito em julgado.
Os RR defenderam-se por impugnação. Saneado o processo e discriminados os factos assentes dos controvertidos, veio a realizar-se a audiência de julgamento e subsequentemente, m 16-06-2011, a ser proferida sentença que condenou a Ré BB a pagar aos AA, CC e DD , a quantia de € 1.500,00 euros, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal a contar do trânsito em julgado da sentença e a absolveu a ela e aos demais RR, EE e FF dos demais pedidos contra eles formulados.
Apelaram AA e RR para a Relação de Évora e nas respectivas alegações, os AA reduziram o pedido de indemnização pela privação do uso para € 6.345,00 euros. E a Relação de Évora, por acórdão de 15-11-2012, deliberou condenar os RR BB, EE e FF a pagar aos AA a quantia de € 6.345,00 euros (valor fixado com recurso à equidade) pelo dano da privação do uso e a quantia de € 1.500,00 euros por danos não patrimoniais, acrescendo a estes montantes os juros de mora desde o trânsito em julgado até integral pagamento bem como os juros compulsórios.
Novo recurso, agora para o STJ, desta feita interposto pelos RR, pugnando pela revogação do acórdão recorrido e reposição da sentença d 1ª instância. Os AA contra-alegaram em defesa da subsistência do acórdão recorrido. Remetidos os autos ao STJ, após o exame e despacho preliminar e acatamento pelos recorrentes do convite à condensação das conclusões da respectiva alegação, foram corridos os vistos. Nada continua a obstar ao conhecimento do recurso.
FUNDAMENTAÇÃO Delimitação do objecto do recurso Importa, antes de mais, delimitar o objecto que os recorrentes propõem para o presente recurso; e são as seguintes as conclusões por eles sintetizadas:
1 – O tribunal de 2ª instância circunscreveu o objecto de recurso às questões seguintes: “1. Da absolvição dos apelados EE e FF e do pedido de indemnização por danos decorrentes das privação do uso do prédio no montante de € 6.345,00. 2. Da condenação dos Apelados a pagar aos Apelantes CC e DD uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 1.500,00 cada um.
2 – O tribunal recorrido, na apreciação e decisão do primeiro dos pontos da apelação, julgou o recurso procedente, acolhendo a tese que defende que o ressarcimento não está dependente de prova, em concreto, de prejuízo sofrido, sendo suficiente a prova da mera privação temporária do uso.
Decorre que,
4 – Não resulta da factualidade assente que os réus EE e FF alguma vez tivessem ocupado o prédio dos autores.
5 – Ou sequer que da ocupação (feita por qualquer um dos réus) tivessem resultado para os autores qualquer dano.
6 – A intervenção dos mesmos nos autos resulta apenas da circunstância do seu pai, demandado original, ter falecido na pendência da acção de reivindicação de propriedade intentada pelos autores.
7 – A ré BB deixou de ocupar o referido prédio em data anterior a Outubro de 2007.
8 – Os recorrentes discordam da interpretação da lei (art. 483º do CC), acolhida pelo tribunal recorrido e que culminou com a sua condenação e acompanham de perto os ensinamentos e a decisão do tribunal de 1ª instância.
Na realidade, 9 – Os recorrentes, se bem que tenham invocado (e qualificado) danos patrimoniais decorrentes da ocupação do seu prédio não lograram prová-los.
10 – A tese da decisão em crise faz da responsabilidade civil um instituto essencialmente repressivo e desligam-no de qualquer preocupação reparadora.
11 – Em violação do que dispõe o artigo 483º do Código Civil, sendo o dano (inexistente “in casu”) um dos pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos.
12 – No que tange à segunda questão a decidir (“da responsabilidade dos réus EE e FF por danos não patrimoniais”) concluiu o tribunal recorrido que os mesmos, como sucessores ocupam o lugar do falecido, sucedendo-lhe na sua posição jurídica pelo que condenou-os no pagamento da quantia de 1.500,00 €.
13 – A este propósito os recorrentes acompanham igualmente o doutamente vertido na decisão de 1ª instância.
De facto, 14 – Por um não resultaram provados quaisquer comportamentos dos recorrentes, EE e FF, geradores de danos.
15 – Por outro lado, não resultaram provados quaisquer danos para o recorrente DD.
16 – Tudo razões para entender que a decisão em crise do condenar todos os réus a solidariamente indemnizar os autores, incluindo o DD, que comprovadamente nenhum dano não patrimonial sofreu, olvida a factualidade assente e colide frontalmente com o disposto no artigo 496º do Código Civil.
17 – Por último e no que concerne à condenação no pagamento dos juros compulsórios é válido igualmente o entendimento do Tribunal da 1ª instância que aqui se deixa transcrito: “Por fim, no que tange aos juros compulsórios, o pedido assenta no preceituado no artigo 829º-A nº4 do Código Civil, preceito legal aditado àquele Código pelo Decreto-Lei nº 262/83 de 16 de Junho. É inequívoco pela inserção sistemática do citado preceito legal (numa subsecção dedicada à execução específica das obrigações) que o mesmo é de aplicar às cláusulas penais fixadas em dinheiro e às sanções penais compulsórias decretadas pelo tribunal nos termos prescritos nos termos do nº1 do artigo 829º-A (A. Varela, P. Lima, ob cit., volume II, 3ª edição, Coimbra Editora Limitada, 1986, página 108). Não pode, por conseguinte, proceder o pedido nesta parte”.
Concluem, pedindo a revogação da decisão em crise.
Por conseguinte, o objecto do recurso decompõe-se na apreciação das seguintes questões:
- Se a privação do uso de um prédio na pendência de uma acção de reivindicação e respectivos recursos configura, só por si, um dano indemnizável; - Responsabilidade dos sucessores de parte falecida na pendência da causa; - Aplicabilidade da sanção pecuniária compulsória à indemnização.
Matéria de Facto São os seguintes os factos provados:
Direito - Apreciação: Cumpre agora apreciar cada uma das questões enunciadas. Comecemos pela 1ª, ou seja, pela questão de saber se a privação do uso de um prédio na pendência de uma acção de reivindicação, configura, só por si, um dano indemnizável se vier a ser decretada a restituição por inexistência de título de ocupação. Ao invés da 1ª instância, a Relação entendeu que sim. Escreveu-se no douto acórdão recorrido, depois de aludir à privação de uso como fonte de danos de natureza patrimonial e não patrimonial:
“Mesmo quando se aceita a sua patrimonialidade, verifica-se uma nítida fractura entre as decisões para as quais basta, para que seja reparável a demonstração do não uso do bem atingido – e aquelas que julgam insuficiente essa demonstração, sendo necessária a prova de um autónomo ou específico dano patrimonial. A privação do uso de um bem constitui, por si, dano patrimonial, visto que constitui lesão do direito real de propriedade correspondente, traduzida na exclusão de uma das faculdades de que ao proprietário é lícito gozar: a de uso e fruição da coisa (art. 1305º do Código Civil). O uso de um bem constitui uma situação favorável que o direito amplamente tutela: a supressão dessa faculdade constitui, juridicamente, um dano. O acto de terceiro que torne materialmente indisponíveis as utilidades que é possível extrair desse bem – que têm, naturalmente, uma expressão pecuniária – deve ser encarado como um dano que, como tal, deve ser objecto de reparação adequada (artigo 483º nº1 do Código Civil). Decerto que, muitas vezes, será difícil, por recurso à teoria da diferença mensurar esse dano e a indemnização que lhe deve corresponder. Mas esta dificuldade não é intransponível: nesta conjuntura sempre restará ao tribunal a última ratio de julgamento representada pela apreciação equitativa do valor do dano (artigo 566º nº3 do Código Civil).”
E, nesta linha, bastando-se com a prova do não uso do prédio pelos respectivos proprietários e sem prova de concretos e específicos danos, a Relação, indiscutida que é a ilicitude e culpa dos lesantes, fixou a indemnização devida por essa privação do uso no valor para o qual os proprietários haviam reduzido o pedido e que, na falta de dados concretos, foi assumido como equitativo. Ora, é inquestionável que, estando o prédio ocupado e recusando os ocupantes a sua entrega aos respectivos donos, forçando estes ao recurso à acção de reivindicação de propriedade com vista à obtenção da restituição do dito, aqueles estiveram impossibilitados de usar o prédio enquanto tal acção esteve pendente, ou seja, até ao reconhecimento - que veio a ter lugar no STJ, por os demandados haverem sucessivamente recorrido através de apelação e de revista das decisões que nas várias instâncias lhes foram sempre desfavoráveis - do direito à restituição com a consequente condenação dos demandados, por falta de título legitimador da ocupação. Com tal restituição, visavam os AA recuperar para a sua esfera jurídica a totalidade dos poderes ou faculdades inscritos no direito de propriedade, maxime os de uso e fruição do imóvel; deve, por isso, entender-se que pretendiam beneficiar da faculdade do uso e fruição do prédio. O direito de uso e de fruição integrado no direito de propriedade representa, assim, uma vantagem económica que se reflecte necessariamente no valor do imóvel. Desde logo no valor de mercado: basta ponderar o caso de dois prédios, em tudo semelhantes (v.g, edifícios geminados) mas um dos quais está ocupado abusivamente e sem qualquer título jurídico por pessoas que se recusam a abrir mão dele; neste caso dificilmente qualquer interessado os adquiriria pelo mesmo valor. O uso como aproveitamento efectivo das utilidades concretas de um dado bem tem um inegável valor económico como objecto de negociação autónoma pelo titular do respectivo direito (proprietário ou usufrutuário): pode ser objecto de contratos onerosos (v.g., locação) ou gratuitos (v. g., comodato), cujos beneficiários terão direito a indemnização se de tal uso forem ilícita e culposamente privados. Por conseguinte, a privação do uso ou da possibilidade de uso configura, só por si, uma desvantagem económica, o mesmo é dizer, implica uma diferença patrimonial, ou seja, um dano; discutível será a questão de saber se este dano se basta com a mera proclamação da privação do uso sem necessidade de mais concretização, ou seja, sem demonstração das utilidades que não foram aproveitadas, um dano abstracto, portanto, ou se, ao invés, a privação do uso como conceito jurídico-normativo deve ser explicitada e concretizada nas utilidades (efectivas ou projectadas) cujo aproveitamento foi impedido. O Prof. Menezes Leitão refere a este propósito que «efectivamente o simples uso constitui uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária, pelo que a sua privação constitui naturalmente um dano», (cfr. Direito das Obrigações, vol. I, 2000, p. 297). negrito e sublinhado nossos).
De igual modo, o Cons, Abrantes Geraldes sustenta que “a ilegítima privação de um bem é susceptível de, por si só, constituir o agente ou o responsável na obrigação de indemnizar o credor ou o lesado, sem necessidade da prova de outros factos…” (cfr. Temas da Responsabilidade Civil, vol I, Indemnização do dano da privação do uso, 2007, p. 13).
Portanto, a mera privação do uso (ou, se se preferir, da possibilidade de uso), constituindo só por si, um dano, seria causa adequada de uma modificação negativa na relação entre o lesado e o seu património que pode servir de base à determinação da indemnização.
Não parece, contudo, que, à luz da matéria de facto provada, estejamos perante um dano (patrimonial) da privação do uso do prédio, susceptível de ser ressarcido. Com feito, o direito à indemnização configura-se como o direito à compensação ou preenchimento da diferença patrimonial entre a situação real e a situação hipotética em que o lesado se encontraria não fora o dano (art. 566º nº2 CC). Para além dos casos - que ora não estão em causa - em que a privação do uso envolve um dano de natureza não patrimonial, não se discute a ressarcibilidade de tal dano quando ele se reconduz a dano emergente (v.g. custos de substituição) ou lucro cessante (vg, rendimentos frustrados). E nestes casos, os factos relevantes determinantes da diminuição (ou não aumento) patrimonial verificada devem ser alegados e demonstrados, como constitutivos do direito à indemnização (art. 342º nº1 CC). Com efeito, muito embora os AA tivessem alegado o valor locativo do imóvel, susceptível de funcionar como critério de fixação da medida da indemnização pela via da equiparação a lucros cessantes (teoria da comercialização do valor de uso), os AA não lograram demonstrá-lo (cfr. respostas negativas aos pontos nºs10º e 11º da base instrutória). Invocaram também a ocupação do imóvel como determinante da sua impossibilidade de nele fazer obras de ampliação da respectiva parte urbana e de nele habitarem quando vinham a Portugal de férias e a A também quando regressou definitivamente ao País, recorrendo, por isso, a acolhimento de favor em casa de familiares. Estes factos constituiriam inequívocos danos emergentes. Expliquemos: O art. 1305º CC prescreve que “o proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e disposição das coisas que lhe pertencem…”. Se bem que integrando o complexo de direitos, poderes e faculdades em que se analisa a posição jurídica do proprietário, o simples uso, enquanto efectivo aproveitamento de utilidades, constituirá, só por si, uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária, mas o não uso não envolve necessariamente uma desvantagem, o mesmo é dizer um dano. Com efeito, se é inquestionável que a privação do uso de uma coisa pode integrar um ilícito gerador de responsabilidade civil e da consequente obrigação de indemnizar, uma vez que impede o seu dono do exercício dos direitos de uso e fruição inerentes à propriedade, ou seja, a faculdade de se servir da coisa e de fazer seus os respectivos frutos (art. 1484º nº1 CC), isso não significa, todavia, que a plenitude do direito de propriedade implique necessariamente o uso ou fruição; bem ao invés, o exercício do uso e fruição corresponde a meras faculdades do proprietário; melhor seria dizer, por isso, que o direito de propriedade envolve apenas e tão só a mera faculdade (que pode ser exercida ou não…) de uso e fruição, logo, o exercício de tal faculdade configura uma manifestação de liberdade do dono no que concerne ao aproveitamento dos seus bens: o proprietário absentista que não usa nem cede o uso nem tenciona fazê-lo, isto é, o que não aproveita nem permite que os outros aproveitem, não sofre dano de privação do uso, pois que nenhuma desvantagem patrimonial lhe advém da eventual actuação de terceiro susceptível de impedir o seu uso… Por isso, este STJ entendeu em Ac de 10-01-2012 (cfr. Revista n.º 189/04.0TBMAI.P1.S1 - 6.ª Secção – Rel. Nuno Cameira) que: “I - A privação do uso de uma coisa pode constituir um ilícito gerador da obrigação de indemnizar, uma vez que impede o seu dono do exercício dos direitos inerentes à propriedade, i.e., de usar, fruir e dispor do bem nos termos genericamente consentidos pelo art. 1305.º do CC. II - Não é suficiente, todavia, a simples privação em si mesma: torna-se necessário que o lesado alegue e prove que a detenção ilícita da coisa por outrem frustrou um propósito real – concreto e efectivo – de proceder à sua utilização” (negrito e sublinhado nosso).
Nesta perspectiva, a mera privação do uso, no sentido de impedimento do aproveitamento das utilidades dos bens, só constitui um dano relevante, susceptível de indemnização, se for explicitada nas concretas e explícitas desvantagens económicas - seja em termos de danos emergentes (v.g., custos de substituição do uso impedido) e de lucros cessantes (v.g, frustração de ganhos ou de rendimentos) seja em termos da frustração ou impedimento da obtenção das concretas vantagens associadas à disponibilidade imediata do bem (v.g., privação de uso concreto susceptível de subsunção à categoria de dano emergente ou de lucro cessante) - manifestados através da diferença patrimonial a que alude o art. 566º nº2 CC. A privação do uso e fruição é a privação da possibilidade de se servir e de fazer seus os frutos da coisa, no momento actual (o que pode integrar um dano emergente) e no futuro (o que pode integrar um lucro cessante) - devendo sempre concretizar-se em que consistiam esses serviços e aproveitamento de frutos. Assim, o STJ em caso algo semelhante (reivindicação de fracção autónoma ocupada) doutrinou que
E, contemplando embora a privação do uso de veículos automóveis, em princípio orientador que vale para quaisquer categorias de bens, na medida em que está em causa a privação da possibilidade de aproveitamento das respectivas utilidades, o STJ tem entendido que “a mera privação do uso de um veículo, independentemente da demonstração de factos reveladores de um dano específico emergente ou de um lucro cessante, é insusceptível de fundar a obrigação de indemnização, no quadro da responsabilidade civil” (cfr Ac. 10-07-2012, Proc. n.º 3482/06.3TVLSB.L1.S1 - 1.ª Secção, Cons. Helder Roque (Relator) E é a privação das concretas vantagens de uso e não a mera perturbação da faculdade de utilização integrada no direito de propriedade que releva para efeitos de autonomização do dano ilícito decorrente da afectação da abstracta possibilidade de uso. Porque importa distinguir entre a faculdade abstracta de utilização da coisa, ou seja, os direitos de utilização inerentes a certa relação jurídica com essa coisa, e as concretas e determinadas vantagens retiradas do gozo da coisa; a primeira, como possibilidade abstracta, inere e corresponde ao chamado licere que constitui o lado interno dos direitos de domínio (faculdades contidas nestes direitos) e a segunda, ou seja, “as concretas vantagens do gozo da coisa não se situam no plano do mero licere inerente à propriedade - (…) – mas situam-se também no plano fáctico”, sendo a privação destas concretas vantagens que importará como dano da privação do uso. e não a perturbação da faculdade (abstracta) de utilização que integra o direito de propriedade, Ainda, segundo o Prof. Paulo Mota Pinto, «a concessão de uma indemnização pela mera privação do uso, independentemente da prova de outros prejuízos patrimoniais, corresponde à posição dominante na generalidade dos países europeus, mas tal não significa que baste a faculdade abstracta de utilização, ignorando-se a concreta vontade ou possibilidade de utilização da coisa, por si próprio ou por interposta pessoa. É neste sentido, também, que deve (tentar) entender-se a posição da jurisprudência alemã, a qual pode ser assumida na máxima “a privação da possibilidade de uso é apenas uma fonte possível de dano, mas não já em si um dano”» (cfr. ob cit, p. 591, sublinhado nosso).
Volvendo ao caso em apreço, significa isto que, desconhecendo-se o valor locativo do imóvel e não se tendo demonstrado, por um lado, que a sua ocupação pelos RR foi a causa de os AA haverem recorrido a favores de familiares quando vinham a Portugal nem, por outro, o seu propósito (logo também a frustração deste) de realização de obras no prédio (cujas condições de habitabilidade seriam, à luz da matéria de facto provada, muito discutíveis), ficaram por provar as concretas vantagens e utilidades que os lesados deixaram de perceber mercê da actuação dos RR. E não constituindo a mera privação do uso – melhor se diria, a mera privação da possibilidade de uso (que não deve ser confundida com a privação do uso…) - um dano patrimonial só por si indemnizável, desacompanhado da demonstração das concretas e efectivas utilizações que a coisa proporcionava ou era susceptível de proporcionar e que a ocupação fez frustrar, forçoso é concluir que falece um dos pressupostos da responsabilidade civil, ou seja, o dano. Dano que, como se sabe, na sua vertente patrimonial – porque só esta está neste momento em causa – exprime uma diferença entre o valor real e efectivo do património do lesado e o valor que esse mesmo património teria sem o evento lesivo (valor hipotético, portanto) - (art. 564º nº2 CC). Ora, tal diferença só pode ser encontrada se o uso ou gozo tiver um valor material concreto, não um valor abstracto; ou seja, quando a sua privação se traduza num dano emergente (prejuízo causado) ou num lucro cessante (benefícios frustrados). O uso pressupõe uma utilização e a impossibilidade (concreta) desta analisa-se ou numa diminuição patrimonial ou numa frustração de aumento do património; é nesta diferença patrimonial concreta e efectiva, resultante quer da diminuição, quer do não aumento, que consiste o dano da privação do uso. Logo, não havendo uso, isto é, aproveitamento das vantagens económicas proporcionadas pela coisa, inexistirá obviamente dano da respectiva privação. E por e para isso é que o Tribunal carece de conhecer, quando está em causa a privação de uso e dando por assente tratar-se de um dano patrimonial, se aquela privação redundou concretamente num dano emergente ou num lucro cessante, para apurar o valor dos mesmos, pois a indemnização visa precipuamente reconstituir - por equivalente pecuniário, na impossibilidade óbvia de reconstituição natural - a situação hipotética que existiria se não tivesse ocorrido o facto ilícito e o dano, (art. 562º e 563º CC). Concluindo, pois: A privação do uso (ou da possibilidade de uso) só constitui dano ressarcível mediante a referenciação às concretas e efectivas utilidades atingidas ou cuja fruição se frustrou; só assim se concretizará tal dano em termos de susceptibilidade da medição através da teoria da diferença (art. 566º nº2 CC); o dano normativo da privação do uso – isto é, sem consideração daquelas utilidades - é meramente abstracto e não exprime uma diferença entre situações patrimoniais, a menos que seja concretizado e explicitado em factos reveladores do prejuízo e dos benefícios frustrados em que consistiu a impossibilidade de gozo.
Considerando que sobre os AA, como lesados, impendia o ónus de prova dos factos constitutivos do seu direito e que estes se analisavam na demonstração quer do valor locativo, quer dos seus propósitos relativamente ao uso e fruição do imóvel quer ainda das razões da frustração destes, o insucesso desta prova determinaria a improcedência da pretensão indemnizatória pelo dano da privação do uso (art. 342º nº1 CC). Ora, é certo que o nº3 do art. 566º CC permite o recurso à equidade se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos – o que seria eventualmente o caso. Mas nem com a equidade seria possível fixar o valor da indemnização; com efeito, o pressuposto da fixação equitativa da indemnização é a existência de limites quantitativos provados: “se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente, dentro dos limites que tiver provados”. E, no caso ema apreço (concedendo a existência do dano da privação do uso), não estão provados quaisquer valores dentro de cujos limites se pudesse arbitrar um valor (equitativo) de indemnização pelo uso. A inexistência de elementos factuais consistentes para quantificar ou balizar a indemnização inviabiliza, portanto, o recurso à equidade nos termos do art. 566º nº3 CC. Escreveu-se, a este propósito, no Ac STJ de 28-10-2010 (Rel Lopes do Rego), referindo-se à revisa do recurso à equidade do nº3 do art. 566º CC: “A previsão contida no referido preceito legal supõe, na verdade, o preenchimento de duas condições ou requisitos: não estar determinado apenas o «valor exacto» do dano mas terem sido provados «limites» , máximo e mínimo, para esse dano – que não podem considerar-se verificadas quando, no momento do julgamento, ocorre uma essencial indefinição acerca do valor real do dano material sofrido, pressupondo a formulação do juízo complementar de equidade uma base factual minimamente sólida e consistente sobre os valores indemnizatórios em causa…”.
Depois, desconhecem-se por inteiro as razões da fixação do valor da indemnização naquele montante, não bastando para tal a mera redução do valor do pedido para tal valor… Sob pena de a equidade se confundir com arbitrariedade, será sempre legítimo perguntar porquê esse valor e não qualquer outro? Quer dizer: a Relação que já não andou bem ao autonomizar a ressarcibilidade do dano abstracto da privação do uso, continuou a andar mal ao arbitrar a indemnização em valor alegadamente equitativo, mas sem fundamentar a equidade de tal julgamento, aceitando como bom e equitativo o valor para o qual os AA haviam reduzido o pedido… Mas perguntamos: Não funcionando a equidade, será de decretar uma condenação genérica? Prescreve o art. 661º nº2 CPC que se não houver elementos para fixar o objecto ou a quantidade o tribunal condenará no que vier a ser liquidado. Subjacente a tal preceito está a demonstração da existência dos danos, mas o desconhecimento do respectivo valor, a condenação em valor genérico a liquidar ulteriormente pressupõe a demonstração daquele e dúvidas quanto à sua quantificação (cfr. Ac STJ 20-11-2012, 176/06.3TBMTJ.L1.S2, Rel. Fonseca Ramos). E, no caso sub júdice, como flui do exposto, não foram provados os danos concretos invocados. II - No enriquecimento por intervenção, o dano patrimonial do lesado pode não existir nas hipóteses de utilização de bens alheios. IV - Mesmo que o proprietário nenhum proveito tirasse dos bens, sempre o intrometido estará obrigado a indemnizá-lo, restituindo-lhe o "valor da exploração". V - Apesar de o lesado entender que os factos alegados integram um caso de responsabilidade civil e não de enriquecimento, nada impede que o Tribunal, na falta de dano reparável, ordene a restituição do montante do enriquecimento. VI - Ocupando a intrometida um imóvel sem título, deverá ser condenada a pagar à proprietária o valor do uso de que ilegitimamente beneficiou, de acordo com as regras que disciplinam o enriquecimento sem causa. VII - É que, a procedência do pedido indemnizatório não está dependente da prova de qualquer dano sofrido pela proprietária do imóvel, mas apenas da prova de que a intrometida o usou, sem título legítimo. O âmbito de aplicação da sanção pecuniária compulsória legal do art. 829º-A nº4 é constituído por todas as obrigações pecuniárias de soma ou quantidade, contratuais ou extracontratuais. “Outro alcance e sentido não podem ser dados à disposição legislativa que não este: quer a sentença de condenação recaia sobre uma soma em dinheiro, cujo montante está estipulado contratualmente, quer a soma em dinheiro a pagar seja determinada pela própria decisão da justiça — como acontece na obrigação de indemnização, fixada em dinheiro, resultante da responsabilidade civil extracontratual, a qual, no momento da fixação do quantum respondeatur, se converte de dívida de valor em obrigação pecuniária — são automaticamente, de direito, devidos juros à taxa de 5% ao ao ano, desde o trânsito em julgado da sentença condenatória” (cfr. Calvão da Silva, Sanção Pecuniária Compulsória”, BMJ, 359-101).
E, justificando a sua divergência com o Prof. A. Varela, continua o Prof. Calvão da Silva: “Não há razões válidas que aconselhem uma interpretação restritiva, pois o espírito da lei é bem claro, sem qualquer traição da sua letra: prescrever uma sanção pecuniária compulsória legal para as hipóteses em que se trate de obrigações ou de simples pagamentos a efectuar em dinheiro corrente» (n.° 5 do preâmbulo do Decreto-Lei n.° 262/83), «quando for estipulado ou judicialmente determinado qualquer pagamento em dinheiro corrente» (primeira parte do n.° 4 do artigo 829 .°-A)”. “A intenção da lei, como acabámos de ver, foi claramente a de abranger todas as obrigações pecuniárias, com o legislador a dizer o que quer no texto legal. E a colocação do preceito só deveria ser feita noutro lugar do sistema, nomeadamente no artigo 806.°, se o adicional de juros tivesse natureza indemnizatória . Como, porém, reveste carácter coercitivo e é autónomo _ e independente da indemnização, com esta cumulável, a sua colocação no artigo 806.°, que fixa o montante da indemnização no caso de não cumprimento das obrigações pecuniárias, não seria sistematicamente correcta. Já é sistematicamente correcta a sua inserção no artigo que consagra inovadoramente a sanção pecuniária compulsória (artigo 829.°-A), embora se deva sublinhar a quebra de -harmonia no sistema provocada pela prescrição do referido adicional, face à subsidiariedade da sanção pecuniária compulsória judicial. Por conseguinte, parece não poder deixar de entender-se que a sanção pecuniária compulsória legal prescrita no n.° 4 do artigo 829 .°-A (adicional de juros de 5% ao ano) se aplica a todas as obrigações pecuniárias, contratuais ou extracontratuais”.
Para além disto, a aplicação de tal sanção é oficiosa, não carecendo mesmo de ser pedida na acção declarativa, como se depreende da expressão “são automaticamente devidos juros à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença de condenação transitar em julgado”, como entendeu o Ac STJ de 14-07-2009 (Proc. nº 630-A/1996.S1, Rel. Fonseca Ramos). Consequentemente, ao invés do entendimento da 1ª instância e tal como a Relação deliberou mas sem qualquer fundamentação, sobre o montante indemnizatório devido à Autora a título de danos não patrimoniais - € 1.500,00 euros – serão automaticamente juros a taxa de 5% ao ano desde a data do trânsito do presente acórdão, os quais acrescerão aos juros de mora que forem devidos à taxa legal. Como é óbvio, os juros compulsórios serão devidos apenas relativamente a obrigações líquidas e não também a obrigações ilíquidas, como in casu acontece com o valor da restituição do enriquecimento cuja liquidação foi relegada para momento ulterior em incidente de liquidação (art. 378º nº2 e 661º nº2 CPC). ACÓRDÃO Pelo exposto, acorda-se neste STJ em conceder parcialmente a revista e, revogando parcialmente o acórdão recorrido, condenar solidariamente os RR BB, EE e FF, aquela por si e como sucessora e estes como sucessores de AA e até as forças da respectiva herança: - a pagarem aos AA, a quantia correspondente ao valor locativo do prédio no período compreendido entre Outubro de 1998 e Setembro de 2007 – pendência da acção de reivindicação e respectivos recursos – a liquidar ulteriormente em incidente de liquidação e até ao limite máximo de € 6.345,00 euros; - a pagarem a CC a quantia de € 1.500,00 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal; - a pagarem juros compulsórios à taxa de 5% ao ano, sobre este valor de € 1.500,00 euros desde a data do trânsito em julgado do presente acórdão e até integral pagamento e sobre o valor que vier a ser fixado naquela liquidação desde a data do respectivo trânsito em julgado e também até integral pagamento. Custas por recorrentes e recorridos na proporção dos respectivos decaimentos. Lisboa e STJ Os Conselheiros Fernando Bento João Trindade Tavares de Paiva |