Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
536/14.6TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: LOPES DO REGO
Descritores: COMPETÊNCIA INTERNACIONAL
PACTO DE JURISDIÇÃO
VALIDADE
REGULAMENTO CE 44/2001
AUTONOMIA DA VONTADE
INTERNACIONALIDADE DA RELAÇÃO
ELEMENTOS DE CONEXÃO RELEVANTES
REENVIO PREJUDICIAL
DISPENSA DE SUSCITAÇÃO
Data do Acordão: 02/04/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO EUROPEU - COMPETÊNCIA JUDICIÁRIA / RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DE DECISÕES EM MATÉRIA CIVIL E COMERCIAL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - TRIBUNAIS / COMPETÊNCIA / MODIFICAÇÕES DA COMPETÊNCIA / PACTOS DE JURISDIÇÃO - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS.
Legislação Nacional:
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 94.º, N.º3, 629.º, N.º2, ALÍNEA A), 671.º, N.º3.
D.L. N.º 220/95: - ARTIGO 19.º, AL.G).
Legislação Comunitária:
CONVENÇÃO DE ROMA: - ARTIGO 3.º, N.º 3.
REGULAMENTO (CE) N.º 44/2001 DO CONSELHO, DE 22 DE DEZEMBRO DE 2000: - ARTIGO 23.º.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
-DE 11/2/2015, P. 877/12.7TVLSB.L1-A.S1.
Jurisprudência Internacional:
JURISPRUDÊNCIA EUROPEIA (TJUE):

- ACÓRDÃO CILFIT DE 6/10/1982.
- ACÓRDÃOS DE 8 DE NOVEMBRO DE 1990, GMURZYNSKA‑BSCHER, C‑231/89, COLECT., P. I‑4003, N.° 18; DE 12 DE MARÇO DE 1998, DJABALI, C‑314/96, COLECT., P. I‑1149, N.° 17, E DE 21 DE JANEIRO DE 2003, BACARDI‑MARTINI E CELLIER DES DAUPHINS, C‑318/00, COLECT., P. I‑905, N.° 4.
- ACÓRDÃOS DE 25 DE MARÇO DE 2004, AZIENDA AGRICOLA ETTORE RIBALDI, E C‑480/00 A C‑482/00, C‑484/00, C‑489/00 A C‑491/00 E C‑497/00 A C‑499/00, AINDA NÃO PUBLICADO NA COLECTÂNEA, N.° 72.
- ACÓRDÃO OWSUSU, DE 1/3/2005, P. C-281/02.
- ACÓRDÃO MALETIC, DE 14/11/2012, P. C‑478/12.
- ACÓRDÃO DE 21/5/2015, P. C - 322/14.
Sumário :
1. Considera-se claro e evidente, face ao relevo que o Direito Comunitário e a jurisprudência do TJ vêm conferindo à autonomia da vontade das partes na estipulação da competência internacional, que bastam como elementos de estraneidade do litígio sujeito a pacto de jurisdição o local possível de cumprimento de obrigações contratuais, a submissão, no exercício da autonomia da vontade das partes, da substância do litígio a um direito material estrangeiro e a conexão – senão jurídica, ao menos funcional e económica - dos contratos de derivados financeiros celebrados por contraentes sediados em Portugal a contratos de mútuo bancário de contexto claramente internacional – determinando a ponderação global de todos esses elementos de internacionalidade que a relação contratual em litígio não possa qualificar-se como relação puramente interna, susceptível de obstar à aplicação da disciplina contida no art. 23º do Regulamento 44/2001.

2. Na verdade, qualquer interpretação, desproporcionadamente exigente, que levasse a condicionar o exercício da autonomia da vontade à existência de uma ligação profunda do litígio à ordem jurisdicional a que se atribui competência para dele conhecer, estabelecida apenas com base na verificação dos elementos típicos que normalmente ( não havendo pacto de jurisdição) relevam no estabelecimento do tribunal internacionalmente competente, implicaria uma desproporcional restrição ao princípio da autonomia da vontade, condicionando-a muito para lá do que seria razoável e adequado: mesmo que se entenda que não deve bastar, como elemento exclusivo de estraneidade, a mera celebração de um pacto de jurisdição, este ficará sujeito à disciplina do art. 23º desde que a relação controvertida , valorada globalmente, apresente indícios minimamente consistentes de transnacionalidade, que obstem à sua qualificação como relação jurídica meramente interna.

3. De acordo com a doutrina contida no Acórdão Cilfit de 6/10/82, considera-se dispensável a suscitação, em reenvio prejudicial, da questão interpretativa quanto à norma do art. 23º do Regulamento 44/2001, uma vez que:

- a questão de interpretação normativa que seria pertinente formular ( saber se o pacto de jurisdição não constitui, só por si, elemento de estraneidade susceptível de despoletar a aplicação da disciplina contida no Regulamento) não é necessária nem pertinente para o julgamento do litígio principal, já que a matéria a este subjacente revela de forma evidente outros elementos de internacionalidade;

- ponderada a jurisprudência reiterada do TJ e a funcionalidade e teleologia das normas comunitárias que prevêem a relevância da autonomia da vontade das partes na estipulação da competência internacional, não subsiste qualquer dúvida razoável quanto à suficiência dos referidos elementos de estraneidade da relação , considerando-se, por isso,  claro e evidente que uma relação contratual com tal configuração não pode perspectivar-se como constituindo uma relação puramente interna, susceptível de afastar a aplicabilidade da norma contida no citado art. 23ºdo Regulamento 44.

4. Perante o regime do Regulamento n.º 44/2001, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado a que o direito interno confira relevo.

5. A validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual integrada num contrato de swap celebrado entre uma empresa pública regional e determinado banco, em que foi aquela a propor ao banco as cláusulas que integram os contratos em litígio, objecto, aliás, de um específico  procedimento negocial, em que a dita empresa foi coadjuvada por outra entidade bancária, é analisada, exclusivamente segundo o disposto no art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. A empresa pública regional AA, SA, com sede no ...., instaurou, nas Varas Cíveis de Lisboa, em 01/04/2014, acção declarativa, na forma de processo comum, contra o Banco...., SA, com sede em Lisboa, pedindo que sejam declarados nulos os contratos de derivados financeiros (swap relativos a taxa de juro) celebrados com o Banco/R. ou, subsidiariamente, que seja decretada a resolução dos contratos em causa, com fundamento na alteração das circunstâncias, devendo, em consequência da procedência da acção, ser restituído à A. montante de  € 6.099.553,71, acrescido dos respectivos juros moratórios

Como fundamento das pretensões que deduziu, alegou a A. que:

 - celebrou dois contratos de financiamento com taxa de juro indexada à Euribor a seis meses – um datado de 13/12/2002, no montante de 190.000.000 €, sendo mutuante a .... B.V. e outro datado de 30/10/2007, no montante de 125.000.000 €, sendo mutuantes o Banco....SA e o Banco ...., S.p.A;

- para cobrir o risco da flutuação das taxas de juro, a A. celebrou com o Banco/R. dois contratos de derivados financeiros – swap de taxa de juro com knock-in e knock-out -, um com data início em 09/06/2008, estando subjacente a este swap a suposta cobertura do risco da variação da taxa de juro do financiamento obtido junto do Banco....e do Banco ....; e outro com data início em 11/05/2006, estando  subjacente a este swap a suposta cobertura do risco da variação da taxa de juro do financiamento obtido junto da ...;

- ora, os referidos contratos são de teor altamente especulativo, não eliminando eficazmente o risco de variação de taxa de juro, antes consistem na troca de um risco por um risco ainda maior, não se incluindo pois, no âmbito da gestão da dívida da A.

    Por outro lado – e antecipando desde logo a eventual suscitação da excepção dilatória de incompetência internacional dos Tribunais portugueses -  alegou a A na petição inicial que:

- nos termos do contrato ISDA Master Agreement celebrado entre a A. e o R. é atribuída competência aos tribunais ingleses para dirimir qualquer litígio referente à validade, interpretação e execução desse mesmo contrato;

- mas esse pacto privativo de jurisdição não é válido, porquanto:

a) a relação jurídica em apreço não apresenta qualquer traço de transnacionalidade, encontrando-se fora do escopo do nº 1 do art. 23º do Regulamento (CE) nº 44/2001;

b) por isso têm de se aplicar as disposições do CPC, sendo que não estão verificados os requisitos de validade exigidos pelo art. 94º, pois a relação controvertida é puramente interna e a eleição do foro não se encontra justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas;

c) a escolha dos tribunais ingleses representa graves inconvenientes para a A. sem que exista um interesse atendível por parte do R., pelo que tal pacto constitui uma cláusula geral proibida;

   O R. contestou, tendo, em primeira linha, pugnado pela sua absolvição da instância, invocando a excepção de incompetência internacional dos tribunais portugueses e, caso assim não se entenda, a excepção de abuso de direito processual ( resultante de a A. ter pretendido conferir jurisdição aos tribunais ingleses , exigindo-o inequivocamente, fazendo da assinatura do Master Agreement uma verdadeira condição do concurso para contratar), alegando, para tanto e em síntese, que:

- as normas do Regulamento CE 44/2001 referentes aos pactos de jurisdição prevalecem sobre as normas reguladoras da competência internacional constantes do CPC português, incluindo as que se reportam a requisitos adicionais dos pactos de jurisdição;

- mesmo para quem entenda que são necessários elementos de estraneidade ou transnacionalidade para ser aplicável a disciplina constante do referido Regulamento – ou seja, que ocorram no litígio elementos de conexão com outras ordens jurídicas que tornem a relação litigiosa não puramente doméstica ou interna– eles verificam-se no caso dos autos, já que:
- o pacto de jurisdição a favor de tribunal estrangeiro deve considerar-se, só por si, elemento suficiente de estraneidade;
- a relação jurídica regulada pelo ISDA Master Agreement apresenta em si mesma elementos bastantes de estraneidade porquanto:
- a celebração dos contratos de swap foi precedida de concurso público internacional;
- embora ambas as partes formais nos contratos de swap em causa sejam entidades portuguesas, o R. é uma filial do Banco ..., com sede em Espanha, sendo por este totalmente detido, tendo actuado  na qualidade de banco internacional, o que se torna evidente no ISDA Master Agreement, pois aí foi considerado uma Multibranch Party, podendo fazer e receber pagamentos em qualquer transacção através da sua filial em Londres ou no Luxemburgo;
- os dois contratos de swap têm subjacentes financiamentos concedidos por bancos estrangeiros;
- tais contratos estão redigidos em inglês, usando terminologia jurídica tipicamente anglo-saxónica e sendo-lhes aplicável– por força de expressa estipulação das partes - a lei inglesa;
- os swaps são um produto do mercado internacional, em que os bancos actuam como intermediários de partes localizadas em diferentes ordenamentos jurídicos, implicando a celebração de contratos simétricos, situando-se no âmbito da lex mercatoria, pondo em jogo os interesses do comércio internacional.



    A A. respondeu às excepções, reiterando a inaplicabilidade ao pacto de jurisdição em causa do nº 1 do art. 23º do Regulamento (CE) 44/2001, já que os contratos de swap em litígio seriam puramente internos, questionando a argumentação da contraparte  ao configurá-los como contratos internacionais; na verdade:
- a alegada actuação do R. como banco internacional e o facto de poder fazer e receber pagamentos através das filiais em Londres e no Luxemburgo não seriam suficientes para configurar um elemento de estraneidade, pois tal consideração pressupõe que (i) bastaria a existência de um accionista domiciliado além-fronteiras ou (ii) a mera referência contratual à possibilidade de ocorrerem pagamentos num outro país para que estejamos perante uma situação transnacional, quando o que releva é a nacionalidade/domicílio das partes e o local efectivo do cumprimento contratual;
- a redacção de um contrato numa língua estrangeira ou a escolha de uma lei material estrangeira não são critério bastante de transnacionalidade;
- a abstracção que é típica dos contratos referentes a derivados financeiros obsta ao estabelecimento da  pretendida conexão dos contratos de swap com os contratos relativos aos financiamentos bancários a eles subjacentes.

    Após os articulados, foram juntos pareceres jurídicos - dois pelo R. e um pela A.

   Foi proferido despacho saneador que julgou procedente a excepção de incompetência internacional arguida pelo. R e declarou o tribunal português internacionalmente incompetente para julgar a causa, absolvendo o R. da instância.


2. Na sequência de recurso de apelação da A., foi proferido, pela Relação de Lisboa, acórdão confirmatório de tal decisão, com o seguinte – e decisivo – fundamento:

Sucede que no caso concreto A. e R. aceitaram que o R. actue como uma Multybranch Party, podendo realizar transacções através das suas filiais em Londres e no Luxemburgo, o que significa que acordaram que o R. pode realizar operações financeiras no mercado internacional no âmbito da sua actuação como parte nos contratos de swap.

Assim, é de concluir que estes concretos contratos de swap têm conexão com mais do que uma ordem jurídica, pelo que está demonstrada a internacionalidade da relação jurídica e preenchidos estão os pressupostos para a aplicação do art. 23º nº 1 do Regulamento (CE) nº 44/2001.

   E – assente a aplicabilidade do Regulamento 44 - considerou-se no acórdão recorrido:

Importa então apreciar se este pacto privativo de jurisdição é inadmissível à luz da alínea g) do art. 19º do DL 446/85 de 25/10.

Dispõe esse normativo que são proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, as cláusulas contratuais gerais que «Estabeleçam um foro competente que envolva graves inconvenientes para uma das partes, sem que os interesses da outra o justifiquem».

Ora, foi a A. que impôs a utilização dos contratos ISDA como claramente resulta do escrito elaborado pelo Governo Regional da Madeira, datado de 06/01/2006 (Proc. 4.2.6 P1) doc. 1 (de fls. 557-561), através do qual foi comunicado ao R., conforme acima se transcreveu, que «As operações financeiras a contratar serão suportadas pelos contratos ISDA em anexo, os quais deverão ser previamente aceites pela V/ instituição, em declarações cujos modelos se anexam, as quais deverão ser juntas às propostas a apresentar, como condição de participação nas operações financeira».

Por outro lado, como se refere no Ac do STJ de11/02/2015 (Proc. 877/12.7TVLSB.L1-A.S1), «A orientação do TJUE é, pois, categórica e inequívoca no sentido dos requisitos de validade do pacto de jurisdição só serem aqueles que estão vertidos no art. 23º do Regulamento nº 44/2001.

(…)

Destarte, é irrelevante para esse efeito, fazer qualquer tipo de apreciação da validade do pacto de jurisdição à luz do direito interno do respectivo Estado-Membro.

E, assim sendo, para que a escolha do tribunal seja válida, é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado.»

De notar, ainda, que a A. é uma entidade de natureza empresarial e não um mero consumidor individual, pelo que e mais uma vez acolhendo o que vem exposto neste aresto do STJ «nessa circunstância, inexiste qualquer disposição de Direito da União Europeia que deva ser respeitada, ao abrigo do art. 67º do Regulamento, pelo que a validade do pacto de jurisdição é aferida exclusivamente pelo disposto no art. 23º do Regulamento.

(…)

Em resumo, a validade do pacto de jurisdição constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada é analisada, exclusivamente, segundo o disposto no art. 23º do Regulamento nº 44/2001».


*

3. As instâncias fizeram assentar a solução do litígio no seguinte quadro factual:

1 – A A. celebrou um contrato de financiamento datado de 13/12/2002 intitulado «Agreement (…) Loan Facility (…)» conforme consta no doc. 3 junto com a p.i.  a fls. 56 v. – 64 e alterado com data de 17/01/2003 conforme consta também nesse doc. 3 a fls. 48-56, sendo mutuárias a A. e BB SA SA, AA SA, CC SA e DD SA e sendo mutuante .... B.V., no montante de 190.000.000 € com vencimento em 2022, onde consta, além do mais, no escrito datado de 17/01/2003:
«(…)
(D) This Agreement (the Agreement”) is being entered into with the intention that this Agreement will supersede and replace the Original Loan Agreement with effect from the date of this Agreement.

(…)
8. Payments
8.1. Place
All payments by a Party under this Agreement shall be made to or to the account of the relevant Party at such account at such office or bank as it may notify to the other Party(ies) for this purpose.
Unless and until the Lender notifies the Borrowers to the contrary, all payments to be made to, or to the account oh, the lender shall be made to the Fiscal Agent at the following account:
     ...Bank plc London
(…)
20. Jurisdiction
20.1 Submission
Each of Lender and each Borrower agrees, for the benefit of the other Parties, that the courts of England have jurisdiction to settle any disputes in connection with this Agreement and according submits to the jurisdiction of the English courts for all purposes relating to this Agreement.
(…)
Forum convenience and enforcement abroad
  Each Party:
a) Waives objection to the English courts on grounds of inconvenient forum oir otherwise as regards proceedings in connection with this Agreement; and
b) Agrees that a judgement or order of an English court in connection with this Agreement is conclusive and binding on it and may be enforce against it in the courts of any jurisdiction.
c) (…)».

2 - A A. celebrou um contrato de financiamento datado de 30/10/2007 intitulado «Loan Facility Agreement» conforme consta no doc. 4 junto com a p.i.  a fls.67-78, sendo mutuárias a A. e BB SA SA, AA SA, CC SA e DD SA e sendo mutuantes Banco....SA e Banca ...., Sp.A, no montante de 125.000.000 € distribuído pelas mutuárias conforme aí descrito e com vencimento em 2032, onde consta, além do mais:
«(…)
26. Law and Jurisdiction
This Agreement shall be governed by and construed in accordance with Portuguese law. The court of Lisbon shall have exclusive jurisdiction to settle any dispute arising out of or in connection with this Agreement.


(…)».

3 - O Governo Regional da Madeira, através de escrito datado de 06/01/2006 (Proc. 4.2.6 P1), comunicou ao R., Banco.... SA, o que consta no doc. 1 (de fls. 557-561) junto com a contestação, onde se lê, além do mais:
«Assunto: Operação Integrada de Gestão da Dívida Directa e Indirecta da Região Autónoma da Madeira
Convite para a apresentação de propostas de cobertura
O Governo Regional da Madeira através da Secretaria Regional do Plano e Finanças, vem por este meio convidar a V/Instituição a participar em operações financeiras no âmbito da gestão da dívida pública regional (doravante designada abreviadamente por “Dívida”), que abrange empréstimos contraídos (ou em fase contratação) directamente pela Região Autónoma da Madeira (“Região”) ou por entidades com capitais exclusivamente públicos, com aval da Região (“Entidades”).
As operações financeiras objecto do presente convite para apresentação de propostas envolverão derivados financeiros e têm por objectivo a redução do risco da exposição da Dívida a subidas de taxa de juro – concorrendo ainda para os objectivos do seu perfil e de redução e optimização dos custos e responsabilidades dela decorrentes, numa perspectiva de médio e longo prazo.
Nesse sentido solicitamos que até ao dia 20 de Janeiro de 2006 nos sejam apresentadas propostas relativas aos pontos 1. e 2. seguintes:
1. Cotação (reportada às condições de mercado às 10h00 T.M.G. de dia 17 de Janeiro de 2006) para os produtos derivados abaixo indicados os quais serão associados a financiamentos com as características descritas no ponto 3. Infra:
 – IRS
- Collar (sem custo) (Compra de um CAP sobre a Euribor com valor a cotar; Venda de um Floor a 2,75%)
- Collar KOO (sem custo) (Compra de um CAP sobre a Euribor com valor a cotar e com Barreira Knock Out a 6%; Venda de um Floor a 2,50%)
2. Além da cotação dos produtos derivados financeiros mencionados no ponto anterior, convidamos a V/ Instituição a apresentar não mais de duas estruturas alternativas que, no V/ entender, melhor compatibilizem os objectivos supra com as características essenciais das principais receitas do Orçamento da RAM.
3. As operações de financiamento que estão a ser objecto de cobertura têm as características tipo abaixo descritas:
   A. Financiamento contraído directamente pela Região:
(…)
B. Financiamento contraído por uma Entidade com capitais exclusivamente públicos, com aval da Região:
(…)
A Região contratou o Banco ... para a assessorar na selecção e avaliação das operações financeiras objecto do presente convite a adoptar, bem como no respectivo processo de contratação.
(…)
Gostaríamos ainda de salientar que:
(…)
. As operações financeiras a contratar serão suportadas pelos contratos ... em anexo, os quais deverão ser previamente aceites pela V/ instituição, em declarações cujos modelos se anexam, as quais deverão ser juntas às propostas a apresentar, como condição de participação nas operações financeiras;
. O Banco BPI deverá ser informado de todos os aspectos relativos a estas operações;
(…)
A Região reserva-se o direito de não adjudicar as presentes operações financeiras ou de as adjudicar, no todo ou em parte, a um ou mais proponentes, e, ainda, de negociar as condições das mesmas.
Ficamos naturalmente à disposição de V. Exas para a prestação de quaisquer esclarecimentos adicionais considerados necessários ou convenientes, através dos contactos acima mencionados. Solicitamos que os pedidos de esclarecimento sejam endereçados por escrito a ambas as entidades.
(…)».

4 - Em 08/03/2006 o Secretário Regional do Plano e Finanças lavrou Despacho, onde se lê, além do mais:
«Considerando o aval da Região concedido às operações de financiamento contraídas por entidades de capitais exclusivamente públicos:
(…)
. AA, SA.
(…)
Considerando que a contratação das operações de cobertura de risco da taxa de juro em questão, por serem acessórias aos financiamentos inicialmente avalizados, não terão influência directa no financiamento, e por isso não desvirtuarão os pressupostos que levaram à autorização do aval nem colidirão com a actividade necessária ou conveniente à prossecução do objecto de todas aquelas entidades, e contribuirão para a correcção do risco decorrente da excessiva exposição da dívida representada pelos empréstimos em questão a subidas de taxas de juro, concorrendo para diversificação do seu perfil;

Considerando o parecer legal emitido pela sociedade de advogados ....& Associados, datado de 23 de Dezembro de 2005, no qual se reconhece capacidade na celebração, por parte daquelas entidades, de operações financeiras de cobertura de risco de taxa de juro.
Assim,
Autorizo a contracção de operações financeiras de cobertura de risco de taxa de juro por parte das entidades acima especificadas, relativamente aos empréstimos cujo aval foi tornado extensível a estas operações, desde que as mesmas verifiquem os seguintes pressupostos:
a) (…)
b) Se materializem em produtos de cobertura de taxa de juro sem risco ou com risco limitado incorporado, como sejam IRS, Swap convertível em Cap, Collar e Collar KO.» (doc. 5 de fls. 576/577 junto com a contestação)

5 - O R., através de escritos datados de 13/01/2006, comunicou à Região Autónoma da Madeira /Governo Regional/Secretaria Regional do Plano e Finanças/Direcção Regional de Planeamento e Finanças bem como ao Banco .../Direcção Financeira, o que consta nos docs 6 e 7 (de fls. 578-585) juntos com a contestação onde se lê, além do mais:
«Referência/Assunto: Operação Integrada de Gestão da Dívida Directa e Indirecta da Região Autónoma da Madeira. Convite para a apresentação de propostas de cobertura
Exmos Senhores
A carta convite que nos foi endereçada com a referência supra, suscitou-nos algumas dúvidas/comentários que gostaríamos de ver esclarecidos antes da data limite imposta para a apresentação de propostas (20 de Janeiro de 2006) e que têm a ver exclusivamente com o teor das minutas dos contratos ISDA apresentados em formato “Draft”.
(…)
Comentários à proposta de Multicurrency ISDA Master Agreement com as entidades madeirenses de capitais públicos (“Entidades”)
Quanto ao teor da proposta de “Shedule to de Master Agreement” por vós apresentada para as entidades madeirenses de capitais públicos (“Entidades”) aproveitamos também para adiantar como questões que gostaríamos de esclarecer:
(…)».

6 - Por e-mail de 18/01/2006 o R. comunicou ao Governo Regional/Secretaria Regional do Plano e Finanças/Direcção Regional de Planeamento e Finanças o que consta no doc. 8 (de fls. 586) junto com a contestação onde se lê, além do mais:
«(…)
Na sequência do Vosso Ofício Circular com o assunto em referência (… de 06/01/2006 e Proc. 4.2.6.P1) (…) junto anexamos propostas para gestão de risco de taxa de juro dos empréstimos referenciados no referido ofício circular.
(…).
Anexo:
(…)
Aceitação de ISDA.pdf – Termos de aceitação do ISDA proposto
Propostas de Gestão de Risco.pdf -.(…)».

7 - No Anexo a esse e-mail que consta de fls. 587, datado de 17/01/2006, lê-se, além do mais:
«Modelo de aceitação da minuta de Contrato 1992 Multicurrency ISDA Master Agreement (Anexo à proposta com a Refª RAM060117 apresentada por Banco...., SA 17 de Janeiro de 2006
Em anexo à proposta acima identificada para a realização de operações financeiras com a(s) entidades madeirenses de capitais públicos (“Entidades”) e caso venhamos a contratar quaisquer operações financeiras com qualquer uma das Entidades, pela presente declaramos que desde que aceites e/ou esclarecidas as nossas dúvidas apresentadas por nossa carta de 13 de Janeiro de 2006, aceitaremos celebrar um contrato 1992 Multicurrency ISDA Master Agreement e respectiva Shedule com o teor da minuta junta pela Região Autónoma da Madeira, na carta convite que nos foi endereçada, ao abrigo do qual nos comprometemos a celebrar essas mesmas operações financeiras.».

8 - Por escrito datado de 24/03/2006, a Região Autónoma da Madeira/Governo Regional/Secretaria Regional do Plano e Finanças/Direcção Regional de Planeamento e Finanças comunicou ao R. o que consta no documento 10 (fls. 614-617) junto com a contestação, onde se lê, além do mais:
«Assunto: Operação Integrada de Gestão da Dívida Directa e Indirecta da Região Autónoma da Madeira – 2ª Fase
Convite para a apresentação de propostas de cobertura
No âmbito do n/ ofício-circular ref. Nº 43/2006, de 6 de Janeiro e das conversações posteriormente havidas, o Governo Regional da Madeira através da Secretaria Regional do Plano e Finanças tem o prazer de comunicar que a V/Instituição foi seleccionada para a cotação de operações financeiras no âmbito da gestão da Dívida Pública Regional (…) que abrange empréstimos contraídos directamente pela Região Autónoma da Madeira (“Região”) ou por entidades com capitais exclusivamente públicos (“Entidades”).
(…)

Tratar-se-á de um processo competitivo, sendo a operação atribuída ao Banco que oferecer o preço mais vantajoso.
As operações financeiras a realizar serão suportadas pelos contratos ISDA enviados em carta anteriormente remetida a V. Exas, os quais foram aceites pela V/ Instituição, em modelos que vos foram oportunamente remetidos. Estas constituíam condição prévia para a participação nas operações financeiras objecto deste convite.
Para além de ter sido estendido o Aval da Região às operações de cobertura em causa, foram atendidas e incorporadas no contrato ISDA as sugestões seguintes:
(…)
Permitimo-nos recordar que se mantém inalteradas as demais condições do convite originalmente remetido à Vossa instituição, ou seja:
(…).
. O Banco .... deverá ser informado de todos os aspectos relativos a estas operações;
(…)
Em anexo enviamos a informação relevante, nomeadamente:
(…)
. As características das operações a cotar
(…)
A Região reserva-se o direito de não adjudicar as presentes operações financeiras ou de as adjudicar, no todo ou em parte, a um ou mais proponentes, e, ainda, de negociar as condições das mesmas.
Ficamos naturalmente à disposição de V. Exas para a prestação de quaisquer esclarecimentos adicionais considerados necessários ou convenientes, através dos contactos acima mencionados. Solicitamos que os pedidos de esclarecimento sejam endereçados por escrito a ambas as entidades.
(…)».

9 - Foi assinado pela A., AA, SA em 08/08/2007 e pelo R., Banco.... SA, em 13/08/2007, o escrito cuja c....a consta como doc. 1 (de fls. 29 v. -37) junto com a p.i., onde se lê, além do mais:
«(Multicurrency –Cross Border)
                              ISDA
International Swaps and Derivatives Association, Inc.
Master Agreement
dated of 13 of June 2006
between




SDPO - AA, SA
              and
Banco.... SA
have entered and/or anticipate into one or more transactions (each a “Transaction”) that are or will be governed by this Master Agreement, wich includes the schedule (the “Schedule”), and the documents and and other confirming evidence (each a “Confirmation”) exchanged between the parties confirming those Transactions.
Accordingly, the parties agree as follows:
1. Interpretation
(a) Definitions. The terms defined in Section14 and in the Schedule will have the meanings therein specified for the purpose of this Master Agreement.
(b) (…)
(c) Single Agreement. All Transactions are enter into reliance on the fact that this Master Agreement and all Confirmations form a single agreement between the parties (collectively refered to as this “Agreement”), and the parties would not otherwise enter into any Transations.
(…)
9. Miscellaneous
(a) Entire Agreement. This Agreement constitutes the entire agreement and understanding of the parties with respect to this subject matter and supersedes all oral, communication and prior writings with respect thereto.
(b) Amendments. No amendment, modification or waiver in respect of this Agreement will be effective unless in writing (including writing evidence by a facsimile transmission) and executed by each of the parties or confirmed by an exchange of telexes or electronic messages on an electronic messaging system.
(…)
10. Offices; Multibranch Parties
(a) If Section 10 (a) is specified in the Schedule as applying, each party that enters into a Transaction through an Office other than its head or home office represents to the other party that, notwithstanding the place of booking office or jurisdiction of incorporation or organization of such party, the obligations of such party are the same as if it had entered into the Transaction through its head or home office. This representation will be deemed to be repeated by such party on each date on which a Transaction is entered into.
(b) Neither party may change the Office trough wich it makes and receives payments or deliveries for the purpose of a Transaction without the prior written consent of the other party.
(c) If a party is specified as a Multibranch Party in the Schedule, such Multibranch Party may make and receive payments or deliveries with respect to a Transaction will be specified in the relevant Confirmation.
(…)
12. Notices.
(a) Effectiveness. Any notice or other communication in respect of this Agreement may be given in any manner forth below (…) to the address (…)
13. Governing Law and Jurisdiction.
(a) Governing Law. This Agreement will be governed by and construed in accordance with the law specified in the Schedule.
(b) Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceeding relating to this Agreement (“Proceedings”), each party irrevocably: -
 (i) submits to the jurisdiction of the English courts, if this Agreement is expressed to be governed by English law, or to non-exclusive jurisdictions of the courts of the State of New York and the United States District Court located in the Borough of Manhattan in New York City, if this Agreement is expressed to be governed by the laws of the State of New York; and
 (ii) waives any objections which it may have at any time to the laying of venue of any Proceedings brought in any inconvenient forum and further waives the right to object, with respect to such Proceedings  in any one or more jurisdictions preclude the bringing of Proceedings in any jurisdiction.
(…)
(c) Service of Process. Each Party irrevocably appoints the Process Agent (if any) specified opposite its name in the Shedule to receive, for it and on its behalf, service of process in any Proceedings. (…)
14. Definitions
(…)
As used this Agreement
“Affiliate” means, subject to the Schedule, in relation to any person, any entity controlled, directly or indirectly, by the person, any entity that controls, directly or indirectly, the person or any entity directly or indirectly under common control with the person. Fort this purpose, “control” of any entity or person means ownership of a majority of the voting power of the entity or person.
(…)
In Witness Whereof the parties have executed this document on the respective dates specified below effect from the first page of this document».


10 - Foi assinado pela A., AA, SA e pelo R., Banco.... SA em 13/08/2007, o escrito cuja cópia faz parte do doc. 1 (a fls. 38-42) junto com a p.i., onde se lê, além do mais:
«(Multicurrency –Cross Border)
                      SCHEDULE                      
                              to the
 Master Agreement
Dated as of 13 June 2006
                 between            
SDPO - AA, SA
a company organized under the laws of Portugal
with head office at Avenida Zarco (…) Portugal
        as
     (“Party A”)
    and
Banco.... SA
a bank organized under the laws of Portugal
with office at (…) Portugal
    as
   (“Party” B”)
(…)
 Part 4: Miscellaneous
(a)  Address for Notices. For the purpose of Section 12 (a) of this Agreement:
       Address for notices or communications to the Party A:
    Avenida Zarco (…)
    Madeira Portugal
   (…)
       For all purposes.

        Address for notices or communications to Party B
                Av. Eng Duarte Pacheco (…)
                (…) Lisboa – Portugal
                (…)
(b) Process Agent: For the purpose of Section 13 (c):

           Party A appoints as its Process Agent:
  SDPO - AA, SA
Av Zarco (…)
Madeira Portugal

Party B appoints as its Process Agent
               Banco.... SA
               18 King William Street
               London
(...)
United Kingdom
               Attention: Office Manager
(c) Offices. The provisions of Section 10 (a) will apply to this Agreement.
(d) Multibranch Party. For the Sectio 10 (c):
Party A is not a Multibranch Party.
Party B is a Mutibranch Party and may enter into transactions through Party B’s London or Luxembourg branches.
(…)
(h) Governing Law. This Agreement will be governed by and construed in accordance with the laws of England.
(…)
Part 5: Other Provisions
(…)
Additional Representations. Section 3 is hereby amended by adding the following additional subsections (), (h), (i):
(…).
The parties executing this Schedule have executed the Agreement and have agreed as to the contents of this Schedule.».


11 – Em 11/05/2006 a A. celebrou com o R. uma transacção financeira – swap - com um valor nocional inicial de 60.971.000 €, documentada na «Confirmation» (doc. 12 junto com a p.i. a fls. 160-v-162 e Anexo I a fls. 163) onde consta, além do mais:

«Interest Rate Collar Transaction  Our reference: 995786/1063042
SDPO –AA – Sociedade de Promoção (…)
(…)
Dear Sirs
The purpose of this letter agreement (this “Confirmation”) is to confirm  the terms and conditions of the Swap Transaction entered between BST – Banco...., SA (“Party A”) and SDPO – AA, SA, (“Party B”) on the Trade specified below.
The definitions and provisions contained in the ISDA Definitions, as published by the International Swaps and Derivates Associations, Inc., are incorporated into this Confirmation. (…)
1. This Confirmation supplements, forms part of, and is subject to, the ISDA master Agreement dated as of 13th June, 2006, amended and supplemented from time to time (the “Agreement”), between us. All provisons contained in the Agreement govern this Confirmation except as expressly modified below.(…).
(…)
6. Additional Definitions and Provisions
(…)
Governing Law. This Transaction will be governed by and construed in accordance with the English law.
Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceedings relating to this Transactions (“Proceedings”) each party irrevocably:
(i) Submits to the jurisdiction of the English courts; and
(ii) waives any objection which it may have at any time do the laying of venue of any Proceedings brought in any such court, wives any claim that such Proceedings have been brought in an inconvenient forum and further waives the right to object, with respect to such Proceedings, that such court does not have any jurisdiction over such party.
(…)».

12 – Dos referidos financiamentos, o financiamento que está subjacente a este swap de 2006, é o que foi obtido junto da .... B.V., mencionado em 1.

13 – O swap de 2006 foi reestruturado em 2009, através da assinatura pelas partes da «Confirmation» datada de 14/12/2009 (doc. 13 de fls. 163 v.- 165 e Anexo I e II de fls. 166 e v.)

14 – Em 09/06/2008 a A. celebrou com o R. uma transacção financeira – swap - com um valor nocional inicial de 36.00.000 € documentada na «Confirmation» (doc. 8 junto com a p.i. a fls. 139-141 e Anexo I a fls. 142) onde consta, além do mais:
«Euribor Range Swap Transaction
  Our reference: 2033576
SDPO –AA – Sociedade de Promoção (…)
(…)
Dear Sirs
The purpose of this letter agreement (this “Confirmation”) is to confirm  the terms and conditions of the Swap Transaction entered between Banco...., SA (“Party A”) and SDPO – AA, SA, (“Party B”) on the Trade specified below.
The definitions and provisions contained in the ISDA Definitions, as published by the International Swaps and Derivates Associations, Inc., are incorporated into this Confirmation. (…)
1. This Confirmation supplements, forms part of, and is subject to, the ISDA master Agreement dated as of 13th June, 2006, amended and supplemented from time to time (the “Agreement”), between us. All provisions contained in the Agreement govern this Confirmation except as expressly modified below.
Each party is hereby advised, and such party acknowledges, that the other party has engaged in (or refrained from engaging in financial transaction and has taken other material actions in reliance upon the parties entry into this Transaction to which this Confirmation relates on the terms and conditions set forth below.
2. The terms of the particular Swap Transaction to which this Confirmation relates are as follows:
(…)
7. Additional Definitions and Provisions
(…)
Governing law. This Transaction will be governed by and construed in accordance with the English law.
Jurisdiction. With respect to any suit, action or proceedings relating to this Transaction (“Proceedings”), each party irrevocably:
(i) Submits to the jurisdiction of the English courts; and
(ii) waives any objection which it may have at any time do the laying of venue of any Proceedings brought in any such court, wives any claim that such Proceedings have been brought in an inconvenient forum and further waives the right to object, with respect to such Proceedings, that such court does not have any jurisdiction over such party.
(…)».

15 – Dos referidos financiamentos, o financiamento que está subjacente a este swap de 2008, é o que foi obtido junto do Banco....e do Banca ....., mencionado em 2.

16 – O swap de 2008 foi reestruturado em 2011 através da assinatura pelas partes da Confirmation datada de 04/05/2011 (doc. 9 de fls. 143 v.).

4.  Inconformada com o decidido pelas instâncias, interpôs a A. a presente revista, a qual – apesar da dupla conformidade da decisão acerca da questão da competência – é admissível, nos termos do art. 629º, nº2, alínea a), do CPC, que considera sempre admissível o recurso quando este tiver por fundamento a violação das regras de competência internacional, esclarecendo, por sua vez, o nº3 do art. 671º do mesmo Código que o obstáculo no acesso ao Supremo que decorreria da existência de dupla conforme não impede a admissibilidade da revista nos casos em que o recurso é sempre admissível.

A recorrente encerrou a respectiva alegação com as seguintes conclusões:

1. O Acórdão é susceptível de recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, independentemente do valor da causa e da sucumbência, ainda que tenha confirmado a decisão da primeira instância.

2. Isto porque é sempre admissível recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça nos termos conjugados dos artigos 629.°, n.° 2, a) e 671.°, n.° 3, ambos do CPC, quando esteja em causa a violação das regras de competência internacional, como sucede no caso em apreço. Veja-se, nesse sentido, o Acórdão recorrido a pp. 13 e 14.

3. No Acórdão, considerou-se, erradamente, o pacto privativo de jurisdição celebrado pelas partes válido e eficaz à luz do ordenamento jurídico português e, como tal, o Réu, ora Recorrido, foi absolvido da instância, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 278.°,n.°l, a),do CPC.

4. O Acórdão merece vários reparos, tendo violado o artigo 23.°, n.° 1, do Regulamento de Bruxelas bem como o artigo 94.°, n.°s 1 e 3, do CPC, e o artigo 19.°, g), da LCCG.

A. Carácter puramente interno da relação jurídica em crise

5. A aplicação do Regulamento de Bruxelas pressupõe a existência de uma relação jurídica transnacional, ou seja de um elemento de estraneidade que ligue a relação jurídica a mais do que uma jurisdição, tal como reconhecido no Acórdão recorrido.

6. No caso vertente, não há nenhum elemento do tipo dos elencados na jurisprudência do TJUE - cf. Acórdãos Maletic, Owusu e Linder - susceptível de conferir carácter transnacional à relação jurídica em crise, visto que ambas as partes são pessoas colectivas de direito português, os contratos em crise foram celebrados em Portugal e o lugar do cumprimento da integralidade das obrigações deles decorrentes é também em Portugal.

7. Contrariamente ao que pretende o Recorrido, a internacionalidade do litígio não pode fundar-se: (i) no facto de os contratos de financiamento celebrados pela Recorrente com terceiros possuírem elementos de conexão com outras ordens jurídicas: (ii) no uso da língua inglesa; (iii) na aplicação da lei inglesa; (iv) no facto de estarmos perante um produto importado que se insere num mercado internacional; (v) na suposta actuação do Recorrido como mero intermediário; (vi) no facto de o capital social do Recorrido ser detido por uma pessoa colectiva estrangeira; e (vii) na possibilidade, nunca concretizada, de o Recorrido poder fazer e receber pagamentos através das suas filiais em Londres e no Luxemburgo.

8. Não há qualquer ligação entre os contratos de mútuo celebrados pelo Recorrente e os swaps em crise, já que os segundos não contêm qualquer referência aos primeiros, sendo a respectiva existência totalmente autónoma.

9. Ademais, como salienta o Recorrido na sua contestação, a abstracção relativamente à realidade subjacente é característica dos derivados em geral: de facto, e como de resto aconteceu no caso do swap de 2006, o contrato de mútuo, mesmo que sirva de referência a um contrato swap, pode ser resolvido antecipadamente sem que isso implique a resolução automática do contrato swap.

10. Os swaps em crise não têm qualquer relação material com os supostos financiamentos subjacentes, conforme alegado na petição inicial.

11. Seria absurdo que a redacção de um contrato numa língua estrangeira ou a mera escolha de uma lei estrangeira - que só será efectiva na medida em que não contrarie as disposições imperativas da lei portuguesa, nos termos do artigo 3.°, n.° 3, da Convenção de Roma -fosse critério bastante de transnacionalidade para este efeito.

12. O mesmo se diga relativamente à alegação de que estamos perante um produto importado que se insere num mercado internacional.

13. Trata-se de um contrato de balcão ("over the counter") e não de um contrato transaccionado em mercado organizado, pelo que não se vislumbra o conteúdo material destes dois conceitos.

14. O facto de os contratos swap usarem como referência a taxa Euribor não pode obviamente ser critério para os definir como contratos internacionais. Usando tal argumentação, cairíamos no absurdo de sustentar que todos os contratos que tomam como referência esta taxa, incluindo, por exemplo, os contratos de crédito à habitação celebrados entre bancos e cidadãos nacionais, domiciliados em Portugal, seriam ipso facto contratos internacionais.

15. O Recorrido não actuou como mero intermediário nos contratos swap.

16. A Recorrente nunca teve conhecimento, nem aquando da celebração dos contratos, nem ao longo da respectiva execução, de que o Recorrido tenha celebrado contratos simétricos com terceiros ou quem seriam esses terceiros, sendo que, em todo o caso, tais contratos não têm qualquer relação jurídica com os contratos aqui em disputa.

17. O facto de o Recorrido pertencer a um grupo internacional não é relevante para este efeito.

18. Se assim fosse, bastaria a existência de um accionista domiciliado além-fronteiras para que estivéssemos perante uma situação transnacional; tal corresponderia, desde logo, à desconsideração da autonomia jurídica da entidade contratante.

19. Todos estes elementos foram considerados pelo Tribunal a quo como irrelevantes para caracterizarem a situação em crise como transnacional.

20. Contrariamente ao decidido no Acórdão, o facto de, ao abrigo do contrato ISDA, o Recorrido poder receber e fazer pagamentos através das filiais em Londres e no Luxemburgo, não configura elemento de estraneidade relevante.

21. Tal implicaria que através de mera referência contratual, e independentemente da sua verificação factual, se poderia afastar a competência dos tribunais portugueses para dirimir uma situação puramente interna.

22. Não se compreende como pode ser dada relevância a uma possibilidade prevista como meramente hipotética num contrato-quadro que servirá em teoria para regular uma infinidade de transacções por um período de tempo indefinido e não ao que concretamente foi estipulado para as transacções swap ora em discussão.

23. As próprias Confirmations (contratos que documentam as transacções ora em crise e que prevalecem sobre o ISDA e o Schedule) não prevêem a possibilidade de o Recorrido actuar através das suas filiais em Londres ou no Luxemburgo, estabelecendo antes que o Recorrido actuaria sempre através da sua sede, sita na Rua ..., n.° 75, 1100 Lisboa.

24. Assim, nas transacções ora em discussão, a utilização das filiais em Londres e no Luxemburgo pelo Recorrido não só não aconteceu (como já vimos o local de cumprimento das obrigações foi Portugal) como nem sequer era uma possibilidade concreta prevista pelas partes nas Confirmations.

 25. A teleologia subjacente à exigência de um elemento efectivo de estraneidade como pressuposto de aplicação do Regulamento de Bruxelas prende-se com a necessidade de garantir que cada Estado-Membro mantenha jurisdição efectiva sobre disputas puramente internas, desiderato que manifestamente se frustraria caso fossem considerados relevantes elementos de conexão ténues e, ou, artificiais.

26. Caso assim não fosse - ou através de construções de maximalismo extremo do conceito de elemento de estraneidade - permitir-se-ia a atribuição de competência à jurisdição de um Estado membro para dirimir litígios que dizem exclusivamente respeito a um outro Estado membro.

27. Ora, de tal interpretação decorreria que a jurisdição nacional passaria a ser meramente facultativa o que não foi, nem poderia ter sido, a intenção do legislador europeu. Desde logo, semelhante interpretação violaria frontalmente os princípios da proporcionalidade e da subsidiariedade que enquadram o processo legislativo europeu.

28. O que releva neste âmbito é a nacionalidade, o domicílio das partes bem como o local efectivo do cumprimento contratual, conforme jurisprudência do TJUE acima referida.

29. Não se conhece nenhuma decisão de qualquer destes tribunais que tenha fundamentado a internacionalidade do litígio em qualquer outro elemento.

30. Estamos, pois, perante uma situação jurídica portuguesa puramente interna, que não apresenta nenhuma conexão com o território de qualquer outro Estado, pelo que não se encontra preenchido o pressuposto espacial ou pessoal de aplicação do Regulamento de Bruxelas.

B. Inadmissibilidade do pacto de jurisdição à luz do artigo 94.°do CPC

31. Sendo inaplicável o Regulamento de Bruxelas, a designação convencional da jurisdição competente para conhecer dos litígios eventualmente decorrentes de certa relação jurídica tem de se conformar com o disposto no artigo 94.° do CPC, que pressupõe, entre outros requisitos, cumulativamente que: (i) a relação controvertida tenha conexão com mais de uma ordem jurídica; (ii) [a designação seja] justificada por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que não envolva inconveniente grave para a outra.

32. Conforme exposto, a situação é puramente interna sendo, que cumulativamente, a escolha da jurisdição inglesa não é justificada por um interesse sério das partes, conforme o se reconhece no Acórdão recorrido, envolve inconveniente grave para a decorrente.

33. Aliás, a escolha da jurisdição inglesa envolve grave inconveniente para o Recorrente. Efectivamente, a distância, os custos decorrentes de litigar no estrangeiro, a língua a adoptar no processo, bem como a circunstância de a Recorrente não ter qualquer experiência em litígios do mesmo género e perante jurisdições estrangeiras, constituirão obstáculos insuperáveis a uma defesa eficaz dos seus interesses.

34. Entre custas judiciais, honorários de advogados, honorários de peritos e outros custos, incluindo traduções, a Recorrente precisaria de, no mínimo, despender dois milhões de euros para conduzir um litígio deste tipo perante os tribunais ingleses.

35. O facto de todo o direito imperativo português ser aplicável, por força do artigo 3.°, n.° 3, da Convenção de Roma, à discussão material do litígio constitui, evidentemente, um obstáculo de monta, i.e., um grave inconveniente, à respectiva dirimição por um tribunal de uma jurisdição estrangeira.

C. Inadmissibilidade do pacto de jurisdição à luz da LCCG

36. Ainda que se qualificasse a relação jurídica em crise como internacional para efeitos do Regulamento de Bruxelas, exercício que se faz sem conceder, o pacto de jurisdição sempre seria inválido à luz da LCCG, designadamente do respectivo artigo 19.°, alínea g).

37. O contrato ISDA é um contrato padronizado, estando inclusivamente, as partes impossibilitadas de o alterar ao abrigo da protecção jurídica dada aos direitos de autor e direitos conexos existindo, portanto, um "pacto privativo de jurisdição assente numa cláusula elaborada de antemão, que as partes se limitaram a aceitar cujo conteúdo não foi previamente elaborado e que o destinatário não pode influenciar, remetendo-nos, assim, para a apreciação do regime das cláusulas contratuais gerais e para a necessidade de ponderar a proteção do aderente a este tipo de negociação pré-formulada, sejam as cláusulas gerais elaboradas pelo proponente, pelo destinatário ou por terceiros (artigo 1.° n°s 1 e 2, e artigo 2.°, do Decreto-Lei n.°446/85)", conforme considerou o Tribunal da Relação de Lisboa, a propósito de documentação ISDA igual à dos presentes autos.

38. Estamos, claramente, perante um contrato padronizado, pré-elaborado por uma entidade estranha à relação contratual, sendo que, atentas as circunstâncias do caso concreto, elencadas supra, existem graves inconvenientes na escolha da jurisdição inglesa para a Recorrente sem que exista um interesse sério do Recorrido.

39. A Recorrente, enquanto investidor não qualificado, é equiparada a consumidor para efeitos de aplicação da LCCG, nos termos do artigo 321.°, n.° 3, do Código dos Valores Mobiliários.

D. Eventual questão prejudicial de Direito da UE

40. O Acórdão que será proferido pelo Tribunal ad quem não é susceptível de recurso ordinário.

41. Nessa circunstância, o Tribunal ad quem terá o dever de submeter a questão da interpretação do âmbito de aplicação do Regulamento de Bruxelas ao TJUE, nos termos do artigo 267.°, §1 e §3 do TFUE, conforme jurisprudência constante do TJUE desde o Acórdão Costa ENEL.

42. A (in)aplicabilidade do Regulamento de Bruxelas ao quadro fáctico de relação jurídica em análise é, evidentemente, uma questão de interpretação de um acto de direito derivado, pelo que o TJUE tem competência para decidir a título prejudicial - cf. artigo 267.°, §1, b) do TFUE.

 43. O thema decidendum não se enquadra nas únicas excepções aduzidas pela jurisprudência do TJUE à obrigatoriedade de reenvio prejudicial por um tribunal de última instância, na denominada jurisprudência Cilfit.

44. Mesmos nos casos em que foi mais maximalista na definição de situação internacional - Acórdãos Maletic, Owusu e Lindner - nunca o TJUE considerou como internacional uma situação tão interna como a aqui em discussão.

45. Sem prejuízo da competência do Tribunal ad quem na definição da questão a submeter ao TJUE, a Recorrente propõe a seguinte formulação:

Uma situação jurídica em que (i) ambas as partes são pessoas colectivas de direito português; (ii) o contrato existente entre ambas foi celebrado e integralmente cumprido em Portugal; (iii) as partes designaram como aplicável a lei inglesa e celebraram um pacto de jurisdição atribuindo competência à jurisdição inglesa; e (iii) o contrato foi redigido em inglês, pode qualificar-se como contendo um elemento de estraneidade suficiente para preencher o âmbito de aplicação pessoal ou espacial do Regulamento de (CE) n. ° 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, na versão aplicável aos factos em crise?

Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser julgada procedente a presente revista, revogando-se, consequentemente, o acórdão recorrido.

Por sua vez, a entidade recorrida sustenta ser injustificado, no caso dos autos, o sugerido reenvio prejudicial, considerando nomeadamente que o reenvio poderia justificar-se se a única questão interpretativa debatida se traduzisse em saber se, perante o Direito Comunitário, a existência de um pacto de jurisdição constituía ou não, só por si, um elemento de estraneidade suficiente para desencadear a aplicação do Regulamento de Bruxelas. Porém, existindo manifestamente, na óptica do recorrido, outros e múltiplos elementos de internacionalidade na relação controvertida, deixa naturalmente tal questão interpretativa de ser necessária e pertinente para a resolução do caso – sendo certo que saber se existem elementos de internacionalidade na relação controvertida não constitui problema de interpretação do Direito da União, pelo que nada haveria a reenviar

E, quanto à questão que constitui objecto do recurso , reitera a sua anterior argumentação, sustentando que – mesmo que se não adira à tese segundo a qual a simples estipulação de um pacto de jurisdição já envolve, em si mesma, um elemento de estraneidade – a situação dos autos, na sua peculiar fisionomia, comporta vários outros elementos de internacionalidade da relação litigiosa, quer vistos individualmente, quer ponderados em conjunto, o que naturalmente deitaria por terra as objecções formuladas quanto à plena aplicabilidade do art. 23º do Regulamento 44/2001.

5. Sendo a decisão a proferir nos autos pelo STJ a decisão final acerca da excepção dilatória de competência internacional, cumpre equacionar a pertinência do reenvio prejudicial, sugerido pela A. e questionado, quanto à sua efectiva justificabilidade, pelo R ( que subsidiariamente o admite, pondo, porém, em causa a pertinência das perguntas sugeridas pela contraparte, que não retratariam adequadamente a verdadeira situação litigiosa dos presentes autos).

  O mecanismo do reenvio prejudicial pressupõe - no campo das questões interpretativas - que um órgão jurisdicional nacional considere necessária para a resolução de um litígio perante si pendente a interpretação de uma norma comunitária, cujo preciso sentido lhe suscita dúvidas, instituindo um instrumento processual de cooperação judiciária que visa potenciar uma aplicação tendencialmente uniforme dos tratados e da legislação europeia no espaço comunitário.

   Tal mecanismo procedimental pressupõe, assim, que a dúvida pertinente a colocar ao TJ incida sobre a interpretação de uma norma de Direito Comunitário, relevante para a dirimição do litígio principal – ou seja, sem a resposta à qual não seja possível proferir a decisão que compete ao juiz perante o qual a causa está pendente: ou seja, deverá ocorrer um nexo de instrumentalidade entre a dúvida interpretativa existente e a concreta solução do litígio principal, que pressupõe necessariamente a respectiva -e prévia - resolução.

 Estão, deste modo, situadas fora do âmbito de tal instituto os casos em que:

- a actividade processual em causa não se traduz na fixação da correcta interpretação normativa de um preceito situado na esfera da ordem jurídica comunitária, prendendo-se exclusivamente ou com a interpretação do direito nacional ou com a apreciação , valoração ou qualificação da matéria de facto litigiosa: na verdade, as competências do TJ não abrangem os aspectos atinentes à valoração da matéria de facto, que se situam de pleno no cerne das competências dos órgãos jurisdicionais nacionais – não fazendo, por isso, o menor sentido que se peça ao TJ para emitir juízos valorativos ou qualificativos acerca da situação fáctica subjacente ao litígio;

- a questão da interpretação autêntica de certa  norma de Direito Comunitário não releva para a decisão da causa, cuja solução não passa pela respectiva aplicação: como se refere no Ac.Owsusu, de 1/3/2005 (P. C-281/02):

O processo previsto no artigo 234.° CE é um instrumento de cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais, graças ao qual o primeiro fornece aos segundos os elementos de interpretação do direito comunitário de que necessitam para a solução dos litígios que são chamados a decidir (v., designadamente, acórdãos de 8 de Novembro de 1990, Gmurzynska‑Bscher, C‑231/89, Colect., p. I‑4003, n.° 18; de 12 de Março de 1998, Djabali, C‑314/96, Colect., p. I‑1149, n.° 17, e de 21 de Janeiro de 2003, Bacardi‑Martini e Cellier des Dauphins, C‑318/00, Colect., p. I‑905, n.° 41).

Assim, a justificação do pedido prejudicial não é a formulação de opiniões a título consultivo sobre questões gerais ou hipotéticas, mas a necessidade inerente à solução efectiva de um contencioso (v., neste sentido, acórdãos Djabali, já referido, n.° 19; Bacardi‑Martini e Cellier des Dauphins, já referido, n.° 42, e de 25 de Março de 2004, Azienda Agricola Ettore Ribaldi e o., C‑480/00 a C‑482/00, C‑484/00, C‑489/00 a C‑491/00 e C‑497/00 a C‑499/00, ainda não publicado na Colectânea, n.° 72).

   No caso dos autos, estando em jogo uma questão de competência emergente do estabelecimento pelas partes de um pacto de jurisdição, a norma comunitária, de sentido duvidoso, a interpretar autenticamente pelo TJ seria naturalmente a que consta do art. 23º do Regulamento 44/2001, enquanto estabelece os requisitos ou pressupostos de tal figura – sendo a dúvida interpretativa suscitada a que se traduz em saber se – vigorando também nesta sede o requisito da internacionalidade ou extraneidade do litígio, correntemente considerado pelo próprio TJ como condição geral de aplicação da disciplina contida no referido Regulamento - ele se deve ter por satisfeito com a mera estipulação do pacto de jurisdição: ou seja, se o pacto de jurisdição, em si mesmo considerado, já consubstancia, só por si e sem mais, um elemento de estraneidade da relação material controvertida, susceptível de despoletar a aplicação do referido Regulamento.

   Porém, e como é evidente, tal questão interpretativa só ganha actualidade e relevância se chegarmos à conclusão que – no litígio objecto dos presentes autos – o único elemento de internacionalidade seria o resultante da estipulação de competência a favor dos tribunais ingleses: se, pelo contrário, apreciando a matéria de facto em que se consubstancia a relação litigiosa, se impuser, de forma clara e inequívoca, a conclusão de que ocorrem seguramente outros elementos materiais de internacionalidade na relação contratual controvertida entre as partes, fica naturalmente prejudicada a referida questão interpretativa a colocar quanto à norma do citado art. 23º. Ora, determinar, perante a matéria de facto litigiosa apurada, se ela revela, de forma clara e consistente, algum elemento de estraneidade ou internacionalidade na relação jurídica,  susceptível de dar cobertura à plena aplicabilidade do art. 23º do Regulamento, é naturalmente tarefa situada no domínio das competências atribuídas ao órgão jurisdicional nacional – não fazendo seguramente sentido, perante a fisionomia do instituto do reenvio prejudicial, que se vá perguntar ao TJ se vislumbra algum concreto indício de internacionalidade na descrição da matéria de facto apurada pelas instâncias…

   A justificabilidade do reenvio prejudicial está, pois, no caso dos autos, dependente de uma operação prévia, situada ainda no domínio das competências do órgão jurisdicional nacional, cabendo-lhe apreciar e valorar a matéria de facto em litígio, de modo a concluir pela existência ou não – na concreta relação contratual controvertida – de elementos ou índices de internacionalidade que ( para além da mera estipulação de um pacto de jurisdição) possam fundar, de forma clara, a aplicação da disciplina contida no art. 23º do Regulamento.

   Em suma: saber se a concreta relação contratual, dissecada nos autos, apresenta, de forma clara e consistente, na sua substância, elementos de estraneidade ou internacionalidade que obstem à sua qualificação como relação jurídica puramente interna ou doméstica – pretendida pela entidade recorrente – é questão lógica e juridicamente anterior à da resolução da dúvida interpretativa  acerca da norma constante do art. 23º do Regulamento – só esta podendo justificar o uso do mecanismo do reenvio prejudicial, de modo a ficar esclarecido se ( não existindo outros factores de internacionalidade na relação) a mera estipulação de um pacto de jurisdição constitui elemento bastante de estraneidade da relação jurídica que possa desencadear a aplicação da disciplina contida no Regulamento 44.

   E, deste modo, a decisão acerca da justificabilidade do reenvio prejudicial só será tomada depois de se ter decidido, perante a concreta matéria litigiosa, se ela revela, de forma clara, outros elementos de internacionalidade que tornem inquestionável a submissão do pacto de jurisdição estipulado pelas partes à disciplina constante do citado art. 23º.

6. As relações contratuais estabelecidas entre as partes foram objecto de contratos-quadro baseados no modelo contratual ISDA Master Agreement, que contém cláusulas contratuais gerais reguladoras de operações reportadas a instrumentos financeiros derivados, dos seus anexos ( Schedules), que contêm cláusulas individualmente negociadas, e de confirmações ( Confirmations) que registaram as transacções individualizadas.

   Ora, da análise deste quadro contratual complexo resulta que:

- as partes estipularam que o contrato se rege pela lei inglesa, devendo ser interpretado de acordo com essa mesma lei ( sendo, aliás, esta escolha, no exercício da autonomia privada, da lei inglesa como lei reguladora da substância da relação contratual que permite explicar e compreender que os contratos e seus anexos se mostrem redigidos na língua inglesa e com utilização de típicos conceitos do direito anglo-saxónico);

- em sede de jurisdição – e identicamente no exercício da autonomia privada – as partes convencionaram que se submetem à jurisdição dos tribunais ingleses, renunciando às objecções que possam em qualquer momento ter em relação ao foro onde o processo se mostre instaurado;

- nos termos da cl. 10 do ISDA Master Agreement, se uma das partes for considerada no Anexo como uma Multibranch Party, tal parte pode fazer pagamentos ou qualquer transacção através de qualquer filial listada no Anexo: e, de acordo com a Parte 4 do Anexo ( Miscelanious)  a parte B ( ou seja, o Banco ...) é considerada uma Multibranch Party, podendo celebrar transacções através das suas filiais em Londres ou no Luxemburgo;

- decorre da matéria fixada ( aliás, na sequência de alegação feita pela própria A. na petição inicial ) que o swap de 2006 tem como subjacente o financiamento obtido junto da .... BV, ao passo que o swap de 2008 tem como subjacente o financiamento obtido junto do Banco....e do Banco .... – destinando-se precisamente os contratos de swap a acautelar os riscos de flutuação das taxas de juro nos referidos empréstimos em que a A. figurava como mutuária.

 Deste quadro factual, fixado pelas instâncias, decorre, pois, categoricamente que:

- para além do pacto de jurisdição que convencionaram, as partes, no exercício da sua autonomia da vontade, submeteram o litígio à lei inglesa – sendo obviamente tal circunstância que permite compreender e justificar a integral redacção dos contratos e seus anexos em inglês, bem como a utilização da terminologia e conceitos típicos do direito anglo-saxónico;

- inseriram cláusula em que admitem como lugar possível do cumprimento de obrigações contratuais, resultantes dos contratos de swap, as filiais do Banco/R., situadas em Londres ou no Luxemburgo;

- a A. situou os referidos contratos de swap num contexto internacional, ao alegar que estes – apesar de juridicamente autónomos dos contratos de mútuo bancário anteriormente celebrados - tinham uma funcionalidade  prática ou económica que os conexionava funcionalmente com os mútuos bancários internacionais anteriormente celebrados com Bancos holandês e italiano, já que visavam precisamente prevenir os riscos de flutuação das taxas de juros convencionadas nos referidos financiamentos.

 Ora – pergunta-se – constituirão tais circunstâncias, plasmadas na matéria factual apurada, elementos bastantes de estraneidade ou internacionalidade da relação jurídica que, obstando à sua caracterização como relação puramente interna ou doméstica, fundamentem a aplicação da disciplina fechada e exaustiva contida no Regulamento 44/2001 quanto aos requisitos dos pactos de jurisdição?

   Considera-se que a resposta a esta questão é claramente positiva.

 Note-se, em primeiro lugar, que se vislumbra logo na relação contratual litigiosa, como elemento de internacionalidade, um dos clássicos elementos de conexão utilizados para fixar a competência internacional dos tribunais em matéria obrigacional, ao prever-se a possibilidade de obrigações contratuais, emergentes dos contratos de derivados financeiros celebrados com o R., serem cumpridas em Londres ou no Luxemburgo ( e, portanto, não apenas em Portugal, onde estão sedeadas as entidades em litígio).

   E, ao contrário do que sustenta a A., considera-se evidente que basta para internacionalizar a relação obrigacional a simples possibilidade, contratualmente prevista,  de o respectivo cumprimento ocorrer no estrangeiro: não é, na verdade, essencial que se demonstre que as obrigações emergentes do contrato foram efectivamente cumpridas em Londres ou no Luxemburgo, bastando a mera possibilidade de aí se cumprir a obrigação para, só por si, se internacionalizar a relação obrigacional em litígio: na verdade, a referida cláusula tem de ser interpretada como estipulando lugares alternativos para o cumprimento de determinadas obrigações das partes, tanto admitindo que estas sejam cumpridas em território português, como que o respectivo cumprimento possa verificar-se noutros países – constituindo esta possibilidade de cumprimento de obrigações contratuais no estrangeiro um evidente elemento de estraneidade da relação.

   Saliente-se que o funcionamento deste típico elemento de conexão, fixado em função do lugar de cumprimento das obrigações, nunca exigiu, para poder verificar-se realmente, que se provasse em que lugar foram efectivamente cumpridas as obrigações em causa: basta, aliás, ponderar que, em muitos casos, a acção proposta assenta – e pressupõe precisamente – o incumprimento da obrigação, estabelecendo-se a competência em função do local onde a obrigação litigiosa deveria ou poderia ter sido cumprida, em nada obstando à fixação da competência a circunstância de não ter ocorrido aí qualquer acto efectivo de cumprimento.

   Em suma: o estabelecimento, em cláusula contratual, de um local alternativo para o cumprimento de obrigações contratuais situado no estrangeiro constitui, só por si, um elemento de internacionalização da relação material controvertida, independentemente de se provar ou não que foram efectiva e realmente cumpridas no estrangeiro determinadas obrigações emergentes do contrato.

  Acresce que, no caso em análise, as partes – no exercício da respectiva autonomia da vontade – não se limitaram a estipular um pacto de jurisdição, reservando a competência internacional aos tribunais ingleses – estabelecendo também que o mérito ou substância da relação contratual seria regida pelo Direito anglo saxónico: ora, como nos parece evidente, não pode qualificar-se como relação jurídica puramente interna aquela que as partes voluntariamente quiseram submeter a um direito estrangeiro.

  Saliente-se que a validade desta estipulação contratual não é controvertida pelas partes, não pondo a A. em causa que aceitou efectivamente que a relação de derivados financeiros que estabeleceu com o R. estaria submetida, quanto ao seu mérito, ao Direito inglês: na verdade, a única questão debatida entre as partes prende-se com a eventual aplicabilidade do regime constante do art. 3º, nº3, da Convenção de Roma, consoante se venha a entender que os referidos contratos são ou não configuráveis como traduzindo o estabelecimento de uma relação internacional ( no sentido específico que este conceito assume nesta Convenção: ou seja, de situações que impliquem um conflito de leis): é que, se porventura o não forem, a escolha da lei inglesa não seria totalmente eficaz, na medida em que não afastaria a aplicação das normas imperativas da lei que seria aplicável se não fosse a dita opção das partes pelas regras materiais do direito inglês.

   Trata-se obviamente de questão, situada no domínio das normas de conflitos – e, deste modo, atinente já à apreciação do mérito da causa - que não cumpre abordar num momento em que apenas está em jogo a questão prévia da definição da competência internacional do Tribunal onde a acção foi proposta.

   Apenas se notará, todavia, que – ainda que procedesse a questão da aplicabilidade do referido nº3 do art. 3º da Convenção de Roma ( fazendo prevalecer sobre a escolha do direito anglo saxónico as normas imperativas do Direito português), - nem por isso deixaria a relação contratual de ser primacial e fundamentalmente regulada pelo Direito anglo saxónico – apenas ocorrendo uma restrição ou limitação, necessariamente pontual e circunscrita, quanto à aplicação à substância e interpretação do contrato do Direito inglês, decorrente da prevalência, neste caso, das disposições imperativas que fosse possível identificar  no Direito português.

   Finalmente – e conforme alegação da própria A. – existe uma conexão funcional, económica e prática entre os contratos de swap celebrados com o R. e os contratos – de cariz e contornos claramente internacionais - de mútuo bancário celebrados pela A. com bancos estrangeiros, destinando-se os contratos de derivados financeiros, de um ponto de vista funcional, a garantir a A. contra possíveis flutuações das taxas de juro, vigentes em cada momento.

   E esta ligação – se não puramente jurídica, atenta a abstracção e autonomia dos contratos de derivados financeiros,-  mas antes de natureza funcional e económica entre os contratos de swap e os precedentes contratos de mútuo bancário, de contornos claramente internacionais – não poderá também deixar de relevar, na medida em que, embora de modo meramente complementar e adjuvante, obsta a que os contratos em litígio se possam perspectivar , na sua globalidade, como uma relação puramente interna.

 Considera-se, por outro lado que – na óptica do Direito Comunitário – estes elementos de estraneidade, verificados na relação controvertida, bastam, de forma clara, para – obstando a que tal relação se pudesse perspectivar como meramente interna – despoletar a aplicação da disciplina contida na norma do art. 23º da Regulamento 44/2001: na verdade, a jurisprudência do TJ tem enfatizado o relevo a atribuir à autonomia da vontade das partes no estabelecimento da competência internacional, nomeadamente em sede de relações contratuais, atribuindo inclusivamente um papel fundamental ao juiz nacional no controlo da electiva existência de um consenso dos contraentes em sede de estipulação da competência internacional.

Como se afirma, por exemplo, no recente Acórdão de 21/5/2015, proferido pelo TJ 3ª Secção no P. C 322/14:

27. A este respeito, há que recordar que, uma vez que o Regulamento Bruxelas I substitui, nas relações entre os Estados-Membros, a Convenção de Bruxelas, a interpretação fornecida pelo Tribunal de Justiça no que respeita às disposições dessa Convenção é válida igualmente para as deste regulamento, quando as disposições desses instrumentos possam ser qualificadas de equivalentes (v., designadamente, acórdão Refcomp, C‑543/10, EU:C:2013:62, n.° 18).

28. É esse o caso do artigo 17.°, primeiro parágrafo, da referida Convenção e do artigo 23.°, n.° 1, do Regulamento Bruxelas I, que têm uma redação quase idêntica (acórdão Refcomp, C‑543/10, EU:C:2013:62, n.° 19).

29. Ora, o Tribunal de Justiça decidiu, a propósito do artigo 17.°, primeiro parágrafo, da Convenção de Bruxelas, que, ao subordinar a validade de uma cláusula atributiva de jurisdição à existência de uma «convenção» entre as partes, esta disposição impunha ao órgão jurisdicional a obrigação de averiguar, em primeiro lugar, se a cláusula que lhe atribui competência foi efetivamente  objeto de consenso entre as partes, que deve manifestar‑se de forma clara e precisa, e que as exigências de forma estabelecidas pelo referido artigo têm por função assegurar que o consentimento seja efetivamente provado (v. acórdão MSG, C‑106/95, EU:C:1997:70, n.° 15 e jurisprudência referida).

30. Daí resulta que, à semelhança do objetivo prosseguido pelo artigo 17.°, primeiro parágrafo, da Convenção de Bruxelas, a existência de consenso dos interessados é um dos objetivos do artigo 23.°, n.° 1, do Regulamento Bruxelas I (v. acórdão Refcomp, C‑543/10, EU:C:2013:62, n.° 28 e jurisprudência referida).

   Na verdade, o Regulamento Bruxelas I destaca a importância do respeito pela autonomia da vontade das partes e pretende operar um amplo reconhecimento da faculdade de escolha do tribunal competente pelos particulares, fora do âmbito das competências especiais protectoras de uma das partes no contrato e das competências exclusivas .

   Ora, qualquer interpretação, desproporcionadamente exigente, que levasse a condicionar o exercício da autonomia da vontade à existência de uma ligação profunda do litígio à ordem jurisdicional a que se atribui competência para dele conhecer, estabelecida apenas com base na verificação dos elementos típicos que normalmente ( não havendo pacto de jurisdição) relevam no estabelecimento do tribunal internacionalmente competente, implicaria uma desproporcional restrição ao princípio da autonomia da vontade, condicionando-a muito para lá do que seria razoável e adequado: não pode, nesta perspectiva, proceder a tese sustentada pela entidade recorrente, segundo a qual a estraneidade da relação passaria - exclusiva e necessariamente - pela valoração da nacionalidade, do domicílio das partes e do local do efectivo cumprimento da relação contratual, já que a mesma traduziria uma desproporcional limitação quanto ao relevo atribuído, nomeadamente pelo Regulamento 44/2001, à autonomia da vontade dos interessados no estabelecimento da jurisdição competente; mesmo que se entenda que não deve bastar, como elemento exclusivo de estraneidade, a mera celebração de um pacto de jurisdição, este ficará sujeito à disciplina do art. 23º desde que a relação controvertida , valorada globalmente, apresente indícios minimamente consistentes de transnacionalidade, que obstem à sua qualificação como relação jurídica meramente interna.

   Note-se que – mesmo nos casos em que não ocorreu a celebração de um pacto de jurisdição – o TJ tem entendido que não pode exigir-se, como condição de estraneidade do litígio, a obrigatória verificação de um dos elementos de conexão tipicamente previstos no Regulamento como conditio da competência internacional do Tribunal : como se afirma no Ac. Maletic, de 14/11/12, (P. C‑478/12),o Tribunal de Justiça já declarou que a aplicação das regras de competência desta Convenção exige a existência de um elemento de estraneidade e que o carácter internacional da relação jurídica em causa não tem necessariamente de decorrer, para efeitos da aplicação do artigo 2.° da Convenção de Bruxelas (atual artigo 2.° do Regulamento n.° 44/2001), da implicação de diversos Estados contratantes, devido ao mérito da questão ou ao domicílio respetivo das partes no litígio (v., neste sentido, acórdão de 1 de março de 2005, Owusu, C‑281/02, Colet., p. I‑1383, n.os 25 e 26).

 Como sustenta Lima Pinheiro no parecer junto aos autos, a fls. 2060, a cuja posição inteiramente se adere, mesmo que se entenda que o art. 23º do Regulamento, enquanto norma de competência internacional,  só é aplicável a litígios internacionais, o critério de internacionalidade relevante deve ser flexível e aberto ao conjunto de circunstâncias do caso concreto, a valorar global e casuisticamente, não se devendo, nomeadamente, exigir o domicílio das partes em Estados diferentes.

   Este critério, amplo e flexível, tem em conta os fins e princípios subjacentes à competência internacional e ao sistema de competência em que se integra, respeitando integralmente a funcionalidade do pacto de jurisdição enquanto veículo da autonomia privada, mediante o qual as partes exprimem o seu juízo sobre a jurisdição estadual mais adequada para o julgamento do seu litígio , eliminando a incerteza sobre a jurisdição em que o litígio será dirimido e reforçando a vertente da protecção da confiança, permitido ainda aglutinar ou unificar, através do exercício da autonomia privada, as vertentes da jurisdição e do direito material aplicável ao litígio.

   Considera-se, pois, claro, face ao relevo que o Direito Comunitário e a jurisprudência do TJ vêm conferindo à autonomia da vontade das partes na estipulação da competência internacional, que bastam como elementos de estraneidade do litígio sujeito a pacto de jurisdição o local possível de cumprimento de obrigações contratuais, a submissão, no exercício da autonomia da vontade das partes, da substância do litígio a um direito material estrangeiro e a conexão – senão jurídica, ao menos funcional e económica - dos contratos de derivados financeiros celebrados por contraentes sediados em Portugal a contratos de mútuo bancário de contexto claramente internacional – determinando a ponderação global de todos esses elementos de internacionalidade que a relação contratual em litígio não possa qualificar-se como relação puramente interna, susceptível de obstar à aplicação da disciplina contida no art. 23º do Regulamento 44/2001.

    E, assim sendo, de acordo com a doutrina contida no Acórdão Cilfit de 6/10/82, considera-se dispensável a suscitação, em reenvio prejudicial, da questão interpretativa do art. 23º do Regulamento, uma vez que:

- a questão de interpretação normativa que seria pertinente formular ( saber se o pacto de jurisdição não constitui, só por si, elemento de estraneidade susceptível de despoletar a aplicação da disciplina contida no Regulamento) não é necessária nem pertinente para o julgamento do litígio principal, já que a matéria factual  a este subjacente revela de forma manifesta outros elementos de internacionalidade;

- ponderada a jurisprudência reiterada do TJ e a funcionalidade e teleologia das normas comunitárias que prevêem a relevância da autonomia da vontade das partes na estipulação da competência internacional, não subsiste  qualquer dúvida razoável quanto à suficiência dos referidos elementos de estraneidade da relação , considerando-se, por isso,  claro e evidente que uma relação contratual com tal configuração não pode perspectivar-se como constituindo uma relação puramente interna, susceptível de afastar a aplicabilidade da norma contida no citado art. 23ºdo Regulamento 44.

7. Assente a aplicabilidade da disciplina contida no art. 23º do Regulamento 44, são improcedentes as objecções esgrimidas pela recorrente à validade do pacto de jurisdição estipulado, quer na óptica do art. 94º do CPC, quer na do regime instituído em sede de cláusulas contratuais gerais no art. 19º, alínea g) do DL 446/85 – cumprindo, quanto a este ponto, realçar que resulta da matéria de facto provada que foi a própria A. a propor ao R. as cláusulas que integram os contratos em litígio, objecto, aliás, de um específico  procedimento negocial, em que a A. foi devidamente coadjuvada por outra entidade bancária ( cfr. pontos 3, 5 e 8 da matéria de facto).

   Assim – e como está há muito pacificamente estabelecido - no seu campo de aplicação, o regime estabelecido no Regulamento CE 44/2001 prevalece sobre as disposições de direito interno que regulam os pactos ou convenções acerca da competência internacional, contendo uma disciplina exaustiva da validade e admissibilidade destes, insusceptível de ser complementada com outras e adicionais exigências, previstas no regime adjectivo da competência internacional no direito interno: daqui decorre naturalmente que – sendo aplicável tal Regulamento – não pode condicionar-se a validade de pacto de jurisdição, celebrado com base nas disposições de Direito Comunitário, em função da invocação de requisitos, previstos na lei de processo interna, mas ali não contempladas – como ocorre precisamente com a exigência de que exista uma conexão efectiva da ordem escolhida com a matéria litigiosa e se mostre adequada e justificada a escolha do tribunal feita pelas partes.

Como se afirma, por exemplo, no recente Ac. de 11/2/15, proferido pelo STJ no P. 877/12.7TVLSB.L1-A.S1 :

Perante uma situação jurídica plurilocalizada e transnacional, tem de se atender às regras da competência internacional e, particularmente, quando envolva Portugal e algum dos Estados-Membros da União Europeia, ao direito da competência internacional da União Europeia, constante do Regulamento (CE) n.º 44/2001, e desde 10/01/2015, do Regulamento (UE) n.º 1215/2012) – cf. art. 8.º, n.º 4, da CRP.
A interpretação uniforme daqueles Regulamentos está confiada ao Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), pelos procedimentos ordinários de interpretação do direito comunitário – cf. art. 267.º do TFUE.
O Regulamento n.º 44/2001 não exige qualquer solenidade especial para a atribuição de competência judiciária e o regime do seu art. 23.º prevalece sobre as regras de forma de direito interno que fixem requisitos formais mais exigentes para os pactos de jurisdição.
- A noção de pacto de jurisdição vertida no Regulamento n.º 44/2001 é autónoma relativamente aos direitos nacionais dos Estados-Membros e deve ser interpretada como um conceito autónomo.
- Perante o regime do Regulamento n.º 44/2001, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado.

Ora, no caso dos autos, estando assente a aplicabilidade do referido Regulamento, por se verificarem os respectivos pressupostos, está naturalmente vedada – face à reconhecida prevalência do regime constante do art. 23º- que contém disciplina fechada e exaustiva dos requisitos da figura do pacto de jurisdição no domínio do Direito Comunitário -  a aplicação de requisitos adicionais previstos na lei adjectiva nacional – como sucede precisamente com a norma constante do nº3 do art. 94ºdo CPC , ao condicionar a validade da eleição do foro à exigência de que esta não envolva  inconveniente grave para nenhuma das partes.

E o mesmo sucede com a pretendida nulidade, decorrente da aplicabilidade do regime das cláusulas contratuais gerais, tal como se mostra delineado nas disposições de direito interno.

   Note-se que não resulta dos autos, com a indispensável clareza, que a referida cláusula se possa sequer considerar como cláusula contratual geral, proposta pelo Banco R. e incluída no contrato sem prévia negociação das partes.

   Mas mesmo admitindo que pudesse revestir tal natureza – e estando em causa litígio entre entidades colectivas, emergente do desenvolvimento das respectivas actividades empresariais – não pode convocar-se a proibição constante do art. 19º, al. g) do DL220/95 para criar um obstáculo adicional à validade dos pactos de jurisdição, tal como emerge do estatuído no art. 23º do Regulamento em causa.

 Citando, mais uma vez, o Ac. de 11/2/15: a validade do pacto de jurisdição, constante de uma cláusula contratual geral, integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada, é analisada, exclusivamente, segundo o disposto no art. 23.º, do Regulamento n.º 44/2001, sendo inaplicável o regime jurídico interno das cláusulas contratuais gerais.

Importa salvaguardar, prima facie, que o TJCE considerou, a propósito da norma similar constante do art. 17.º da Convenção de Bruxelas – sendo essa jurisprudência extensível ao art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001[53] –, que a noção de pacto de jurisdição é autónoma relativamente aos direitos nacionais dos Estados-Membros (cf. Acórdão do TJCE Powell Doffryn v. Wolfang Petereit, de 10/03/1992)[54].

Este mesmo princípio tem sido várias vezes reiterado, e foi-o, recentemente, no Acórdão do TJUE Refcomp SpA v. Axa Corporate Solutions Assurance S.A. e outros, de 07/02/2013, em cujo ponto 40 se adverte que o conceito de pacto privativo de jurisdição deve ser interpretado como um conceito autónomo e dar ao princípio da autonomia da vontade, no qual se fundamenta o art. 23.º, n.º 1, do Regulamento n.º 44/2001, a sua plena aplicação[55].

Por seu turno, ainda segundo a jurisprudência do TJUE, que, recorda-se, é lapidar para a uniformização do Direito da União Europeia, é ponto assente que o art. 23.º assume carácter exclusivo na apreciação da validade dos pactos de jurisdição submetidos à aplicação do Regulamento n.º 44/2001.

Neste sentido, veja-se o importante Acórdão do TJCE Trasporti Castelletti Spedizioni Internazionali SpA v. Hugo Trumpy SpA, de 16/03/1999[56], que se debruçou sobre a norma paralela do art. 17.º da Convenção, e inúmeras vezes citado, em cujas considerações decisórias, aqui pertinentes (e que se reproduzem), se exarou:

 “ (…) 48. Tal como o Tribunal de Justiça afirmou em diversas ocasiões, obedece ao espírito de segurança jurídica, que constitui um dos objectivos da convenção, o facto de o juiz nacional a quem foi submetida a questão poder facilmente pronunciar-se sobre a sua própria competência com base nas regras da convenção, sem ser obrigado a proceder a um exame do processo quanto ao mérito (acórdãos de 22 de Março de 1983, Peters, 34/82, Recueil, p. 987, n.° 17; de 29 de Junho de 1994, Custom Made Commercial, C-288/92, Colect., p. 1-2913, n.° 20; e Benincasa, já referido, n.° 27). Nos n.ºs 28 e 29 do acórdão Benincasa, já referido, o Tribunal de Justiça precisou que esta preocupação de garantir a segurança jurídica através da possibilidade de prever com segurança o foro competente foi interpretada, no âmbito do artigo 17.° da convenção, através da fixação de condições de forma estritas, tendo esta disposição por objectivo designar, de forma clara e precisa, um tribunal de um Estado contratante a quem é atribuída competência exclusiva em conformidade com o consenso das partes.

49. Resulta do exposto que a escolha do tribunal designado só pode ser apreciada à luz de considerações ligadas às exigências estabelecidas pelo artigo 17.°

50. Foi por estas razões que o Tribunal de Justiça concluiu em várias ocasiões que o artigo 17.° da convenção abstrai de qualquer elemento objectivo de conexão entre a relação controvertida e o tribunal designado (acórdãos de 17 de Janeiro de 1980, Zeiger, 56/79, Recueil, p. 89, n.° 4; MSG, já referido, n.° 34; e Benincasa, já referido, n.° 28).

51. Pelas mesmas razões, numa situação como a dos autos no processo principal, deve excluir-se o controlo suplementar do mérito da cláusula e do objectivo prosseguido pela parte que a inseriu, e não pode ser reconhecida qualquer incidência, quanto à validade da referida cláusula, das normas substantivas em matéria de responsabilidade aplicáveis no tribunal escolhido.

52. Deve, por consequência, responder-se às terceira, sétima e sexta questões que o artigo 17.°, primeiro parágrafo, segunda frase, terceira hipótese, da convenção deve ser interpretado no sentido de que a escolha do tribunal designado numa cláusula atributiva de jurisdição só pode ser apreciada à luz de considerações ligadas às exigências estabelecidas pelo artigo 17.° da convenção. São estranhas a estas exigências quaisquer considerações relativas aos elementos de conexão entre o tribunal designado e a relação controvertida, ao mérito da causa e às normas substantivas em matéria de responsabilidade aplicáveis no tribunal escolhido” .

A orientação do TJUE é, pois, categórica e inequívoca no sentido dos requisitos de validade do pacto de jurisdição só serem aqueles que estão vertidos no art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001.

Isto mesmo é enfatizado por Sofia Henriques: “O Regulamento comunitário, tal como acontecia na Convenção de Bruxelas, não exige, nos pactos de jurisdição, qualquer conexão entre o tribunal escolhido pelas partes e a relação litigiosa, nem a adequação ou justificação da escolha do tribunal.

Na verdade, diferentemente do que acontece no nosso direito interno, (…) o Regulamento não exige o controlo dos fundamentos da atribuição de competência ao tribunal escolhido, pelo que as partes poderão escolher um qualquer foro competente, independentemente das razões que fundamentam essa escolha”[57].

Destarte, é irrelevante para esse efeito fazer qualquer tipo de apreciação da validade do pacto de jurisdição à luz do direito interno do respectivo Estado-Membro.

E, assim sendo, para que a escolha do tribunal seja válida é desnecessário que exista qualquer conexão entre o objecto do litígio e o tribunal designado, não sendo valoráveis, designadamente, os hipotéticos inconvenientes, para uma das partes, da localização do foro convencionado.

Aliás, parece ostensivo, sempre que as partes atribuem, através de uma pacto de jurisdição, competência a um tribunal estrangeiro, o qual se situa forçosamente noutro Estado-Membro, ocorrerá sempre o inconveniente, pelo menos para uma delas, de esse tribunal ser distante da respectiva sede.

Adicionalmente, mesmo que se pondere que nos deparamos com uma cláusula contratual geral, tem se atender ao facto de a autora/recorrida ser uma sociedade comercial que se dedica à fabricação de produtos de papel e alimentares, e, por isso mesmo, uma entidade com natureza empresarial e não um mero consumidor individual. 

Ora, nessa circunstância, inexiste qualquer disposição de Direito da União Europeia que deva ser respeitada, ao abrigo do art. 67.º do Regulamento, pelo que a validade do pacto de jurisdição é aferida exclusivamente pelo disposto no art. 23.º do Regulamento.

Só assim não seria se a cláusula contratual geral estivesse integrada num contrato celebrado com um consumidor, pois, nessa circunstância, decorre do art. 67.º do Regulamento, de forma indirecta, que se impõe a consideração do disposto na Directiva 93/13/CEE do Conselho, de 05/04/1993, relativa às cláusulas abusivas nos contratos celebrados com os consumidores – cf., v.g., art. 3.º, n.º 3 da Directiva e n.º 1, al. q), do Anexo à Directiva (pode ser abusiva a cláusula que suprima ou entrave a possibilidade de intentar acções judiciais ou seguir outras vias de recurso por parte do consumidor)[58].

Em todo o caso, mesmo aventando que o pacto de jurisdição constava de uma cláusula contratual geral e que se considerasse que o contrato foi outorgado em Portugal, constando as cláusulas em apreço de dois contratos de swap celebrados entre empresários ou entidades equiparadas (para utilizar a terminologia da Secção II LCCG), nunca seria de aplicar a Directiva 93/13/CEE – ou o regime do art. 21.º da LCCG (que está inserido na Secção III reportada aos consumidores finais) – por não estar em causa qualquer consumidor.

Acrescenta-se, também, e como já antes se demonstrou, que jamais seria de recorrer ao art. 19.º, al. g), da LCCG, por se tratar de um normativo de direito interno, não resultante do direito europeu, o qual é insusceptível de prevalecer sobre o regime do art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001.

Em resumo: a validade do pacto de jurisdição constante de uma cláusula contratual geral integrada num contrato celebrado entre um empresário ou entidade equiparada é analisada, exclusivamente, segundo o disposto no art. 23.º do Regulamento n.º 44/2001.

 Em suma: não é aplicável aos pactos privativos de jurisdição regidos pelo Regulamento 44/2001 o requisito – condicionador da legitimidade da eleição do foro - previsto em disposições de direito interno, quer no âmbito do CPC, quer no do regime das cláusulas contratuais gerais, segundo o qual tal eleição está condicionada à exigência de que a fixação do foro competente não envolva inconveniente grave para nenhuma das partes.

E, deste modo, estando assente a aplicabilidade ao pacto de jurisdição celebrado do regime contido no art. 23º do Regulamento 44/2001 e ponderada a sua autonomia e completude, relativamente aos requisitos exigidos nos Direitos nacionais quanto à competência convencional, resta confirmar o decidido pelas instâncias, no sentido da vinculação da A. ao pacto de jurisdição que celebrou com a contraparte, o que naturalmente envolve a procedência da excepção dilatória de incompetência internacional dos Tribunais portugueses para a presente acção.

8. Nestes termos e pelos fundamentos apontados nega-se provimento à revista, confirmando a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 4 de Fevereiro de 2016

Lopes do Rego (Relator)

Orlando Afonso

Távora Victor