Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07P015
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: SIMAS SANTOS
Descritores: RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
CONCLUSÕES DAS INSTÂNCIAS
DIREITO AO SILÊNCIO
PEDIDO CÍVEL
REJEIÇÃO PARCIAL
Nº do Documento: SJ200702150155
Data do Acordão: 02/15/2007
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Área Temática: DIR PENAL * DIR PROC PENAL
Sumário : 1 – Resulta da Revisão de 1998 do CPP, que o Supremo Tribunal de Justiça foi restituído à sua qualidade de Tribunal de revista que conhece exclusivamente da matéria de direito, com a excepção dos recursos trazidos de decisões finais do tribunal de júri e das decisões em que as Relações funcionam como tribunais de 1.ª Instância.
2 – Nos restantes casos, o Supremo Tribunal de Justiça não conhece da questão de facto que lhe seja colocada pelos recorrentes, o que não o impede de oficiosamente declarar, se for o caso, a existência de qualquer dos vícios do n.º 2 do art. 410.º do CPP, que impossibilitam a definição da aplicação do direito, por insuficiente ou inadequada matéria de facto.
3 – As conclusões ou ilações que as instâncias extraem da matéria de facto são elas mesmo matéria de facto que escapam à censura do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, salvo se em vez de desenvolverem a matéria de facto a alteram, o que não vem sequer invocado.
4 – O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções. O recurso às presunções naturais não viola o princípio in dubio pro reo, pois elas cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto, pelo que aquele princípio constitui o limite àquele recurso.
5 – É ao recorrente que compete apresentar as razões da sua discordância com a qualificação jurídica dos factos, não cabendo ao Tribunal ad quem substituir-se ao recorrente na procura de eventuais razões de discordância.
6 – Mesmo quando o recorrente não ponha operativamente em causa a incriminação definida pelas instâncias, não pode nem deve o STJ – enquanto tribunal de revista e órgão, por excelência e natureza, mentor de direito – dispensar-se de reexaminar a correcção das subsunções, pois constitui núcleo essencial da função de julgar, o enquadramento jurídico dos factos apurados, a determinação do direito, pelo que não está limitada por errado enquadramento que haja sido feito pelos interessados ou pelas partes.
7 – Se o arguido agiu animado por um sentimento de raiva, porque estava convencido que este tinha um envolvimento amoroso com a sua anterior namorada, não agiu por motivo fútil. Se é certo que o propalado “ciúme” não surge como um motivo nobre e socialmente aceite como desculpabilizante de um crime contra o sujeito que se deseja ou sobre o rival, o estado de raiva em que colocou o recorrente e em que este agiu, afasta o motivo fútil, que é o “motivo sem motivo”, a sem razão que permita compreender psicologicamente a acção.

8 – A circunstância de o arguido em julgamento se haver remetido ao silêncio não pode ser valorada em seu desfavor, na certeza de que o fez no exercício de um direito – art. 343.º, n.º 1, do CPP, mas, como vem alertando o Supremo Tribunal de Justiça, a opção pelo silêncio pode ter consequências, que não passam pela sua valorização indevida. O mesmo já fez também o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, tendo presente o art. 6.º da CEDH e a propósito do silêncio do arguido e das presunções judiciais.
9 – Num crime de homicídio simples, mostra-se adequada a pena de 14 anos de prisão, quando:
– o arguido tinha apenas 20 anos de idade à data dos factos, e estava social e familiarmente inserido (vive com a mãe), apesar da instabilidade afectiva decorrente da recente separação da sua companheira e mãe do filho de ambos (separação que esteve na origem dos factos ilícitos cometidos), com emprego, (trabalhava como caixa de um parque de estacionamento, auferindo cerca de 600/700 mensais), tem o 8º ano de escolaridade, não regista antecedentes criminais, sempre considerado pelos amigos e tido como uma pessoa pacífica, não lhe sendo conhecidos hábitos de violência;
– é elevada a ilicitude, em especial por causa do modo de execução (de que se destacam as 26 facadas desferidas sobre a vítima, várias delas na cabeça), sendo a vítima amigo de infância do arguido.
10 – Se nas conclusões e texto da motivação o recorrente se limita a pedir a diminuição do montante da indemnização sem indicar qualquer razões, nem particularizar sequer a que parte da indemnização se refere, não deve ser convidado a corrigir as conclusões e o recurso deve, nessa parte, ser rejeitado por insuficiência de motivação.
Decisão Texto Integral: 1.
O tribunal Colectivo da 1ª secção da 5.ª Vara Criminal de Lisboa (Proc. n.° 917/04.3PVLSB) condenou o arguido JCCS, como autor do crime de homicídio qualificado dos arts. 131.° e 132.°, n.°s 1 e 2, als. d) e i), do C. Penal, na pena de 20 anos de prisão e a pagar à assistente MMRMF, mãe da vítima, a quantia de 101,785.00 , a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento

Inconformado com esta decisão condenatória, dela recorreu o arguido para a Relação de Lisboa pedindo a sua revogação e a respectiva absolvição, ou, subsidiariamente, a atenuação extraordinária da pena, suspendendo-se a pena de prisão a aplicar ou, ainda, fosse reconhecida a existência de vício do n.° 2 do art. 410.° do CPP, reenviando-se o processo para novo julgamento.

A Relação de Lisboa (proc. n.º 7217/06-5), por acórdão de 24.10.2006 decidiu julgar parcialmente procedente o recurso e condenar o arguido como autor do crime de homicídio qualificado dos art.ºs 131.º e 132.º, als. i) do C. Penal, na pena de 18 anos de prisão, bem como no pagamento da indemnização cujo montante foi reduzido para 86.785,00 , acrescido de juros de mora à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento, no mais confirmando a decisão recorrida.

Ainda inconformado recorre para este Supremo Tribunal de Justiça, concluindo na sua motivação:

1 - O douto acórdão recorrido é de ser censurado pois ajuizou mal da prova produzida em audiência de julgamento e ainda depois da decisão da RELAÇÃO (que desde logo alterou a medida da pena) fazendo ainda uma incorrecta qualificação dos factos e consequentemente uma excessiva determinação da pena.

2 - O Tribunal de Comarca não fez boa apreciação e utilização da prova produzida em audiência de julgamento e demais elementos de prova valoráveis constantes do processo, erro em que o Tribunal da Relação reincidiu ao apreciar o recurso interposto, não ponderando nos termos constitucionais de um princípio de legalidade não deveria de ser aplicada ao arguido qualquer pena.

3 - O Tribunal da Relação manteve como provados actos que o arguido não cometeu e comportamentos que lhe não são imputáveis, designadamente os que tipificam a conduta punível nos termos da norma incriminadora pela qual o arguido foi punido (Homicídio)

4 - A sua interpretação extrapola as regras do princípio da livre apreciação da prova sustentando-se em meras presunções, meios lógicos ou mentais sem suporte na prova disponível no processo, e colhida e em audiência de julgamento, qualificando ainda tal ilícito (Homicídio Qualificado)

5 - O tribunal recorrido e mesmo a 1ª instância consideraram indirectamente que o exercício do direito ao silêncio seria negativa.

6 - Violou um principio constitucional do art. 32 ° C’RP, além disso e entre outros também o disposto nos artigos 40.º, 50.º, 70.º a 74.º todos do Código Penal.

7 - Deveria o tribunal da RELAÇÃO ter determinado pena igual para o recorrente e co-arguidos suspensas na sua execução

8 - Deveria o Tribunal da RELAÇÃO ter determinado PENA INFERIOR E SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DA PENA APLICADA AO ARGUIDO determinando a aplicação do instituto do art. 50.° da CP, nada desabonando em seu prejuízo

9 - Deverá pois ser o ACORDÃO REVOGADO e em sua substituição ser determinado pena ao recorrente em último caso suspensa na sua execução e se esse for o entendimento da sua responsabilidade criminal.

10 - Deverá ainda ter em consideração a redução efectiva do pedido de indemnização civil para 3.5000 .

Respondeu o Ministério Público, que concluiu:

Em conclusão, será de considerar:

– ter-se limitado o recorrente a reeditar questões cuja apreciação colocara já quando impugnara o acórdão proferido na 1 Instância, através do recurso por si interposto para o Tribunal da Relação, em razão do que existe carência de objecto do recurso interposto para o S.T.J., geradora da consequência do seu não conhecimento, impondo-se a sua rejeição;

– ter a lei sido aplicada e a prova valorada em conformidade com os poderes de cognição do Tribunal da Relação;

– não padecer o acórdão recorrido de falta de fundamentação, insuficiência, erro de apreciação, omissão ou qualquer ou qualquer nulidade/irregularidade;

– ter sido dado cumprimento integral ao disposto no art.127 do C.P.P., não se registando violação do estatuído nos arts.410°., n°.2, 374°. e 379°. do C.P.P.;

– porém, face à matéria de facto dada como provada – a respeito da qual inexistem razões para aplicação do princípio in dubio pro reo, por ter tal prova sido apreciada de acordo com a lei, não se tendo colocado qualquer dúvida ao Tribunal –, ter o arguido cometido um crime de homicídio simples p. e p. pelo art.131°. do Código Penal a que corresponde moldura penal abstracta cujo limite máximo é de 16 anos de prisão;

– tendo presentes os preceitos legais convocáveis em matéria de fixação do “quantum” da pena, mormente os arts.40°. e 71°. do Código Penal – com especial destaque para a forma brutal como o crime foi cometido – dever consequentemente ao arguido/recorrente ser imposta pena de prisão em medida próxima de tal limite máximo, se não mesmo com ele coincidente, por se entender ser a mesma justa e adequada à prossecução dos fins punitivos, face à culpa do recorrente e à gravidade do crime;

– o acórdão recorrido não merecer qualquer censura, no que tange às demais questões suscitadas, concedendo-se provimento ao recurso interposto pelo arguido, tão-somente no que tange à subsunção jurídica da sua respectiva conduta, nos termos expostos.

Distribuídos os autos a 4.1.2007 neste Tribunal, teve vista o Ministério Público.

Colhidos os vistos teve lugar a audiência. O relator situou o objecto do recurso e lembrou as questões colocadas em recurso e indicou duas outras que entendia deverem ser abordadas: saber se., a ser inoperante a impugnação da qualificação jurídica, ainda assim o Supremo Tribunal de Justiça poderia conhecer dela oficiosamente e se não haveria insuficiência de motivação quanto à impugnação da indemnização civil.

Em alegações orais, o Ministério Público referiu, em síntese, que não cabe ao Supremo Tribunal de Justiça apreciar a impugnação da matéria de facto, que já o foi minuciosamente na Relação; que a questão da qualificação jurídica não foi devidamente colocada pelo arguido; mas que oficiosamente a questão pode ser abordada pelo Supremo Tribunal de Justiça, e admitindo que se conclua pela prática de um crime de homicídio simples, a pena deve ser fixada em 14 anos de prisão.

A Assistente sustentou a decisão recorrida, entendendo que não há verdadeira motivação quanto à impugnação do pedido de indemnização.

Já a defesa limitou-se a remeter para a motivação do recurso.

Cumpre, pois, conhecer e decidir.

2.1.

E conhecendo.

Suscita o recorrente as seguintes questões:

— Impugnação da decisão de facto (conclusões 1.ª a 5.ª)

— Qualificação jurídica da conduta (conclusões 3ª e 4.ª)

— Medida da pena (conclusões 7.ª a 9.ª)

— Montante da indemnização civil fixada (conclusão 10.ª)

Vejamo-las, começando pela que concerne com factualidade apurada pelas instâncias.

Impugnação da decisão de facto.

Sustenta o recorrente que a 1.ª Instância não fez boa apreciação e utilização da prova (produzida em audiência de julgamento e constante do processo), erro em que o Tribunal da Relação reincidiu, não ponderando que, nos termos constitucionais de um princípio de legalidade, não deveria ser aplicada ao arguido qualquer pena. (conclusão 2), pois manteve como provados actos que o arguido não cometeu, correspondentes ao crime de homicídio (conclusão 3).

Defende, ainda, que foram violadas as regras do princípio da livre apreciação da prova sustentando-se em meras presunções, meios lógicos ou mentais sem suporte na prova disponível e a colhida em julgamento, para mais qualificando o crime como de homicídio qualificado (conclusão 4), tendo considerado “indirectamente que o exercício do direito ao silêncio seria negativa” (conclusão 5), com violação de um princípio constitucional do art. 32 ° CRP (conclusão 6).

Sucede, porém que a questão de facto já está, neste momento e no recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, definitivamente arrumada.

Com efeito, resulta da Revisão de 1998 do CPP, que o Supremo Tribunal de Justiça foi restituído à sua qualidade de Tribunal de revista que conhece exclusivamente da matéria de direito, com a excepção dos recursos trazidos de decisões finais do tribunal de júri e das decisões em que as Relações funcionam como tribunais de 1.ª Instância.

Nos restantes casos, o Supremo Tribunal de Justiça não conhece da questão de facto que lhe seja colocada pelos recorrentes, o que não o impede de oficiosamente declarar, se for o caso, a existência de qualquer dos vícios do n.º 2 do art. 410.º do CPP, que impossibilitam a definição da aplicação do direito, por insuficiente ou inadequada matéria de facto.

O que é ainda mais claro quando, como no caso, o recorrente já beneficiou de um efectivo duplo grau de jurisdição em matéria de facto, uma vez que já colocou perante a Relação as suas críticas à matéria de facto apurada na 1.ª Instância, críticas que aquele Tribunal Superior apreciou com detalhe, e que o recorrente mesmo agora se dispensa de abordar, remetendo-se para generalidades.

Depois, deve notar-se que o recorrente impugna o uso feito pelas instâncias do princípio da livre apreciação da prova, matéria que esteve sempre arredada do conhecimento do Supremo Tribunal de Justiça, mesmo no âmbito da “revista alargada” (ao conhecimento dos vícios do n.º 2 do art. 410.º) e, assim, nem anteriormente à revisão de 1998 poderia ser apreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Quanto às presunções de que fala o recorrente na conclusão 4.ª importa notar, em síntese, que, como se refere no AcSTJ de 21/10/2004 (proc. n.º 3247/04-5, com o mesmo relator), as conclusões ou ilações que as instâncias extraem da matéria de facto são elas mesmo matéria de facto que escapam à censura do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, salvo se em vez de desenvolverem a matéria de facto a alteram, o que não vem sequer invocado.

Depois, e como aí se esclarece, o sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções. O recurso às presunções naturais não viola o princípio in dubio pro reo. Elas cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto, pelo que aquele princípio constitui o limite àquele recurso.

Não cabe, pois a este Supremo Tribunal de Justiça a censura da factualidade apurada pedida pelo recorrente, sendo certo que oficiosamente lhe não encontra qualquer vício.

2.2.

É a seguinte a matéria de facto assente pelas instâncias e que se deve atender neste recurso:

Durante cerca de dois anos e meio, o arguido manteve com ISASR uma relação amorosa, fruto da qual nasceu, em 17/08/04, JDAC, filho de ambos.

Durante essa relação amorosa, o arguido e ISASR viveram juntos durante cerca de um ano, até sensivelmente ao final desse mesmo mês de Agosto de 2004, data em que tal relação terminou, por iniciativa da Inês Roque, que considerava o arguido muito ciumento.

O arguido nunca se conformou com esta separação.

Porque no início do mês de Outubro de 2004 se constou na zona do Cais do Sodré que AJMF teria um relacionamento amoroso com a ISASR, em dia não apurado desse mesmo mês o arguido perguntou àquele, seu amigo há pelo menos mais de dez anos, se tal correspondia à verdade, o que por aquele foi negado.

Todavia, no dia 24/10/04, data em que a aludida ISASR fez 17 anos de idade, após uma festa de comemoração de tal aniversário realizada em casa de PFPP, sita na Travessa de Remolares, n.º 11, 3.º esq. em Lisboa, a referida ISASR e o mencionado AJMF, após saírem de tal festa, envolverem-se amorosamente nas escadas de tal prédio e aí tiveram uma relação sexual.

No dia 04/11/04, no Jardim Amália Rodrigues, em Lisboa, situado por cima do parque de estacionamento, junto à Rua Marquês da Fronteira e adjacente ao Parque Eduardo VII, a hora não concretamente determinada mas seguramente depois das 20.00, ali se encontrando o arguido e o aludido Artur Ferreira, o arguido agarrou numa faca cujas características concretas não foi possível apurar, mas com uma lâmina de pelo menos cerca de 10 cm de comprimento e 3 cm de largura de base e com ela, animado de um sentimento de raiva, desferiu no corpo de AJMF os seguintes golpes corto-perf’urantes:

a) um na região infra clavicular direita vertical, com cerca de 2,5 cm de diâmetro, em movimento muito ligeiramente de diante para trás, da direita para a esquerda e de cima para baixo;

a) um na região dorsal esquerda, a 9 cm da linha média, com cerca de 3 cm de comprimento, em movimento de trás para diante, ligeiramente da direita para a esquerda e de baixo para cima

c) um na região lombar esquerda, oblíquo para baixo e para fora, com cerca de 5 cm de comprimento, em movimento de trás para diante, ligeiramente da direita para a esquerda e horizontal

d) um na região cervical posterior mediana, com cerca de 4,5 cm de comprimento, era movimento de trás para diante, ligeiramente da direita para a esquerda e horizontal

e) um na região cervical posterior direita, com 2 cm de comprimento, a 4.5 cm para baixo do pavilhão auricular;

f) outros dois na região cervical posterior direita, com 2 e 1 cm, respectivamente

g) um outro na região cervical posterior direita inferior, com 2 cm de comprimento

h) um na região cervical posterior mediana esquerda com cerca de 4,5 cm de comprimento

i) um na região cervical posterior esquerda, com cerca de 3 cm de comprimento

j) um na região cervical latero-posterior esquerda, de base interna oblíqua para baixo e para diante, com cerca de 2 cm de comprimento

k) um na região inter escapular superior mediana, com cerca de 2 cm de comprimento

1) um na região inter escapular esquerda. oblíquo para baixo e para dentro, com cerca de 6 cm de comprimento

m) um na região externa do braço direito, na transição do terço superior com o médio, com cerca de 2 cm de diâmetro

n) um no bordo superior do ombro esquerdo, com 3 cm de comprimento e

o) um na região malar esquerda, oblíquo para baixo e para dentro, com cerca de 1,5 cm de diâmetro.

e os seguintes golpes cortantes

p) um no couro cabeludo, na região parietal posterior à direita, com 8 cm de comprimento;

q) um no couro cabeludo, na região occipital superior mediana, com 9 cm de comprimento;

r) um no couro cabeludo, na região occipital inferior mediana, com 7 cm de comprimento:

s) um no couro cabeludo, na região occipital à direita, com 2 cm de comprimento;

t) um na região infra orbital direita, oblíquo para baixo e para fora, com cerca de 2 cm de comprimento;

u) um na primeira prega inter digital da mão direita, com cerca de 3 cm de comprimento;

v) três na face palmar das primeiras falanges dos 30, 4° e 5° dedos da mão direita, com cerca de 1.5cm cada

w) um no ângulo direito da mandíbula à direita, oblíquo para baixo e para diante, com cerca de 2 cm de comprimento.

Como consequência directa e necessária das agressões descritas, sofreu AJMF:

– com o golpe descrito supra em a), ferida de natureza corto-perfurante dos músculos intercostais do 1 °espaço junto ao bordo direito do esterno, dos músculos da base do pescoço à direita, laceração da artéria subclávia direita e hemotórax à direita de cerca de 750 c.c., com infiltração hemorrágica dos músculos supra e infra claviculares esquerdos;

– com o golpe descrito supra em b), ferida de natureza corto-perfurante dos músculos intercostais do 10°espaço posterior, do lobo inferior do pulmão esquerdo, laceração do diafragma à esquerda, bem hemotárax à esquerda de cerca de 250 c.c. e ferida parcial dos músculos intercostais do 8°espaço anterior esquerdo

– com o golpe descrito supra em c), ferida de natureza corto-perfurante dos músculos longos dorsais a esse nível e do músculo spoas à esquerda

– com o golpe descrito supra em d). ferida de natureza corto-perfurante dos músculos longos dorsais a esse nível e fractura das lâminas esquerdas de C5 e C6 e

– com o golpe descrito supra em p), infiltração hemorrágica do couro cabeludo e aponevrose epicraniana nas regiões occipital e parietal esquerda, e fractura da calote craniana no osso parietal posterior esquerdo nas tábuas externa e interna, com escassa infiltração hemorrágica das leptomeninges na base dos lobos frontais, lesões examinadas e descritas no relatório de autópsia médico-legal constante de Eis. 442/448, que aqui se dá como integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, tendo os golpes descritos em a). b), c) e d), determinado directa e necessariamente a morte de AJMF.

Após assim ter actuado, o arguido procurou esconder o corpo de AJMF, que se encontrava em posição de decúbito ventral, por debaixo de uns ramos de árvores secos, os quais colocou por cima de tal corpo, numa área do referido Jardim onde termina a relva e se inicia uma zona de pequenas árvores e arbustos, deixando no local, junto ao corpo, pelo menos, um saco plástico de cor preta e tamanho grande.

Posteriormente nessa noite, o arguido encontrou-se com uns seus amigos na zona do Cais do Sodré, contando-lhes então a história que havia estado com o AJMF no estabelecimento denominado «Recife» e que à saída do mesmo haviam surgido uns indivíduos de raça negra a perguntar pelo AJMF e pelo «Paulo Grande», sendo que o AJMF havia conseguido fugir, não sabendo no entanto qual teria sido o seu destino.

Sabia o arguido que o mencionado AJMF e PFPP, conhecido por «Paulo Grande», haviam tido, dias antes, problemas com uns indivíduos de raça negra.

Ainda nessa noite, o arguido deslocou-se à residência do dito «Paulo Grande», onde voltou a contar a este a mesma história.

O cadáver de AJMF veio a ser descoberto no dia seguinte, 05/11/04 (no acórdão da 1.ª instância escrevera-se 05/11/05 lapso corrigido pela Relação), cerca das 12.00, por LMGA, electricista de umas obras de construção civil que decorriam sobre o espaço do referido parque de estacionamento, que de imediato alertou as autoridades policiais.

Junto ao cadáver de AJMF foi encontrado o saco plástico supra mencionado, bem como uma pá, de formato quadrangular, marca «Bul jota» que eram pertença da empresa detentora do referido parque de estacionamento e que havia sido retirada das instalações deste e ainda um gorro.

O arguido trabalhava então, como caixa, no dito parque de estacionamento.

No dia 05/11/04, pelas 19.28, do telemóvel n° 964393360, foi enviada para o telemóvel do dito «Paulo Grande», com o n° 966538224, uma mensagem com o seguinte teor: «filho da puta, já apanhámos o AJMF sabemos onde moras ele xibou-se todo, tas fodido meu cabrão, vou-te cortar o pescoço».

O arguido desferiu os golpes descritos sobre o corpo de AJMF porque estava convencido que este tinha um envolvimento amoroso com a já mencionada ISASR.

Ao empunhar a referida faca, cujas características bem conhecia e ao vibrar com a mesma os golpes supra descritos no corpo de AJMF, efectuados em zonas do corpo onde se alojam órgãos vitais, o que bem sabia, agiu o arguido movido pelo propósito de lhe tirar a vida, o que efectivamente aconteceu, revelando baixeza de carácter pelo motivo que o levou a praticar tal crime.

O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo ser a sua conduta proibida e punida por lei.

AJMF faleceu no estado de solteiro sem descendentes.

A assistente é mãe de AJMF.

O arguido e AJMF eram frequentadores do mesmo bairro e tinham um círculo de amigos em comum.

AJMF tinha, à data da sua morte, 23 anos de idade.

Residia com a sua avó materna e com um irmão mais velho, NFF de 27 anos de idade.

A avó de NFF tem 80 anos de idade e padece de uma doença que lhe afecta a locomoção e capacidade de mobilidade, sendo que era aquele que, muitas vezes, a ajudava e auxiliava em actos da sua higiene diária.

Por vezes, era também NFF quem se ocupava da limpeza e arrumação da casa e da própria confecção de refeições para si e para a avó.

O já referido irmão de AJM, NFF, é doente esquizofrénico e epiléptico, acompanhado clinicamente pelos médicos do Hospital Miguel Bombarda, sendo submetido a internamentos periódicos e a regime ambulatório diurno e era muitas vezes AJMF quem o levava e o ia buscar àquele hospital.

A avó de AJMF, hoje, é acompanhada em regime de apoio domiciliário.

Para custear o funeral de AJMF, a assistente pagou 1,785.00 (mil setecentos e oitenta e cinco euros).

AJMF era um jovem saudável, solidário e muito devotado à família

Com a morte de AJMF ocorrida nas circunstâncias supra descritas, sofreu a assistente uma dor brutal.

No dia em que veio a falecer, AJMF, assistiu pela televisão, no café «Recife» a, pelo menos, parte do jogo Benfica/Estugarda, que foi transmitido pela Sport Tv e cuja transmissão terminou às 19.06, tendo saído do dito café após o fim da mesma.

O arguido, como caixa do mencionado parque de estacionamento, auferia cerca de 600/700 mensais.

Vive com a mãe e tem um filho, que é o supra referido JDAC, decorrente da sua relação com ISASR e que reside com esta.

Tem o 8° ano de escolaridade.

Não regista antecedentes criminais.

Era considerado pelos seus amigos e também estes, amigos do falecido AJMF, uma pessoa pacífica, ao qual não lhe eram conhecidos hábitos de violência.

A sua longa amizade com o falecido AJMF era conhecida por muitos amigos e conhecidos de ambos da zona do Cais do Sodré.

Factos não provados:

Não se provou, do constante da acusação e do pedido de indemnização civil, que:

O arguido tenha tido conhecimento que AJMF e a ISASR haviam mantido relações sexuais e que por isso tenha formulado o plano de tirar a vida a AJMF.

De acordo com o plano que formulou de tirar a vida a AJMF, o arguido, no dia 03/11/04. se tenha munido da faca atrás mencionada e que na posse da mesma, se tenha dirigido para o referenciado Jardim Amália Rodrigues e aí a tivesse escondido por debaixo de uns arbustos existentes nesse jardim, junto às obras de construção civil que ali decorriam.

No dia 04/11/04, um pouco antes das 19.00, na prossecução do plano previamente formulado e com vista a encontrar o AJMF e ali atrai-lo, o arguido se tenha deslocado a casa da avó deste, onde aquele também habitava, sita na Rua do Ferragial, n°29, 3° Dt., em Lisboa, não o tendo, contudo, aí encontrado.

De seguida, sabendo que AJMF o costumava frequentar, o arguido se tenha deslocado ao estabelecimento comercial tipo “snack-bar” denominado “Recife”, sito no Largo do Cais do Sodré, em Lisboa.

Ali tivesse chegado cerca das 19.00, e aí tivesse encontrado o AJMF, que estava a ver, através de transmissão televisiva, o jogo de futebol entre as equipas do Sport Lisboa e Benfica e do Estugarda e que se tivesse sentando junto deste.

Depois do termo de tal jogo, às 19.06, o arguido tenha saído para o exterior de tal estabelecimento e que tivesse abordado AJMF, solicitando que o acompanhasse até ao seu local de trabalho, dando como justificação, o que sabia não corresponder à verdade, que necessitaria de aí se deslocar para trazer umas camisas de trabalho que teria no seu cacifo e que precisariam de ser lavadas.

AJMF, convencido que o arguido apenas queria a sua companhia, tivesse acedido a este pedido e que ambos se tenham deslocado a pé até ao Largo do Corpo Santo, em Lisboa, onde, depois de terem esperado cerca de 5 minutos, tenham apanhado um táxi, no qual viajaram até ao alto do Parque Eduardo V na Rua Marquês da Fronteira, local onde o arguido pediu ao motorista de tal táxi que os transportasse.

Aí chegados, cerca de 20 minutos depois. o arguido e JMF tenham saído de tal veículo automóvel e seguido a pé ao longo do Jardim Amália Rodrigues, por cima do referido parque de estacionamento.

Ao passarem no local onde o arguido no dia anterior havia escondido a referida faca, este tenha começado a discutir com o AJMF, desferindo a seguir diversas chapadas na face deste e de seguida, ambos tenham caído ao solo.

Logo após, o arguido tenha agarrado na faca que previamente para o efeito ai havia escondido.

O arguido tenha desferido, primeiro e quando ainda ambos estavam no chão, num movimento rápido, com a dita faca, um golpe na zona lombar do AJMF.

O arguido, depois de ter tirado a vida a AJMF, tenha percorrido novamente o referido jardim e se dirigido a uns contentores próprios para transportar entulho, pertencentes ás referidas obras, que estavam colocados junto da escada 1 de acesso ao piso 1 do aludido parque de estacionamento, tendo então arremessado para o interior de um desses contentores a faca que havia utilizado momentos antes para tirar a vida a AJMF, descendo de seguida ao piso 1 desse parque de estacionamento, pela escada n° 2 de acesso ao mesmo e dali tenha retirado, junto a uma mangueira do sistema de incêndios, o saco plástico de cor preta e tamanho grande, que ai se encontrava, dentro de um saco azul e que acima se fez referência, bem como, de um caixote de areia, também próprio para o serviço de incêndios, uma pá de formato quadrangular, marca «Bul jota», com vista a, com tais objectos, ocultar o corpo da vítima AJMF,

Na posse de tal pá e sacos, o arguido, pelas mesmas escadas, tenha regressado ao local onde se encontrava o cadáver de AJMF e ali deixado a mencionada pá.

De seguida, o arguido, porque tivesse as mãos e o vestuário cobertos de sangue, e sabendo que no parque de estacionamento estava de serviço o seu colega JNPB, se tenha dirigido novamente a tal parque de estacionamento, entrando no mesmo pela rampa de acesso automóvel ao interior do parque, a que se acede a partir da Rua Marquês da Fronteira, pelo piso 1, descendo acto continuo a rampa conducente ao piso 0.

Aí chegado, se tenha dirigido para junto da recepção, onde se encontrava o referido JNPB tendo-lhe então dito que havia sido assaltado e que precisava de ajuda, pedindo-lhe de seguida a chave de acesso à sala técnica, onde tinha o seu cacifo.

Logo após, tenha entrado na casa de banho destinada aos deficientes, localizada no piso O, junto da recepção, e aí tenha lavado a face e as mãos, limpando-se de seguida com toalhetes de papel existentes nessa casa de banho e se tenha dirigido de seguida à sala técnica, sita no piso 1, onde tenha aberto o seu cacifo, e daí retirado umas calças, uma camisola e sapatos, que então vestiu, transportando depois os artigos de vestuário trocados até ao piso O, e os tenha lançado num caixote de lixo aí existente. De seguida, tenha convencido o JNPB a levá-lo a casa no carro deste, de matrícula 02-94-DO, marca e modelo Fiat Uno, e que tal tenha acontecido pelas 21.37.

A mensagem enviada pelo n° 964393360 para o telemóvel do mencionado «Paulo Grande», com o n° 966538224, tenha sido enviada pelo arguido, através do telemóvel de JNPB para conferir credibilidade à história por si inventada e que supra se referenciou.

Ao empunhar a referida faca e aos desferir com a mesma, no corpo de AJMF, os golpes supra referidos, o arguido tivesse agido de forma premeditada.

A mãe do assistente vivesse na exclusiva dependência do falecido AJMF e que a assistente, com a morte deste, se veja obrigada a contratar alguém que a possa ajudar nas tarefas que eram desempenhadas por aquele no que toca ao apoio, quer da referida avó, quer do seu irmãos, NFF.

2.3.

Qualificação jurídica da conduta

A crítica encetada pelo recorrente da qualificação jurídica efectuada pelas instâncias é, para ele, tributária sua discordância da matéria de facto por elas fixada (conclusão 1), por considerar que a Relação manteve como provados actos que ele não cometeu, designadamente os que tipificam o crime de homicídio (conclusão 3), que a sua interpretação extrapola as regras da livre apreciação da prova sustentando-se em meras presunções, sem suporte na prova, qualificando ainda o crime como de homicídio qualificado (conclusão 4).

Mas, como se viu, esta crítica cai pela base, pois, que não exerceu este Supremo Tribunal de Justiça a pretendida censura sobre a matéria de facto.

Aliás, nem o recorrente formula qualquer crítica a tal qualificação jurídica no quadro da factualidade tida por provada pelas Instâncias e que é de atender aqui.

Na verdade, também aqui se dispensa de demonstrar que não há homicídio ou que este não é qualificado, deixando, aliás, cair a pretensão de alteração da qualificação jurídica que formulara perante a Relação e que não retoma neste recurso.

E, como é óbvio, não cabe ao Tribunal ad quem substituir-se ao recorrente na procura de eventuais razões de discordância.

O que não significa que, se for o caso, não possa e deva oficiosamente indagar da correcção da qualificação jurídica da conduta, tanto mais que vem impugnada a medida concreta da pena.

Na verdade, como vem decidindo este Supremo Tribunal de Justiça (AcSTJ de AcSTJ de 08/02/2001, proc. n.º 2745/00-5, de 08/11/2001, proc. n.º 2243/01-5, de 13/12/2001, proc. n.º 3745/01-5 e de 17/01/2002, Acs STJ X, 1, 183, todos com o esmo relator) o acórdão uniformizador de jurisprudência n.° 4/95, de 7.6.95 (DR IS-A de 6-7-95 e BMJ n.º 448 pág. 107) que decidiu: "o Tribunal Superior pode, em recurso, alterar oficiosamente a qualificação jurídico-penal efectuada pelo tribunal recorrido, mesmo para crime mais grave, sem prejuízo, porém, da proibição da reformatio in pejus", e assento n.º 2/93 do STJ, em cuja senda aquele se situa, reformulado, na seguinte forma (Assento n.º 3/2000, 15-12-1999, DR IS-A de 11-2-2000.): "Na vigência do regime dos Códigos de Processo Penal de 1987 e de 1995, o tribunal, ao enquadrar juridicamente os factos constantes da acusação ou da pronúncia, quando esta existisse, podia proceder a uma alteração do correspondente enquadramento, ainda que em figura criminal mais grave, desde que previamente desse conhecimento e, se requerido, prazo, ao arguido, da possibilidade de tal ocorrência, para que o mesmo possa organizar a respectiva defesa." fundam-se na ideia de que constitui núcleo essencial da função de julgar, o enquadramento jurídico dos factos apurados, a determinação do direito, pelo que não está limitada por errado enquadramento que haja sido feito pelos interessados ou pelas partes.

Esta ideia reafirmada no mencionado acórdão de fixação de jurisprudência n.º 4/95 com redobrado valor, tratando-se já não de pronúncia, mas de sentença penal condenatória que potencia o exame e crítica em via de recurso e que ganha ainda maior sentido tratando-se, como se trata, de um recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça, cuja natureza e funções tornariam incompreensível que, detectado um erro de direito em relação a uma condenação submetida a recurso, se abstivesse de o corrigir, mesmo tratando-se de fazer respeitar a sua jurisprudência obrigatória, defesa cuja importância justifica, só por si, a existência de um recurso extraordinário próprio - o do art. 446.º do CPP.

Assim, mesmo quando o recorrente não ponha operativamente em causa a incriminação definida pelas instâncias, não pode nem deve o STJ – enquanto tribunal de revista e órgão, por excelência e natureza, mentor de direito – dispensar-se de reexaminar a correcção das subsunções.

Constitui, pois, núcleo essencial da função de julgar, o enquadramento jurídico dos factos apurados, a determinação do direito, pelo que não está limitada por errado enquadramento que haja sido feito pelos interessados ou pelas partes (cfr. os mencionados acórdãos uniformizadores de jurisprudência) – AcSTJ de 20/03/2003, proc. n.º 504/03-5, com o mesmo Relator.

Assente que este Tribunal pode reexaminar a correcção da qualificação jurídica da conduta do recorrente, deve adiantar-se que desse exame resulta o afastamento da agravação determinada pelas instâncias quanto ao crime de homicídio.

Com efeito, a Relação manteve a opção pelo homicídio qualificado com base na afirmação do motivo fútil do crime: al. i) do n.º 2 do art. 132.º.

Sucede, porém, que está assente que o recorrente teve durante cerca de 2 anos e meio, manteve com ISASR uma relação amorosa, fruto da qual nasceu, em 17/08/04, JDAC, filho de ambos, tendo chegado a viver juntos durante cerca de 1 ano, até ao final de Agosto de 2004, tendo a relação terminado, por iniciativa desta que considerava o arguido muito ciumento, mas nunca se conformou o recorrente com esta separação. No início de Outubro de 2004 constou que a vítima, amigo do recorrente, teria um relacionamento amoroso com a ISASR, pelo que este perguntou àquele se era verdade, ele negou.

Ora, no dia 04/11/04, quando o recorrente desferiu inúmeros golpes com uma faca no corpo da vítima, fê-lo animado por um sentimento de raiva, porque estava convencido que este tinha um envolvimento amoroso com a já mencionada Inês Roque.

Se é certo que o propalado “ciúme” não surge como um motivo nobre e socialmente aceite como desculpabilizante de um crime contra o sujeito que se deseja ou sobre o rival, o estado de raiva em que colocou o recorrente e em que este agiu, afasta o motivo fútil, que é o “motivo sem motivo”, a sem razão que permita compreender psicologicamente a acção.

O crime cometido pelo recorrente é, pois, o de homicídio simples.

2.4.

Medida da pena.

Neste domínio, afirma o recorrente que foi considerado “indirectamente que o exercício do direito ao silêncio seria negativa” (conclusão 5).

Refere-se a esta problemática a fls. 1668, na sequência de uma série de considerações genéricas sobre a medida da pena («daí e no caso sub júdice, resta apurar qual o lugar a conferir à culpa do recorrente a prevenção na determinação da medida da pena e o exercício do DIREITO AO SILÊNCIO de que este fez uso, adequado e legítimo»), a fls. 1669 sobre o direito ao silêncio («Nessa matéria, e exemplarmente, citamos: O arguido recorrente como qualquer outro, tem o direito ao silêncio e não pode ser desfavorecido se o exercer, como foi o caso, e não houve nem há qualquer confusão deste com os termos e uso de tal direito no sentido de desfavorecer como o não exercer”. Na verdade, a confissão, que foi proferida pelo arguido em inquérito, não foi em qualquer momento posterior confirmada mas que também esta “confissão” só poderá ser valorada positivamente se espontânea e a razoável, em confronto com o silêncio do arguido do qual resultará para o tribunal de um desconhecimento de motivos; que não podem desfavorecê-lo. Daí o Acórdão ao fazer menção relativa ao silêncio do arguido recorrente veio a demonstrar, mal, uma valoração negativa de tal atitude. Poderemos dizer que houve uma inversão do princípio in dubio pro reo.»)

É certo que a circunstância de o arguido em julgamento se haver remetido ao silêncio não pode ser valorada em seu desfavor, na certeza de que o fez no exercício de um direito – art. 343.º, n.º 1, do CPP.

Mas como vem alertando o Supremo Tribunal de Justiça a opção pelo silêncio pode ter consequências, que não passam pela sua valorização indevida.

Assim:

— «Um arguido que mantém o silêncio em audiência, não pode ser prejudicado, pois não é obrigado a colaborar e goza da presunção de inocência, mas prescinde assim de dar a sua visão pessoal dos factos e eventualmente esclarecer determinados pontos de que tem um conhecimento pessoal. Daí que quando tal suceda não possa pretender que foi prejudicado pelo seu silêncio.» (AcSTJ de 20/10/2005, Proc. nº 2939/05-5 e de 14/06/2006, Proc. nº 2175/06-5)

— «Na avaliação da personalidade não está em causa o direito ao silêncio, em ordem a extrair deste um juízo desfavorável relativamente àquela. Porém usando o arguido daquele direito, fica impedido o tribunal de se socorrer de elementos que poderiam levá-lo a uma atitude de compreensão em termos de culpa, susceptível de se repercutir na medida da pena e no prognóstico do seu comportamento futuro, com interesse para as exigências de prevenção especial e da própria necessidade da pena.» (AcSTJ de 30/10/1996, Proc. nº 59/96)

— «Se o recorrente não pode sair prejudicado do uso do seu direito ao silêncio, também não pode ser beneficiado porquanto uma confissão espontânea, acompanhada de sincero arrependimento, relevante para a diminuição da pena, fica obviamente arredada pelo direito ao silêncio.» (AcSTJ de 24/10/2001, Proc. nº 2762/01-3)

— «Resultando da factualidade provada e respectiva motivação que o arguido, usando do direito ao silêncio, não prestou quaisquer declarações em julgamento, e não podendo, obviamente, ser prejudicado por isso, certo é que impediu, desse modo, que o tribunal tivesse um melhor acesso à sua personalidade, condições de vida sócio-familiares, e perspectivas de reinserção social.» (AcSTJ de 10/03/2004, Proc. nº 258/04-3)

— «7 - O uso do silêncio a perguntas feitas por qualquer entidade, designadamente no decurso do julgamento, não pode prejudicar o arguido, pois é um direito consagrado na lei (arts. 61.°, n.º l, al. c), e 343.º, do CPP).

8 - Todavia, ao não falar, o arguido prescinde de poder gozar de circunstâncias atenuantes de relevo, como sejam a confissão e o arrependimento.

9 - Por outro lado, embora a mentira do arguido não seja sancionada penalmente, também não é um direito que lhe assiste, pelo que a tentativa de enganar a investigação e de prejudicar gravemente outra pessoa cuja responsabilidade é menor representa uma conduta processual censurável.» (AcSTJ de 14/07/2006, Proc. nº 3163/06-5)

Aliás, o próprio Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, tendo presente o art. 6.º da CEDH e a propósito do silêncio do arguido e das presunções judiciais, lembra a que:

«1 - É da exclusiva competência dos tribunais nacionais apreciar a prova produzida, cabendo ao Tribunal apurar apenas se o processo, no seu todo, foi ou não equitativo, de que um dos elementos integrantes é a observância do princípio da presunção de inocência.

2 - Decorre do artigo 6º § 2º da Convenção que os juízes devem apreciar o caso sem preconceitos, designadamente no que se refere à culpabilidade do arguido, e ainda que o ónus da prova recai sobre a acusação, e que em caso de dúvida se julga a favor do arguido, constituindo violação do princípio da presunção de inocência a transferência do ónus da prova da acusação para a defesa.

3 - As presunções legais (de culpa) e o juízo que se faça do silêncio do arguido não são, em regra e só por si, incompatíveis com a presunção de inocência, não sendo absolutamente interdito que os tribunais nacionais possam inferir uma conclusão do silêncio do arguido, mas tais deduções só serão admissíveis quando a prova reunida é de tal modo concludente que do silêncio do arguido, quando com ela confrontado, apenas se pode inferir que não a pode negar.

4 - Sendo a prova produzida meramente circunstancial - baseando-se apenas num relatório da polícia que apresentava o requerente como o principal utilizador do veículo envolvido no sinistro, e tendo-se demonstrado, posteriormente, que aquele também era utilizado pela irmã do requerente, sem que a vítima do acidente tivesse conseguido identificar o condutor (não sabendo, sequer, dizer se era homem ou mulher) -, se os tribunais pedem ao requerente explicações para os factos de que vinha acusado e que não estavam provados transferem o ónus da prova da acusação para a defesa.

5 - O facto dos tribunais terem especulado sobre se o requerente teria agido (sem que tivessem provado a sua participação no sinistro) sob a influência do álcool, não tendo para tanto - como reconheciam - qualquer suporte probatório, demonstra haver preconceito sobre a culpabilidade do requerente, pelo que, também por isso, deve ser admitida a violação do princípio da presunção de inocência.» (Ac. do TEDH de 20/03/2001, Caso Telfner c. Áustria)

Clarificado o entendimento sobre os contornos do direito ao silêncio do arguido, importa notar mais uma vez que o recorrente se fica por um discurso hermético e se dispensa de demonstrar a afirmação de que a instâncias teriam valorado indevidamente o seu silêncio.

No domínio da medida da pena, para além da conclusão 7.ª manifestamente estranha, pelo seu conteúdo, ao caso sujeito, sustenta o recorrente que a decisão da Relação fez uma incorrecta qualificação dos factos e consequentemente uma excessiva determinação da pena (conclusão 1) e deveria ter determinado pena inferior e suspensão de execução da pena aplicada ao arguido com aplicação do instituto do art. 50.° da CP, “nada desabonando em seu prejuízo” (conclusões 8 e 9).

Tais conclusões não podem deixar de gerar alguma dificuldade, pois que, aparentemente a crítica da medida da pena se situa só no plano da discordância da qualificação jurídica da conduta e logo da mudança de moldura penal abstracta, como parece resultar da conclusão 1.ª, reforçada pela constatação de que nas outras conclusões atinentes a tal matéria se pede uma pena suspensa, limitada às penas não superior a 3 anos de prisão (art. 50.º do C. Penal), quando a pena tida por aplicável pelas instâncias se situa no caso entre 12 e 25 anos (art. 132.º, n.º 1 do C. Penal).

E não nos esclarece o recorrente, na sua motivação, sobre a forma de compatibilizar essas disposições normativas, nem a encontra este Supremo Tribunal, pelo que essa pretensão não pode deixar de soçobrar.

No texto da motivação faz, no entanto, o recorrente referência ao facto de ser primário, de ter hábitos regulares de trabalho, ter uma filha com cerca de 2 anos e apoio familiar, como circunstâncias a atender na determinação da pena concreta. Mas deixou cair a questão da atenuação especial de jovem delinquente que formulara perante a Relação (conclusão 19.ª), não se referindo sequer na motivação para este Tribunal, à sua idade, como factor a atender.

A Relação ao afastar o recurso à atenuação especial da pena, logo entendeu que os factores que poderiam levar a tal atenuação (nomeadamente a idade) deveriam ser valorados na medida da pena, dentro da moldura normal que entenderam corresponder ao crime.

E ao conhecer da questão da medida da pena, depois de citar a decisão da 1.ª instância e clarificar com recurso à Doutrina os parâmetros de decisão, o acórdão recorrido é do seguinte teor:
«O crime pelo qual o arguido foi condenado é punível com pena de prisão de 12 a 25 anos, como já foi referido supra.
Perante o circunstancialismo provado relativamente às condições pessoais do arguido – jovem de apenas 20 anos de idade à data dos factos, social e familiarmente inserido (vive com a mãe), apesar da instabilidade afectiva decorrente da recente separação da sua companheira e mãe do filho de ambos (separação que esteve na origem dos factos ilícitos cometidos), com emprego, (trabalhava como caixa de um parque de estacionamento, auferindo cerca de 600/700 mensais), tem o 8º ano de escolaridade, não regista antecedentes criminais, sempre considerado pelos amigos e tido como uma pessoa pacífica, não lhe sendo conhecidos hábitos de violência – e tendo como contrapeso a muito elevada ilicitude dos factos, em especial por causa do modo de execução (de que se destacam as 26 facadas desferidas sobre a vítima, várias delas na cabeça), já que o resultado final (morte da vítima), sendo elemento do tipo não pode, por isso, ser valorado em sede de medida da pena, chega-se à conclusão que a pena aplicada peca por ser um pouco excessiva, estando acima da aludida “moldura de prevenção”.
Nessa conformidade, ponderando todos os factores relativos à execução do facto – grau de ilicitude, modo de execução, gravidade das consequências, intensidade do dolo, motivos que determinaram a prática do crime –, bem como os relativos à personalidade do arguido manifestada no facto, condições pessoais e situação económica, a tenra idade do arguido, a ausência de antecedentes criminais e reputação de pessoa não violenta junto do círculo de amigos, tudo a ponderar nos termos e para os efeitos do art. 71.º, n.ºs 1 e 2, als. a) a e), do CP, julga-se justa e adequada, por suficiente à satisfação das aludidas necessidades de prevenção e sem exceder a respectiva culpa, uma pena que se fixa em 18 (dezoito) anos de prisão.»
Estas considerações, salvo a que resulta da diversa moldura penal, merecem a concordância deste Supremo Tribunal de Justiça. Daí que, tendo em consideração a nova moldura aplicável: 8 a 16 anos de prisão, se entenda e decida que a pena se deve fixar em 14 anos de prisão, que se tem por suficiente para garantir no caso as necessidades de prevenção geral de integração e se mostra adequada à culpa do agente.
2.5.

Montante da indemnização civil fixada.

Na conclusão 10.ª da sua motivação pede o recorrente «deverá ainda ter em consideração a redução efectiva do pedido de indemnização civil para 35.000 ».

E no texto da sua motivação só dedica a esta questão uma única linha (fls. 1670): «E ainda determinando uma igual redução da indemnização civil a 35.000 €».

Lembre-se que a Relação teve, nesse domínio, por justo e adequado o montante fixado de 50 000,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela vítima e pela perda da vida, mas reputou exagerado o quantum indemnizatório para os danos sofridos pela própria demandante, mãe do Artur, que fixou em 35.000 e reduziu para 85000,00 o montante indemnizatório correspondente aos danos não patrimoniais.
O que vale por dizer que nem se percebe, pelo mero pedido que formula, qual a parcela que o recorrente tem por exagerada, se são as duas, em que percentagem, e quais os fundamentos da sua discordância, as razões que fundam o recurso.

Desrespeitou, assim, o recorrente patentemente, nesta parte, a norma do n.º 1 do art. 412.º do CPP.

Com efeito, dispõe-se aí:


Artigo 412.º

(Motivação do recurso e conclusões)


1 - A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido.

O que, como se viu, o recorrente não fez.

E dado que no texto da motivação o recorrente não diz mais do que na conclusão, não é de lhe endereçar o convite para completar as conclusões, pois que, como entendem o Supremo Tribunal de Justiça e o Tribunal Constitucional, o texto da motivação é o limite da correcção das conclusões, no sentido de que essa correcção se não pode socorrer de elementos que nãos constem do texto.

Ora é jurisprudência deste Tribunal, a que se adere, que o incumprimento do n.º 1 do art. 412.º, nos termos referidos, constitui deficiência de motivação que deve ser tratada como falta de fundamentação e conduzir à rejeição, nessa parte, do recurso.

Na verdade decidiu o Supremo Tribunal de Justiça:

— (1) - Se o recorrente, na peça processual que apresenta e apelida de motivação, se limita a insurgir contra uma condenação que não teve efectivamente lugar e não indica especificadamente os fundamentos do recurso, como expressamente o exige o mandamento estatuído no art. 412º, nºs 1 e 2 do CPP87, esta não tem a dignidade que lhe é atribuída pelo citado dispositivo. (2) - Impõe-se a conclusão de que falta a motivação o que, em linha recta, conduz à rejeição do recurso nos termos do art. 420º, nº 1 do CPP.» (AcSTJ de 19/09/1990, AJ n.º 10/11).
— «(1) - Nas respectivas alegações de recurso o recorrente deve concretizar minimamente as razões da sua pretensão, sendo que nas correspondentes conclusões deve efectuar o resumo de tais razões. (2) - Sem a indicação destas razões não é possível censurar a decisão recorrida, constituindo tal omissão uma violação do preceituado no art. 412.º, n.º 1, do CPP, o que determina a rejeição do recurso, por falta de motivação do mesmo.» (AcSTJ de 11/04/2002, proc. n.º 1065/02-5)

— «(1) - Os recursos visam a reparação da desconformidade das decisões com a ordem jurídica, impondo-se aos recorrentes a identificação dos erros ou vícios nelas contidos, com indicação dos fundamentos da impugnação, para que o tribunal superior possa apreciar se assiste razão aos recorrentes, sem embargo de, dentro dos limites legais, apreciar oficiosamente outras questões. (2) - Não basta para se submeter uma decisão a recurso uma vaga impugnação da mesma, esperando-se que o tribunal de recurso se substitua ao recorrente na identificação e abordagem dos vícios da decisão carecidos de reparação.» (AcSTJ de 18/02/2004, proc. n.º 4411/03-3)

E, como resulta da jurisprudência fixada por este Supremo Tribunal de Justiça «formuladas várias pretensões no recurso, podem algumas delas rejeitar-se, em conferência, prosseguindo o recurso quanto às demais, em obediência ao princípio da cindibilidade.» (AcFJ de 24/06/1992, DR IS-A de 6-8-92 e BMJ 418-327).

Assim, rejeita-se, por insuficiência de motivação, o recurso na parte respeitante ao quantum da indemnização fixada.

3.

Pelo exposto, acordam os juízes da (5.ª) Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em conceder parcial provimento ao recurso, alterando a qualificação jurídica da conduta, para o crime de homicídio simples e fixando a pena em 14 anos de prisão, no mais mantendo o acórdão recorrido.

Custas, no decaimento, pelo recorrente, com a taxa de justiça de 3 Ucs.

Lisboa, 15 de Fevereiro de 2007


Simas Santos (relator, vencido parcialmente)

Santos Carvalho

Rodrigues da Costa

Arménio Sottomayor


Declaração de voto: Vencido em parte, pois, como venho decidindo (AcSTJ de 10/10/2002, proc. n.º 2577/02-5, de 14/11/2002, proc. n.º 3316/02-5, de 30/10/2003, proc. n.º 3281/03-5 e de 15/12/2005, proc. n.º 2978/05-5), o n.º 1 do art. 132.º do C. Penal, que contem uma cláusula geral, resulta que o homicídio é qualificado, ou agravado, sempre que a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade; é essa a matriz da agravação, por forma a que sem especial censurabilidade ou perversidade, ela não ocorre. Depois, ao lado desse critério aferidor da qualificação assente na culpa e que recorta efectivamente o tipo incriminador, o legislador produz uma enumeração aberta, meramente exemplificativa pois, de indicadores ou sintomas de especial censurabilidade ou perversidade, de funcionamento não automático, como o inculca a expressão usada na lei "é susceptível" (1.ª parte do corpo do n.º 2). Mas os indicadores enumerados não esgotam a inventariação e relevância de outros índices de especial censurabilidade ou perversidade que a vida real apresente, como resulta da expressão usada pelo legislador: "entre outras" no segmento final do corpo do n.º 2. De concluir, pois, que nem sempre que está presente algum dos indicadores das diversas alíneas do n.º 2 se verifica o crime qualificado, bastando para tanto que, no caso concreto, que esse indicador não consubstancie a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o n.º 1; mas que na presença deste último elemento, está-se perante um crime de homicídio qualificado mesmo que se não se verifique qualquer daqueles indicadores.

No caso, o modo de execução do crime, com violência e reiteração pouco habituais, e o mau motivo da conduta, tratando-se de um amigo de infância, mesmo que não enquadráveis em nenhuma das alíneas do n.º 2 do art. 132.º, preencheriam os requisitos do n.º1, pelo que manteria a qualificação jurídica, mas desceria a pena para 17 anos de prisão.

Lisboa, 15 de Fevereiro de 2007


Simas Santos