Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | 7ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANA PAULA BOULAROT | ||
Descritores: | SOCIEDADE COMERCIAL RESPONSABILIDADE DO GERENTE DEVER DE DILIGÊNCIA DEVER DE LEALDADE | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 02/14/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
Área Temática: | DIREITO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS - ADMINISTRAÇÃO E FISCALIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL PELA CONSTITUIÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E FISCALIZAÇÃO DA SOCIEDADE. DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO / ACTOS PROCESSUAIS (NULIDADES) - PROCESSO DE DECLARAÇÃO - SENTENÇA (EFEITOS) - PROCESSOS ESPECIAIS. ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA - TRIBUNAIS DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (TRIBUNAIS DE COMÉRCIO). | ||
Doutrina: | - João Soares da Silva, Responsabilidade Civil Dos Administradores De Sociedade: Os Deveres Gerais E A corporate governance, in ROA, Ano 57, Tomo II, 605/628. - Menezes Cordeiro, “Código Das Sociedades Comerciais” Anotado, 2ª edição, 2011, 279, 292; Os Deveres Fundamentais Dos Administradores Das Sociedades, in ROA, Ano 66, Tomo II, 443/488. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS (CSC): - ARTIGOS 64.º, 72.º, N.º1, 79.º. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 199.º, 204.º, 672.º, 1122.º E SS.. LEI N.º3/99 DE 13-1 (LEI DE ORGANIZAÇÃO E FUNCIONAMENTO DOS TRIBUNAIS JUDICIAIS - LOFTJ): - ARTIGO 89°, Nº 1, ALÍNEA C). | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I A expressão «corporate governance» abrange um conjunto de princípios válidos para uma gestão de empresa responsável abrangendo as regras jurídicas societárias aludidas no artigo 64º do CSComerciais, as regras gerais de ordem civil, os deveres acessórios de base jurídica, as normas de gestão de tipo económico e os postulados morais e de bom senso que interfiram na concretização de conceitos indeterminados. II A violação de tais princípios por banda dos gerentes da sociedade faz impender sobre estes, não só o dever de ressarcir aquela dos danos que eventualmente lhe venha a causar, como também, dos danos que igualmente possam advir aos restantes sócios por via dessa sua actuação. (APB)
| ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
I S por si e em representação da sociedade M, LDA., demandou A, pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de € 54.533,32 - € 19.093,12 a título de danos patrimoniais à sociedade M e € 35.440,60 a título de danos patrimoniais à Autora S, montantes esses acrescidos dos juros de mora, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento. Alegou em síntese que a Autora sociedade tem por objecto a representação e comercialização de calçado e acessórios de moda, consistindo a sua actividade comercial na venda de produtos da sociedade anónima denominada "F - Calçado, S.A.", no Centro Comercial Dolce Vita, em Miraflores, no âmbito de um contrato de franchising celebrado em 3/11/2004 e que a Autora S e a Ré A são as únicas e actuais sócias/gerentes da sociedade autora, detentoras de uma quota de € 2.500,00 cada uma. Desde inícios de 2005 que a Ré, no exercício da gerência da sociedade e sem qualquer consentimento da mesma, tem praticado mínimo, a auferir, não fora a conduta culposa da ré que conduziu ao encerramento definitivo da loja em 3/8/2005 até hoje, computando-se os prejuízos em € 19.093,12. A Autora S, em 4/8/2005, procedeu ao pagamento do transporte dos móveis da sociedade da loja do Centro Comercial para uma garagem no Cacém, no valor de € 121,00; com a regularização e cancelamento da conta da sociedade gastou € 176,34; efectuou investimentos na sociedade - como garantia do stock depositado na loja da sociedade pagou à F € 25.000,00, recebeu € 16.597,96, pelo que tem ainda a receber € 8.402,04; com a abertura da loja gastou € 24.778,18 tendo, para tal, contraído um empréstimo junto do BES, pagando mensalmente a quantia de € 482,18, sendo que, à data do encerramento da loja, o crédito total era no valor de € 26.771,22, situação que se mantém, somando os prejuízos o valor de € 35.440,60.
Na contestação a Ré excepcionou a incompetência material do tribunal, a nulidade da deliberação tomada e a ilegitimidade das autoras e deduziu pedido reconvençional pugnando pela condenação solidária das Rés a pagar à Ré/Reconvinte a quantia de € 33.428,92, acrescida dos juros legais desde a citação até efectivo pagamento.
Após julgamento foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e improcedente a reconvenção tendo a Ré sido condenada a pagar à sociedade autora a quantia de € 19.093,12 e à Autora S € 31.477,56, acrescendo sobre estas quantias os juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação até integral pagamento e as autoras absolvidas do pedido reconvencional.
Inconformada a Ré apelou, tendo a Apelação sido julgada improcedente.
Vem agora a Ré recorrer de Revista, apresentando as seguintes conclusões: - O Tribunal da Relação, apesar de ter modificado a matéria de facto dos artigos 32°, 33° e 34° da douta base instrutória, ainda assim, apesar desta alteração, fundamenta a decisão com base em factos que alterou, designadamente “em frente a clientes e no horário do seu funcionamento”, ora, não estando provados estes factos não podem eles servir de fundamento para a decisão; - Como questão prévia, a recorrente entende que A. S ao marcar uma Assembleia Geral Extraordinária, da sociedade, a realizar no dia 15/01/2007, pelas 19 horas, ou seja quase dois anos após o encerramento do estabe1ecimento, na Avenida …., viola a Lei art. 377°, nº 6 do Código das Sociedades Comerciais. A sede da sociedade não é neste local, mas antes na Avenida …., Oeiras. “A mudança da sede de uma sociedade comercial envolve alteração do contrato de sociedade com as consequências daí resultantes em matéria de consentimento e formalidades”. Cfr. Acordão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18.12.2001. A Assembleia deveria ter sido convocada para a sede da sociedade - Cfr. art. 377°, nº 6 do Código das Sociedades Comerciais, e a sede deveria ter sido alterada e registada essa alteração na Conservatória, e não tendo sido convocada para a sede da sociedade a assembleia não foi validamente convocada e, por isso, é nula a deliberação nela tomada - cfr. art. 56°, n°1, alínea a) do Código das Sociedades Comerciais. - Fundamentam as recorridas o pedido ao abrigo do disposto no artigo 75° do Código das Sociedades Comerciais, estando em questão uma acção da sociedade por actos alegadamente praticados pela Ré, enquanto gerente da sociedade M, assim, e salvo melhor opinião, estamos perante uma acção relativa ao exercício de direitos sociais, da competência dos Tribunais de Comércio, prevista no artigo 89°, nº 1, alínea c) da Lei 3/99 de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais) sendo o Tribunal comum incompetente para a presente acção. Neste sentido, Cfr. Acordão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Janeiro de 2011, proferido no processo nº 1032/08.6TYLSB.L1.S1, 6ª Secção.; - Foi curta a vida desta sociedade, feita a escritura em 22.12.2004, e encerramento em 03 de Agosto de 2005, durou apenas 8 meses. É muito pouco tempo para saber se um negócio dá certo ou não e muito menos para apurar com rigor qual seria a facturação previsível da sociedade. É tecnicamente incorrecto dizer-se que a sociedade iria ter uma evolução de vendas sem ter em consideração o passivo, designadamente as rendas em divida, Foram confundidos pelo Tribunal a quo conceitos, ao igualar o termo técnico volume de vendas ao termo margem bruta, volume de vendas não é o mesmo que margem bruta nem esta é o mesmo que margem bruta simplificada, conceitos que ficaram por esclarecer. Entendemos que tudo o que aqui se está a discutir é matéria de dissolução e liquidação da sociedade e eventualmente de prestação de contas, uma vez que a sociedade deixou de ter qualquer actividade desde 3 de Agosto de 2005 e que já não paga rendas do estabelecimento desde Abril de 2005. Ambas, Autora e Ré, entraram com dinheiro para a sociedade, mas como as receitas não deram aquilo que elas esperavam, não dando sequer para pagar a renda do estabelecimento, estando 5 meses de renda em atraso (meses de Abril a Agosto de 2005), e bem assim a segunda prestação do direitos de ingresso, mais juros, eis o que os documentos que fazem fls 99 e 100 demonstram, as coisas começaram a funcionar mal. Por conseguinte se há contas a prestar ou a liquidar é entre a sociedade e as sócias e não entre estas. É um problema de liquidação; - O Tribunal da Relação fundamenta a decisão que mantém a condenação da Ré A a pagar às Autoras, na violação exclusiva dos deveres de cuidado e de lealdade a que estava adstrita para com a sociedade M e para com a outra sócia. Não descortinamos que dever de cuidado ou de lealdade para com a sociedade tenha a Ré violado, até porque tinha esta todo o interesse que a sociedade tivesse sucesso para recuperar o capital investido e poder beneficiar das receitas que o negócio podia e devia gerar. Os documentos da sociedade estão na posse da Autora impedindo a Ré de os usar e assim demonstrar que não violou qualquer dever (violando o artigo 342º do Código Civil). Acontece é que na realidade a sociedade não gerava receitas suficientes para fazer face às despesas, quer com a renda do estabelecimento quer com os encargos assumidos com ambos os familiares delas e o controle sobre as contas da sociedade perdeu-se. Mas a responsabilidade por esta situação é repartida igualmente por ambas as sócias. Se porventura algum acto praticado pela Ré tenha prejudicado o património da sociedade não podemos olvidar que também se reflectiu indirectamente sobre o património da sócia aqui recorrida. o que exclui a responsabilidade de indemnizar. Neste sentido cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Março de 2011: - Alega a A. recorrida que não vai recuperar todo o dinheiro que investiu na sociedade, por culpa da Ré, mas acaso esquece que também a recorrente não vai recuperar tudo aquilo que lá investiu, e qual é a culpa da Ré? Ou será antes que a culpa é da Autora que encerrou a Loja sem fazer diligências no sentido de salvar a sociedade e ter feito seu um cheque da sociedade no valor de € 6.597,96 - Provado em 63°, A Ré para além de ter entrado com metade do capital social, ter pago metade do valor das obras (cfr, provado em 57, a contrario ), efectuou diversos suprimentos (provado em 9, 59), pagou despesas (provado em 10, 60, 61 e 62), estando desembolsada em mais de € 28.946,74. Não se descortina qualquer ilicitude na conduta da Ré, mesmo que, em tese, se considere os factos incorrectamente apurados pelo Tribunal a quo, quer contratual quer legal. - Relativamente à fundamentação da condenação da recorrente no pagamento à Autora S, com base no disposto no artigo 79° do Código das Sociedades Comerciais. Tem sido entendimento da Jurisprudência e da Doutrina que a responsabilidade a que se refere este artigo é por danos directamente causados. Ora esse nexo causal não foi efectuado e, por conseguinte, não existe obrigação de indemnizar; - Não se verificando os apertados limites de aplicação do disposto no artigo 79° do Código das Sociedades Comerciais não deve a ré A ser responsabilizada pelo pagamento de qualquer quantia à recorrida, sua, sócia, antes devem ir discutir o deve o haver numa acção de prestação de contas ou em liquidação da sociedade, que há muito deveria ter sido dissolvida, ou requerida a sua apresentação à insolvência; - O Tribunal da Relação de Lisboa ao decidir da forma que decidiu violou, entre outros, o disposto no artigo 89°, nº1, alínea c) da Lei 3/99 de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), nos arts. 64° 72° e 79°, do Código das Sociedades Comerciais, e nos artigos 342°, nº1, 483° do Código Civil.
Não foram apresentadas contra alegações.
II Põem-se como problemas de direito a resolver no âmbito do presente recurso os de saber: i) se a deliberação tomada é nula; ii) se o Tribunal comum é o competente para conhecer da acção; iii) e sendo o mesmo o competente se há fundamento legal para a condenação da Ré ora Recorrente.
As instâncias deram como provada a seguinte factualidade: - A autora S e a ré constituíram a autora M, Lda., em 22 de Dezembro de 2004, com o capital social de € 5.000, com quotas iguais de € 2.500,00 cada, sendo as únicas sócias e gerentes da sociedade, conforme consta do documento que dou por reproduzido e que dos autos de é fls. 19 a 22. (Alínea A)) - A M, Lda., é uma sociedade comercial por quotas e encontra-se registada na Conservatória do Registo Comercial de Cascais, tendo por objecto a representação e comercialização de calçado e acessórios de moda e sede na Av…, conforme consta de documento que dou por reproduzido e que dos autos é fls., 19 a 23. (Alínea B)) - A autora M efectuava a venda de produtos da - Por carta registada, datada de 21 de Dezembro de 2006, a ré foi notificada da convocatória para a assembleia geral extraordinária da ", Lda." a realizar no dia 15 de Janeiro de 2007, pelas 19h00, na Avenida … com a seguinte ordem de trabalhos: "Ponto Único: Propositura de uma acção declarativa condenatória de indemnização - Foi elaborada a acta n° 8 da assembleia geral extraordinária da "M, Lda." realizada no dia 15 de Janeiro de 2007, onde consta que foi deliberado e aprovado com os votos da sócia S a propositura de uma acção declarativa condenatória de indemnização, legalmente prevista no citado art. 75/1 do C.S.C., conforme consta do documento que dou por reproduzido e que dos autos é fls. 46-47. (Alínea E)) - Todas as diligências relacionadas com o encerramento - No dia 19 de Agosto de 2005, a ré para seu benefício individual com o cartão multibanco da M, Lda., n°…. conta depósito à ordem - empresas n° 000 do Banco Santander Totta, S.A. procedeu ao levantamento da quantia de €20,00. (Alínea G)) - No dia 22 de Agosto de 2005, a ré efectuou da conta depósito à ordem - empresas n° 000 - Banco Santander Totta, S.A. uma transferência a seu favor, no valor de €515,00. (Alínea H)) - Em 01 de Fevereiro de 2005, a ré efectuou novo suprimento - A ré pagou uma factura à F, no valor de - Em 12 de Janeiro de 2005 a ré efectuou um pagamento com cheque do Banco da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo e para seu benefício individual, no valor de € 64,80. (resposta ao ponto 1. da base instrutória) - Em 23 de Janeiro de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda do Banco Espírito Santo, efectuou compras para o seu benefício individual, na loja W, em Almada, no valor de € 85,75. (resposta ao ponto 2. da base instrutória) - Em 11 de Fevereiro de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, efectuou um pagamento no cabeleireiro B, em Linda-a-Velha, no valor de € 10,50. (resposta ao ponto 3. da base instrutória) - Em 26 de Fevereiro de 2005, a ré, com quantias da conta da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para seu benefício individual, efectuou compras na loja C, em Algés, no valor de € 69,00 e um levantamento de € 20,00. (resposta ao ponto 4. da base instrutória) - Em 2 de Março de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na V C, em Miraflores, no valor de € 17,37. (resposta ao ponto 5. da base instrutória) - Em 9 de Março de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou um pagamento no Gabinete de Identificação Civil de Lisboa, no valor de € 7,05 e um levantamento em numerário de € 20,00. (resposta ao ponto 6. da base instrutória) - Em 1 de Maio de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na loja C, em Algés, no valor de € 58,99. (resposta ao ponto 7. da base instrutória) - Em 7 de Maio de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras nas lojas W e P, ambas e Lisboa, nos valores respectivamente de € 19,99 e de €41,80. (resposta ao ponto 8. da base instrutória) - Em 10 de Julho de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na Loja do G P, em Lisboa, no valor de € 61,60. (resposta ao ponto 9. da base instrutória) - Em 13/7/2005, a ré com quantias da conta da - Em 17 de Julho de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras nas lojas P e J, em Lisboa, nos valores respectivamente de € 25,00 e € 254,00. (resposta ao ponto 11. da base instrutória) - Em 18 de Agosto de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou um pagamento na V Clínica, em Linda-a-Velha, no valor de € 16,00. (resposta ao ponto 12. da base instrutória) - Em 22 de Agosto de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras no C de Oeiras, no valor de €62,23. (resposta ao ponto 13. da base instrutória) - Em 23 de Agosto de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na Loja do G P, em Oeiras, no valor de € 135,15. (resposta ao ponto 14. da base instrutória) - Em 24 de Agosto de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na O, em Linda-a-Velha, no valor de €80,73. (resposta ao ponto 15. da base instrutória) - Em 27 de Agosto de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na loja H, em Lisboa nos valores de € 23,80 e € 59,00. (resposta ao ponto 16. da base instrutória) - Nesse mesmo dia (27/08/05) a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou um pagamento à sociedade comercial por quotas denominada N Portugal, Lda., em Carnaxide, no valor de € 124,73. (resposta ao ponto 17. da base instrutória) - Em 29 de Agosto de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para seu benefício individual efectuou compras no I, em Alfragide Amadora, no valor de €44,41. (resposta ao ponto 18. da base instrutória) - Em 5 de Setembro de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras no C, em Lisboa, no valor de €124,56. (resposta ao ponto 19. da base instrutória) - No dia 11 de Setembro de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou um pagamento num restaurante sito em Setúbal, no valor de €26,10. (resposta ao ponto 20. da base instrutória) - Nesse mesmo dia (11/07/05) a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou também compras na loja S, em Lisboa, nos valores respectivamente de € 5,90 e € 39,90. (resposta ao ponto 21. da base instrutória) - No dia 18/07/2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para seu benefício individual, efectuou um pagamento na E, em Linda-a-Velha, no valor de € 40,00. (resposta ao ponto 22. da base instrutória) - Nesse dia (18/08/05) a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou também compras na loja P P, em Lisboa nos valores respectivamente de € 8,00, € 39,90. (resposta ao ponto 23. da base instrutória) - No dia 19 de Setembro de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou pagamentos no S Cabeleireiros, B M e J M R, todos em Lisboa, nos valores de € 11,00, € 12,00 e € 40,00. (resposta ao ponto 24. da base instrutória) - No dia 20 de Setembro de 2005, a ré, com quantias da conta da M, Lda., no Banco Espírito Santo, para o seu benefício individual, efectuou compras na loja C, em Linda-a-Velha, no valor de € 13,95. (resposta ao ponto 25. da base instrutória) - Em 18 de Março de 2005, a ré para seu benefício individual, com o cartão multibanco da M, Lda., n°…., da conta depósito à ordem - empresas n° 000 - Banco Santander Totta, S.A, efectuou um pagamento no Posto da … Barreiro, no valor de € 50,00. (resposta ao ponto 26. da base instrutória) - Nesse mesmo dia (18/03/05) a ré para seu benefício individual, com o cartão multibanco da M, Lda., n° …., da conta depósito à ordem - empresas n° 000 -Banco Santander Totta, S.A, no Fórum Montijo, procedeu ao levantamento da quantia de € 20,00. (resposta ao ponto 27. da base instrutória) - Em 1 de Abril de 2005, a ré transferiu da conta depósito à ordem - empresas n° 000, do Banco Santander Totta, SA, a quantia de € 481,00 - transferência n° … que identificou como sendo para a F..., para o NIB 000, para seu benefício individual, cujo destinatário é J S, seu pai. (resposta ao ponto 28. da base instrutória) - Nos dias 10 de Maio e 4 de Julho de 2005, a ré, para seu benefício individual, com o cartão multibanco da M, Lda., …, da conta depósito à ordem - empresas n° 000 Banco Santander Totta, S.A, no Centro Comercial Colombo, a ré procedeu ao levantamento das quantias, respectivamente de € 100,00 e € 200,00. (resposta ao ponto 29. da base instrutória) - Nos dias 23 de Maio e 1 de Junho de 2005, a ré, para seu benefício individual, com o cartão multibanco da M, Lda., n°…., da conta depósito à ordem - empresas n° 000 - Banco Santander Totta, S.A., efectuou pagamentos no Posto E, nos valores respectivamente de 15,00 e €10,01. (resposta ao ponto 30. da base instrutória) - Nos dias 18 de Abril de 2005, 3 de Junho de 2005 e 28 de Julho de 2005, a ré, para seu benefício individual, emitiu cheques nos valores respectivamente de € 42,00, € 23,00 e € 55,00, este último favor de F P, da conta depósito à ordem - empresas da M, n° 000 - Banco Santander Totta, S.A.. (resposta ao ponto 31. da base instrutória) - A partir de meados do mês de Junho de 2005, houve falhas no registo dos dados da facturação da M. (resposta ao ponto 32. da base instrutória) - A ré provocava constantemente discussões no estabelecimento comercial da M com a outra sócia/gerente, S, chamando-lhe inútil, atrasada mental, estúpida. (resposta ao ponto 33. da base instrutória) - Tais factos contribuíram para gerar uma quebra no volume de vendas da M em Junho de 2005. (resposta ao ponto 34. da base instrutória) - Em Julho 2005 a ré retirou do estabelecimento/loja da M o sistema informático de registo, o computador, modem de acesso à Internet, leitor óptico, dockstation, terminal POS e o carimbo da empresa. (resposta ao ponto 35. da base instrutória) - O que impedia o funcionamento da loja da M. (resposta ao ponto 36. da base instrutória) - O volume de vendas mensal em Junho era de € 935,00. (resposta ao ponto 37. da base instrutória) - A margem bruta simplificada referente ao meses de Maio, Junho e Julho de 2005 foi, respectivamente, de € 944,91, € 10,04 e de €3.532,08. (resposta ao ponto 38. da base instrutória) - A M teve que encerrar o estabelecimento porque também estava desprovida de bens para laborar, considerando a margem bruta. (resposta ao ponto 39. da base instrutória) - Não restou outra alternativa à M, senão a de rescindir o Contrato Comercial de Franchising celebrado com a sociedade comercial anónima denominada "F - Calçado SA". - Se a loja da autora M estivesse aberta teria o volume de vendas mensais de € 935,00. (resposta ao ponto 40. da base instrutória) - Para pagamento do transporte dos móveis da M, da loja F no Centro Comercial Dolce Vita, em Miraflores, para a garagem n° …, do prédio sito na … no Cacém, despendeu a autora S, em 4 de Agosto de 2005, a quantia de € 121,00. (resposta ao ponto 42. da base instrutória) - Para regularização e posterior cancelamento da conta da M, Lda., n° 000, do Banco Santander Totta SA, despendeu a autora S, em 5 de Abril de 2006, a quantia de € 176,34. (resposta ao ponto 43. da base instrutória) - Com o encerramento definitivo da loja/estabelecimento da M no Centro Comercial Dolce Vita, em Miraflores, em 3/8/2005, a autora S está impossibilitada de recuperar o capital que investiu na M. (resposta ao ponto 44. da base instrutória) - Em 3 de Novembro de 2004, pagou a autora S, da sua conta pessoal, à sociedade comercial anónima denominada "F - Calçado SA", como garantia pelo stock depositado na loja/estabelecimento da M, a quantia de €25.000,00. (resposta ao ponto 45. da base instrutória) - Dos € 25.000,00 entregues à "F - Calçado SA", como garantia pelo stock depositado na loja/estabelecimento da M acima mencionados, a autora S recebeu a quantia total de € 6.597,96 euros. (resposta ao ponto 46. da base instrutória) - Com a abertura da loja/estabelecimento da M - A ré estava no gozo de férias desde o dia 29 de Julho de - A ré, em 25/01/2005, efectuou à Sociedade M, um suprimento, no valor de € 1.295,00. (resposta ao ponto 52. da base instrutória) - A ré pagou à empresa de franchising F € 12,500,00 (direitos de entrada) dinheiro que lhe foi emprestado pelo pai, e que a Sociedade entregava a este em prestações mensais de € 484,00, cada. (resposta ao ponto 55. da base instrutória) - Em 30/09/2005, a ré pagou ao Banco, pela utilização do cartão de crédito, a quantia de € 914,49, extracto de 10/10/2005. (resposta ao ponto 56. da base instrutória) - E em 30/10/2005, pagou € 237,25, extracto de 10/11/2005. (resposta ao ponto 57. da base instrutória) - A autora S recebeu o cheque de € 6.597,96, pertença da sociedade. (resposta ao ponto 60. da base instrutória)
1.Da impugnação da decisão face à utilização de matéria de facto não provada.
Pretende a Recorrente, fazer retirar da circunstância do Tribunal da Relação ter modificado parcialmente a matéria de facto dos artigos 32°, 33° e 34° da base instrutória, maxime, ao ter retirado da resposta dada ao ponto 33. que as expressões proferidas o foram “em frente a clientes e no horário do seu funcionamento”, e dela se tendo servido para sustentar a sua decisão de direito, a eventual ilegalidae da decisão tomada.
Contudo, sem razão.
Não obstante o Tribunal da Relação tenha referido, talvez por lapso de simpatia em relação à primitiva redacção da pergunta inserta no ponto 33., que as discussões provocadas pela ora Recorrente com a Autora teriam ocorrido à frente dos clientes e durante o horário de trabalho, expressão esta que antes eliminara aquando da apreciação da impugnação da matéria de facto, tal expressão não se mostrou, nem se mostra, relevante para a conclusão que daí se extraiu, tendo sido, antes, fundamental, a circunstância de que todos aqueles eventos ali relatados contribuíram para a quebra do volume das vendas, como deflui da resposta dada ao ponto 34. da base instrutória e deflui, inequivocamente, do raciocínio expendido a este propósito no aresto sob censura.
Daqui decorre, sem necessidade de mais considerandos, por despiciendos, a improcedência das conclusões neste conspectu.
2.Da questão prévia da nulidade da deliberação tomada pela AG da Autora M, Lda, do dia 15 de Janeiro de 2007.
Vem a Ré, em sede de conclusões de recurso de Revista, levantar como a «questão prévia», a nulidade da deliberação tomada na AG da Ré M, realizada em 15 de Janeiro de 2007, pois na sua tese tendo tal AG sido marcada para ter lugar na Avenida da …, em Alfragide, onde existia um estabelecimento daquela entretanto encerrado, sendo a sua sede na Avenida …, em Miraflores, Oeiras e envolvendo a mudança da sede de uma sociedade comercial a alteração do contrato de sociedade com as consequências daí resultantes em matéria de consentimento e formalidades a assembleia não foi validamente convocada e, por isso, é nula a deliberação nela tomada, nos termos dos artigos 377º, nº6 e. 56°, n°1, alínea a) do Código das Sociedades Comerciais.
Esta questão foi suscitada pela Ré em sede de contestação, como defesa por excepção, tendo a mesma sido objecto de apreciação, pela sua improcedência, igualmente, no despacho saneador, do qual aquela, inconformada, interpôs recurso de agravo o qual veio a ser admitido, cfr fls 207 a 226, 232 e 269.
Contudo, tal recurso veio a ser julgado deserto por despacho de fls 273, face à ausência de apresentação de alegações pela Agravante, ora Recorrente, tendo a decisão que ora se pretende impugnar em sede de Revista, transitado em julgado, nos termos do normativo inserto no artigo 672º do CPCivil.
Falecem as conclusões quanto a este particular.
3.Da competência dos Tribunais comuns.
Insurge-se a Ré, aqui Recorrente, contra o Acórdão recorrido, uma vez que na sua tese porque estamos perante uma acção relativa ao exercício de direitos sociais a mesma é da competência dos Tribunais de Comércio, prevista no artigo 89°, nº 1, alínea c) da Lei 3/99 de 13 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais).
Conforme resulta inequivocamente dos autos, a Ré, aqui Recorrente, em sede de contestação, arguiu, além do mais, a excepção de incompetência material do Tribunal comum, sustentando que tal competência estaria deferida aos Tribunais de Comércio, atentos os interesses sociais em causa.
Aquando do despacho saneador, o primeiro grau tomou conhecimento da sobredita excepção e pela sua improcedência, como deflui de fls 207 a 216, sendo certo que da decisão então prolatada a Ré foi devidamente notificada e dela agravou, não tendo todavia apresentado as respectivas alegações de recurso, na oportunidade, pelo que a sua impugnação recursiva foi julgada deserta, cfr fls 273, tendo tal decisão transitado em julgado, nos termos do normativo inserto no artigo 672º do CPCivil, pelo que se mostra precludida a oportunidade de rediscussão de tal temática, improcedendo pois, também, as conclusões quanto a este ponto.
4.Do erro na forma de processo.
Defende a Ré que se há contas a prestar ou a liquidar é entre a sociedade e as sócias e não entre estas, sendo assim um problema de dissolução e liquidação da sociedade Autora.
Quer dizer, a seguirmos o raciocínio expendido pela Ré/Recorrente em sede de recurso de Revista, raciocínio esse também já antes defendido em sede de recurso de Apelação, estar-se-ia, eventualmente, face a uma questão de erro na forma de processo pois que o mesmo teria de seguir os termos do processo especial para liquidação judicial de sociedades a que aludem os normativos insertos nos artigos 1122º e seguintes do CPCivil, que nunca foi pela mesma arguida no primeiro grau, em sede de contestação, como lhe impunham os artigos 199º e 204º daquele mesmo diploma processual, o que aquela omitiu, tratando-se, desta sorte, de uma questão que a existir, sempre seria de se considerar sanada, para além de ser, inequivocamente, uma questão nova, pois só foi suscitada em sede de recurso.
Ora, como se sabe e constitui jurisprudência firme, os recursos destinam-se a tratar das questões discutidas na decisão judicial deles objecto, não se destinando a obter dos Tribunais superiores decisões sobre questões novas, salvo as de conhecimento oficioso que não tenham sido já discutidas.
A sobredita matéria não foi objecto de discussão, nem de conhecimento pelo Tribunal de primeira instância, tendo sido apenas trazida pela parte em sede de recurso de Apelação e, sem embargo de neste recurso ter sido tratada, foi-o indevidamente, pois excedeu o objecto do recurso e nesta medida, não será por nós conhecida.
5.Da condenação da Ré.
Insurge-se a Recorrente contra o Acórdão recorrido, uma vez que o Tribunal da Relação fundamenta a decisão que mantém a sua condenação a pagar às Autoras, na violação exclusiva dos deveres de cuidado e de lealdade a que estava adstrita para com as mesmas, não descortinando que dever de cuidado ou de lealdade para com a sociedade tenha a Ré violado, não se verificando o nexo causal exigido pelo artigo 79º do CSComerciais para a sua condenação.
Vejamos.
O Acórdão recorrido, no seguimento da sentença de primeiro grau, assentou a sua decisão no apuramento da violação pela Ré/Recorrente dos deveres de diligência e de lealdade, a que se refere o artigo 64º, alíneas a) e b) do CSComerciais, que considerou resultar da matéria dada como provada nas alíneas G) e H) da matéria assente e na constante das respostas aos pontos 1. a 36. da base instrutória
Efectivamente, parece ser inequívoco que daquela enunciada factualidade resulta a infracção por banda da Ré, enquanto sócia e gerente da Autora M, das mais elementares normas de conduta que integram a chamada «corporate governance», expressão esta que não obstante não seja definível juridicamente, abrange um conjunto de princípios válidos para uma gestão de empresa responsável, para o seu controlo e para a sua transparência, aí sendo abrangidas as regras jurídicas societárias aludidas no artigo 64º do CSComerciais, regras gerais de ordem civil, deveres acessórios de base jurídica, normas de gestão de tipo económico e postulados morais e de bom senso que interfiram na concretização de conceitos indeterminados, cfr João Soares da Silva, Responsabilidade Civil Dos Administradores De Sociedade: Os Deveres Gerais E A corporate governance, in ROA, Ano 57, Tomo II, 605/628, Menezes Cordeiro, Os Deveres Fundamentais Dos Administradores Das Sociedades, in ROA, Ano 66, Tomo II, 443/488.
Dos aludidos actos praticados pela Ré, resultou para esta, de harmonia com o normativo inserto no artigo 72º, nº1 do CSComerciais, a obrigação de indemnizar a sociedade Autora, tal como vem decidido pelas instâncias, porquanto aquela não logrou provar, tal como lhe competia, que agiu sem culpa, cfr Menezes Cordeiro, Código Das Sociedades Comerciais Anotado, 2ª edição, 2011, 279.
Por outra banda, atenta a factualidade apurada e resultante dos pontos 42. a 47. e 60. da base instrutória, dela decorre a responsabilidade da Ré para com a Autora S, a ressarcir nos termos do disposto no artigo 79º, nº1 do CSComerciais, já que os danos que esta veio a sofrer, ali plasmados, foram devidos à actuação negligente e culposa daquela, a qual causou a «falência» técnica da Autora sociedade, nela «arrastando» a Autora que se viu impedida de recuperar o investimento feito, para além de ter tido de efectuar desembolsos adicionais por via do encerramento do estabelecimento/loja que a sociedade tinha no centro comercial Dolce Vita, cfr Menezes Cordeiro, ibidem, 292.
As conclusões, estão, desta forma, condenadas ao insucesso.
III Destarte, nega-se a Revista, confirmando-se a decisão plasmada no Acórdão sob recurso.
Custas pela Recorrente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário que lhe foi concedido.
Lisboa, 14 de Fevereiro de 2013
(Ana Paula Boularot)
(Pires da Rosa)
(Maria dos Prazeres Pizarro Beleza)
|