Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | 6.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANTÓNIO BARATEIRO MARTINS | ||
Descritores: | AÇÃO EXECUTIVA EXECUÇÃO DE DECISÃO ESTRANGEIRA REGULAMENTO (UE) 1215/2012 REGIME TRANSITÓRIO DECLARAÇÃO DE EXECUTORIEDADE EXEQUATUR APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO REGULAMENTO (CE) 44/2001 TÍTULO EXECUTIVO EXEQUIBILIDADE EXECUÇÃO PARA PAGAMENTO DE QUANTIA CERTA EMBARGOS DE EXECUTADO | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 06/22/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA. | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO. | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | A disposição transitória constante do art. 66.º, n.º 2, do Regulamento n.º 1215/2012, ao mandar aplicar o Regulamento n.º 44/2001 às decisões proferidas (pelos tribunais dos Estados-Membros) em ações judiciais intentadas antes de 10-01-2015, quer dizer que, independentemente da data da prolação de tais decisões e da data em que venham a ser executadas, precisam tais decisões, para poder ser executadas, da prévia obtenção da declaração de executoriedade constante do art. 38.º, n.º 1, do Regulamento n.º 44/2001 (não lhes sendo aplicável a supressão do exequátur do art. 39.º do Regulamento n.º 1215/2012). | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: |
Processo 878/17.9T8VNF-D.G1.S1 6.ª Secção
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
I – Relatório R.P.Industries, SA., com sede na Av.ª da Independência, 8, em Braga, por apenso à execução, com processo ordinário, para pagamento de quantia certa que lhe moveu Avasco Industries Nv., com sede na Bélgica – para haver dela, com base em sentença proferida em 21/10/2015, pelo Tribunal de Comércio de ..., Divisão de ..., Bélgica, a quantia de € 47.386,01[1], sentença que segundo alegou se enquadra no âmbito de aplicação do Regulamento (EU) nº 1215/2012, de 12 de dezembro – veio deduzir embargos à execução, alegando, em síntese e no que aqui interessa[2], que o título dado à execução é inexequível, uma vez que a ação, em que foi proferido o título/sentença dado à execução, foi instaurada em 22/05/2014 e o Regulamento (UE) nº 1215/2012 só se aplica aos processos instaurados após 10/01/2015, sendo assim ao caso aplicável o Regulamento (CE) nº 44/2001, segundo o qual as decisões proferidas num Estado-Membro e que nesse Estado tenham força executiva, para serem executadas noutro Estado-Membro, têm que ser declaradas executórias a requerimento de qualquer parte interessada, declaração esta – de executoriedade – que não foi requerida pela exequente, razão pela qual o título dado à execução é inexequível. Contestou a exequente/embargada, sustentando, em resumo, que o Regulamento (UE) nº 1215/2012, de 12 de dezembro, é aplicável ao caso dos autos na medida em que, de acordo com o seu art. 81º, se aplica a partir de 10/01/2015, sendo que a sentença executada foi proferida pelo Tribunal de Comércio ... em 21/10/2015 (e tanto assim é, acrescenta, que o próprio Tribunal de Comércio de ... procedeu à emissão de certidão nos termos e para os efeitos do artigo 53º do Regulamento (CE) nº 1215/2012, de 12 de dezembro, o que não teria feito se o mesmo não fosse aplicável ao caso); concluindo pela improcedência do fundamento de oposição em causa (inexequibilidade do título executivo). Designada e realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador, tendo-se no mesmo julgado totalmente improcedente a questão da inexequibilidade do título (tendo-se entendido que o título era exequível, por se aplicar o Regulamento (UE)1215/2012).
Inconformada com tal decisão, interpôs a executada/embargante recurso de apelação, o qual, por Acórdão da Relação de ..., proferido em 17/12/2020, foi julgado improcedente, com a consequente confirmação da decisão recorrida. Ainda inconformada, interpõe agora a executada/embargante o presente recurso de revista, visando a revogação de tal Acórdão da Relação e a sua substituição por decisão que “decida pela inexequibilidade do título executivo”. Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: “(…) 1. O raciocínio da Tribunal a quo assenta numa premissa errada, justamente a de considerar que o legislador comunitário não regulou expressamente a situação dos autos - decisão a executar tenha sido proferida ao abrigo da lei antiga, no entanto a execução seja instaurada após a entrada em vigor da nova lei. 2. Dispõe o artigo 66.º n.º 2 do Regulamento 1215/2012 que "Não obstante o artigo 80.º, o Regulamento (CE) n.º 44/2001 continua a aplicar-se às decisões proferidas em ações judiciais intentadas, aos instrumentos autênticos formalmente redigidos ou registados e às transações judiciais aprovadas ou celebradas antes de 10 de janeiro de 2015 e abrangidas pelo âmbito de aplicação daquele regulamento." 3. É precisamente o termo "ações judiciais intentadas" que retira qualquer dúvida - aplica-se o Regulamento 44/2001 às decisões proferidas em ações judiciais intentadas antes de 10 de Janeiro de 2015. 4. Caso contrário, o legislador ao invés de se referir a "decisões proferidas em ações judiciais intentadas...antes de 10 de janeiro de 2015", referia "execuções instauradas ... antes de 10 de janeiro de 2015". 5. O artigo 66.º do Regulamento 1215/2012 é absolutamente esclarecedor, não deixando dúvidas que às decisões proferidas em ações judiciais antes de 10 de Janeiro de 2015 aplica-se o Regulamento 44/2011 e às proferidas em ações intentadas após aquela data aplica-se o Regulamento 1215/2012, não havendo espaço para uma interpretação diferente e, sendo irrelevante o momento em que a execução é instaurada. 6. Se o legislador previu que assim fosse, é indubitável que não iria prever expressamente qual o regulamento que se aplicaria às execuções de sentenças proferidas em ações instauradas antes da entrada em vigor do ultimo, pois, aquele preceito (66.º) já responde indiretamente e sem quaisquer dúvidas a tal. 7. Tendo sido este o entendimento da jurisprudência, nomeadamente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proc. 5007/13.5TBCSC.L1-6, de 21.01.2016. 8. Sendo relevante o momento em que a ação judicial na qual foi proferida a decisão é instaurada, que, in casu, se deu em 22.05.2014 e não o momento da instauração da execução que, in casu, ocorreu em 07.02.2017, é indubitável que é o Regulamento 44/2001 que se aplica aos presentes autos. 9. Não tendo sido requerida a declaração de executoriedade da decisão executada nos presentes autos, tal com prevê o artigo 36.º n.º 1 do Regulamento 44/2001, o título que serve de fundamento é inexequível..(…)”
A exequente/embargada respondeu, sustentando, em síntese, que o Acórdão recorrido não violou qualquer norma, pelo que deve ser mantido nos seus precisos termos. Terminou a sua a alegação com as seguintes conclusões: “(…) A) Vem o recurso interposto, pôr em causa o Douto Acórdão que manteve a decisão que considerou exequível a sentença que constitui o título executivo da presente execução, indeferindo, pois, a exceção invocada pela Recorrente. B) Com o devido respeito pelo alegado pela Recorrente, que muito é, terá sempre que se dizer que o presente recurso se encontra votado ao insucesso, na medida em que é indubitável a exequibilidade do título executivo subjacente à presente execução. C) Conclui o Tribunal de 1.ª instância, bem como o Tribunal da Relação de ... pela exequibilidade da sentença dada à execução, atento o disposto no artigo 81.º do Regulamento (EU) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, sendo que, de resto, o próprio Tribunal do Comércio de ..., Divisão de ..., 6.ª Secção, procedeu à emissão de certidão da decisão nos termos e para os efeitos do artigo 53.º do mesmo Regulamento. (…) R) Estabelece o artigo 81.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro o seguinte: “O presente Regulamento entra em vigor no vigésimo dia seguinte ao da sua publicação no Jornal Oficial da União Europeia. Aplica-se a partir de 10 de janeiro de 2015, com exceção dos artigos 75.º e 76.º, que se aplicam a partir de 10 de Janeiro de 2014.” S) A sentença aqui dada à execução foi proferida em 21/10/2015, pelo Tribunal do Comércio de ..., Divisão de ..., 6.ª Secção, referente ao processo n.º A/14/00353; T) Pelo que, quanto à aplicação no tempo, aplica-se ao caso concreto, o Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro; U) Basta, aliás, uma leitura simples da norma, a qual é absolutamente clara, sem reservas ou condicionantes; V) E, tanto assim é, que o próprio de Tribunal do Comércio de ..., Divisão de ..., procedeu à emissão de certidão da decisão nos termos e para os efeitos do artigo 53.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, o que jamais teria feito caso o mesmo não fosse aplicável ao caso em apreço; W) Ao abrigo do disposto no citado Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro, estamos perante uma decisão que se enquadra, para os devidos efeitos, no âmbito de aplicação do mesmo e, portanto, perante um Título Executivo Europeu (cfr. Artigos 1.º e 2.º do Regulamento). X) A aplicação do n.º 1, do artigo 36.º do citado Regulamento ao caso concreto, ou seja, a partir de 10 de janeiro de 2015, não consubstancia qualquer exceção: o artigo 81.º apenas exceciona os artigos 75.º e 76.º, que se aplicam desde 10 de janeiro de 2014; Y) As restantes normas do Regulamento (UE) n.º 1215/2012, de 12 de dezembro aplicam-se, sem mais, a partir de 10 de janeiro de 2015; Z) Tendo em consideração o supra exposto, dúvidas não restam de que o recurso apresentado não merece provimento, devendo manter-se a douta sentença proferida pelo Tribunal a quo. (…)”
Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
*
II. Fundamentação de facto Os elementos factuais relevantes, como já consta do relatório, são: - a ação, em que foi proferida a sentença dada à execução, foi instaurada em 22/05/2014 - tal ação foi contestada pela ali R. e aqui executada; - a sentença dada à execução foi proferida em 21/10/2015; - a exequente juntou com o requerimento executivo cópia da decisão proferida na língua original e traduzida para a língua portuguesa e certidão emitida pelo tribunal de origem nos termos do artigo 53º do Regulamento (UE) 1215/2012, estando reunidos os formalismos impostos por tal Regulamento; - e requereu a citação da executada previamente à penhora para dar cumprimento ao disposto no art. 43º do Regulamento (UE) 1215/2012 (que impõe que a certidão emitida nos termos do artº 53º seja notificada à pessoa contra a qual a execução é requerida antes da primeira medida de execução). - a exequente não requereu a declaração de executoriedade da sentença dada à execução.
*
III – Fundamentação de Direito Tratam os autos da execução num Estado-Membro (Portugal) duma sentença proferida noutro Estado-Membro (Bélgica), residindo a questão – a única questão da revista (como já antes havia sido a única questão da apelação) – em saber qual é o Regulamento Bruxelas I (relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial) ao caso aplicável: o inicial Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000 ou, ao invés, a sua “reformulação” constante do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012 (Regulamento este que, como resulta do seu artigo 80.º, revogou o Regulamento (CE) n.º 44/2001). Questão cuja relevância, no caso, decorre do Regulamento 44/2001 determinar, no seu artigo 38.º/1, que “as decisões proferidas num Estado-Membro e que nesse Estado tenham força executiva podem ser executadas noutro Estado-Membro depois de nele terem sido declaradas executórias, a requerimento de qualquer parte interessada”, enquanto o Regulamento 1215/2012 passou a determinar, no seu art. 39.º, que “uma decisão proferida num Estado-Membro que aí tenha força executória pode ser executada noutro Estado Membro sem que seja necessária qualquer declaração de executoriedade”. O que significa que, se for ao caso aplicável o Regulamento 1215/2012, podia a exequente requerer, como fez, a imediata execução da sentença proferida na Bélgica (limitando-se, como também fez, a juntar a certidão emitida nos termos do art. 53.º de tal Regulamento e a requerer que a mesma fosse “notificada à pessoa contra a qual a execução é requerida antes da primeira medida de execução”, conforme o disposto no art. 43.º/1 de tal Regulamento 1215/2012); e que, se for ao caso aplicável o Regulamento 44/2001, não podia a exequente requerer, como fez, a imediata execução da sentença proferida na Bélgica, uma vez que, antes, tinha que requerer, em Portugal, a sua declaração de executoriedade. Efetivamente, embora, nos termos do art. 33.º do Regulamento 44/2001, o reconhecimento duma sentença proferida noutro Estado-Membro seja/fosse automático ou ipso iure e sem necessidade de recurso a qualquer processo prévio, a atribuição de força executiva a uma tal sentença, nos termos do já referido art. 38.º/1 do Regulamento 44/2001, depende/ia dum processo prévio: uma declaração de executoriedade ou exequatur a requerimento de qualquer parte interessada, requerimento/processo que é/era um processo sumário não contraditório, em que a parte requerida não pode/ia apresentar observações, a apresentar ao tribunal ou à autoridade competente indicada na lista constante do anexo II ao Regulamento e que em Portugal é/era o Tribunal de Comarca, ou seja, a declaração de executoriedade é/era dada após um simples controlo formal – o art. 41.º do Regulamento determina/va que “a decisão será imediatamente declarada executória quando estiverem cumpridos os trâmites previstos no artigo 53.º, sem verificação dos motivos referidos nos artigos 34.º e 35.º” – havendo como que uma presunção favorável ao reconhecimento (dependendo a apreciação dos fundamentos de não executoriedade da sentença – os que constam/avam dos arts. 34.º e 35.º do Regulamento – da interposição de recurso e da alegação/prova de tais eventuais fundamentos). Enfim, a declaração de executoriedade do art. 38.º/1 do Regulamento 44/2001 é/era formal (bastava verificar se estavam “cumpridos os trâmites previstos no artigo 53.º”), porém, sendo aplicável o Regulamento 44/2001, tal procedimento “intermédio” a tomar antes da execução no Estado-Membro (em que a execução é requerida), é/era um pressuposto indispensável para a parte condenada na sentença proferida no outro Estado-Membro poder ser executada. E foi isto que não foi feito, pelo que, se for ao caso aplicável o Regulamento 44/2001, assiste razão à executada/recorrente, ou seja, o título/sentença dada à execução é (ainda) inexequível. E, a nosso ver, com todo o respeito pelas opiniões opostas vertidas nos autos, o Regulamento 44/2001 é mesmo o aplicável ao caso. Pelo seguinte: O Regulamento 1215/2012, nas suas disposições finais, mais exatamente nos seus artigos 80.º e 81.º, revoga o Regulamento 44/2001 e diz que o Regulamento 1215/2012 se aplica a partir de 10 de janeiro de 2015[3]. Mas, além disto, na sua disposição transitória, constante do seu art. 66.º, diz o Regulamento 1215/2012: 1. O presente regulamento aplica-se apenas às ações judiciais intentadas, aos instrumentos autênticos formalmente redigidos ou registados e às transações judiciais aprovadas ou celebradas em 10 de janeiro de 2015 ou em data posterior. 2. Não obstante o artigo 80.º (que revoga o Regulamento 44/2001), o Regulamento (CE) n.º 44/2001 continua a aplicar-se às decisões proferidas em ações judiciais intentadas, aos instrumentos autênticos formalmente redigidos ou registados e às transações judiciais aprovadas ou celebradas antes de 10 de janeiro de 2015 e abrangidas pelo âmbito de aplicação daquele regulamento. Preceito este que o acórdão recorrido convocou (e bem) para decidir, mas que interpretou, sempre com o devido respeito, incorretamente. Escreveu-se, no acórdão recorrido, que “não contém (…) o Regulamento (EU) 1215/2012 qualquer disposição transitória relativamente ao regulamento aplicável nas execuções instauradas após a entrada em vigor da nova lei, mas cujas decisões a executar, foram proferidas ao abrigo da lei antiga, por terem sido proferidas em processos iniciados antes da entrada em vigor da lei nova”; e, a partir daqui, observou-se/raciocinou-se que, “não tendo o legislador regulado expressamente tais situações, tendo a execução sido instaurada muito após a entrada em vigor da lei nova, entende-se que os requisitos a exigir pelo Estado membro requerido para executar a decisão proferida pelo Estado de origem são os exigidos pela lei nova, cuja aplicabilidade resulta do seu art. 81º”, acrescentando-se ainda que, “se o legislador pretendesse que a execução das sentenças proferidas em ações instauradas antes da entrada em vigor do Regulamento Bruxelas I-A continuasse a ser regulada pela lei antiga, não deixaria de o ter previsto, o que não fez.” Sucede – é o ponto – que os Regulamentos Bruxelas I (como é o caso dos 2 regulamentos em causa) dizem respeito e contêm regras sobre a competência judiciária e sobre o reconhecimento e execução de decisões (em matéria civil e comercial) proferidas noutro Estado-Membro, ou seja, contêm regras sobre a execução de decisões e não propriamente regras sobre o processo executivo, pelo que, é onde se quer chegar, não têm (não faz sentido que tenham) os Regulamentos Bruxelas I disposições transitórias relativamente ao regulamento aplicável a execuções e a processos executivos. A aplicação dos Regulamentos Bruxelas I às execuções acontece tão só, no seu momento inicial, para saber/dizer como devem ser tratadas as decisões proferidas pelos tribunais dos Estados-Membros: se como se estivesse perante decisões proferidas no Estado-Membro requerido (como resulta do já referido art. 39.º do Regulamento 2012/2015, preceito que suprimiu a declaração de executoriedade[4]) ou se como decisões que precisam do tal procedimento prévio e “intermédio” da declaração de executoriedade (como resulta do também já referido art. 38.º/1 do Regulamento 44/2001). Portanto, o art. 66.º/2 do Regulamento 2012/2015 – ao dizer que o “Regulamento (CE) n.º 44/2001 continua a aplicar-se às decisões proferidas em ações judiciais intentadas (…) antes de 10/01/2015” – diz tudo o que podia dizer, ou seja, diz (e quer dizer) que as decisões proferidas pelos tribunais dos Estados-Membros em ações judiciais intentadas antes de 10/01/2015 devem ser “tratadas” segundo o Regulamento 44/2001, isto é, não podem tais decisões ser tratadas como decisões proferidas no Estado-Membro requerido, precisando do tal procedimento prévio e “intermédio” da declaração de executoriedade (como resultava do referido art. 38.º/1 do Regulamento 44/2001). Em remate, o art. 66.º/2 do Regulamento 2012/2015 não contém qualquer “lacuna” e, ao falar em decisões proferidas pelos tribunais dos Estados-Membros em ações judiciais intentadas antes de 10/01/2015, contempla todos os momentos temporais em que tais decisões venham a ser proferidas e depois executadas, devendo as mesmas, repete-se, serão sempre tratadas, em termos de exequibilidade e força executória, segundo o Regulamento 44/2001[5]. É quanto basta, em conclusão, para julgar procedentes as alegações da executada/recorrente, uma vez que, como se vem de explicar, a exequente intentou a execução sem antes ter requerido/obtido a declaração de executoriedade do art. 38.º/1 do Regulamento 44/2001, o que significa que o título/sentença (proferida em ação intentada em 22/05/2014) dada à execução é (ainda) inexequível (enquanto não cumprir o estabelecido no Regulamento 44/2001, como o exige o art. 706.º/1 do CPC), razão pela qual, em consequência, se impõe revogar a decisão recorrida e substituí-la por decisão a julgar procedente a oposição por embargos e a determinar a extinção da execução. *
IV - Decisão Nos termos expostos, decide-se julgar procedente a apelação, concedendo a revista e revogando-se, em consequência, a decisão recorrida, que se substitui por decisão a julgar procedente a oposição por embargos e a determinar a extinção da execução. Custas aqui e nas instâncias pela executada/recorrida.
*
Lisboa, 22/06/2021
António Barateiro Martins (Relator) Luís Espírito Santo Ana Paula Boularot
*O relator declara que, nos termos do art. 15.º-A do DL n. 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo DL n. 20/2020, de 1 de maio, o presente acórdão tem voto de conformidade dos Conselheiros adjuntos.
Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).
__________________________________________________________
[1] Sendo: a) 7.869,00 relativa ao saldo da fatura nº UVF1500697, de 30.12.2011, acrescida de juros de mora à taxa de 8%, desde 28.02.2012 até efetivo e integral pagamento; b) 26.274,92 relativa ao saldo da fatura nº UVF1500698, de 27.05.2013, acrescida de juros de mora à taxa de 8%, desde 30.06.2013 até efetivo e integral pagamento; e c) 2.500,00, relativa à cláusula de indemnização calculada sobre os referidos montantes, acrescida de juros de mora legais, até efetivo e integral pagamento. [2] Alegou ainda ser titular de um contra-crédito sobre a exequente e haver erro no cálculo dos juros peticionados, questões que não foram objeto de decisão e que por isso não fizeram parte da apelação e da presente revista. [3] Exceciona os art. 75.º e 76.º (que diz que se aplicam a partir de 10 de janeiro de 2014), os quais versam sobre matéria que não vem ao caso. [5] Sendo de todo irrelevante que o Tribunal de Comércio de Gent haja procedido à emissão de certidão referida no artigo 53º do Regulamento 1215/2012, uma vez que tal certidão é emitida a pedido de qualquer interessado.
|